Entrevistas - Página: 9 - Revista Algomais - a revista de Pernambuco

Entrevistas

"Água tratada pelos Jardins Filtrantes no Riacho Cavouco tem grau de limpeza de 95%"

Mariana Pontes, Diretora da Aries, explica como um sistema que emprega plantas, além de pedras e areia, está despoluindo a foz do Riacho do Cavouco, que deságua no Capibaribe. A iniciativa foi realizada no Parque o Caiara, no Recife, que foi reformado com áreas de lazer, para crianças e para contemplar o rio. Moradores de Iputinga, bairro da Zona Oeste do Recife, estavam curiosos para saber como ficaria o Parque do Caiara, depois da reforma. Tiveram uma boa surpresa. Aberto ao público nesta sexta-feira (31), o espaço recebeu não só as melhorias demandas pela comunidade, como hoje ostenta uma iniciativa inovadora para despoluição do Riacho do Cavouco, que desagua no Capibaribe, justamente na altura do Caiara. O parque agora abriga os Jardins Filtrantes um sistema de limpeza de cursos d'água realizada com o uso de plantas, areia e pedras. Além de despoluir o riacho, a inovação transformou o espaço com uma estética paisagística e já modificou o microclima local, o que permitiu a visita bem-vinda de borboletas, sapos e capivaras. O projeto é implementado nacionalmente pelo Pnuma (Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente) e executado no Recife pela Aries (Agência Recife para Inovação e Estratégia) em parceria com o Porto Digital e a Prefeitura do Recife. A iniciativa é também um projeto-piloto do CITinova, do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação e seu custo foi de aproximadamente R$ 8 milhões financiados pelo Fundo Global para o Meio Ambiente. Mas as mudanças no Caiara vão além dos Jardins Filtrantes porque englobam uma nova etapa do Parque Capibaribe, projeto da Prefeitura do Recife e da UFPE, que até então estava restrito ao bairro das Graças. As demandas da comunidade foram ouvidas e hoje o público conta com um deque com arquibancadas, onde pode apreciar a bela vista do Capibaribe, além de parques para crianças, espaços para descanso e piquenique. Cláudia Santos entrevistou a arquiteta e urbanista Mariana Pontes, diretora da Aries, sobre a reforma no Caiara, a despoluição da foz do Riacho do Cavouco e a possibilidade desse projeto ser replicado em outras regiões. Qual a importância do Riacho do Cavouco para o Recife? O Cavouco é um riacho urbano que tem aproximadamente três quilômetros. Ele vem lá da Universidade Federal de Pernambuco, onde fica a sua nascente – é o laguinho tão famoso da Federal – corta vários bairros, desaguando no Rio Capibaribe no Parque do Caiara. Ele recebe não só esgoto in natura, mas também a chamada poluição difusa, ou seja, a poeira da fumaça dos carros e o lixo das ruas que, quando chove, escorrem para as suas águas. O Cavouco é um riacho muito poluído. O Recife é uma cidade muito cortada por rios e córregos d’água. O Capibaribe recebe não só o esgoto que chega diretamente às suas águas, mas também o que chega pelos riachos e o Cavouco é uma dessas contribuições. Ele é muito importante para a comunidade. Antes as pessoas tomavam banho nesse riacho, pescavam. Havia essa atividade que hoje não é mais possível por causa da poluição. O que são os Jardins Filtrantes? O Jardim Filtrante é uma solução baseada na natureza para a limpeza da água. É um sistema filtrante, composto por um tanque de captação, que faz o bombeamento, isto é, a bomba puxa a água do rio que se depara com o primeiro filtro, ou seja, a primeira etapa da limpeza. Há um gradil que retira os sólidos maiores. A água entra no Jardim Filtrante por gravidade e penetra nos tanques que foram escavados no solo, impermeabilizados e preenchidos com areia ou pedras e na superfície são depositadas as espécies aquáticas, além de outras que são plantadas diretamente nas pedras e/ou na areia. Ao todo são cinco tanques e cada um é uma etapa de tratamento. Então, por gravidade, a água vai passando entre esses filtros para que ela tenha uma qualidade melhor. O sistema de filtragem retira resíduos como coliformes fecais, nitrato, nitrito e outros componentes que poluem o riacho. Hoje o Jardim Filtrante tem a capacidade de limpeza de 350 mil litros por dia. Temos a capacidade de filtrar até 10% do volume do Cavouco no inverno, quando a vasão está mais alta porque é uma época com maior incidência de chuvas, e 90% no verão, quando a vasão está mais baixa. No inverno, a sujeira da água já está muito diluída porque há uma quantidade maior de água. No verão, a sujeira do esgoto está concentrada, porque tem menos água por ser um período de pouca chuva. O Jardim Filtrante é uma forma de mostrarmos ao poder público e à sociedade civil que existem outras opções para a limpeza dos rios sem uso de nenhum tipo de agente químico artificial. Estamos devolvendo uma água mais oxigenada, mais limpa para o Riacho do Cavouco e consequentemente para o Capibaribe. Essa é uma tecnologia que foi utilizada, por exemplo, para a despoluição do Rio Sena, na França. Por meio desse projeto piloto no Riacho do Cavouco, que tem captação internacional, a ideia é que mostrarmos a potência dessa inovação, para que estimulemos outras prefeituras, outros governos, enfim, outras instituições de que é possível colaborarmos com a melhoria da qualidade da água a partir de uma tecnologia que é limpa, baseada na natureza e que a gente consegue executar sem maiores dificuldades. Toda a água tratada vai para o riacho? Uma parte devolvemos para o Riacho do Cavouco e outra parte é destinada a uma cisterna que o parque já tinha. Vamos usar essa água para jardinagem, para regar o próprio parque. Não conseguimos fazer com que essa água seja usada de forma que as pessoas possam entrar em contato com ela, como tomar banho, porque precisaríamos clorá-la e como a gente quer devolver a água para o corpo d’água, a gente não pode clorar. A nossa etapa de tratamento não tem nenhum componente químico, é realizada apenas pelas pedras, pela areia e pelas plantas. Quando o sistema estiver 100% em operação, o grau de limpeza da

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"O endividamento atinge em torno de 70% do setor de bares e restaurantes"

Presidente da Abrasel-PE, Tony Souza, analisa os impactos da pandemia, como o aumento de dívidas das empresas, diz que plataformas digitais, como o Google e o TripAdvisor, são o novo “boca a boca” para divulgar as casas e falou sobre as ações para combater a violência contra as mulheres. A pandemia mudou muitos hábitos dos brasileiros, incluindo os pernambucanos, que passaram a utilizar com mais frequência o delivery ou os pedidos “para viagem”. O consumidor também vivencia a rotina do trabalho remoto ou híbrido (o que reduziu o almoço fora de casa e o happy hour) e o uso de pagamentos digitais, como cartões e, principalmente, o pix. Todas essas mudanças provocaram profundas transformações no setor de bares e restaurantes. Porém, o que causou o impacto mais negativo foram os lockdowns e a elevação das taxas de juros e da inflação provocaram o endividamento de 70% dos estabelecimentos. “Não que esse percentual esteja inadimplente. Eles estão endividados e estão pagando mas, para conseguir pagar, operam, muitas vezes, no vermelho”, explica Tony Sousa, presidente da Abrasel-PE (Associação Brasileira de Bares e Restaurantes – Seccional Pernambuco). Uma situação que levou cerca de 30% das casas a encerrarem as atividades. Nesta entrevista a Cláudia Santos, Tony Sousa avalia as consequências da pandemia para o setor e comenta a lei que estabelece um protocolo para enfrentar a violência contra a mulher nesses estabelecimentos e também fala do encontro nacional da associação que acontece hoje, dia 29. Pesquisa da Abrasel Nacional revelou que o setor tem enfrentado dificuldade de retomar o desempenho de antes da pandemia. Esse quadro também é verificado em Pernambuco? Sim. O setor em todo o País está com dificuldade de alcançar o desempenho com lucratividade. Vamos entender: os restaurantes têm uma capacidade de reestruturação fenomenal mas, apesar de recuperarem o faturamento de antes da pandemia, não conseguiram ter lucratividade que ficou comprometida por duas verticais. A primeira é a inflação. Muitos produtos subiram mais de 100%, alguns como camarão, salmão, picanha tiveram um aumento absurdo. O segundo pilar é o nível de endividamento dos restaurantes. Em 2020 os estabelecimentos estiveram em lockdown e precisaram ir aos bancos, muitos recorreram a créditos tradicionais, outros a créditos subsidiados pelo governo. Porém, a Selic estava abaixo de 4%, hoje, está em 14%. Então, houve um aumento de quase 40% nas parcelas e as casas não estão conseguindo gerar lucro para atualizar a sua operação. Lamentavelmente, no ano passado, várias empresas operaram no vermelho, isso minimizou um pouco no segundo semestre porque teve a black friday, foi ano de eleição e Copa do Mundo, depois as festas de final de ano que, por gravidade, melhoram o movimento. Mas, em janeiro, voltamos à realidade de um mês normal e ainda por cima trata-se de um mês de férias. O endividamento atinge em torno de 70% do setor. Não que esse percentual esteja inadimplente, eles estão endividados e estão pagando mas, para conseguir pagar, operam, muitas vezes, no vermelho. O endividamento representa uma média de 10% do faturamento, para um segmento que apresenta um resultado líquido na ordem de 12% ou 13%. Basicamente o lucro que se faz é para pagar boa parte desse endividamento. Muitos estabelecimentos precisaram refinanciar suas dívidas. Muitos fizeram um financiamento em 2020 e em 2021 estávamos novamente em lockdown que foi a segunda onda da pandemia. Os estabelecimentos tiveram que contrair novas dívidas para pagar a anterior e conseguir ter um novo prazo de carência, que se encerrou em 2022, quando ainda não estávamos livres da pandemia, tanto que a gente não teve o Carnaval. As casas começaram a ter que honrar seus compromissos porque venceu a carência sem que estivéssemos com o movimento recuperado. Para muitos isso virou uma bola de neve que os levou à insolvência. Em torno de 30% dos estabelecimentos encerraram suas atividades. O momento é muito delicado, precisamos de políticas públicas para recuperar um setor que tanto emprega. Temos expectativas que linhas de créditos possam ser abertas, que os prazos sejam ampliados, para que os estabelecimentos possam inserir essa quitação do endividamento no seu fluxo de caixa sem sacrificar o que ele precisa fazer de investimento para atualização do seu negócio e o que ele precisa retirar como dividendo, como lucro, para sua sobrevivência. Vocês têm levado essas demandas para o Governo Federal que, inclusive, está nesta peleja com o Banco Central por causa da Selic? Participamos de algumas frentes, como a Frente de Comércio e Serviços com outras associações, mostrando a fragilidade do setor, desde a equipe de transição. Nosso presidente executivo nacional, Paulo Solmucci, vem buscando essa aproximação. Tivemos no Recife, no lançamento do Carnaval, a presença da ministra Daniela [Carneiro, do Turismo], do seu Secretário Executivo Bento Nunes. Disseram que será lançado o Fungetur 2 (Fundo Geral de Turismo) que é um programa que deve vir ampliado com novos indexadores e maiores prazos. Há uma sensibilidade do novo governo quanto a essa realidade, mas tudo leva um tempo para operacionalizar. E, como você colocou, o Banco Central tem hoje sua independência e essa questão de juros precisa ser ajustada para que haja um entendimento para que a redução não leve a um incentivo da inflação, porque a gente ganharia de um lado e perderia de outro. Esperamos que isso consiga ser operacionalizado antes que mais algumas empresas morram por inanição. Quantas pessoas o setor emprega em Pernambuco? Cerca de 480 mil pessoas em empregos diretos e formais, além da camada de informalidade e empregos indiretos, como os motoqueiros de aplicativos que fazem as entregas. A geração de emprego e renda é a nossa principal vocação aliada ao fato de sermos uma escola, ao oferecer a oportunidade do primeiro emprego para muita gente. O home office e o trabalho híbrido afetaram o setor? Com a pandemia as empresas viram que a produtividade de alguns colaboradores de alguns segmentos aumentou porque a pessoa não perde tempo em trânsito e produz de maneira mais rápida em casa. O home office e o trabalho híbrido são uma

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"Não se pode, em hipótese alguma, excluir o trecho até Suape da Transnordestina"

Adriano Lucena, presidente do Crea-PE, fala das articulações para mobilizar setores de Pernambuco em defesa da manutenção do ramal que conecta Suape à Transnordestina. Ele explica os motivos que embasam a manutenção do trecho que liga o porto à ferrovia e afirma estar esperançoso de que o problema será solucionado. D esde que assumiu a gestão do Crea-PE (Conselho Regional de Engenharia e Agronomia de Pernambuco), a nova direção da entidade decidiu voltar-se para os problemas que afligem a sociedade, destacando o papel social dos engenheiros. Questões como moradia, mobilidade, prejuízos provocados pelas enchentes têm sido alvo de ações da entidade. E foi dentro dessa linha de atuação que o Crea-PE se engajou na defesa da manutenção do ramal do Porto de Suape da Transnordestina. O trecho de Salgueiro até o porto pernambucano foi excluído num aditivo de contrato assinado entre a ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) e a empresa TLSA (para compreender detalhes desse tema confira a matéria de capa da edição anterior da Algomais). Nesta entrevista de Cláudia Santos com o presidente do conselho Adriano Lucena, ele fala sobre as conversas que tem mantido com outras entidades como o Sistema S, sindicatos, políticos e universidades, para construir uma mobilização em prol do porto pernambucano. Também tem mantido conversas com as secretarias estaduais, mas ressalva que precisam “avançar mais com a participação efetiva do gabinete da governadora”. O presidente do Crea-PE ressalta as razões técnicas que conferem a Suape ter a conexão com a ferrovia e se diz esperançoso com o surgimento de uma solução por parte da gestão do presidente Lula. “Nós estamos falando do aditivo assinado no governo passado. Nós mudamos essa página. Hoje, quem está no governo é quem idealizou a ferrovia em 2006”, analisa Lucena. Confira a seguir a entrevista: Qual é a posição do Crea-PE sobre o aditivo que foi assinado entre a Agência Nacional de Transportes Terrestres e a empresa TLSA que exclui o ramal da Transnordestina para Suape? Foi um equívoco a assinatura desse aditivo. Não se pode, em hipótese alguma, excluir o trecho de Salgueiro a Suape. Esse trecho, como bem colocado na reportagem da Algomais, tem uma extensão menor em comparação à Pecém, e abrange o maior porto do Nordeste que é o Porto de Suape. Então, não tem o menor sentido esse aditivo. Precisamos da mobilização da sociedade organizada em Pernambuco. Não só do Crea, mas do CAU (Conselho de Arquitetura e Urbanismo), da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), dos diversos conselhos, do Sistema S, dos políticos, para que possamos mostrar à sociedade brasileira uma forma eficiente de utilizar esses recursos que são dos brasileiros. E uma forma eficiente de realizar essa entrega é fazer o percurso até Suape. Que tipo de mobilização o Crea-PE tem feito nesse sentido? O Crea tem buscado debater esse assunto com o Sistema S, com Bernardo [Peixoto, presidente] da Fecomércio, com o Sinduscon-PE (Sindicato da Indústria da Construção Civil de Pernambuco), com o Sinaenco (Sindicato Nacional das Empresas de Arquitetura e Engenharia Consultiva). Temos buscado conversar com o mundo empresarial e também com universidades. Inclusive, sexta-feira passada (dia 10), estivemos em Petrolina conversando com o reitor da Univasf para que pudéssemos ter uma ação de forma organizada e programada, com uma cronologia para que possamos ter ações imediatas. Estava conosco em Petrolina o deputado Lucas Ramos. Essa ação tem que envolver todos os pernambucanos, em todas as frentes para que Pernambuco não seja prejudicado e não é só Pernambuco não, para que o Nordeste não seja prejudicado, porque a construção do ramal para Suape será muito boa não só para Pernambuco, mas para toda a região. Como vão as articulações do Crea com o governo estadual para uma mobilização em favor da construção do ramal da ferrovia para Suape? Conversamos com as secretarias afins ao tema, como Desenvolvimento Econômico, Mobilidade e Infraestrutura. Entendemos que precisamos avançar mais com a participação efetiva do gabinete da governadora. E quais são os próximos passos? Vamos fazer seminários, promover debates, para mostrar que do ponto de vista técnico e econômico temos o melhor traçado, e o melhor porto para que a ferrovia possa chegar. Também não pode ser um debate ou ações de palavras jogadas ao vento, precisamos ter ações concretas para mostrar a importância de concluir o traçado até Suape, mostrarmos por que temos o melhor traçado, porque ele é mais eficiente do ponto de vista econômico, ambiental e social. Essas ações têm que estar juntas, ligadas, como uma corrente, com cada peça conectada para que a gente possa tornar isso cada vez mais forte. O senhor conhece o embasamento técnico que levou a esse aditivo? Do ponto de vista técnico, o que a gente tem conhecimento, até o momento, é que o traçado até Suape, é mais vantajoso por oferecer um percurso mais curto em 100 km. Numa viagem de ida e volta, a redução é de 200 km. Além disso, Suape hoje é o melhor porto do Nordeste. Então nós não conseguimos identificar o porquê de não utilizar o traçado de Suape do ponto de vista técnico, econômico e social. A TLSA e a ANTT anunciaram que embasaram o aditivo num estudo da consultoria Mckinsey… Até o momento eu não conheço alguém que tenha conhecimento desse estudo e em todas as abordagens levamos em consideração os elementos postos no mundo técnico que mostram que o traçado até Suape é muito mais eficiente do que qualquer outro porto. A TLSA construiu a ferrovia de Eliseu Martins, no Piauí, até Salgueiro e pretende construir o restante do trajeto até Pecém. A Bemisa mostrou interesse em completar o percurso de até Suape. Qual a melhor solução para realizar o transporte de carga das duas empresas? Se a Bemisa ficar responsável para concluir o traçado até Suape, o ideal seria que ela utilize o percurso da TLSA até Salgueiro. Eu vejo como uma coisa muito ignorante do ponto de vista da modernidade fazer uma ferrovia duplicada, paralela a uma já existente. Então, a Bemisa utilizando

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Entrevista com o peladeiro e médico Oscar Coutinho sobre saúde, vacinas e Fake News

Considerados um dos mais renomados clínicos de Pernambuco, Oscar Coutinho cultiva uma outra atividade que talvez poucos pacientes seus conheçam: é um assíduo jogador de futebol. É tão assíduo que este ano ele e seu grupo de amigos com quem pratica o esporte bretão vão comemorar 60 anos de pelada em maio, um marco que ele já tentou até figurar no Guiness. Criada pela iniciativa de dois ícones da medicina pernambucana, Ciro de Andrade Lima e Rostand Paraíso, que convidaram alguns alunos seus para bater uma bola – entre eles Coutinho – a pelada hoje conta com novos integrantes, mas nunca foi interrompida nestas seis décadas. E talvez seja esse o motivo da boa forma de Oscar Coutinho em plenos 82 anos. Nesta conversa com Cláudia Santos, o clínico conta detalhes dessa longeva pelada, fala da sua vivência como médico durante a fase mais crítica da Covid-19, elogia as vacinas, analisa o aumento dos casos de depressão e insônia e afirma que as fake news talvez sejam pior que o próprio coronavírus e que a teleconsulta veio para ficar. Confira a entrevista a seguir. Como foi sua experiência como clínico ao atender casos de Covid-19? A Covid foi um aprendizado desde o início porque foi uma doença nova. Já tínhamos convivido com o coronavírus, mas o que causa a Covid-19 foi diferente. Não foi só a ignorância do médico em lidar com ele, nem apenas pelos falsos remédios, como a cloroquina e similares, mas nunca a categoria médica do mundo imaginou a violência e a gravidade das primeiras variantes, a Alfa, a Beta, a Delta, que matavam mais e causavam mais complicações. Mas, o vírus vai perdendo a agressividade, porque ele é inteligente: para sobreviver, precisa do hospedeiro que somos nós, humanos, e que estejamos vivos. Então, à medida que ele faz mutações, ele pode continuar a ser contagioso, mas menos mortal. Veja o que aconteceu: no ano passado, pensávamos que estava tudo ótimo, até setembro quando chegou a mutação chamada Ômicron que, em novembro, provocou uma elevação assustadora do número de casos. Porém, era pouco agressiva. Até o fim de dezembro atendi uns 280 doentes afetados pela variante, mas só dois foram hospitalizados, nenhum foi pra UTI ou morreu. Este ano, com o Carnaval, quando eu esperava um repique maior, parece que está tudo calmo, porque há muitas pessoas vacinadas. Além disso, muita gente teve a Covid e não foi relatada, não entrou nas estatísticas. Esse pessoal ficou com alguma imunidade também. O Brasil hoje é considerado um dos melhores perfis do mundo para imunidade da Covid porque vacinou mais de 50% da população. Sou totalmente a favor das vacinas. Quais as características da vacina bivalente? A grande vantagem da bivalente é o fato de ser uma vacina mais moderna, o desenho dela nos protege melhor da Ômicron. E 99% do vírus da Covid-19 que está circulando corresponde a essa variante. Assim como as outras vacinas, a bivalente não evita a doença, mas se tivermos a Covid, estando vacinados, será de uma forma branda. As vacinas contra a Covid-19 podem provocar alguns sintomas, uma dorzinha no local da picada, que demora 24 horas. Eu mesmo tive febre leve, duas vezes em que fui vacinado e um pouquinho de moleza. Agora, num universo de bilhões de pessoas no mundo, a vacina pode provocar, excepcionalmente, alguma complicação, como a síndrome de Guillian-Barré, uma doença neurológica grave, mas que acomete uma em 100 mil pessoas. Se você for comparar o custo benefício em termos de proteção, é seguramente melhor tomar a vacina. Mas, quando acontece um desses raros casos, espalha-se pelas redes sociais aquele terrorismo como se a vacina fosse o mal, quando o mal é a ignorância. Como o senhor enfrentou as fake news? As fake news têm sido talvez um problema maior do que o próprio vírus. Circulam em rede social tratamentos falsos, como a cloroquina e a ivermectina, que são absolutamente ineficazes, além da vitamina D, como se ela aumentasse a imunidade. Vitamina D é bom para o osso, não tem nada a ver com a imunidade. Ao mesmo tempo, surgiram notícias falsas afirmando que as vacinas matavam e aleijavam. As fake news são um tremendo mal que infelizmente veio com essa modernidade dos meios de comunicação. Com a chegada da bivalente agora, voltaram a circular mentiras contra a vacina dizendo que provocaria AVC, trombose. Tive que informar, por WhatsApp, a uma grande quantidade de pacientes e familiares que essas informações eram falsas. Meu exemplo era esse: a vacina é boa, estou me vacinando e toda minha família também. O senhor recorreu à teleconsulta? O Conselho Federal de Medicina, muito antes da pandemia, chegou a liberar a telemedicina, mas a liberação não durou muitos meses, principalmente porque os sindicatos nos diversos Estados acharam que era uma forma prejudicial de fazer medicina, que iria prejudicar os mais pobres que não tinham acesso aos meios de comunicação. Então, o Conselho revogou a legalização. Com a pandemia, novamente ela foi legalizada e eu imediatamente aderi. Fiz muita teleconsulta, a maioria eram casos de Covid. Ainda hoje não há uma semana que eu não tenha, ao menos, uma meia dúzia de teleconsultas que nada tem a ver com a Covid. Agora, a teleconsulta é limitada porque falta o exame físico, mas há muitas situações em que ela é válida. No meu caso, faço clínica médica. Muitas vezes a pessoa é um cliente antigo meu, que eu já conheço e que quer fazer um checkup. Então é basicamente ouvir as queixas básicas, pedir os exames que o paciente manda via WhatsApp. Nesse período, houve um aumento do número de casos de depressão e ansiedade. Esse quadro ainda persiste? O início da pandemia foi o pior momento para o transtorno psicológico porque o mundo estava cheio de incertezas e as fake news contribuíram para o sentimento de insegurança. A própria categoria médica favoreceu muito essa situação, muitos médicos, sem a formação adequada, faziam comentários sinistros sobre a doença, sobre os tratamentos, que geraram insegurança

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"Você tem que respeitar o consumidor, porque ele não pode ser substituído"

Nesta edição de aniversário da Algomais, estreamos a seção História de Sucesso, ao trazer a trajetória de Eraldo Barbosa dos Santos, conhecido como Lau. Aos 13 anos ele vendida copos nas feiras livres de Timbaúba e hoje é um bem-sucedido empresário do setor de revenda de automóveis. Em cima de uma carroceria de caminhão, Lau com apenas 13 anos, saía do sítio onde morava com a família, na zona rural de Timbaúba, para vender copos na feira livre da cidade. Sacolejando em meio às mercadorias pelas estradas esburacadas da Zona da Mata, nos anos 1960, ele também comercializava nas feiras de São Vicente Férrer, em Itambé e em Itabaiana (PB). Logo passou a vender também tecidos e roupas e com os ganhos realizou o sonho de alugar uma casa na área urbana de Timbaúba e transferir para lá a família. “Aí, passamos a ter água encanada e energia, privilégios que a gente não tinha no sítio”, conta Lau que, depois dessa primeira conquista, passou a acumular outras tantas até se tornar um empresário de sucesso do setor de revenda de veículos. Batizado Eraldo Barbosa dos Santos – “mas só me conhecem como Lau, o Eraldo, às vezes, até eu acho estranho” – ele hoje é dono da Disnove, concessionária da Volkswagen, com 110 funcionários e um volume médio de venda de 200 carros por mês. Ano passado, ele e sua equipe de funcionários comemoraram 50 anos de atuação no mercado. Nesta conversa com Cláudia Santos, Lau contou como conseguiu, com seu tino comercial, ousadia e uma incondicional prioridade ao cliente, erguer a empresa que já recebeu vários prêmios de melhor concessionária do Brasil e foi reconhecida pela Assobrav (Associação Brasileira dos Revendedores Volkswagen) como a 14ª concessionária em faturamento entre as de cerca de 600 revendas espalhadas no País. Aos 74 anos, Lau acompanha a segunda geração da empresa com os filhos Eraldo Júnior e Evandro, mantém hábitos simples e ainda encontra tempo para ser conselheiro do time do coração, o Náutico. Como começou a sua carreira empresarial? Sou timbaubense. Saí de Timbaúba e vim para o Recife já bem estruturado. O início mesmo foi bem difícil. Morava em um sítio. Comecei a trabalhar com 13 anos de idade, por necessidade. Foi quando dei uma “fugida” e fui para a cidade. Um tio me deu um apoio e comecei a trabalhar nas feiras livres, vendendo copo americano. Depois, passei a vender também tecidos e roupas prontas. Eu vendia na feira de Timbaúba no sábado, no domingo na feira em São Vicente Férrer, na segunda em Itambé e na terça em Itabaiana. Eu era uma criança e fazia esse trabalho sozinho. Como o senhor se transportava de uma cidade para a outra? Viajava na carroceria de caminhão, com as mercadorias. Naquela época as estradas eram péssimas. Várias outras pessoas também viajavam e com a carga alta. Era muito difícil. Aos 15 anos realizei o meu primeiro sonho que foi alugar uma casa na cidade com dinheiro que eu ganhava na feira e transferir a minha família para morar lá. A nossa origem é bem humilde, somos 10 irmãos, meus pais sofriam muita dificuldade para dar alimentação aos filhos. Aí, passamos a ter água encanada e energia, privilégios que a gente não tinha no sítio. Continuei vendendo, foi aumentando o negócio e a quantidade das vendas. Depois, abandonei os copos e fiquei só com tecidos e roupas feitas nessas feiras. Aos 18 anos me casei com minha esposa Edilene. Tenho 55 anos de casado, cinco filhos, 14 netos, dois bisnetos. Depois desisti das feiras e comprei um carro, uma rural, para colocar na praça. Passei um ano e pouco, mas não me adaptei. Percebi que tinha motoristas com 20 anos, 30 anos nesse trabalho e só conseguiam ter aquele carrinho velho. Então voltei para o comércio. Mas ao invés de ser no varejo, consegui comprar peças de tecido fechadas e vendia por atacado àqueles ex-colegas meus que faziam feira. Deu certo, foi ótimo. Depois, inventei de comprar carro e vender. Saía de Timbaúba, vinha para o Recife, pegava um ônibus e ia para São Paulo. Comprava um carro novo, vinha dirigindo de lá para cá. A primeira viagem que fiz foi em 1968. Imagino em que estado estavam as estradas… Eram muito ruins. Eram quatro dias de ônibus daqui para lá. E de lá para cá, eu saía de São Paulo, dormia em Vitória da Conquista (na Bahia) sozinho, dentro do carro, porque eu não podia ter custo. Saía de Vitória da Conquista e ia dormir em Timbaúba. Geralmente fazia três viagens para São Paulo por mês. Continuei lutando com muita vontade, com muita disciplina, com despesas altas, porque depois que casei fiquei com despesas de duas famílias. Até que apareceu uma oportunidade de trabalhar na Disnove que já era revenda autorizada da Volkswagen em Timbaúba. O então o proprietário me chamou para trabalhar para ele, disse que não tinha nenhum conhecimento em automóveis, era fazendeiro e não estava satisfeito com o negócio. Eu disse a ele que não queria, porque nunca tinha sido empregado, sempre fui independente. Então, ele me fez uma proposta irrecusável para sócio, sem entrar com o dinheiro. Como foi seu desempenho? Para você ter uma ideia, a Disnove em nove meses, de janeiro até o dia 4 de outubro de 1972, vendeu oito carros, menos de um carro por mês. A situação era complicada. Eu entrei em 4 de outubro e até o final do ano, vendi 57 automóveis. Aí começaram a dizer: “esse cara não pode sair da empresa”. E qual foi esse segredo dessa performance? Nessa época eu era aquele garoto muito bem aceito na cidade, trabalhava na área. Sempre digo que temos que respeitar nosso maior patrimônio: "sua excelência, o cliente.” Sem ele não existe mercado. Depois, em segundo lugar, vêm os nossos colaboradores. Do servente até o diretor, para mim era o mesmo tratamento. Em 1977 o sócio faleceu e ficou a revenda com os herdeiros que me convidaram a continuar sócio.

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"Os assistentes virtuais serão a próxima grande onda de aplicativos"

Como toda nova tecnologia que surge, o aplicativo ChatGPT tem suscitado muita discussão tanto sobre seus benefícios, quanto seus efeitos negativos. Há temor de que ela seja empregada para facilitar a divulgação de fake news, favorecer o plágio nas teses acadêmicas e até ser usada por hackers. Ao mesmo tempo, o ChatGPT abre uma série de possibilidades de usos para auxiliar o dia a dia de pessoas e empresas. “Assim como toda ferramenta com grandes potencialidades, essa tecnologia pode ser utilizada para o bem ou para o mal”, adverte João Paulo Magalhães, professor da CESAR School. Nesta entrevista a Cláudia Santos, Magalhães afirma que o primeiro impacto do uso do aplicativo ocorrerá nas áreas de atendimento ao cliente e suporte técnico, proporcionando menos tempo de espera e menores custos. Ele acredita que assistentes virtuais, como Alexa, passarão a utilizar os modelos de linguagem semelhantes ao do ChatGPT para potencializar as suas funcionalidades e, em breve, ele prevê o surgimento de uma segunda onda desses aplicativos. “Todos nós aprenderemos e faremos o nos- so trabalho acompanhado de um assistente profissional digital”, projeta o professor. O que é o ChatGPT? Estritamente falando, ChatGPT é um aplicativo de mensageria, ou chat, no qual os usuários conversam não com uma pessoa, mas com uma inteligência artificial baseada em um grande mo- delo de linguagem natural, o GPT-3, que tem como objetivo che- gar o mais próximo possível de uma conversa com um humano. O seu grande diferencial é que esse modelo aprende a partir de uma quantidade gigantesca de dados, em sua maior parte oriun- da da internet, como notícias, livros, sites, artigos de revistas, etc. Isso faz com que o ChatGPT entenda perguntas complexas e gere respostas em uma linguagem muito natural para nós, humanos. Além disso, o ChatGPT é capaz de armazenar o contexto de uma conversa, então, se você estiver perguntando sobre um determi- nado assunto, o aplicativo manterá este assunto e tudo que foi perguntado em sua memória, assim como nós fazemos, o que torna a conversa muito mais fluida. De forma mais ampla, ChatGPT é a ponta de um iceberg de possíveis aplicações extraordinárias a partir dos grandes modelos de linguagem natural. Isso é possível porque a linguagem é, por si só, talvez a ferramenta mais poderosa já desenvolvida pois, por meio dela, podemos descrever e transmitir todos os outros co- nhecimentos, bem como imagens, vídeos e praticamente tudo o que existe. Se conseguirmos criar uma ferramenta que se aproxi- ma de nossa linguagem, muito provavelmente, os impactos em todas as áreas em que atuamos pode ser potencializado. Isto já está ocorrendo na criação de imagens e vídeos, bem como na programação de computadores, por exemplo. Você poderia dar exemplos de aplicações que essa nova tecnologia pode proporcionar? A primeira leva de aplicações vai ser um salto de melhorias nos assistentes digitais como o Alexa, a Siri e o Assistente do Google, além dos chatbots em geral, que encontramos em sites diversos. Uma segunda onda será marcada pelo que estou chamando de assistentes digitais profissionais e educacionais, um assistente digital que vai ajudar os profissionais e estudantes em suas tarefas do dia a dia, potencialmente em qualquer área, como por exem- plo, para fazer pesquisas em grandes bases de dados de conhecimento e conteúdo. Neste sentido, saem na frente as profissões que fazem uso maior da escrita, como o jornalismo, a escrita de livros ou criação de resumos e conteúdos diversos, bem como a programação de computadores, que poderá ser feita por meio de uma linguagem mais próxima do natural. A tradução entre idiomas também vai dar um salto de qualidade e rapidez, eventualmente chegando a ferramentas de tradução simultânea. O ChatGPT foi baseado em redes neurais e machine learning, o que isso significa para o público leigo em tecnologia? No geral, a parte mais técnica das tecnologias não deveria significar muito para o público leigo em geral. Assim como não precisamos nos preocupar em como a energia elétrica é produzida e transmitida para nossas casas, mas sim que a luz ligue quando tocamos no interruptor. O mais importante é entender os seus potenciais usos em nossas áreas de atuação, bem como os ris- cos decorrentes de toda ferramenta poderosa. Entre esses riscos, precisamos entender que toda ferramenta que tem como base machine learning é treinada a partir de dados e vai reproduzir e potencializar os conceitos e preconceitos ali presentes. Além disso, por não se tratar de uma ferramenta algorítmica, o seu comportamento pode se tornar catastrófico em situações limítrofes. Poderia nos exemplificar situações em que o Chat GPT usará machine learning? O ChatGPT é uma ferramenta baseada no modelo de Machi- ne Learning GPT-3, pois se caracteriza por aprender (fazer relações entre perguntas e respostas) a partir de grandes bases de dados, sem a necessidade de ser explicitamente programada para cada pergunta. Desta forma, o ChatGPT faz uso de machine learning desde o seu aprendizado (processo em que armazena essas relações), passando pela forma com que gera um texto fluido e também quando corrigimos alguma informação, que passa a fazer parte de sua base de conhecimentos, pelo menos para a conversa atual. Leia a entrevista completa na edição 205 da Algomais: assine.algomais.com

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"Tudo aquilo que faz a alma pernambucana passa pela contribuição dos indígenas"

Muitos pernambucanos, que assistem estarrecidos as imagens da tragédia dos ianomâmis na Amazônia, desconhecem que Pernambuco possui uma das maiores populações indígenas do País. Elas têm sido essenciais para a formação do Estado e sempre estiveram presentes nos principais momentos históricos, como na invasão holandesa ou na Revolução de 1817. Com o intuito de contribuir para dissipar esse desconhecimento, os antropólogos Estêvão Martins Palitot e Lara Erendira de Andrade idealizaram o projeto Atlas do Pernambuco Indígena https://www.atlasindigena.org/, portal que reúne cartografias e textos com informações sobre as etnias indígenas pernambucanas e que teve o incentivo do Funcultura, Fundarpe, Secult, Governo de Pernambuco. Nesta conversa com Cláudia Santos, Estêvão Palitot, que é professor do Departamento de Ciências Sociais do Centro de Ciências Aplicadas e Educação da Universidade Federal da Paraíba, fala do projeto, da situação dos povos indígenas locais, da luta pela demarcação das terras no Estado e do processo de invisibilidade que foram vítimas. “Sabemos muito bem falar das contribuições dos portugueses, dos holandeses, dos franceses, dos judeus, mas quando chegamos nas contribuições dos povos negros e indígenas, isso é silenciado, demonizado, criminalizado”, analisa o antropólogo, que se diz esperançoso com a criação do Ministério dos Povos Indígenas. O que é o projeto Atlas do Pernambuco Indígena e quais seus objetivos? O projeto foi pensado por mim e por Lara Erendira de Andrade. Somos antropólogos, trabalhamos com povos indígenas e temos duas paixões: a história e a cartografia. Os trabalhos dos historiadores são fantásticos, o dos antropólogos também, mas terminam sendo lidos por nós, por quem está na academia. A ideia do projeto é tornar esse conhecimento mais acessível ao grande público. O Atlas é um site no formato de blog com dois tipos de postagem: artigos, que têm um caráter mais acadêmico, com uma densidade maior, e as cartografias, com textos menores em que procuramos explicar os mapas, que são muito interativos. Cada pontinho do mapa pode ser clicado e aparece uma informação, com referências a outros trabalhos para aprofundar os conhecimentos. Agora, pensamos nos próximos passos, inclusive convidando colegas que têm produções relevantes para trazer para o Atlas. Pretendemos fazer um trabalho que seja vivo, sendo alimentado e podendo ser utilizados por professores, estudantes, por outros pesquisadores, pelos próprios povos indígenas nas escolas das aldeias como ferramenta de conhecimento, de luta, de valorização, de afirmação, de direitos. Por que vocês escolheram o modelo de cartografia? Os mapas também são um discurso e ferramentas de poder. Quem sempre desenhou os mapas foram os poderosos e a finalidade era dizer: “o meu poder vai até aqui”, seja o poder do Estado, da empresa, do rei, de quem quer que seja. Nessa representação da realidade apenas alguns aspectos são enfatizados. Por exemplo, os mapas históricos sobre Pernambuco, sobre o Nordeste, sobre o Brasil, não revelavam a presença dos povos indígenas. Mesmo hoje, quando você pega os mapas rodoviários, eles vão mostrar na Amazônia as terras indígenas, mas no mapa de Pernambuco, não mostram. Fazer um mapa é fazer uma escolha entre o que vai ser visível e o que vai ser invisibilizado. A nossa contribuição é produzir ou reproduzir mapas nos quais os indígenas estejam presentes, queremos ser uma espécie de amplificador das vozes indígenas. Nunca vamos querer tomar o lugar das vozes indígenas. Eles lutam continuamente para não serem apagados, riscados do mapa, literalmente. Por falar em invisibilidade, Pernambuco conta com a quarta população indígena do País, um dado que pouca gente conhece. Como está a situação dessas etnias? Pernambuco tem uma das maiores populações indígenas do Brasil, mas que é invisibilizada, que vive principalmente no Agreste e no Sertão do Estado. Os xucurus têm em torno de 10 mil pessoas, os atikuns em torno de 8 mil, os fulniôs, trukás, pankararus, em torno de 5 mil. Se contabilizarmos os que migraram, esse número é muito maior. Temos uma estimativa que existam uns 2 mil pankararus em São Paulo, os atikuns têm aldeias na Amazônia, porque vivem numa região muito seca e muitos grupos familiares migraram para o Rio São Francisco, para os serrados da Bahia, para o Tocantins e para o Pará. Há também os processos de luta por recuperação territorial. O caso dos xucurus, dos trukás e dos pankararus são os mais conflituosos, com uma série de assassinatos. No caso dos pankararus, há uma série de ameaças de morte e atentados. Recentemente um posto de saúde indígena foi destruído em razão de conflitos fundiários que ainda não estão resolvidos, muitas vezes por omissão ou lentidão do Estado. Nos últimos 70 anos, houve um processo de lenta recuperação dos territórios indígenas porque eles nunca se calaram, nunca deixaram de reivindicar. Quando, desde o Século 19, se diz que “os índios estão misturados, miscigenados” a frase seguinte era: “logo, não precisam de terras, podem virar trabalhadores nas fazendas, nos engenhos ou nas periferias urbanas. Eles podem ser pobres, eles já são brasileiros”. E os indígenas dizem: “Alto lá! A gente é até brasileiro, mas somos os primeiros brasileiros, temos direito a um pedaço de terra”. Há uma luta histórica e o Atlas procura ser um registro dela para que reverbere as frases que os indígenas dizem: “nunca mais um Brasil sem nós. Sempre estivemos aqui”. Procuramos levar esses subsídios que registramos nas pesquisas históricas e antropológicas para um conhecimento público. O que tem sido feito com os ianomâmis, já foi feito em Pernambuco e em todo o Brasil: guerras, escravizações. Há um relato de um massacre na região de Juazeiro e Petrolina, o Massacre do Rio Salitre, em que um padre acompanhou uma expedição de guerra contra um grupo de indígenas. Mais de 500 foram capturados, desarmados e dois dias depois todos os homens foram degolados e as mulheres e crianças levadas como escravas. Em Pernambuco essa violência, nas últimas décadas, foi marcada por assassinatos, como o de Xicão Xucuru e de várias lideranças trukás. O preço para reconquistar parte do território indígena foi o sangue das lideranças, a criminalização, a difamação. A sociedade pernambucana precisa ter consciência disso

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Marco Alves: "Pernambuco peca em política externa"

Especialista em direito internacional e fellow do Iperid (Instituto de Pesquisas Estratégicas em Relações Internacionais e Diplomacia) analisa o impacto de uma recessão global e da guerra na Ucrânia e as perspectivas do Brasil no cenário internacional. Num mundo a caminho de uma recessão global, que vive o acirramento da disputa entre China e Estados Unidos pela hegemonia econômica mundial e o impacto da guerra na Ucrânia, o fortalecimento dos Brics e do Mercosul é um fator positivo para o Brasil, segundo Marco Alves. Mestre em Ciências Políticas, em Direito Internacional e Europeu e em Relações e Negócios Internacionais, Alves afirma que esses agrupamentos evitam a dependência econômica com outros países e cria novas oportunidades, como a possibilidade de os Brics formarem uma área de livre comércio. “Já pensou uma zona comercial de 3,2 bilhões de habitantes? Seria simplesmente a maior zona de livre comércio do mundo, com duas superpotências, líderes mundiais em matérias-primas e hidrocarbonetos e um dos celeiros do mundo”. Com a experiência de ter atuado em 27 países (incluindo o Brasil, onde trabalhou para o Governo de Pernambuco), Marco Alves é fellow do Iperid (Instituto de Pesquisas Estratégicas em Relações Internacionais e Diplomacia), mora na França e atua no continente africano como especialista na retomada econômica em zonas complexas para organizações humanitárias. Nesta entrevista a Cláudia Santos, ele analisou a redução da influência política e econômica da Europa, como consequência da guerra na Ucrânia, ressaltou a importância do presidente Lula para a inserção do Brasil no cenário internacional e lamentou que Pernambuco não aproveite a rede consular de que dispõe, como estratégia para se destacar no mercado externo. O mundo caminha para uma recessão global? Quais seus reflexos no Brasil e em Pernambuco? Muitas das agências internacionais anunciam o risco de recessão para boa parte do mundo. O Banco Central Europeu já fala [que pode atingir] metade dos países da Zona do Euro, incluindo Alemanha e Itália, duas principais potências industriais do conjunto. Nos Estados Unidos, esforços do Banco Central estão reduzindo o aumento da inflação, mas terá impactos na atividade econômica do país pela limitação do acesso ao crédito. Eles só vão se segurar graças a uma economia extremamente subvencionada em detrimento do resto do mundo. A União Europeia está disposta a ir pelo mesmo caminho e aceitar que empresas fechem e o desemprego suba para controlar a inflação. A grande diferença é que na Europa vamos pagar mais caro a energia do que os EUA e vamos importar o gás deles. Na China, vamos ver como o país se recupera da crise da Covid e a abertura total de todas as restrições, o que impactará a economia mundial. Ou seja, vamos todos pagar a conta dessa crise que é de vários níveis (econômica, energética, geopolítica), alguns mais do que outros. Penso no continente africano dependente das compras chinesas de matéria-prima e das ajudas internacionais ocidentais. No Burkina Faso, país que conheço bem, a inflação atingiu mais de 20% este ano, e teve falta de gasolina (tal como em outros países vizinhos). Isso, cumulado às situações de ataques terroristas, dois milhões de deslocados no território, secas e insegurança alimentar agregam dificuldades a uma situação já extremamente complicada. O Brasil vai sentir os impactos, mas, como é costume, um pouco depois dos demais. Não está garantido que haja crescimento para 2023, segundo dados oficiais. A inflação continua presente, apesar de a taxa Selic ter aumentado umas setes vezes (se não estou enganado). O País priorizou vender commodities – em detrimento de um desenvolvimento industrial consolidado – mas como vendê-las se a maioria dos compradores está limitando seus gastos? Qual vai ser a variação do valor das commodities neste contexto internacional? Qual será o valor do barril de petróleo que terá um impacto tremendo no custo das exportações e importações brasileiras? Como equilibrar os desafios externos e internos? São perguntas essenciais e tenho a sensação de que, devido à campanha presidencial, não estão em pauta ainda, mas têm que vir logo. A vantagem que o Brasil tem em relação a outros países é sua capacidade de resiliência e sua reatividade em termos macroeconômicos. Ē um país que reage muito rápido às políticas instauradas. Veremos rapidamente se o que será executado funciona ou não. Em relação a Pernambuco, o Estado tem uma vantagem geográfica tremenda que continua mal aproveitada. Existe, no meu ver, um déficit estratégico por parte do Governo Federal que não soube valorizar o território, mesmo com os investimentos recentes. Existe também uma falta de coerência entre Estados do Nordeste, cada um puxando para seu lado para se tornar hub regional, quando um ponto focal forte traria mais resultado e poderia se espalhar para os demais. E último ponto: Pernambuco peca em política externa, aliás, não há política externa. Nada é coordenado para atuar como um pivô comercial no panorama internacional. Quantos acordos firmados e efetivos temos com outros portos do mundo? Quantas rotas marítimas diretas estão em funcionamento? Acredito que poderíamos ter feito mais, apesar de ter reduzido um pouco essa desvantagem. Acho que os dirigentes sucessivos não dimensionam o quão importante seria colocar Pernambuco no mapa, de fato. Temos uma das maiores redes consulares do País e não sabemos fazer diplomacia econômica. Vamos ter que aprender e fazer. Nesse cenário global, como fica a polarização entre China e EUA pela hegemonia econômica mundial? A guerra na Ucrânia permitiu aos EUA revitalizar a Otan, que estava parada, e fazer com que a Europa queira estar submissa à defesa americana em detrimento de construir uma Europa da Defesa. O segundo impacto da guerra é e será a perda de força da Alemanha. Ela construiu seu modelo econômico com o gás russo barato, agora vai tentar manter sua indústria comprando um gás americano quatro vezes mais caro e sem real possibilidade de reatar com os antigos parceiros, se a situação geopolítica o permitisse, porque foram sabotados os dois gasodutos Nord Stream 1 e 2. Os vencedores deste conflito, do ponto de vista político e econômico, são os

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"O desafio é garantir que o Estado olhe para a UPE como um equipamento com potencial enorme"

Maria do Socorro Mendonça Cavalcanti é a primeira reitora empossada na UPE (Universidade de Pernambuco). Filha de um pai semianalfabeto, que trabalhava nas usinas de cana-de- -açúcar, e de uma mãe que concluiu apenas o ensino primário, sua trajetória estudantil, até o doutorado, e profissional, até o comando da universidade mais capilarizada no Estado, foi marcada por muitos sacrifícios familiares e pessoais. À frente da universidade em um período de amplos desafios para o ensino superior do País, ela tem a missão de seguir expandindo a atuação da UPE, além de ofertar melhor estrutura nos campi da capital e do interior e aprovar um novo Plano de Cargos e Carreiras. Com a remuneração atual do quadro docente e de técnicos, a instituição tem encontrado dificuldade em fixar os profissionais no seu quadro. Desafios do tamanho de uma universidade que atende 22,6 mil estudantes em programas de graduação e pós-graduação, além de 5,7 mil servidores, entre professores e técnicos, 12 campi e 16 polos de educação a distância. Inicialmente, gostaria que a senhora contasse a sua trajetória até chegar à universidade. Sou filha de Leonice Ramos de Mendonça e Mário Lopes de Mendonça. Meu pai era um semianalfabeto e minha mãe concluiu o ensino primário. Mas meu pai sempre investiu muito para que os filhos estudassem. Eu nasci na Usina Jaboatão. Ele, inicialmente, trabalhava na cana, depois no adubo e chegou a trabalhar como caldeireiro na usina. Sou a primeira filha e logo aos 9 anos terminei o primário. Na época, já morávamos na Usina Ipojuca e eu não tinha como continuar os estudos pois só havia o ginásio à noite e não me aceitavam por causa da idade. Fui morar com meus avós na Usina Jaboatão, um pouco mais perto da cidade. Aí, iniciei o ginasial. Mas meu pai sentia muito a minha falta, pediu demissão e conseguiu um emprego numa usina de açúcar no Estado do Ceará, na cidade de Paracuru, que contava com um colégio e fomos morar lá. E como foi o início no ensino superior? No colégio da cidade havia apenas o curso normal naquela época, o curso pedagógico. Eu queria fazer faculdade mas meu pai não tinha condições financeiras de me manter em Fortaleza. Ele pediu demissão novamente e voltou para Pernambuco. Foi trabalhar na Usina Salgado, que fica em Ipojuca. Fomos morar na cidade de Nossa Senhora do Ó, comecei a estudar no Cabo de Santo Agostinho para terminar o ginasial. Mas naquela época havia muita enchente e eu não conseguia chegar no colégio. Foi quando o ensino público começou a ter muitas dificuldades, devido à falta de professores. Meu pai batalhou bastante e conseguimos uma vaga no Ginásio Pernambucano. Aí eu voltei a morar com meus avós na Usina Jaboatão e estudando no Ginásio Pernambucano. Após a minha avó falecer, meu pai comprou uma casa na Vila do Cabo em Cabo de Santo Agostinho e voltei para casa dos meus pais. Naquela época foi inaugurado o Colégio Contato e o diretor convidou alguns alunos para fazer seleção para conseguir bolsa. Não consegui mas meu pai fez um esforço para pagar o cursinho. Eu estudava no Ginásio Pernambucano e saía direto para o Contato. Foi um esforço enorme! A senhora vem de uma família bem humilde e de onde veio essa ideia de fazer faculdade? Alguém a inspirou? Primeiro, meu pai e, desde pequena, sempre gostei de estudar. Esqueci de dizer uma coisa: quando fui alfabetizada, meu pai na caldeira já tinha um cargo de chefia e precisava fazer a escala dos trabalhadores. Mas ele não conseguia. Era eu quem fazia e disse para ele: “vou lhe ensinar”. Eu alfabetizei meu pai. Sempre tive o desejo de estudar e ensinar e quando fui crescendo queria fazer universidade. Eu acreditava no que meus pais sempre me diziam: “estudar é a melhor forma de conseguir vencer na vida, de sair dessa situação”. Eles fizeram todos os esforços necessários para que eu e meus irmãos conseguíssemos estudar. Fui a primeira da família a fazer universidade. Sempre quis melhorar a minha condição de vida e a da minha família. A senhora é a primeira mulher reitora na universidade. Qual a importância desse marco para a universidade? Esse marco é importante para toda mulher porque elas sempre trabalharam bastante e acho que ocupar esses espaços de liderança é extremamente importante, principalmente neste momento em que a gente vive uma violência tão grande contra as mulheres. Ter mulheres em espaços de liderança só reforça essa luta que todas nós temos contra essa a discriminação e a violência. Acho que é muito importante para todas nós demarcarmos esses espaços e avançarmos nessa conquista para que mais mulheres possam ocupar esses espaços. Quais os principais desafios que vocês pretendem enfrentar e quais os planos para essa gestão? A UPE é uma universidade que se interiorizou não de forma muito planejada, com um orçamento que garantisse essa interiorização. Isso trouxe algumas dificuldades para que pudéssemos manter esses cursos funcionando. Não tínhamos prédio próprio em muitos lugares, sendo espaços emprestados ou alugados. Nem sempre tivemos concursos para professores para essas unidades. Então isso foi sendo levado como desafio. O professor Pedro Falcão (o reitor antecessor) foi uma das pessoas que abraçou este desafio. Ainda há algumas unidades que foram criadas e que ainda não têm sede própria, um dos desafios é construir o campus Palmares. O campus Caruaru, onde foi instalado um dos primeiros cursos do interior, ainda não tem sede própria também. De 2019 e durante a pandemia, a Faculdade de Odontologia foi desativada por questões de infraestrutura e hoje ainda não tem a sua sede. Os alunos estão distribuídos em três espaços: no ITEP, no Oswaldo Cruz e no CISAM. Um dos nossos desafios é conseguir a construção da FOP. O outro grande desafio é garantir que o Estado olhe para a universidade como um equipamento de governo que tem um potencial enorme. Somos a universidade que está mais capilarizada em Pernambuco. Hoje temos um alcance de chegar em 80 municípios

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"A dependência de importação de produtos para a saúde é um problema a ser enfrentado"

Jarbas Barbosa, médico pernambucano eleito para dirigir a Organização Pan-Americana da Saúde, fala dos seus planos à frente da instituição, diz que atuará para ampliar o acesso das populações a vacinas e tratamentos e conta como a vivência em Pernambuco influenciou sua trajetória profissional.

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