Famosa pelos bolos de rolo e Souza Leão, ícones da gastronomia pernambucana, a Casa dos Frios chegou à boa idade. São 60 anos de funcionamento como um empório gourmet dos mais sofisticados da cidade. Além de uma história de sucesso empresarial – pois seus produtos chegam hoje a todo o País – sua trajetória é marcada por uma série de fatos recordados com carinho pela matriarca fundadora Fernanda Dias. Tradição e empreendedorismo são os ingredientes da receita de longevidade do estabelecimento. Uma casa que já faz parte da memória afetiva do Recife.
A primeira sede foi na Rua da Palma, no bairro de Santo Antônio, que funcionava desde 1949 sob a direção de um empresário alemão e foi adquirida pela família em 1957. Ficava em frente ao antigo Cine Art-Palácio. “Meu marido comprou para ele e para os irmãos. Mas não era nada parecido ao que é hoje. Vendiam frios, chope, cachorro quente. Quando assumimos a direção, mudamos o espaço todo e passamos a vender especiarias finas, geleias, bebidas, bolos”, recorda dona Fernanda.
Ela revela que a Casa dos Frios foi o primeiro empório recifense a vender produtos importados e conta que o incentivo foi dela para que o marido trouxesse as iguarias europeias para o paladar dos pernambucanos. A partir daí chegaram vinhos, uísques, champanhes, patês e chocolates. Itens que vinham de Portugal, Alemanha, França, Itália e de outros países referência na fabricação de produtos alimentícios finos.
Em 1969, a sua sede mais conhecida, na Avenida Rui Barbosa, foi inaugurada. “Nosso depósito era muito pequeno, na rua do Riachuelo, e já não comportava mais as mercadorias. Daí, passeando pelo Palácio dos Manguinhos vimos a mercearia e fomos na casa da proprietária, que nos alugou o espaço”. O novo local passou a ter um andar de loja e um de depósito.
Dona Fernanda lembra que muitos diziam que eles não durariam dois meses na Rui Barbosa. “Falavam que na praça em frente à loja só havia bêbados. Mas acreditamos que daria certo e fomos em frente”. A chegada da loja em Boa Viagem acontece apenas na década de 80, quando a Casa dos Frios finca os pés na Zona Sul da cidade.
Foi nessa década, aliás, que aconteceu um dos fatos marcantes na vida de Dona Fernanda. Na ocasião da vinda do Papa João Paulo II ao Recife, ela foi a escolhida pelo então arcebispo de Olinda e Recife, Dom Helder Camara, para servir o santo padre. “Nossa vida se divide entre antes e depois desse encontro com o Papa”.
Somente Dona Fernanda era a responsável por levar a comida ao pontífice. “Passamos a noite trabalhando, foi muito bom”. Ela revela que Dom Helder não queria que servissem bebidas alcoólicas. Mas de última hora mudou de ideia. “Tínhamos um licor da Polônia. E, assim que o papa chegou foi a primeira coisa que ele pegou. Ele adorou!”. Da visita do santo padre ficaram sob a guarda da família dois presentes em agradecimento, um terço e uma medalha.
A receita do mais famoso produto da casa, o bolo de rolo, foi criada, logo nos primeiros anos de funcionamento da casa por Ana Maria, uma senhora que morava em Paulista e estava desempregada na época. “Ela sabia fazer muito bem o bolo e nós a chamamos para a Casa dos Frios. Aprendi com ela, que era formidável. Trabalhou conosco até os 92 anos”. A demanda pelo quitute passou a exigir uma linha de produção do estabelecimento que hoje produz uma tonelada do bolo por dia.
É vendido nas lojas da Casa dos Frios e nos quiosques espalhados por 10 Estados do País, e ainda por meio de pedidos de grandes empresas. “A Fiat nos encomendou, uma vez 6 mil bolos em uma semana. Mobilizei todos, fomos trabalhar e entregamos o pedido no prazo”, conta, orgulhosa, dona Fernanda.
O bolo Souza Leão, outra delícia pernambucana, também começou a ser vendido nos primeiros anos da casa. “Eu não conhecia esse bolo, que era consumido por poucas famílias tradicionais. Consegui a receita, mas achava muito gorduroso e doce. Fiz uns ajustes e começamos a servi-lo também”.
Com o crescimento da loja e dos filhos, que passaram a apoiar os negócios, dona Fernanda resolve preparar os pratos tradicionais, com gostinho de caseiros, que são servidos na casa e que antes eram apreciados apenas pela família. “Comecei a fazer vatapá, sarapatel, bobó de camarão, canjicas. Sempre comidas caseiras, que conquistaram um público sofisticado da cidade”.
Os quitutes regionais passaram a dividir o espaço com mais de mil rótulos de vinho e iguarias da cozinha internacional. A matriarca da Casa dos Frios, mesmo após décadas à frente da marca e aos 83 anos de idade, segue apaixonada pela atividade e diariamente trabalha na loja.
Serviço: Casa dos Frios, Av. Rui Barbosa, 412 – Graças e Av. Engenheiro Domingos Ferreira, 1920 loja A, Boa Viagem, tel.: (81) 2125-0220.