Monumento aos Mártires de 1710, 1817 e 1824 (Por Leonardo Dantas Silva) – Revista Algomais – a revista de Pernambuco
Arruando pelo Recife

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Leonardo Dantas Silva

Monumento aos Mártires de 1710, 1817 e 1824 (Por Leonardo Dantas Silva)

Das antigas províncias formadoras do território nacional, nenhuma contribuiu com o maior número de mártires em favor da causa da liberdade do que Pernambuco, haja visto a imensa lista de condenados à pena capital nos movimentos emancipacionistas de 1710, 1817 e 1824. Numa consulta à História de Pernambuco, veremos que todos os movimentos emancipacionistas aqui originários estavam inspirados no orgulho nativista dos Restauradores de 1654.

Uma mesma ideologia, a de que os antepassados pernambucanos conquistaram esta terra aos holandeses e que doaram a El-Rei de Portugal debaixo de certas condições, se repete ao longo de todas as revoluções e vem explicar o ideal republicano da gente de Pernambuco. Esse comportamento é uma constante em quase todos os movimentos revolucionários como bem observou Evaldo Cabral de Mello, “uma espécie de doutrina das relações entre a Capitania e a Coroa”.

Falta a essa legião de mártires o reconhecimento da gente pernambucana que, até o momento, em que pesem às comemorações pelo transcurso do segundo centenário da Revolução de 1817, ainda não tiveram os seus nomes gravados em um grande bloco de granito a ser colocado na Praça da República. Assim sendo, estamos propondo a construção deste Monumentos aos Mártires da Pátria, constituído de um bloco de granito de cinco metros, inclinado sobre o jardim central da Praça da República, no qual, em sua face polida, sejam talhados os respectivos nomes dos que deram a vida pela causa da liberdade, de modo a ser conhecidos e reverenciados pelas gerações do presente e do futuro.

O IDEÁRIO PERNAMBUCANO
O sentimento de pernambucanidade que nos move ao longo dos séculos é derivado da doutrina formadora do sentimento nativista presente nas guerras que antecederam a Restauração Pernambucana de 1654:

A gente da terra deveria à Coroa não a vassalagem ‘natural’ a que estariam obrigados os habitantes do Reino e os demais povoadores da América Portuguesa, mas uma vassalagem de cunho contratual, de vez que restaurada a capitania do domínio dos Países Baixos, haviam-na espontaneamente restituído à shttp://portal.idireto.com/wp-content/uploads/2016/11/img_85201463.jpgania portuguesa (Evaldo Cabral de Mello in Rubro Veio)

Quando da revolta dos habitantes de Olinda contra os do Recife, em que se falou na criação de uma república nos moldes venezianos, proclamada em 7 de novembro de 1710, surgiu que veio a ser consagrada pela expressão do escritor José de Alencar (1829-1877) de Guerra dos Mascates; título inspirado na da publicação do romance publicado em 1873.
Tratava-se pois de um movimento com um ideário separatista, defendido por alguns dos seus líderes de sentimentos antimonárquicos, falando-se em transformar Pernambuco em uma república, “ad instar a de Veneza”, ou em um governo autônomo “sob a proteção do Rei de França”. No dizer do conselheiro Antônio Rodrigues da Costa, em pronunciamento perante o Conselho Ultramarino (Lisboa), “uma sublevação formal e abominável, de que não há exemplo na Nação Portuguesa, sempre fiel e obediente aos seus legítimos Príncipes”.

Temendo pela sua segurança o governador português Sebastião de Castro Caldas foge para Bahia, deixando no governo da capitania o bispo dom Manuel Álvares da Costa, que vem governar Pernambuco até 10 de outubro de 1711, quando é substituído por Felix José Machado de Mendonça Eça Castro e Vasconcelos. Este, nomeado pela Coroa portuguesa, aqui permanece até 1º de junho de 1715, quando retorna à Lisboa (Loreto Couto).

No período do seu governo, Felix Machado, a propósito de um suposto plano para assassinar o governador, mandou prender e enviar ao Reino os principais responsáveis pelo primeiro levante, ao arrepio do perdão régio que lhes fora anteriormente concedido por D. João V, segundo bem esclarece Evaldo Cabral de Mello:
“Pela portaria de 16 de fevereiro de 1712, o novo governador ordenou a João Marques Bacalhau que, com o auxílio dos oficiais da justiça e da milícia, procedesse à detenção de quinze indivíduos. A lista compreendia Leonardo Bezerra Cavalcanti; seus filhos Cosme e Manuel Bezerra Cavalcanti; seus irmãos Cosme Bezerra Monteiro, Manuel e Pedro Cavalcanti Bezerra; André Dias de Figueiredo e José Tavares de Holanda; João de Barros Rego; Bernardo Vieira de Melo e seu filho André; Matias Vidal de Negreiros; João de Barros Correia; Matias Coelho Barbosa; e Sebastião de Carvalho Andrade.”

Recolhidos à cadeia do Limoeiro, em Lisboa, pouco se sabe do final do processo desses pernambucanos, mas tão somente o que nos informa Rocha Pitta, concluindo pela absolvição dos acusados, “fazendo embarcar só dois para a Índia em degredo perpétuo”. Ocorre, segundo pondera Evaldo Cabral de Mello (Fronda dos Mazombos; 1995), que quando a sentença absolutória vem a ser prolatada, “já havia poucos a perdoar, pois nada menos de oito presos haviam falecido no Limoeiro”.

Graças às certidões de óbito fornecidas pelo vigário da paróquia de São Martinho, freguesia da Alfama, na qual localizava a cadeia do Limoeiro, “pode-se reconstituir esta intrigante sucessão de mortes”: Manuel Cavalcanti Bezerra (8.1.1714); Bernardo Vieira de Melo (10.1.1714); André Vieira de Melo (10.4.1715); Cosme Bezerra Monteiro (10.5.1715); João Luís Correia (9.6.1715); Matias Coelho Barbosa (13.4.1716); Manuel Bezerra Cavalcanti (11.9.1717); André Dias de Figueiredo (27.11.1718).

Conclui José Antônio Gonsalves de Mello, que, pela interligação de um ideário de liberdade dos pernambucanos que remonta “à vitória sobre os holandeses e se renova não só em 1710, aqui referido, como ainda em 1817, 1824 e 1848. Dentro dessa linha de reivindicações, aqueles que pagaram então com a vida, nas celas do Limoeiro, seu ideal político de participação no governo de sua terra, estão na companhia de outros mártires pernambucanos como o padre João Ribeiro, frei Caneca e Nunes Machado”.

Por conta da proclamação das República de 1817, treze presos foram condenados à morte. Quatro foram fuzilados em Salvador e nove foram enforcados no Recife, sendo depois seus corpos esquartejados, com as cabeças e mãos expostas em diferentes locais públicos de Pernambuco e da Paraíba, e os troncos amarrados e arrastados por cavalos até o cemitério.

Morreram como consequência direta no envolvimento da revolução em 1817: No Largo do Erário (atual Praça da República), depois denominado de Campo da Honra, em 8 de julho de 1817, os capitães Domingos Teotônio Jorge Martins Pessoa e José de Barros Lima; além dos mártires Antônio Henrique Rabelo, Amaro Coutinho, José Peregrino Xavier de Carvalho, Inácio de Albuquerque Maranhão e o padre Antônio Pereira de Albuquerque.

Na Bahia foram executados por fuzilamento no Campo da Pólvora: o padre José Ignácio de Abreu e Lima – Padre Roma, em 29 de março de 1817; seguindo-se dos patriotas Domingos José Martins, José Luiz de Mendonça e o padre Miguel Joaquim d’Almeida (frei Miguelinho), em 12 de junho de 1817.

Um monumento aos Mártires da República de Pernambuco de 1817, concebido em bronze pelo escultor Abelardo da Hora, foi inaugurado na Praça das República em 1987 pelo Governo de Pernambuco, atendendo à sugestão do Instituto Arqueológico, Histórico e Geográfico Pernambucano, mas omite os nomes dos que morreram pela causa republica e não faz qualquer referência aos que foram imolados por conta dos movimentos libertários de 1710 e de 1824.

Segundo o padre Dias Martins, autor do livro Os Mártires Pernambucanos – vítimas da liberdade nas duas revoluções ensaiadas em 1710 e 1817 (Recife, 1853), a lista dos denunciados nos dois movimentos somam o número de 628 se forem a ela acrescidos os que sofreram nas enxovias das prisões.

Com a Confederação do Equador, iniciada em 20 de março de 1824, culminando com o manifesto de Manuel de Carvalho Paes de Andrade, em 2 de julho, novamente a chama da liberdade toma conta de Pernambuco, numa revolta contra o poder absolutista de Dom Pedro I.

Pernambuco foi punido pelo nosso primeiro imperador com a perda do território da Comarca do São Francisco, que se estendia da vila de Juazeiro às fronteiras com a Capitania das Minas Gerais, numa área estimada em cerca de 130 mil quilômetros quadrados, superior ao atual estado.

O movimento de caráter republicano, que tinha como líder o carmelita frei Joaquim do Amor Divino Caneca, vem a ser derrotado em 29 de novembro de 1824, sendo os principais envolvidos punidos com a pena capital. Por conta de seu envolvimento com a Confederação do Equador foram condenados à morte, além do carmelita Joaquim do Amor Divino Caneca, fuzilado em 13 de janeiro de 1825, foram enforcados João Guilherme Ractcliff, Joaquim da Silva Loureiro, João Metrowich, Agostinho Bezerra Cavalcanti e Souza, Nicolau Martins Pereira, James Heide Rodgers, Antônio do Monte e Francisco Antônio Fragoso; os três primeiros no Rio de Janeiro e os demais no Recife.

Todos esses patriotas que morreram pela causa da liberdade, nas revoltas de 1710, 1817 e 1824, merecem ter seus nomes talhados no granito deste Monumento aos Mártires da Pátria de maneira ser lembrados pelas gerações do presente e do futuro.

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