Vidas absolutas e alento- Por Maurício Costa Romão*

 As mídias em geral têm repercutido ad nauseam o nefasto atingimento de 100 mil mortes por coronavírus no Brasil, registrado no dia 8 de agosto próximo passado. E aí não adianta acalentar ressalvas de que o País é continental, onde vivem 213 milhões de pessoas e que, portanto, em se tratando de uma pandemia, o número de óbitos tem que ser visto não em termos absolutos, mas proporcionalmente ao tamanho de sua população.

Se assim fosse feito, o Brasil teria no cotejo internacional uma taxa até razoável de 504 óbitos por milhão de habitantes, atrás, por exemplo, de países como a Bélgica (857), Peru (789), Espanha (612), Reino Unido (609), Itália (585), Suécia (572), Chile (543), Estado Unidos (521), e um pouco acima da França (466). (Dados de 16/8/2020, Worldmeter)

Embora tal procedimento seja o correto, do ponto de vista avaliativo, argumentar a seu favor nesta hora triste é minimizar a tragédia das mortes, circunscrevendo-as a meros números relativos, quando, o que importa mesmo são as vidas absolutas perdidas.

Não obstante o infortúnio vivenciado, é oportuno observar o quadro numérico da crise sanitária no Brasil a partir de algumas tendências recentes que se estão delineando.

Veja-se, por exemplo, o número de mortes desde o dia 12 de julho até o dia 15 de agosto (28 dias, para coincidir com as últimas quatro semanas epidemiológicas computadas pelo Ministério da Saúde, da 30ª a 33ª, quer dizer, de 19-25/07 até 9-15/08). Calcule-se para esse período a média móvel de 7 dias desde o dia 19 de julho. O resultado está espelhado no Gráfico 1, abaixo. A média móvel consiste em incorporar continuamente novos dados da série, descartando os mais antigos, o que a torna sempre atualizada. Tem a vantagem adicional de diluir o peso dos valores extremos, e arrefecer oscilações bruscas, por exemplo, como as que ocorrem nos registros de casos do vírus nos fins de semana.

Nota-se que a linha de óbitos, construída a partir das 21 médias do período, apresenta um perfil evolutivo descendente, indicando que as últimas quatro semanas registraram promissora tendência de regressão diária de vidas perdidas.

 

O mesmo pode ser visto de outro ângulo, olhando-se o histograma no Gráfico 2, que retrata o número de mortes no Brasil por semana epidemiológica.

 

Vê-se que quando o país ultrapassou pela primeira vez a lamentável marca de mais de 7 mil mortes na 23ª semana epidemiológica (31 de maio a 6 de junho), de lá para cá houve uma notável estabilidade nesses números, conforme está ilustrada pela linha vermelha de tendência.

Isso significa que nos últimos 75 dias, inobstante o total de óbitos por semana continuar alto, gravitando no entorno de 7 mil por semana, ou mil por dia, esse total não está aumentando, tendo, inclusive, uma leve perspectiva de baixa a partir da 30ª semana (colunas azul-claras).

O corolário dessa constatação se reflete na taxa de letalidade do coronavírus (total de mortes sobre o total de casos), ajudando a explicar a significativa queda na sua trajetória (Gráfico 3).

 

 

Desde o primeiro caso de morte registrado no país em 17 de março, a taxa de letalidade cresce continuamente até atingir 7% no fim de abril. Permanece ao redor desse patamar até meados de maio e, a partir de então, inicia trajetória sistemática de queda, estando hoje estabilizada no entorno de 3,2%.

Isso é importante porque mostra que embora o total de casos registrados da Covid-19 esteja aumentando no País, como acontecer em muitas partes do mundo, a quantidade de vidas perdidas pela doença está diminuindo proporcionalmente. Em outras palavras, dos novos casos de contração da doença, uma quantidade relativa cada vez menor de pessoas está falecendo e mais pessoas se estão recuperando.

Por último, se se considerar o número de novos casos de coronavírus no Brasil do ponto de vista das médias móveis de 7 dias (girando atualmente perto de 45 mil casos por dia), das mesmas quatro semanas epidemiológicas tratadas neste texto, pode-se notar que há estabilidade e até ligeira tendência de declínio de ocorrências na população.

Essa constatação está retratada no Gráfico 4 abaixo.

 

Não há nada que compense as vidas que se foram. Resta pelo menos o alento de que o quadro devastador da doença no Brasil emite sinais de que pode estar em regressão.

* Maurício Costa Romão, é Ph.D. em economia pela Universidade de Illinois, nos Estados Unidos. mauricio-romao@uol.com.br

 

 

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