Arruando pelo Recife

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Leonardo Dantas Silva

Caboclinhos: os guerreiros da jurema

Os Caboclinhos da Jurema, conjuntos de bailarinos, inspirados no culto da jurema, aparecem no Carnaval do Recife a partir de 1892. Esses agrupamentos, formados por duas fileiras de mulheres, seguidas depois do estandarte e de duas filas de homens a fazerem evoluções que lembram as danças de espada europeias, apresentando vistosos cocares e tangas, confeccionados com penas de ema, colares de contas e dentes de animais, empunhando machadinhas e preácas (conjunto de arco e flecha), dançando agitadamente ao som de um conjunto formado por uma flauta (inúbia), tarol, surdo e chocalhos (caracaxás), é algo inusitado dentro da paisagem carnavalesca da cidade.

Ao contrário do que se propaga, a presença do culto indígena nas manifestações do Carnaval do Recife é mais recente do que se possa imaginar. O misticismo, combinado com o medo do desconhecido, está presente no inconsciente coletivo dos que fazem a grande festa e têm na pajelança a religião dos seus antepassados. Uma boa parte dos que integram as agremiações carnavalescas são seguidores do candomblé e da umbanda, havendo outros que cultuam a linha da jurema, o catimbó como é popularmente conhecida, em que os “senhores mestres” e os caboclos são invocados com a utilização de “pequenos apitos, do maracá, da jurema e do cachimbo”.

Nos cultos indígenas, os chamados Ajunto de Jurema, ou simplesmente jurema, eram oferecidos pelos pajés e mestres do catimbó certa infusão extraída dos galhos e raízes da jurema-branca, sendo o costume registrado já no Século 18.
Em pesquisa no Arquivo Nacional da Torre do Tombo (Lisboa), Cartório da Inquisição de Lisboa, encontrei o processo n.º 6238 em que figura como denunciado o capitão-mor dos Índios da Povoação de São Miguel dos Barreiros (Pernambuco), Francisco Pessoa, acusado da prática de feitiçaria pela utilização da jurema nos rituais de pajelança.

Trata-se de um folguedo de existência recente entre nós, anunciado pelo Jornal do Recife, na edição de 28 de fevereiro de 1892; seguindo-se depois já com a denominação de Caboclinhos da Jurema, nas edições de 15 de fevereiro de 1901; 9 de fevereiro de 1902; 19 de fevereiro de 1903; só para citar estas.

Em entrevista ao Diario de Pernambuco, edição de 25 de janeiro de 1997, José Severino dos Santos, o Zé Alfaiate (falecido em 2016, com 96 anos), confessava ao jornalista Jaques Cerqueira, ter fundado a sua tribo, a Sete Flechas, em 1969, em Maceió, transferindo a sua agremiação, em 1971, para o Recife, e que “caboclinhos e terreiros de umbanda são praticamente uma coisa só. Tudo tem caboclo no meio”.

Segundo Manoel Ferreira de Lima, o Manuelzinho, presidente dos Carijós, a sua tribo desfilou pela primeira vez em 5 de março de 1897, tendo sido fundada no local então denominado “Fora de Portas”, nas proximidades do Forte do Brum.
Segundo a tradição oral, o seu fundador, estivador Antônio da Costa, costumava nas sessões de jurema incorporar o caboclo Carijó:

“Numa dessas manifestações espirituais, recebeu a ordem para fundar um grupo fantasiado de índio e brincar o Carnaval. Aí não pensou duas vezes: em pouco tempo seus caboclos estavam nas ruas do Recife, com penachos coloridos, arcos, flechas e lanças, dançando perré, ao som de tambores, pífanos, gaitas de taboca e ganzá”; na descrição do redator da matéria. Na verdade, os instrumentos seriam inúbia (uma espécie de flautim), tarol, surdo e caracaxás ou maracás.
De uma dissidência na Tribo Carijós (1896) surgiu, no ano seguinte, a Tribo Canindés (1897).

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