É importante preservar direitos básicos do trabalhador – Revista Algomais – a revista de Pernambuco

É importante preservar direitos básicos do trabalhador

Bruno Baptista elegeu-se presidente da OAB-PE (Ordem dos Advogados do Brasil-seccional Pernambuco) concorrendo numa chapa única, algo incomum para a entidade, que sempre teve eleições disputadas, e para o momento atual do País onde as opiniões são tão radicalmente polarizadas. Nesta conversa com Cláudia Santos e Rafael Dantas, Baptista falou dos planos da sua gestão e da participação da ordem em assuntos importantes para o País e o Estado como a violência urbana e as reformas trabalhista e da Previdência.

Quais são seus planos à frente da OAB-PE?
Nossa meta é aproximar ainda mais a OAB dos advogados e da sociedade, para que sirva como uma caixa de ressonância da sociedade e da advocacia. Queremos valorizar cada vez mais as prerrogativas profissionais que são muito mais direitos do próprio cidadão. Quando você tem um advogado atuando com respeito às prerrogativas é o cidadão, o cliente dele, quem tem essa garantia. Também nos voltamos para os jovens advogados. Quando eu comecei, há 18 anos, a grande dificuldade era ter meu próprio escritório e pagar despesas de condomínio, secretária, telefone. Hoje, oferecemos dentro da nossa sede, um local onde o advogado vem gratuitamente e pode atender o seu cliente. Por outro lado, precisamos dar uma atenção maior para aqueles que atuam no interior. Por fim, planejamos uma gestão administrativa com transparência. A gestão anterior de Ronnie Duarte deu um grande avanço em relação a isso.

Quais as ações para aproximar a OAB da sociedade?
A OAB tem um papel que ultrapassa as barreiras das representações da classe. Todos os grandes momentos da história recente do País tiveram a participação da OAB. Então é fundamental que a OAB de Pernambuco tenha uma maior participação nos momentos importantes do Estado. Por exemplo, hoje nós enfrentamos um grave problema de insegurança pública e é essencial que participemos do debate, contribuindo e não apenas criticando, até porque não temos partido político. Nosso papel é contribuir. O mesmo acontece na saúde pública. A OAB, em razão do número de advogados que possui e em razão da representatividade da categoria, pode apoiar esses debates.

Qual a análise que o senhor faz sobre a violência no Estado?
Na implantação do Pacto pela Vida houve uma redução dos crimes dolosos contra a vida e de roubos, e a gente tinha uma sensação de segurança maior. Mas houve problemas na execução do Pacto Pela Vida. Ultimamente deu uma melhorada, mas ainda estamos longe da situação ideal. Não tenho dúvida de que um dos principais problemas que o cidadão tem hoje em dia é a insegurança de não poder andar na rua, de sair de casa sem saber se vai voltar, e de ficar preocupado com os filhos que estão na rua. Ano passado promovemos um debate com a participação de especialistas de todo o País, inclusive fizemos sugestões para o governo, como a valorização da carreira policial e o aparelhamento das delegacias no interior do Estado. Foram várias sugestões, algumas de fácil execução, que não demandam muitos recursos. O importante é congregar os esforços e que todo mundo – polícia, cidadão, OAB, judiciário, Ministério Público – participe para achar o melhor caminho.

Como o senhor analisa o projeto anticrime do ministro Sérgio Moro?
Vejo alguns pontos positivos. Mas existem muitas questões que ainda serão submetidas ao Supremo Tribunal Federal. Por exemplo, a prisão após julgamento em segunda instância: não adianta se mudar a lei sem antes o Supremo determinar se isso é inconstitucional ou não. Minha opinião é que é. Mas o projeto não ataca o ponto principal da insegurança. Acho que elevar a pena de uma maneira geral não coíbe criminalidade. O que coíbe é a ausência da impunidade. Ninguém vai deixar de delinquir porque a pena é maior mas, sim, quando souber que delinquindo será preso efetivamente e irá responder pelo crime que praticou. As estatísticas mostram que a maior parte dos homicídios que acontece no País não chega à solução, assim como os roubos. A gente não pode encarar esse projeto como uma panaceia, uma solução de todos os males, porque não é. São necessárias várias outras coisas para a gente ter uma melhora na questão da insegurança e da criminalidade.

Como vocês conseguiram o feito de concorrer com uma chapa única em tempos de tanta polarização?
Isso é um motivo de muito orgulho para nós, já que vivemos em um momento de tanta divergência. Nossas eleições normalmente são bem disputadas. Acho que se deve a uma gestão bem aprovada e a uma chapa que representa todos os setores da advocacia. Nossa chapa tem mais de cem pessoas, tem todo tipo de advogado (iniciantes, veteranos, da capital, do interior). Essa pluralidade contribuiu muito para a formação da chapa única.

Como o senhor avalia as críticas do presidente nacional da OAB Felipe Santa Cruz de que a Lava Jato não pode se prolongar por tanto tempo?
A Lava Jato foi e continua sendo fundamental para o País. É muito importante para se acabar com a ideia que se tinha no Brasil de que os poderosos não são punidos. O presidente fez a declaração muito mais no sentido de criticar os métodos da Lava Jato e, aí, realmente eu acho que ele tem a razão, de que se extrapola às vezes o devido processo legal, como a ampla defesa. A crítica, eu acredito, tenha sido ao método e não à operação.

Quanto à reforma da Previdência Social, como realizá-la sem afetar os direitos do trabalhador?
Já está pacificado de que a reforma é necessária. Temos um sistema previdenciário, que vem dos anos 1980, 90, e ocorreram mudanças como a expectativa de vida da população. Hoje há pessoas que chegam à idade produtiva com 70 anos e que produzem muito bem. O que eu acho é que a reforma tem que focar em dois pontos. O primeiro é acabar com os privilégios, não se admite hoje a manutenção de privilégios, que eram justificáveis no momento em que tínhamos 30 pessoas contribuindo para um inativo. Hoje a proporção é de três para um e não se justifica mais isso. Segundo, temos que olhar para aquelas pessoas que precisam da Previdência, aquelas que ganham um salário mínimo, que vivem no corte da cana, da exploração do gesso. A idade mínima de 65 anos é justa? Sim, em alguns casos. Para advogados, por exemplo. Muitos chegam a essa idade no auge, o mesmo ocorre com um médico. São atividades que permitem ao profissional chegar aos 65 com uma alta produtividade. Já o cortador de cana de 65 anos de idade não vai encontrar emprego em lugar algum. Quem convive com isso, e eu convivo porque atuo nessa área, percebe que um trabalhador desses de 50 anos aparenta muitas vezes ter 70. Além disso, a expectativa de vida é variável. A média hoje no Brasil é de 75 anos, mas enquanto em Santa Catarina a média chega aos 80 anos, no Maranhão não chega nem a 65. Outra coisa, a expectativa de vida em Boa Viagem e do Coque são completamente diferentes. Então, é injusto passar uma régua tratando todo mundo igual. Acho que tanto o projeto anticorrupção do Moro quanto a reforma da Previdência precisam ser debatidos com a sociedade. É algo que influi na vida de todo mundo, então, é importante que o Congresso abra esse espaço. Tem que ser feito um debate para se conhecer as realidades e para que se tenha uma precisa noção.

Um debate que não aconteceu na eleição passada.
É verdade. O debate foi muito ideológico e cultural, mas deveria ter sido sobre as reformas da Previdência, tributária, política, questões trabalhistas. Estão falando da extinção da Justiça do Trabalho, que é um completo e total absurdo e vai deixar desamparado o trabalhador. Tudo isso deveria ter sido discutido durante a campanha. A gente teve muito mais votos contra do que a favor. Votava-se em um porque não queria o outro. Mas ainda existe tempo de se debater esses assuntos.

O senhor acredita que a apologia à ditadura militar feita por certos setores põe em risco a democracia?
Acho que o pleito foi democrático; foi escolhido o presidente da República de uma maneira legítima e democrática e a gente tem que respeitar essa maneira como foi escolhido e o projeto de governo dele. Mas é importante ficarmos atentos contra qualquer tipo de retrocesso. Não acredito que isso parta do próprio presidente da República, mas é necessário que as instituições sejam fortalecidas para que as pessoas passem e as instituições fiquem.

Como o senhor analisa a reforma trabalhista?
Houve uma redução no número de demandas. Acho que nós ainda vamos sentir os efeitos dela mais adiante, mas é importante que se preservem esses direitos básicos do trabalhador. Muita gente fala para extinguir a Justiça do Trabalho. Mas 60% das demandas versam sobre verbas trabalhistas de rescisão. É o básico do básico. Então, aquelas ações que havia na Justiça do Trabalho antigamente, como dano moral de mais de R$ 1 milhão, isso não existe. É uma minoria ínfima. Um erro da reforma trabalhista pode ser observado agora na questão de Brumadinho com a limitação das indenizações. Famílias que perderam tudo, ao que tudo indica por culpa do empregador, vão ter a indenização limitada em 200 salários mínimos. Claro que não se repara uma vida nunca, mas você receber uma indenização dessas, com esse limite para a perda de uma vida por culpa de uma empresa é um absurdo. Isso demonstra erros que essa reforma trabalhista teve, inclusive a OAB Nacional ingressou com uma ADPF (arguição de descumprimento do preceito fundamental) que é usada para discutir uma norma em face da Constituição. O objetivo é discutir essa limitação das indenizações trabalhistas. Mas houve também pontos positivos como, por exemplo, quando você obriga a parte a pagar os honorários de sucumbência da outra parte (princípio pelo qual a parte perdedora no processo é obrigada a arcar com os honorários do advogado da parte vencedora). Isso já faz com que se pense duas vezes antes de entrar com a ação.

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