Camila Bandeira: “Vamos tornar a Fenearte um atrativo turístico”

Diretora-executiva da feira, Camila Bandeira, fala das novidades desta edição do evento, como a realização de atividades em 50 espaços do Recife e de Olinda que dialogam com o artesanato. O objetivo é atrair turistas para as cidades. Também anuncia a realização de um estudo que vai fornecer um diagnóstico do setor.

Q uem visitar a 23ª edição da Fenearte este ano, vai poder não só conhecer e adquirir as peças de mais de cinco mil artesãos que vão expor seus trabalhos no Centro de Convenções, mas também participar de uma ampla programação paralela que acontece em cerca de 50 espaços localizados no Recife e em Olinda. As atividades compõem o Circuito Fenearte e vão acontecer em galerias, museus e restaurantes. Entre as atrações estão a Feira de Arte Contemporânea, que acontece no Cais do Sertão, a mostra Tapeçaria Timbi: Bordando as obras do mestre J. Borges no Mercado Eufrásio Barbosa e a Cozinha Fenearte, iniciativa em parceria com o Instituto César Santos, com a participação de 10 restaurantes que vão apresentar um cardápio especial no período do evento.

“O público que gosta do artesanato também gosta de gastronomia, de moda, de artes visuais, de artes plásticas. Então, estamos ampliando esse diálogo com essas outras linguagens e para outros equipamentos”, explica Camila Bandeira diretora-executiva da feira. O intuito da inovação, segundo Camila, é transformar a Fenearte numa atração turística. A feira – que este ano acontece de 5 a 16 de julho – é considerada a maior da América Latina, tem investimento de R$ 8 milhões e a expectativa de movimentação financeira superior a R$ 40 milhões. Apesar desses números superlativos, o evento não conta com muitos visitantes de outros Estados e Camila acredita que a Fenearte tem o potencial para estimular o turismo no Recife e em Olinda.

A inspiração vem da Fuorisalone, famosa feira de design de Milão que oferece atrativos no entorno do salão onde acontece o evento e que atrai visitantes de outras localidades para a cidade italiana. Camila Bandeira, que também é diretora-geral de promoção da Economia Criativa da Adepe (Agência de Desenvolvimento de Pernambuco) conta, nesta entrevista a Cláudia Santos, as novidades da Fenearte, fala do estudo sobre o setor de artesanato que será iniciado durante o evento e ressalta a importância dos loiceiros (artesão que fazem peças utilitárias de barro), que são homenageados desta edição da feira.

Por que, nesta edição, a programação da Fenearte será realizada em outros espaços, além do Centro de Convenções?

Identificamos algumas questões que nos levaram para essa tomada de decisão. A primeira delas é que a Fenearte, por si só, apesar de todo potencial, não é ainda um atrativo turístico. São poucos turistas que vêm de fora de Pernambuco para a feira. Olhando para isso, começamos a pensar como que a gente conseguiria dar esse caráter e fomentar mais o turismo. Daí, surgiu a ideia do Circuito Fenearte, no qual estamos expandindo a feira para outros espaços, para atividades relacionadas com artesanato, mas com conexão com outras linguagens.

O público que gosta do artesanato também gosta de gastronomia, de moda, de artes visuais, de artes plásticas. Então, estamos ampliando esse diálogo com essas outras linguagens e para outros equipamentos. Acreditamos que , desta forma, vamos tornar a Fenearte um atrativo turístico. A feira, com a comercialização dos trabalhos dos artesãos continua sendo realizada no Centro de Convenções, não haverá nenhum ponto de venda fora dele, mas vamos oferecer uma programação paralela para colocar o artesanato em diálogo com outras linguagens e com isso incentivar o turismo.

Que tipo de atrações o visitante vai conhecer nesses outros espaços?

A gente vai ter o circuito gastronômico. Alguns chefs, que estarão na Fenearte, inclusive com a aula-show que é oferecida na feira, estarão também nos seus restaurantes, em seus espaços, ativando com prato especial, com horário estendido, com a sinalização de que ali também faz parte do Circuito Fenearte. Além de restaurantes, museus, equipamentos culturais, galerias de arte, espaços de economia criativa das cidades do Recife e de Olinda estarão com programação específica nesse período em que a feira é realizada. Alguns começando antes, outros estendendo até um pouco mais, mas cerca de 50 espaços serão ativados pela Fenearte, provocados para pensarem em programações específicas.

Essa iniciativa foi inspirada na feira Fuorisalone, de Milão, onde surgiram essas ativações orgânicas que iam acontecendo ali ao redor do salão principal do evento, segundo eu soube – porque não fui lá ainda – hoje essas atividades paralelas têm tanto poder atrativo quanto o salão. A economia da cidade vive atualmente a partir do que acontece no seu entorno, nas galerias, nos outros equipamentos que são ocupados.

Nesta edição, a feira homenageia os loiceiros. Qual a importância deles para o artesanato e para a identidade cultural de Pernambuco?

Esse saber tradicional da loiça é milenar, vem dos povos originários, muitas vezes as pessoas nem sabem, mas a própria arte figurativa vem da arte utilitária de pegar o barro da terra e fazer objetos como uma panela. A partir daí, vai-se modificando ao longo do tempo, através das tradições, até chegar no que a gente tem hoje como arte figurativa, arte expressiva, arte contemporânea.

Por isso a ideia de homenagear esse saber tão antigo, tão milenar, da raiz de onde vem, por exemplo, Vitalino e Maria Amélia, que são dois artistas renomados por trabalhar com cerâmica. Os pais de ambos eram loiceiros, eles começaram a ter esse contato com o barro e com a cerâmica ao fazerem objetos utilitários. Então, a ideia é homenagear todos esses mestres e mestras que estão espalhados pelo Estado todo.

Nessa edição vocês vão realizar um estudo sobre o setor. Qual o objetivo dessa pesquisa e quando os resultados serão concluídos?

O objetivo é a gente ter um panorama, um diagnóstico profundo sobre a cadeia do artesanato que vai nos dar subsídios para entender essa cadeia e podermos traçar as estratégias mais adequadas e estruturantes para esse setor. O estudo tem quatro pilares: mercado (olhar para o artesanato a partir do viés do mercado, conhecer onde é que esses artesãos vendem, como vendem, quais os canais de distribuição, de comercialização, o que poderia ser explorado, o que não está sendo); território (o lugar onde produzem e vivem influencia muito no resultado); o próprio artesão como pessoa e o objeto, a obra, a peça, que produz.

Com esse olhar completo, teremos esse diagnóstico, esse panorama para ter subsídios e poder traçar as estratégias dos próximos anos. A previsão é de que o estudo esteja pronto até o final deste ano. Ele será iniciado na Fenearte, porque vamos aproveitar a oportunidade desse momento, quando muitos artesãos estarão aqui, para fazer essa pesquisa. Mas o estudo vai continuar pós-Fenearte. Iremos até os seus territórios, vamos in loco fazer essa pesquisa para que ela fique robusta e, no final do ano, vamos divulgar esses resultados e traçar as estratégias a partir do ano que vem.

Apesar de o estudo ainda não estar concluindo, quais as informações econômicas que se tem do setor?

As informações estão muito dispersas, desatualizadas e esse é um dos motivos pelo qual a gente precisa desse estudo robusto, consistente. Existe uma pesquisa sobre o setor de economia criativa como um todo, realizada pela Fundação Itaú, que, acho, serve como um balizador para nós. É uma referência. Ela aponta que a economia criativa representa 3% do PIB nacional. Esse é um dado muito relevante mas, agora, como mencionei, o estudo abarca todas as atividades da economia criativa e não só o artesanato.

Esse estudo não separa as diferentes linguagens do setor, como a gente pretende entrar, cascavilhar e entender, realmente, todas as nuances que o artesanato tem. Nossa ideia é, depois de concluída a nossa pesquisa, aproveitar essa experiência e fazer estudos sobre outras linguagens da economia criativa, como games, audiovisual, moda, gastronomia etc.

Existem informações sobre o impacto que a pandemia causou entre os artesãos?

O que eu posso dizer é que, segundo outros estudos aos quais tive acesso, o artesanato, mesmo durante a pandemia e até mesmo por causa dela, foi o segundo colocado entre as linguagens que mais são valorizadas pelos brasileiros. Eu não posso falar de crescimento econômico ainda porque não tenho os dados, mas o artesanato fica atrás apenas de games.

Isso talvez seja em razão do consumo consciente, responsável e sustentável. Talvez durante a pandemia tenha vindo muito à tona essa questão que está relacionada à produção do artesão. Na pandemia também as pessoas se voltaram para organizar suas casas e as peças artesanais entram como decoração. As artes visuais tiveram também um salto. A própria questão da ancestralidade, da identidade, as pessoas se voltando para o que é da sua cultura, acho que o artesanato seduz muito nesse sentido.

O conceito de artesanal está se expandindo, por exemplo para gastronomia, para a cerveja. E esta edição da Fenearte terá algumas novidades nessa área. Quais são elas?

Sim. Estamos dando um destaque, realmente, este ano para a gastronomia. Lançamos o restaurante Pernambuco à Mesa, que é um projeto da nossa diretoria a partir, também, dessa ligação com o tema deste ano, a loiça. A ideia do projeto Pernambuco à Mesa é que chefs pernambucanos que darão aulas na Fenearte também vão servir seus pratos para o público visitante numa grande mesa – como o pernambucano gosta e sabe fazer muito bem. Para ele, servir a mesa é um ato de acolher as pessoas, de ter uma boa conversa, tem muito de afeto.

Vamos tentar, de certa forma, transmitir essa característica cultural a partir desse projeto que vai ser uma grande mesa com as loiças, com os utilitários decorativos de cerâmica, de barro e os chefs vão produzir seus pratos.

Fale um pouco da sua trajetória profissional.

Estou há mais de 20 anos nesse mercado de economia criativa, sou fundadora da primeira empresa de economia criativa do Porto Digital, quando ele ampliou a atuação e incorporou, além da tecnologia, a área de economia criativa. A minha empresa foi a primeira a fincar a bandeira nesse sentido, a Proa Cultural e, desde então, a gente tem explorado bem esse universo, olhando para a cultura como negócio, como ferramenta de comunicação e transformação social.

Abri a Proa em 2010. Antes disso passei por agências de publicidade e produtoras de eventos, sou formada em administração com especialização em marketing, mas sempre gostei da cultura, sempre fui mais por esse lado, trabalhando com eventos e cá estou! Sou conselheira do Porto Digital e desde março assumi, de cara, esse desafio maravilhoso de realizar a Fenearte. Antes eu já tive a oportunidade de trabalhar na feira, com a Proa, produzindo a parte de conteúdo digital.

Eu cheguei há três meses, mergulhei na Fenearte e mal tenho tempo para pensar em outra coisa. Mas passando a Fenearte, se a gente conversar daqui a outros três meses, eu terei um monte de coisa para lhe dizer porque eu vou ter feito meu planejamento. Mas nós já temos várias diretrizes traçadas do planejamento, de forma geral, para todos os setores da economia criativa.

A ideia é olhar para a economia criativa, para a cultura, como negócio. Nós dizemos que a parte de salvaguarda e de transmissão de saberes é fundamental, mas é da alçada da Fundarpe e da Secretaria da Cultura. Nós estamos ligados à Agência de Desenvolvimento Econômico que, por sua vez, está ligada à Secretaria de Desenvolvimento Econômico. Então, temos esse olhar econômico para a cultura, para a criatividade. As diretrizes vão bem por aí: gerar emprego e renda e olhar para o trabalho e para o trabalhador da cultura e da economia criativa com esse olhar de longo prazo, com essa visão estruturante. É isso que a gente vai querer implementar.

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