O Consórcio Pernambuco Universitas, composto pela UPE, UFPE, UFRPE, Univasf, Unicap e Ufape, alerta que a manutenção do Enem 2020 tende a agravar as desigualdades educacionais e solicita a ampliação do prazo de inscrição do exame e a postergação das datas de realização das provas. Em nota divulgada ontem, o consórcio, atenta que enquanto alunos das escolas privadas estão voltando às aulas por meio digitais, “a maioria dos estudantes das escolas públicas e pobres não usufruem, no momento atual, de uma educação remota” A nota ressalta que 1/3 dos brasileiros não têm acesso à internet e que 56% dos estudantes brasileiros não tem wi-fi em suas casas. “Nesta direção, a Agência Nacional de Telecomunicações evidencia que 55% dos acessos móveis (uso de celulares e smartphones) no Brasil são de contas pré-pagas e, por isso, com acesso limitado”. Leia a nota na íntegra abaixo: O Consórcio Pernambuco Universitas, composto pela UPE, UFPE, UFRPE, Univasf, Unicap e Ufape, que planejam, num engajamento conjunto, as ações futuras para o andamento de suas atividades acadêmicas, inclusive o ingresso nas instituições pós relaxamento das condições de isolamento e distanciamento social, baseadas nos decretos estaduais e protocolos de convivência dos órgãos de saúde, desaprovam a decisão de manutenção do calendário do Enem (Exame Nacional do Ensino Médio), principal porta de acesso ao Ensino Superior e Técnico no país. No período em que o Brasil ultrapassa as marcas de 150 mil contaminados e 11 mil mortos confirmados pela Covid-19, com possibilidade de subnotificação reconhecida pelas autoridades de saúde, com indicativo de progressão geométrica desses números e com todo o ensino presencial suspenso no estado e possivelmente no país, o Edital n°25, de 30 de março de 2020, institui as inscrições para o Enem 2020 a partir de 11 de maio e mantém o calendário de provas para novembro do mesmo ano. Enquanto pelo menos 14 países na América, Ásia e Europa, continentes mais afetados pelo novo coronavírus, informam que seus exames de acesso ao Ensino Superior serão suspensos ou adiados (a França cancelou o BAC 2020; o SAT nos Estados Unidos e o GAOKAO no China foram adiados, dentre outros), o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), órgão responsável pelo Enem e vinculado ao Ministério da Educação (MEC), insiste numa situação de normalidade inexistente nas escolas brasileiras. As escolas privadas no estado de Pernambuco, num esforço conjunto e com o emprego de investimentos, retomaram paulatinamente suas aulas de forma remota, porém, as escolas públicas permanecem praticamente com as suas atividades paralisadas por motivos diversos. Some-se a isso a situação de vulnerabilidade social da maioria dos estudantes dessas escolas, que lutam pelo cuidado da sua saúde e dos seus familiares, pela continuidade de suas vidas com dignidade no cenário complexo da economia nacional. Diante desses fatos, a manutenção do Enem envolve o risco de agravamento das desigualdades educacionais, uma vez que a rede pública de ensino concentra mais de 80% dos alunos do Ensino Médio e os estudantes mais pobres certamente enfrentam as maiores dificuldades para estudar com as escolas, os programas e projetos de preparação para o Enem suspensos. A exemplo dos pré-vestibulares da UPE e da UFRPE, Prevupe e Prepex respectivamente, que atendem estudantes exclusivamente das escolas públicas do estado, que ainda não tiveram suas atividades iniciadas em 2020 em consequência da pandemia do novo coronavírus. Dados das análises socioeconômicas do Enem 2018, divulgados em janeiro de 2019, evidenciam que um a cada quatro estudantes da classe média triunfa no Enem, enquanto que a proporção dos estudantes das classes C e D é de um a cada 600. Na atual conjuntura de pandemia mundial e isolamento social, com o acirramento das desigualdades sociais, econômicas e educacionais já existentes, essa proporção referente aos segmentos C e D certamente será drasticamente potencializada, inviabilizando o acesso ao Ensino Superior e Técnico por boa parte dos jovens brasileiros que estudam em escolas públicas. Sobre estas desigualdades, ressaltamos que as premissas que objetivam o desenvolvimento de competências que contemplam a assimilação de informações e o seu uso em contextos adequados, cuja interpretação dos códigos e linguagens adquiridos permite tomada de decisões autônomas, descritas na Lei de Diretrizes e Bases da Educação LDB (art. 36), não poderão servir de referências para o processo avaliativo ENEM, visto que muitos estudantes não estão tendo sequer acesso aos conteúdos e experiências necessárias pela impossibilidade de dar continuidade aos estudos, “quando ofertados” em formato de ensino remoto. Segundo o inciso IV do art. 35, da LDB, uma das finalidades do Ensino Médio é a compreensão dos fundamentos científico-tecnológicos dos processos produtivos, relacionando a teoria com a prática, no ensino de cada unidade curricular. Portanto, para que este parâmetro possa ser considerado no instrumento avaliativo no Enem, os sistemas de ensino, assim como suas instituições, deverão garantir que tal finalidade se efetive de forma equitativa para seus estudantes, o que está impossibilitado no cenário atual de pandemia. O Enem não “é uma competição”, como anunciado recentemente pelo MEC, ele é uma macroavaliação adotada como seleção para o ingresso no Ensino Superior. E se o fosse, nas atuais circunstâncias, não seria uma competição justa porque a maioria dos estudantes das escolas públicas e pobres não usufruem, no momento atual, de uma educação remota assim como acontece para os estudantes de escolas particulares. Sabemos que 1/3 dos brasileiros não têm acesso à internet e que 56% dos estudantes brasileiros não tem wi-fi em suas casas. Nesta direção, a Agência Nacional de Telecomunicações evidencia que 55% dos acessos móveis (uso de celulares e smartphones) no Brasil são de contas pré-pagas e, por isso, com acesso limitado. Repudiamos qualquer tentativa de difusão de uma falsa normalidade na educação brasileira, como a manutenção do cronograma do Exame Nacional do Ensino Médio 2020 o qual, caso mantido, ampliará as desigualdades tendo em vista que esta é a única oportunidade de ingresso numa instituição pública de Ensino Superior ou técnico para milhares de estudantes de escolas públicas brasileiras. Manter o calendário atual do Enem é ignorar as circunstâncias inadequadas