Megamurais no Recife: Galeria de arte a céu aberto
Além de embelezar o centro, o edital Megamurais favorece a revitalização da região e também contribui para a valorizar e dar oportunidades aos artistas urbanos *Por Rafael Dantas Que o Recife é um berço da arte, não é novidade para ninguém. O que surgiu como uma inovação em meio aos edifícios dos seus bairros centrais são os megamurais em homenagem às manifestações musicais locais, que começam a embelezar a cidade e a impulsionar a visibilidade do grafite recifense. A partir de um edital público, foram selecionados 24 projetos para dar mais cores ao cinza urbano da Boa Vista. A capital pernambucana foi escolhida há três anos pela Unesco como um dos destinos globais da música, unindo-se à Rede de Cidades Criativas. A iniciativa já ganhou as fachadas de nove prédios e até o final do ano outras construções receberão a criatividade e a assinatura dos artistas urbanos. O projeto dos megamurais no Recife, idealizado em 2021, tem como objetivo transformar a paisagem urbana da cidade por meio da arte. A iniciativa, coordenada pelo Gabinete de Inovação Urbana da Prefeitura do Recife, em parceira com o Recentro, busca revitalizar espaços públicos e criar uma verdadeira galeria de arte a céu aberto. A previsão é que, até o final do ano, o circuito tenha até três novas obras de grande escala. Além de embelezar o Centro da cidade, a secretária-executiva, Flaviana Gomes, ressalta o impacto positivo do projeto. “A arte tem esse poder de transformação, de atrair o turista e impactar a economia criativa, a cultura e o conhecimento.” Ela ressalta que a iniciativa também promove a inclusão social, pois muitos artistas envolvidos vêm de periferias e trazem suas histórias e forças para as criações que vão marcando a paisagem urbana dos recifenses. O esforço do Recife de investir nesses megamurais faz parte de uma tendência crescente de utilizar murais gigantes como uma forma de revitalização urbana em cidades ao redor do mundo, segundo o professor da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco) e doutor em Comunicação e Cultura Contemporâneas, Thiago Soares. Essa prática visa a transformar áreas urbanas cinzentas e sem vida, marcadas pela predominância de concreto, em espaços vibrantes e visualmente atraentes. “A elaboração dos murais na cidade coloca o Recife dentro de um circuito um pouco mais global, que eu acho que no Brasil teve início em 2016, na ocasião dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, quando o grande muralista Eduardo Kobra pintou uma série de murais numa área que era muito árida no Rio de Janeiro.” O pesquisador avalia que a presença dessa arte em grande escala nas fachadas de prédios e em espaços públicos promove uma conexão mais profunda entre os cidadãos e a cidade. RECONHECIMENTO PARA A ARTE URBANA As telas gigantes estão mudando a concepção da cidade acerca do trabalho desses artistas urbanos. Essa é a percepção que eles relatam após executar os painéis. Uma maior compreensão da manifestação artística do grafite e, mesmo, mais oportunidades de trabalho são mencionados por todos. “Cada megamural entregue repercute na cena artística como um todo, não só dos coletivos artísticos. Reverbera para a classe”, ressalta Flaviana. Essa abordagem valoriza a arte urbana e fortalece os vínculos entre a cultura local e a população. Um dos nomes que teve a oportunidade de assinar um megamural na cidade foi Marquinhos ATG, nome artístico de José Marcos Santos. O projeto Recife Meu Amor, no Edifício Santa Apolônia, proporcionou um reconhecimento maior do seu trabalho no cenário artístico, abrindo portas para novas oportunidades. Ele consolidou parcerias importantes com empresas, como a Iquine, e ampliou seu portfólio com projetos de grande escala. “Meu maior projeto é levar minha arte para cada vez mais lugares, para mais longe”, diz Marquinhos, expondo o desejo de ampliar o alcance da sua arte. O trabalho de Marquinhos ATG, marcado por temas como o ser feminino e a religiosidade, já tem atravessado fronteiras. Seu talento e dedicação o levaram a realizar murais em diversas cidades do Brasil, como Curitiba, Rio de Janeiro, São Paulo, Porto Alegre e Fortaleza. A participação no projeto dos Megamurais trouxe ainda mais legitimidade para a trajetória de Micaela Almeida. Ela tem observado um aumento no respeito pela arte urbana no Recife, que antes enfrentava preconceito. Ela é a autora do painel Naná Vasconcelos, Sinfonia e Batuques. A obra de Micaela Almeida preenche nada menos que 200 metros quadrados do Edifício Guiomar, que fica em frente ao Parque 13 de Maio e bem próximo da Faculdade de Direito do Recife. “Profissionalmente falando, é um trabalho que fica mais exposto, isso traz um reconhecimento da mídia e da população, legitimando minha trajetória. Além dessa legitimação profissional, vemos pessoas respeitando mais a arte em si, vendo a importância do impacto da arte na cidade.” A seleção para participar de um festival internacional com mulheres no Peru é uma das novidades na sua carreira após expor sua obra a um público tão amplo na capital pernambucana. Ela foi uma das poucas grafiteiras do Brasil selecionadas e a única do Nordeste. BOLHAS “FURADAS” E TRANSFORMAÇÃO SOCIAL A participação de Nathê Ferreira no projeto dos Megamurais representou uma nova fase em sua carreira, trazendo uma maior dimensão ao seu trabalho. O painel Nossa Rainha já se Coroou, assinado por ela e por Fany Lima no Edifício Almirante Barroso, não apenas expandiu seu alcance artístico, mas também quebra barreiras, atingindo novos públicos. “O megamural furou bolhas, alcançando pessoas que nem sequer pensavam em grafite. Ele consegue atingir muito mais gente”. Ela lembra que já teve prédios pintados em São Paulo, mas esse foi seu primeiro no Recife. Ela avalia que a experiência também contribuiu para o desenvolvimento de um mercado local para esse tipo de arte e de produção, um fenômeno que ainda estava em formação. O projeto está estimulando uma cadeia de prestadores de serviços para esse segmento, segundo Nathê. Além de seu impacto artístico, a grafiteira vê essa arte como uma ferramenta de transformação social e econômica. Ela, que nasceu e foi criada no subúrbio de Jaboatão
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