As campanhas políticas são machistas – Revista Algomais – a revista de Pernambuco

As campanhas políticas são machistas

A conselheira do Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco, Teresa Duere, fala à equipe da Algomais sobre sua trajetória social e política. Sua amizade com Dom Helder e a sua experiência de viver no Chile, em anos de ditadura militar no Brasil também entraram na conversa. Recifense, ela foi uma das deputadas estaduais de maior destaque na Assembléia Legislativa de Pernambuco.

Como foi a sua infância?
A minha infância foi muito boa. Sou recifense com muito orgulho. A cidade ainda era pacífica. As crianças podiam brincar na rua, podiam viver e ser criança. Tinha o Parque 13 de maio, tinha a festa da mocidade… Morei na Av. Visconde de Suassuna. Meu pai era empresário e depois foi político. O único trabalho da minha mãe foi ser voluntária no Banco da Providência com Dom Helder Camara.

A senhora teve contato com Dom Helder?
Trabalhei nove anos com ele. Eu fui fazer parte de um movimento chamado “Bandeirantismo” que, à época, era uma forma de você dar formação. Quem foi minha chefe foi Zezita Cavalcanti, secretária de Dom Helder. Fui uma das selecionadas para estagiar e lá fiquei trabalhando em uma área que Dom Helder chamou de “Operação Esperança”, que era um movimento de formação de grupos para discutir as questões de direitos sociais, principalmente nas periferias. Depois ele ganhou um prêmio do exterior e quis mostrar que a reforma agrária era possível. Com esse prêmio comprou três engenhos e a partir daí fui trabalhar na zona rural, na questão da reforma agrária, no Cabo. Eu devia ter uns 20 e poucos anos.

Como era esse trabalho?
Reunião com associações. Trabalhava com eles para a formação da comunidade do engenho, formávamos escola, tínhamos uma área coletiva onde todos tinham que dar uma contribuição. Todo um trabalho de educação social.

Esse trabalho influenciou sua carreira?
Eu acho que não influenciou. Eu sempre gostei. Eu tenho um compromisso muito grande com a questão social, popular. Achei que o curso de Serviço Social seria o caminho a seguir, e foi. Foi um caminho que me deu muito conhecimento de instrumentos para essa questão. Depois, houve o golpe militar e consideraram que essa área rural de Dom Helder era guerrilha e aí tivemos – eu e Zezita – que sair. Eu fui para o Chile e ela para o México. Eu passei cinco anos fora, de 68 até 73.

Como foi essa experiência?
Eu trabalhava em uma fábrica de móveis que tinha sido tomada pelos trabalhadores e, à tarde, trabalhava em um projeto de pesquisa e estudo sobre as questões que estavam ocorrendo naquele momento. Era um grupo de intelectuais e eu ajudava como um apoio administrativo.

Como era a atmosfera na época?
A gente tinha muito receio, porque o governo brasileiro tinha profissionais para ficar nos acompanhando. Não podíamos formar grupos, a não ser que você conhecesse. Havia um isolamento grande pelo medo que tínhamos de se relacionar porque essas pessoas poderiam ser informantes. Não que fizéssemos grandes coisas, mas, por exemplo, íamos para as marchas de Salvador Allende. Sábados e domingos colhíamos vinhas que tinham sido tomadas pelos agricultores. Os estudantes eram convocados e nós íamos, pois não havia máquinas. Nunca me arrependi. Foi uma experiência válida.

Como foi a queda de Allende?
Eu saí 24 horas antes dele cair. Tinha uma pessoa muito amiga de Dom Helder, que era ministro, e ele me disse: “Vá embora enquanto é tempo. Tem um avião saindo para Buenos Aires, pegue e vá embora”. Pegamos o avião e fomos. Ficamos em Buenos Aires para de lá voltarmos para o Brasil. Mas só pude voltar para o Recife na Anistia, em 79. Enquanto o processo corria, fiquei no Rio de Janeiro. Ainda quando cheguei lá quiseram me prender. Nesse período que fiquei no Rio. Tive apoio do pessoal de Dom Helder para trabalhar, mas sempre quis voltar para Recife. Quando pude voltar, fui falar com velhos companheiros de luta e as pessoas sempre diziam que não podiam fazer nada. A vida é muito interessante mesmo, porque quem me telefonou convidando para voltar foi Gustavo Krause. Ele me disse: “Olhe, sou prefeito do Recife, mas quero dizer a você que se você quiser voltar para o Recife, tenho um lugar”. Eu respondi que não me filiaria ao partido dele, mas ele me deixou à vontade. Até que chegou uma época em que se falava muito dos “Tupamaros de Krause” (risos), que era aquele pessoal mais de esquerda que ele chamou para fazer o trabalho social. Eu era um desses. Construímos várias ruas, fizemos os barracões, grupos de ações comunitárias, feirinhas típicas… Teve um trabalho social muito intenso naquela época. Ele dava autonomia completa.

Qual foi a emoção de ter voltado para Recife depois de tanto tempo?
Recife é meu lugar, eu amo essa cidade, gosto de Pernambuco. Às vezes as pessoas dizem que se tivessem mais novas iriam embora por causa dos problemas. Se eu fosse mais nova ficaria aqui e não tenho nenhuma vontade sair, a não ser para passear. Tenho que lutar por isso, é minha raiz e meu povo. Voltar para o Recife foi um recomeço de muita coisa e foi interessante porque voltei dessa forma. Depois Krause foi ser vice de Roberto Magalhães.

Como você entrou para a vida político partidária?
Depois de trabalhar na área de habitação no governo, fui convidada por Marcos Vilaça para a Legião Brasileira de Assistência (LBA). Fui posteriormente ser diretora nacional da LBA no Rio de Janeiro. A intermediação para a carreira política veio através de Marcos Vilaça, que era muito amigo. Ele ficou forçando para que eu me candidatasse e fui a Dom Helder, que me encorajou. Fiquei preocupada com a ligação com o partido de José Mendonça, mas Dom Helder disse que isso não valia de nada. O importante eram meus princípios, convicções e o trabalho que eu iria fazer. Fui e fiquei na suplência de José Mendonça. Sempre ficava desconfiada porque todos diziam que ele era coronel, mas hoje digo que foi um grande amigo que tive. Tenho saudades dele. Ele sempre me teve respeito absoluto. Fui líder da oposição ao governo Arraes. Fui a primeira líder de uma bancada de 26 homens. Depois fui líder no governo de Jarbas. Doutor Arraes me dizia: “Foi danado José Mendonça ter passado na frente, porque eu achava que você daria uma ótima deputada”.

Como foi essa liderança?
Ninguém dá espaço a mulher, você tem que conquistar seu espaço. Por exemplo, Temer não botou nenhuma mulher no ministério. Diz ele, que depois que puxaram a orelha dele, vai botar. Ele escolheu o pessoal da área econômica, que foi a preocupação inicial dele. O resto ele pediu aos partidos. Pernambuco depois de Cristina Tavares, não teve outra parlamentar tão representativa. Teve Ana Arraes, mas ela não teve aquela participação como Cristina Tavares. Se você vai para outros Estados, a representação não existe. É uma mulher para 60, 70 homens. Vai escolher aquela mulher para a bancada? Não escolhe. A bancada é pragmática, é política.

Por que essa pouca participação?
Campanha política é machista. O que puderem dificultar para a mulher em termos de acesso a uma campanha, fazem. Você tem que ter, sobretudo, coragem. Se você for carregada por alguém, não tem problema porque as pessoas limpam o caminho para você passar. Esse negócio de cota não funciona. O poder é machista. Isso é um comportamento do gênero, isso tem que ser discutido e trabalhado dentro do gênero.

O período em que você foi parlamentar foi bem complicado para Pernambuco. Como foi a experiência?
Teve o problema do Bandepe. Inclusive, como líder da oposição, só ia ao Palácio quando Doutor Arraes chamava. Aliás, justiça seja feita, quando ele tomava as grandes decisões com os parlamentares ele sempre convidava o líder da oposição e ouvia. Era uma época onde tinha debate na Alepe. O pessoal da imprensa adorava. A gente tinha que estudar. Tinha conteúdo, boas discussões… O Legislativo perdeu muito isso. Até porque era meio a meio, hoje se tem uma hegemonia. Isso eu acho que prejudica o Legislativo. Foi uma experiência muito boa ser deputada, gostei muito, mas não tenho nenhuma vontade de voltar.

E como aconteceu a ida para o Tribunal de Contas do Estado?
Ia ser aberta uma vaga aqui do Tribunal, que era de Rui Lima de Albuquerque, e eu estava para disputar a presidência da Assembleia Legislativa. Mas fui falar com Jarbas Vasconcelos e disse que estava querendo vir para o Tribunal. Não vim em busca de um emprego. Eu já estava com minha campanha feita. A quarta. Porque eu era líder do governo de Jarbas e já estava com 40 mil votos computados. Mas, eu sempre era da Comissão de Finanças e Orçamento. Eu sempre gostei da questão tributária, sempre gostei dessa área. Quando cheguei no Tribunal, eu comecei a estudar mais sobre controle interno e gostei muito.

O que mudou no TCE com sua chegada?
Eu já tive casos aqui em que o prefeito escreveu no relatório, e era verdade, que ele tinha gasto quase 30% em saúde. Só que eu fui buscar os indicadores e eles não batiam. Ou ele não estava aplicando ou ele estava aplicando mal. Então, a gente tem hoje muita preocupação não só com os números, também com a qualidade da saúde e educação, por exemplo. Muitas vezes as contas são rejeitadas dessa forma.

Esse problema na aplicação dos recursos é decorrente da corrupção, da má gestão ou das duas coisas?
Eu acho que são as duas coisas. Acho, por exemplo, que o problema da educação não é falta de dinheiro. É de gestão mesmo. Dinheiro existe.

O resultado desse trabalho sinaliza para que melhorem as contas públicas?
Eu acho que vem melhorando. Vem melhorando porque se tem também um grande instrumento contra a corrupção, que é a transparência. Por exemplo, nós tínhamos problemas nas folhas de pagamentos dos municípios, era um inferno. Hoje, eles precisam botar a folha na internet. Se alguém perceber alguma irregularidade pelo portal denuncia aqui na ouvidoria. Então, o Tribunal evoluiu muito. O Tribunal de Pernambuco é referência nacional. Nossa equipe técnica é de altíssimo nível, pessoal de primeira linha.

A presidente Dilma sofreu impeachment acusada de crime de responsabilidade fiscal. A senhora acredita que, em decorrência disso, a população comece a conhecer mais as finanças públicas?
Eu acho que foi um alerta, porque, na verdade, isso que se chama de pedalada foi feito por outros governos. Mas nunca foi feito na dimensão que foi feito agora. Está certo que o crime não diz valor. Antes que se chegasse a essas pedaladas, Dilma fez créditos orçamentários por decreto para que o Congresso não tomasse conhecimento. Aí mostra que houve realmente o dolo. Isso mostra que ela sabia que estava errada.

Como é sua rotina como tricolor?
Eu sou apaixona! Sou conselheira do Santa Cruz. Isso é uma das coisas que herdei de José Mendonça, que quando foi presidente me convidou para ser conselheira e eu aceitei. Eu não vou à estádio, mas vejo o jogo. Se não for televisionado na tv aberta, tenho o pay per view para assistir. Participo, sou amiga do presidente Alírio Moraes. A torcida do Santa Cruz é algo que dá gosto de ver. Tanto faz o time ser campeão, como participar da Série D jogando em um lugar que não tem nem vestiário. A torcida é a mesma. É um amor diferenciado.

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