A esquecida rua do Imperador
Dentre as ruas que marcaram o centro do Recife, destaca-se a Rua do Imperador D. Pedro II, a primeira surgida na ilha entre os anos de 1606 e 1613, quando os frades franciscanos nela fizeram erguer o convento e uma igreja dedicada a Santo Antônio. Por ocasião da invasão holandesa, em 1630, foi o Convento de Santo Antônio cercado por muralhas e transformado no Forte Ernestus, uma fortificação retangular com quatro baluartes, dispondo de 19 canhões de diversos calibres. Nesta rua fixou residência o Conde João Maurício de Nassau-Siegen, que aqui chegou como governador do Brasil Holandês em 1637, ocupando uma casa então localizada na atual esquina da Rua Primeiro de Março. Nela o sábio Georg Marcgrave (1610-1648) instalou o primeiro observatório astronômico em terras das Américas e iniciou seus estudos sobre a fauna, flora e tipos humanos da região. Naquele local ele ergueu uma torre de observação em madeira, onde instalou o seu telescópio com o qual fez observações sobre o nosso céu e documentou o primeiro eclipse solar, ocorrido em 13 de novembro de 1640. No extremo norte da ilha, o Conde de Nassau fez erguer o Palácio das Torres (Friburgo) em 1642, rodeado por jardins, árvores frutíferas e dois grandes viveiros para criação de peixes, construindo assim um Jardim Zoobotânico destinado às experiências e estudos dos membros de sua comitiva de cientistas. O trajeto do caminho do palácio, margeado pelo Capibaribe, veio a ser aplainado e transformado em pista de esportes equestres (cavalhadas, corridas, etc.), sendo no seu extremo construído o templo religioso dos calvinistas franceses (1642). No final do século 17 foi criada a Ordem Terceira de São Francisco que iniciou a construção da monumental Capela Dourada dos Irmãos Noviços, construída entre 1695 e 1697, junto ao Convento Franciscano. Os Irmãos Terceiros de São Francisco, irmandade constituída pelos mais ricos comerciantes da então Vila de Santo Antônio do Recife (1709), logo iniciaram a construção do seu templo cujas obras se estenderam de 1702 a 1828. Em 1731 a primitiva Rua de São Francisco recebeu o prédio da Cadeia Pública (hoje ocupado pelo Arquivo Público Estadual) e, por conta dele, a denominação de Rua da Cadeia Nova, pois a primitiva prisão continuaria no bairro do Recife. O primitivo templo dos calvinistas passou a ser ocupado pelo Colégio dos Jesuítas (1686). Com a expulsão dos padres da Companhia de Jesus do Brasil (1757), o conjunto de prédios veio a ser ocupado pelo Palácio dos Governadores da Capitania, seguindo-se do Tribunal da Relação de Pernambuco e pela igreja do Divino Espírito Santo, esta a partir de 1855. No ano de 1859 o Recife recebe com grandes festas a Família Imperial Brasileira, que desfila em grande cortejo na então Rua do Colégio, naquele 22 de novembro. É nesta ocasião que o D. Pedro II, emocionado com a calorosa recepção quando do seu desembarque, haveria exclamado: “Pernambuco é um céu aberto...” A partir da visita da Família Imperial, a antiga Rua da Cadeia mudou seu nome para Rua do Imperador D. Pedro II. Com o centro religioso de devoção, com o Convento de Santo Antônio a receber, todas as terças-feiras, centenas de devotos, durante todo ano... Com suas calçadas largas a permitir a formação a um só tempo de dezenas de conglomerados de homens a falar de política, futebol, vida alheia, negócios e tanta coisa mais... Com os diversos centros administrativos no seu entorno, como o Palácio da Justiça, Fóruns Cível e Criminal, Secretaria da Fazenda, a secção regional da Ordem dos Advogados do Brasil, cartórios, repartições, redações de grandes jornais (Jornal do Commercio, 1919), instituições culturais (Gabinete Português de Leitura, 1850; Arquivo Público Estadual, 1945), bancos, escritórios de advocacia, casas comerciais, bares... Até recentemente, era a Rua do Imperador uma das mais movimentadas da cidade do Recife. A sua história, porém, se confunde com a própria história do Recife... As pedras do seu calçamento testemunharam o caminhar para a forca mártires das revoluções liberais, a exemplo de Agostinho Bezerra Cavalcanti e Frei Joaquim do Amor Divino Caneca (1825)... Foi da sacada de um dos seus sobrados que o então estudante da Faculdade de Direito do Recife (que funcionava no prédio do antigo Colégio dos Jesuítas), Antônio de Castro Alves (1847-1871), conclamava a Mocidade Acadêmica naquele seu Improviso, quando da questão Ambrósio Portugal (1867): Moços! A inépcia nos chamou de estúpidos! Moços! O crime nos cobriu de sangue! Vós os luzeiros do país, erguei-vos! Perante a infâmia ninguém fica exangue Protesto santo se levanta agora, De mim, de vós, da multidão, do povo; Somos da classe da justiça e brio, Não há mais classe ante esse crime novo! Sim! mesmo em face, da nação, da pátria, Nós nos erguemos com soberba fé! A lei sustenta o popular direito, Nós sustentamos o direito em pé!
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