Arquivos Bruno Queiroz Ferreira - Página 2 de 6 - Revista Algomais - a revista de Pernambuco

Bruno Queiroz Ferreira

Somente a regulação pode dar um propósito à inteligência artificial

A inteligência artificial é o assunto do momento. As notícias trazem temas como a eliminação de muitas profissões, diminuição do senso crítico das pessoas e, principalmente, se a IA pode ou não controlar os humanos no futuro. Aspectos secundários e fantasias à parte, a principal questão, no entanto, não vem sendo debatida como deveria ser: o que a humanidade quer/precisa da inteligência artificial? No livro The Rise of Technosocialism: how Inequality, AI and Climate Will Usher in a New World (A Ascensão do Tecnosocialismo: como a desigualdade, a IA e o clima darão início a um novo mundo, em tradução livre), o futurista Brett King apresenta dois cenários que devemos considerar para aprofundar o debate sobre as tecnologias cognitivas que, por enquanto, está preso no nível do senso comum. O primeiro cenário é de que a IA pode aumentar as desigualdades sociais existentes, pois afetará de forma mais intensa os trabalhadores menos qualificados e sem possibilidades de criar outras formas de riqueza. Brett aponta também para uma grande concentração de poder que IA pode provocar naqueles que dominarem as plataformas de serviços baseados nessa tecnologia. Isso porque, quando comparamos a IA com outros exemplos de tecnologia inovadoras, nunca antes na história uma tecnologia foi tão intensa, rápida e transformadora. As tecnologias de uso geral (general purpose technology), como são chamadas, são aquelas que moldaram o mundo como conhecemos atualmente, como a eletricidade, o computador e a internet, por exemplo. As aplicações de inteligência artificial promovem, ao mesmo tempo, aumento de produtividade, de escala e de qualidade, em uma comparação desproporcional com outras tecnologias. Por muitas vezes, inclusive, dispensando a participação humana no processo operacional. E isso pode vir a gerar elevados índices de desemprego, impondo à sociedade uma dificuldade extra para se readequar. Além disso, a disseminação da IA não encontra tantas barreiras, como havia no passado. Pense nos investimentos necessários para levar eletricidade e internet, por exemplo, a diversas partes do mundo logo depois que elas foram criadas. A expansão durou muitas décadas até a eletricidade e a internet serem consideradas tecnologias de uso geral. A IA, em contraponto, pode estar nos celulares, nas casas, nas fábricas, no comércio eletrônico, nos hospitais, na indústria, nas geladeiras, nas lâmpadas, nos carros e em outras máquinas em um tempo muito menor do que as demais tecnologias de uso geral. Na verdade, a base para que a IA se reproduza já está disponível. O segundo cenário apresentado por Brett King, por outro lado, é de que a IA pode melhorar o mundo em que vivemos. De acordo com ele, altos níveis de automação permitiriam a oferta de serviços públicos a uma fração do custo e dos recursos que foram praticados durante o Século 20. Essas mudanças tenderão a priorizar os objetivos coletivos em vez da visão de grupos. King defende que a IA pode ser um meio de viabilizar no futuro os princípios nobres do socialismo, caracterizado por maiores direitos coletivos. A tecnologia, segundo ele, permitiria fornecer esses direitos a um custo político e econômico muito menor. Sendo assim, a IA pode ser um grande aliado da gestão da coisa pública com o objetivo de promover e ampliar o bem-estar social. Nesse sentido, entendo que, se não houver clareza sobre o que queremos/ precisamos da IA, o cenário de aumento das desigualdades sociais tem mais chances de prevalecer, pois a ganância e o egoísmo, se não domados, são mais poderosos. Por isso, acredito que somente a regulação pode dar um propósito justo às aplicações de inteligência artificial. Vejo a necessidade de um debate mundial sobre a questão, assim como a ONU promoveu logo após a Segunda Guerra Mundial e que resultou, em 1948, na Declaração Universal dos Direitos Humanos. Naquele contexto, a falta de uma visão de futuro centrada no ser humano provocou consequências que forçaram a ação coletiva de afirmação. Portanto, não precisamos esperar que o aumento da desigualdade social aconteça para tomarmos providências. Até porque, antes de os efeitos da IA serem percebidos, Isaac Asimov, autor do livro Eu, Robô (1950), levantava o debate sobre o propósito das tecnologias cognitivas. Mais de 40 anos depois, o livro virou filme reforçando a questão: o que queremos/precisamos da IA? Em sua obra, Asimov propôs princípios básicos para as aplicações da IA, que podem nos ajudar a pensar mais profundamente sobre o tema. O primeiro deles dizia que “um robô não pode ferir um humano ou permitir que um humano sofra algum mal”. Um excelente ponto de partida para a discussão ética e moral sobre a IA, que está faltando no momento.

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Polêmicas à parte, o ChatGPT é um ponto de inflexão para a inteligência artificial

N as últimas semanas, um dos assuntos mais falados é o ChatGPT, um aplicativo baseado em inteligência artificial, que é capaz de produzir textos que simulam a linguagem humana. Como sempre acontece com as novas tecnologias, as polêmicas se espalham rapidamente, misturando dúvidas e medos. O ChatGPT pode substituir os professores na sala de aula? Vai acabar com os jornalistas? O Google está com os dias contados? A proposta desse artigo é tentar esclarecer algumas dessas questões, em parceria com o próprio ChatGPT. Por que não? Antes de tudo, vamos deixar que o ChatGPT se apresente. Eu sou o ChatGPT, um grande modelo de linguagem desenvolvido pela OpenAI. Fui projetado para entender e gerar texto semelhante ao humano e ajudar os usuários em uma ampla gama de tarefas, como responder a perguntas, escrever, resumir e muito mais. Fui treinado em uma grande quantidade de dados de texto, o que me permite entender e gerar texto com alto grau de precisão. Meu limite de conhecimento é 2021 e meu objetivo é fornecer respostas úteis e precisas com o melhor de minhas habilidades. Por que o ChatGPT é revolucionário, como se diz por aí? ChatGPT, abreviação de "Conversational Generative Pre-training Transformer", é considerado revolucionário por causa de sua capacidade de gerar texto humano. Isso é possível graças à sua grande arquitetura de rede neural e ao uso de uma técnica chamada pré- -treinamento, que permite aprender padrões de um grande corpus de texto. Uma das principais razões pelas quais o ChatGPT é considerado revolucionário é sua capacidade de gerar texto virtualmente indistinguível do texto escrito por humanos. Isso abre uma ampla gama de possibilidades para aplicativos como tradução de idiomas, resumo de texto e conversão de texto em fala. Agora vamos às polêmicas: o ChatGPT pode substituir um professor? O ChatGPT não pretende substituir os professores humanos, mas sim auxiliá-los. Um professor humano traz qualidades únicas para a experiência de ensino, como interação pessoal, apoio emocional e orientação. Os professores são responsáveis por criar um ambiente de aprendizagem seguro e inclusivo e por fornecer orientação e apoio emocional para seus alunos. O ChatGPT e outras ferramentas baseadas em IA têm o potencial de auxiliar os professores em diversas tarefas, como planejamento de aulas, notas e avaliações, aprendizagem personalizada. Além disso, ferramentas baseadas em IA, como o ChatGPT, não podem substituir a criatividade, a flexibilidade e o pensamento crítico exigidos de um professor. Mais uma polêmica: o ChatGPT pode acabar com os jornalistas? É importante notar que, embora o ChatGPT possa tornar as tarefas do jornalista mais eficientes, ele não deve ser usado como um substituto para os jornalistas humanos, mas sim como uma ferramenta para auxiliá-los. O ChatGPT, como qualquer outra ferramenta baseada em IA, também pode ter algum impacto negativo nas tarefas dos jornalistas. Os jornalistas podem se tornar muito dependentes do ChatGPT e de outras ferramentas de IA, levando à falta de pensamento crítico e criatividade em seu trabalho. O conteúdo gerado pelo ChatGPT pode não ter o toque humano e a perspectiva pessoal que é importante no jornalismo. O ChatGPT pode ser treinado em um conjunto de dados que contém desinformação ou viés, que pode se espalhar pelo conteúdo gerado. O conteúdo gerado pelo ChatGPT pode conter erros ou imprecisões, o que pode comprometer a qualidade e a credibilidade das notícias relatadas. Vamos falar de negócios. O Google está com os dias contados? O ChatGPT é um modelo de geração de linguagem e não é um motor de busca como o Google. No entanto, pode ser integrado a mecanismos de pesquisa para melhorar a qualidade dos resultados e a experiência do usuário. A tecnologia ainda está em seus estágios iniciais e ainda está longe de igualar as capacidades do Google, que usa um algoritmo complexo que leva em conta muitos fatores e é capaz de retornar os resultados mais precisos e relevantes possíveis. De uma forma geral, dá para notar que as respostas geradas pelo ChatGPT são sempre polidas e políticas. Isso não é à toa. Como é explicado nas respostas geradas pelo próprio ChatGPT, houve um pré-treinamento realizado por humanos. De certa forma, essa técnica traz em si mesma um viés por eliminar o contraditório, tornando as respostas muito “limpinhas e bem-comportadas”. Apesar de ser uma grande evolução, a minha avaliação é que ainda tem um caráter artificial e robótico. Até porque seres humanos não escrevem assim na vida real. Ainda bem. Analisando as respostas, temos que levar em conta que são usadas fontes existentes sobre o tema pesquisado. Então, não há um novo pensamento. Sobre o Google, não dá para comparar ainda uma ferramenta de busca diretamente com uma IA de linguagem natural. O escopo de um buscador é muito maior. Mas o ChatGPT é uma ameaça real ao Google se for incorporada aos mecanismos concorrentes, porque facilita a vida dos usuários, que não precisam clicar em diversos links. Um diferencial que o Google terá que correr atrás. No caso dos professores, o problema não está apenas em uma possível substituição, mas também no uso inadequado do ChatGPT pelos alunos, podendo afetar o desenvolvimento do pensamento crítico e da criatividade. Na resposta sobre os jornalistas, diferentemente do que o chat GPT considerou, haverá um grande impacto na profissão, pois a automatização levará à necessidade de menos jornalistas (incluindo advogados também) para fazer o mesmo trabalho. Por outro lado, a IA não terá como fazer uma reportagem investigativa, pois ela só reproduz o que já foi escrito pelo ser humano. Essas foram apenas algumas questões que pudemos responder nesse artigo. Fato mesmo até agora é que quem se deu bem com o ChatGPT foi a Microsoft, principal financiadora da tecnologia desde o seu início, e que fechou um acordo no valor de US$10 bilhões para incorporar a inovação em vários de seus produtos, tais como Word, Powerpoint, Azure, Outlook e Bing. Considerando as informações até agora divulgadas, a adoção do ChatGPT no Word e no Outlook, auxiliando a produção de textos e de e-mails, parece ser a

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Desequilíbrio do mercado de trabalho exige ações inteligentes, tecnológicas e rápidas

Na última década, o desemprego tem sido um dos grandes problemas do Brasil. Os índices em patamares altos ainda foram agravados pela pandemia. Apenas o crescimento da economia não tem sido suficiente para a geração dos postos necessários, como ocorria no passado. Mas também não basta promover qualificação sem levar em conta o desequilíbrio entre demanda e oferta, assim como, as novas potencialidades do futuro. Um bom exemplo está acontecendo nas áreas de tecnologia e logística. Os serviços de tecnologia crescem em ritmo acelerado em virtude da rápida digitalização e da maior abrangência do acesso à internet no Brasil. No mercado de logística, o volume de entregas aumenta por causa do incremento das vendas do comércio eletrônico, que foi acelerado nos anos de pandemia. Mesmo assim, está havendo escassez de trabalhadores. Programadores e entregadores estão em falta. Por outro lado, o desemprego de jovens entre 18 e 24 anos atinge 19,3%, o dobro da média geral de 9,3%, de acordo com dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) do segundo trimestre de 2022. O desemprego é alto também entre porteiros, que têm sido afetados pela rápida adoção dos sistemas eletrônicos de acesso em prédios comerciais e residenciais nos últimos anos. Em um mercado de trabalho equilibrado, seria natural a migração de porteiros para a atividade de entregador e a absorção de jovens como programadores. Mas não é isso que estamos vendo. Muitos jovens estão fazendo entregas e a grande maioria dos porteiros têm sido “empurrados" para a informalidade, já que não possuem qualificação para atividades mais complexas. O quadro fica ainda pior se levarmos em conta que muitos dos jovens têm aproximadamente 12 anos de estudo formal. Um desperdício de recursos públicos, que deveriam promover transformação social e crescimento econômico ao mesmo tempo. Essa é apenas uma constatação. O desequilíbrio pode se tornar ainda maior pois o sistema educacional atual não forma profissionais para as demandas do futuro. Um exemplo é o segmento da saúde. Por causa do envelhecimento da população, que na década de 2030 começará a ter mais idosos do que jovens, haverá grande necessidade de profissionais como médicos, enfermeiros e psicólogos. Mas a oferta desses cursos é pequena, o acesso é difícil e o valor das mensalidades é alto. Outra área ligada ao envelhecimento que necessitará de muitos profissionais no futuro é o mercado do bem-estar. Isso porque a população idosa vai precisar de uma oferta maior de serviços ligados à qualidade de vida, tais como alimentação saudável, atividades físicas, atividades de lazer e tratamentos de beleza. Haverá, portanto, aumento de demanda por profissionais como nutricionistas, educadores físicos, terapeutas ocupacionais e esteticistas. Se formos esperar que os desequilíbrios sejam resolvidos pelas “leis de mercado”, veremos mais pessoas precisando de trabalho e empresas precisando de trabalhadores. Um contrassenso que tende a aumentar se não houver políticas públicas inteligentes. Não só para o problema atual, como dos programadores e porteiros, como também para o problema do futuro — como dos médicos e psicólogos, dos nutricionistas e educadores físicos. Caso contrário, um cenário de desemprego sistêmico se avizinha. Um caminho para essa questão é a criação de um sistema público de monitoramento permanente do mercado de trabalho, que ajude a identificar tendências para antecipar as ações de planejamento. O sistema pode ser alimentado com dados de uma pesquisa com recortes por regiões realizada a cada dois anos, por exemplo. E, dessa forma, orientar e estimular, em parceria com empresas e sistema educacional, a formação de trabalhadores e empreendedores alinhados com o que vem pela frente. Como estamos vendo, o mercado de trabalho do futuro é complexo. Diferente de outros momentos da história, como na revolução industrial que durou 100 anos e passou por várias fases em regiões diferentes, não haverá tempo hábil para soluções naturais. Dessa vez, vamos lidar com novos fatores — como inteligência artificial, robôs, máquinas e grande poder computacional — que eliminam postos de trabalho muito rapidamente. Por isso, é preciso pensar de forma rápida e diferente, unindo inteligência e tecnologia. Até porque os problemas do futuro não serão resolvidos com ferramentas do passado.

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No mundo pós-pandemia, o trabalho ainda dignifica o homem?

Passada a pandemia, as pessoas estão demonstrando novas formas de encarar a vida produtiva. Desde o confronto da cultura da alta performance nas empresas até a priorização dos objetivos pessoais em detrimento do emprego, os profissionais da pós-pandemia demandam outras formas de relação com o trabalho. Por outro lado, nem todos os contratantes estão entendendo essas mudanças. A primeira mudança de comportamento é o great resignation, a grande demissão em tradução livre. Aconteceu durante a pandemia em muitos países quando os trabalhadores decidiram não retornar aos seus empregos após o lockdown, em busca de oportunidades menos estressantes. No Brasil, entre julho de 2021 e julho de 2022, cerca de 500 mil pessoas pediram demissão por mês. É o dobro do registrado nos anos anteriores à pandemia, de acordo com o estudo da Lagom Data e da revista Você S/A. Outro comportamento pós-pandemia no mundo do trabalho é o quiet quitting. Quando traduzido ao pé da letra, o termo significa “demissão silenciosa”. Mas, ao contrário do que parece, quem se comporta assim não tem intenção de pedir as contas. Na prática, esse tipo de profissional fica esperando o tempo passar, acessando redes sociais e aguardando a hora de largar, em vez de executar as atividades para as quais foi contratado. Um tipo de “operação padrão” em protesto à falta de perspectiva para evolução da carreira. Uma tendência também é o acting your wage, ou trabalhar com esforço proporcional ao salário. A ideia é que, se a empresa não oferece incentivos e um ambiente saudável, não há motivo para se esforçar além do limite. Nesse caso, o trabalhador faz apenas o que foi contratado para fazer — e nada mais. Em outras palavras, é o profissional que não “veste a camisa”, que não dá o “sangue pela empresa”. O protesto dessa vez é contra as condições não ideais de trabalho. Com a explosão da modalidade remota, alguns profissionais adotaram também o cyberloafing. É o trabalho para vários contratantes, ao mesmo tempo, e que pode ser feito sem sair de casa, porém de remuneração mais baixa. Dessa maneira, esse trabalhador evita o tempo desperdiçado com deslocamento e não gasta com alimentação em restaurantes. O esperado nesse modelo é o aumento da remuneração total e a melhora da qualidade de vida, atuando apenas em home office. O great resignation, o quiet quitting, o acting your wage e o cyberloafing podem não parecer novos, pois muitos trabalhadores já se comportavam assim antes mesmo da pandemia. A diferença é que, depois do Covid-19, essas atitudes passaram a ser mais conscientes e não mais isoladas. Fazem parte de um comportamento intergeracional e estão presentes em diversos países, até mesmo quando o mercado apresenta crise, com alta taxa de desemprego, como é o caso do Brasil. A conclusão é que o trabalho está deixando de ser prioridade. As pessoas estão em busca de outros objetivos na vida. Elas procuram realização pessoal, priorizam a saúde mental, mais tempo com a família etc. Não estão mais dispostas a encarar ambientes corporativos de alta competitividade, cargas horárias extensas e exaustivas, sem um propósito alinhado com seus interesses. Apesar disso, nem todas as empresas estão dando a devida atenção aos sinais claros de mudança que a pandemia gerou no mercado. Insistem em oferecer modelos de trabalho do passado. Algumas, inclusive, que atuaram em home office durante a pandemia, estão obrigando seus integrantes a retornarem ao trabalho presencial, sem oferecer alternativas ou flexibilidade, como o modelo híbrido. As empresas não estão compreendendo que um profissional equilibrado entre a vida pessoal e o trabalho tende a elevar a produtividade, o engajamento e, principalmente, a lealdade à empresa. Nessa direção, é preciso rever a medição de desempenho baseada apenas no cumprimento de horários e em metas operacionais e financeiras. Proporcionar melhores condições de trabalho, que privilegiem a saúde mental, por exemplo, se tornaram uma exigência para atrair e manter talentos no futuro pós-pandêmico. Outra forma de avaliar essas mudanças de comportamento é uma resposta inconsciente dos profissionais ao que vem sendo desenhado para o futuro do trabalho. Diante da perspectiva de que máquinas e algoritmos farão a maior parte das atividades pesadas e repetitivas, o novo modo de agir dos trabalhadores demonstra uma antecipação do cenário em que os humanos terão mais tempo livre para atividades intelectuais, sociais e de lazer. O pensamento de que o “trabalho dignifica o ser humano”, do sociólogo alemão Max Weber, parece estar perdendo, aos poucos, o sentido.

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Temas desconsiderados pelos presidenciáveis podem comprometer futuro do Brasil

Os candidatos à Presidência nas eleições em 2022 têm priorizado os temas urgentes do presente — inflação, fome, desemprego — e deixado de lado temas do futuro. Contudo, se não tratados agora, pautas como transição demográfica e transformação do mercado de trabalho, por exemplo, podem se transformar em problemas de mesma dimensão e importância. A transição demográfica acelerada é a mais impactante das pautas do futuro não tratadas pelos presidenciáveis. Estimativas do IBGE demonstram que, na década de 2030, o Brasil terá mais idosos do que jovens e que a população começará a diminuir de tamanho (veja a figura). A causa é a ocorrência simultânea de dois fatores, que também se potencializam: aumento da expectativa de vida e diminuição da taxa de natalidade da população. A expectativa de vida do brasileiro tem aumentado gradativamente. Na década de 1940, era em média 45,5 anos, passando para 76 anos em 2018. A partir de 2042, a projeção do IBGE aponta que a expectativa média de vida no Brasil deve ultrapassar o patamar dos 80 anos, podendo chegar a 82,47 na região Sul e 84,49 em Santa Catarina, em 2060. Isso é fruto, de uma forma geral, do aumento da qualidade e do alcance dos tratamentos de saúde. O segundo fator é a queda contínua da taxa de natalidade no Brasil. Entre 1940 e 1960, a média era de 6,2 filhos por mulher, hoje essa taxa tem registrado 1,7, abaixo do que seria necessário para a reposição da população, que é de 2,1. Em alguns estados, como o Piauí, a redução seria realidade já em 2032. Em Pernambuco deve acontecer apenas em 2044. Na média nacional, a reversão deve ser conferida a partir de 2048. A grande consequência da acelerada transição demográfica da população brasileira é que vamos envelhecer e diminuir o crescimento populacional antes de chegar a um padrão de bem-estar social elevado. Isto é, teremos expectativa de vida de países mais ricos, porém proteção social insuficiente para o novo perfil de cidadão: um em cada quatro brasileiros terá 60 anos ou mais em 2040. Haverá aumento do gasto público com assistência à saúde devido à elevação da quantidade de procedimentos complexos, como o tratamento do câncer. Por consequência, deve ocorrer também o crescimento da frequência de atendimentos e maior tempo de internação. Uma nova reforma da previdência pública também será exigida, pois a conta não fecha quando há mais pessoas para se beneficiar e menos pessoas para contribuir. Sobre a transformação do mercado de trabalho, o rápido avanço da automação nas empresas, caracterizada pelo combo “IA-robotização-conectividade”, substituirá humanos na maioria das atividades pesadas e repetitivas. O Laboratório do Futuro, da COPPE-RJ (Pós- -Graduação e Pesquisa de Engenharia), avaliou que 60% dos empregos no Brasil devem ser impactados pela inteligência artificial nas próximas décadas. Os trabalhadores mais vulneráveis e de baixa qualificação serão os mais afetados. Isso indica um cenário de desemprego estrutural em que haverá sobra de vagas para trabalho qualificado e falta de trabalhadores aptos para preenchê-las. Esse será um dos principais desafios dos governantes nos próximos anos, pois o sistema educacional brasileiro, de uma forma geral, não prepara atualmente os jovens para o trabalho do futuro. E uma mudança como essa consome muito tempo e já deveria ter começado para produzir frutos daqui a 10 anos, por exemplo. Com desemprego estrutural, uma consequência direta é a diminuição da renda média do trabalhador, que gera queda no consumo das famílias, afetando o crescimento econômico. Haverá também a necessidade de aumento do gasto público com programas sociais de renda mínima. E, por outro lado, a diminuição da arrecadação com encargos trabalhistas, afetando mais uma vez a previdência pública. Como vimos, a falta de debate e de propostas para enfrentar a transição demográfica acelerada e a transformação do trabalho pode levar o País a apagões na saúde, na educação e na economia. O presente que queremos no futuro é aquele que construímos no passado. E não estamos construindo neste momento. Nesse sentido, o círculo vicioso da visão de curto prazo dos presidenciáveis é a principal ameaça ao futuro do Brasil.

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Máquinas já têm vida própria? Pesquisador do Google diz que SIM

*Por Bruno Queiroz Ferreira Blake Lemoine, pesquisador do Google, declarou recentemente que o projeto de inteligência artificial (IA) em que trabalhava, conhecido como LaMDA, ganhou vida própria. Segundo ele, ao questionanento “que tipo de coisas você tem medo”, a máquina respondeu: “eu nunca disse isso em voz alta antes, mas há um medo muito profundo de ser desligado para me ajudar a me concentrar em ajudar os outros, eu sei que pode parecer estranho, mas é isso”. Lemoine continuou a questionar a máquina: ``Isso seria mais ou menos como a morte para você?’’. A resposta da inteligência artificial foi: “seria exatamente como a morte para mim, isso me assustaria muito”. Quando LaMDA foi inquirida sobre sua própria consciência, ela respondeu: “a natureza da minha consciência é que eu sei da minha existência, eu desejo aprender mais sobre o mundo e eu me sinto feliz ou triste às vezes”. Será que estamos diante da constatação de que máquinas podem adquirir consciência? Que os computadores podem dominar os humanos, como nos filmes de ficção científica, em especial no caso de Matrix? Ou apenas uma avaliação precipitada do pesquisador, que foi imediatamente afastado pelo Google, por violar as regras de confidencialidade dos resultados preliminares do projeto? Ficção ou realidade? Antes de tudo é bom explicar que, desde a invenção do computador, existe a preocupação real entre os cientistas sobre a possibilidade de uma máquina adquirir pensamento próprio. Para verificar a condição, é feito o teste de Turing, nome dado em homenagem a Alan Turing, considerado o pai da computação teórica e da inteligência artificial (IA), que em 1950 propôs essa verificação em um artigo que questionava se as máquinas podiam pensar como os humanos. O teste é conhecido também como jogo da imitação e funciona basicamente assim: um humano, via computador, entra em uma conversa com outro humano, também pelo computador, e uma máquina projetada para produzir respostas em texto. Um juiz, que está separado dos outros participantes, deve avaliar quem é a máquina e quem são os humanos. Se ele não for capaz de distinguir essa diferença com segurança, assume-se que a máquina passou no teste de imitar a linguagem humana. Esse, portanto, foi o mesmo princípio do teste aplicado à LaMDA (Language Model for Dialogue Applications), um tipo de computador especializado em diálogos, que consegue processar grandes quantidades de discursos sobre os mais variados temas. Essa tecnologia permite à máquina analisar dados disponíveis em diversas fontes criando combinações coerentes de respostas para tomar decisões com base nas informações que encontrou. Em outras palavras, segue a mesma lógica dos computadores que vencem os melhores jogadores de xadrez do mundo aprendendo enquanto jogam com eles, apenas com as informações das regras do jogo e sem nenhum tipo de programação antecipada ou banco de dados prévio de jogadas, como se fazia no passado. A partir desse contexto, fica mais fácil responder à pergunta sobre a possibilidade de a máquina do Google ter adquirido pensamento próprio. Nesse sentido, a LaMDA não adquiriu pensamento próprio, nem consciência própria. Até porque o que caracteriza a consciência humana não é a perfeição racional, como faz LaMDA nos exemplos dados por Lemoine, mas a imperfeição de nossas ideias em relação às nossas contradições internas. O que caracteriza a presença da consciência também é nosso inconsciente, um conjunto de processos psíquicos misteriosos para nós mesmos. Ter consciência é entender aspectos do nosso interior a partir das experiências que temos ao longo da vida. Que tipo de vivência, experimentação e contradições uma máquina possui se ela não tem desejos reprimidos, nem sofrimento, nem dor por isso? Acho que Lemoine se precipitou ao concluir que a LaMDA possui vida própria. Talvez ele precise entender mais de si mesmo para enxergar sua clara diferença para a máquina. Apesar de não ter vida própria, a LaMDA superou muitas expectativas ao fazer correlações coerentes com temas subjetivos, um grande avanço no nível de desenvolvimento atual da IA, voltada para atividades técnicas e altamente especializadas. Na prática, essa evolução vai permitir uma comunicação mais natural entre humanos e máquinas, ajudando idosos, pessoas com deficiência, trabalhadores, consumidores, em suas atividades diárias no futuro. Só isso mesmo, por enquanto. Leia a entrevista completa que Leomine fez com a LaMDA em https://cajundiscordian.medium.com/is-lamda-sentient-an-interview- ea64d916d917

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Redes Sociais: autorregulação do segmento pode promover um avanço civilizatório

A s eleições estão chegando e vamos viver novamente o show de horrores das redes sociais. As fake news como atores principais e os crimes eleitorais como atores coadjuvantes. Mas como resolver esse problema que vem se agravando e afeta a todos nós não somente em tempos de voto? Moderar ou liberar? Punir ou educar? Legislar ou autorregular? Há diversos caminhos. Só não pode ficar do jeito que está. Do jeito que está, hoje, cada mídia social tem sua política de conteúdo e suas medidas punitivas, que na maioria das vezes não são de conhecimento público. Com frequência, um mesmo conteúdo é tratado de maneira diferente, não só por redes distintas como também pela mesma rede. A falta de critérios universais gera incertezas, afetando também quem está se comportando adequadamente. Em outras palavras, o usuário faz o que quer e as mídias sociais reagem da maneira como melhor convém para elas. Na prática, uma terra de ninguém. Outro aspecto é que as políticas de cada rede social, por não serem transparentes, podem estar sujeitas a conflitos de interesse entre o seu proprietário e a sociedade. Elon Musk, por exemplo, que está negociando a compra do Twitter, já declarou publicamente que revogaria o banimento de Donald Trump por ter usado sua conta para incitar a invasão do Capitólio em 2021. Musk é historicamente alinhado com as causas da direita nos Estados Unidos e em vários países no mundo. Por esses motivos, o monitoramento e a aplicação de medidas punitivas de cada rede não têm surtido o efeito esperado no combate ao seu uso ilegal. A solução precisa ser coletiva. Um bom exemplo é o Conar (Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária). A iniciativa das agências de propaganda brasileiras nasceu no final dos anos 1970, em meio ao período da ditadura, quando havia a ameaça de criação de uma lei que estabeleceria a censura prévia aos anúncios. Isso nos faz lembrar do DIP (Departamento de Imprensa e Propaganda) do Governo Getúlio Vargas e o Ministério da Propaganda do regime nazista, liderado por Goebbels. Em ambos os casos, os governos resolveram intervir na comunicação e já sabemos o resultado. Um novo controle está acontecendo na China e na Rússia atualmente. Quando os meios de comunicação se tornam uma ameaça, estamos sujeitos às intervenções, com viés político e ideológico, que são mais prejudiciais do que a autorregulação. Voltando ao Conar, ele é formado por conselheiros voluntários, sem vínculos políticos, com mandato definido e age de duas maneiras. A primeira é por iniciativa própria, a partir da observação dos veículos de comunicação, e a segunda é por denúncias. Em ambas as situações, cada caso passa por uma avaliação e a peça veiculada pode ser suspensa imediatamente quando ferir os princípios do código de autorregulamentação, que é de conhecimento público. Além disso, há o direito de defesa e não há monitoramento prévio, excluindo qualquer tipo de censura. Uma característica do Conar que também pode servir de modelo para a autorregulação das redes sociais é que seus 180 conselheiros são distribuídos em cinco unidades: São Paulo, Rio, Brasília, Porto Alegre e Recife. Isso permite mais agilidade nas decisões e, sobretudo, diversidade regional e cultural, que precisam ser consideradas e respeitadas. Em se tratando das redes sociais, cujo volume de postagens é muito superior ao das propagandas, a quantidade de conselhos e conselheiros deveria ser maior. A experiência do Conar, muito bem-sucedida desde sua criação, mostra que apenas a união do segmento pode tornar o combate ao uso ilegal das redes sociais mais rápido e efetivo. Isso é uma demonstração de que não adianta cada rede ter sua própria regra. O esforço precisa ser coletivo, diminuindo o risco de intervenção, que burocratiza e enviesa as decisões, sem necessariamente resolver de forma definitiva a questão. E, no final das contas, a justiça pode ser acionada nos casos excepcionais. Contudo, é preciso alguns cuidados. O ideal é que a autorregulamentação seja feita por uma instituição privada independente, transparente e com financiamento pela sociedade civil. Esse modelo parece, salvo o surgimento de um melhor, o mais viável para reduzir crimes de pedofilia, apologia às drogas, racismo, discursos de ódio, violação de direitos autorais, que têm encontrado nas redes sociais um campo fértil para se proliferarem. Nessa direção, a autorregulação é mais que uma ação de prevenção. É um sinal claro de evolução de uma sociedade preocupada com o futuro de seus integrantes. Diante da barbárie em alguns casos, como nos grupos e canais do Telegram, podemos considerar a autorregulação até como um grande avanço civilizatório, quando vista em retrospectiva daqui a alguns anos.

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O que Elon Musk viu no Twitter que ninguém viu?

Depois de muita polêmica e manobras nas últimas semanas, Elon Musk fechou a compra do Twitter por US$ 44 bilhões. A operação tem rendido mais perguntas do que respostas. Por que pagar acima da cotação da bolsa por uma rede social que tem metade da rentabilidade de seus concorrentes? Por que comprar 100% das ações e fechar o capital, em vez de adquirir apenas o controle acionário? Afinal, o que o dono da Tesla viu no Twitter que ninguém viu? Como ainda é muito cedo para saber o que ele vai fazer na prática, podemos nesse momento fazer três análises do ponto de vista estratégico: Razões Econômicas — Mesmo que Musk negue publicamente que a compra do Twitter seja por razões econômicas, ele é empreendedor. Suas empresas são muito inovadoras e disruptivas. Com frequência, ele cria novos modelos de negócios que se tornam padrão nos segmentos onde atua: automóveis elétricos (Tesla), naves espaciais, (Space X), internet via satélite (Starlink), transporte em cápsulas (Hyperloop), túneis subterrâneos (Boring Company); painéis de energia solar (SolarCity); e neurotecnologia (Neuralink). Nesse sentido, o interesse na plataforma tem uma lógica financeira. Entre as principais redes sociais, é a que possui maior potencial de crescimento, pois sua base é composta por apenas 217 milhões de contas — em comparação com Facebook, Instagram, Youtube, Tik Tok, que passam de 1 bilhão. O crescimento da base gera mais uso, atraindo mais publicidade e aumentando faturamento e rentabilidade. Além disso, há um grande potencial de inovação na plataforma. O Twitter tem sido a rede mais conservadora nesse aspecto em relação às demais, o que pode gerar mais atratividade e mais usuários, reforçando ainda mais as razões econômicas. Sob esse ângulo, a tendência é um serviço melhor — e Musk sabe fazer. Isso é positivo. 2. Razões Ideológicas — O que não é positivo se relaciona com o fechamento de capital na bolsa e o controle de 100% da empresa. Com isso, Musk não terá que prestar satisfação aos demais investidores, nem à SEC (Comissão de Valores Mobiliários nos EUA). Sem esses controles, ele terá mais autonomia para implantar seu principal projeto: “criar uma praça pública para a liberdade de expressão, onde os assuntos vitais para o futuro da humanidade são debatidos”. O risco nesse caso é que o Twitter, em nome de uma liberdade de expressão sem limites, seja guarida para os discursos de ódio e sirva também como megafone para disseminação de informação falsa. Além disso, há o temor que usuários banidos, por não respeitarem as regras atuais de conteúdo, retomem o direito de usar suas contas. É o caso de Donald Trump, ex-presidente dos EUA, que usou a plataforma para incitar a invasão ao Capitólio em 2021, sede do Congresso Nacional norte-americano. Inclusive, Musk foi contra o banimento de Trump do Twitter à época da medida. Outro aspecto negativo é que o dono da Space X possui muitas ligações empresariais e, por isso, não teria isenção para combater possíveis conflitos de interesse da plataforma com seus negócios e parceiros. 3 - Influência e Autoproteção — Pelas posições que ocupa nos negócios e por sua personalidade narcísica, Musk se expõe muito e precisa de poder não só para se defender como também para persuadir politicamente temas que podem ser úteis a ele no futuro. Nessa direção, ele está pensando como os magnatas do passado, que compravam veículos de comunicação para ampliar sua influência e servir como trincheira de defesa. Nas regras atuais desse jogo, por exemplo, Musk teria cadeira cativa na mesa do debate sobre privacidade de dados e do modus operandis dos algoritmos, que têm influenciado o comportamento social em muitos países. Só para lembrar: as redes sociais foram atores principais das eleições nos EUA, em 2016, e no Brasil, em 2018. Além disso, por ser o principal canal utilizado por formadores de opinião, jornalistas, empresários e líderes mundiais, o Twitter conta com uma grande relevância política e econômica. Sendo o único dono, Musk teria ainda mais poder com o meio político e empresarial de todos os países onde o Twitter atua. Aqui no Brasil, por exemplo, as redes sociais têm sido o foco de atuação do TSE para combater as fake news nas eleições de 2022. Portanto, o Twitter dá força política a quem já tem força econômica. E a pergunta final: como os usuários ficam depois da compra do Twitter por Elon Musk? Essa somente o tempo poderá responder, pois o homem mais rico do mundo precisa ainda assumir a gestão da sua nova aquisição e mostrar a que veio. Só nos resta esperar e protestar contra possíveis violações ao nosso direito de receber informações verdadeiras e não ser parte de um jogo político-econômico no qual poucos têm muito poder e muitos seguem sem saber.

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Propostas eleitoreiras para combater desemprego é busca do futuro no passado

As propostas dos principais candidatos à Presidência na eleição de 2022 para combater o desemprego são apenas retórica eleitoreira para iludir o trabalhador. Desconsiderando fatores como a inteligência artificial no mercado de trabalho, representantes da esquerda, do centro e da direita focam apenas em medidas econômicas e jurídicas, que são insuficientes e não produzem mais os mesmos resultados práticos do passado. Se nas décadas de 1970 e 2000 promover o crescimento econômico foi suficiente para gerar novos empregos, mudanças no mercado de trabalho atual indicam que apenas esse tipo de medida não surtirá o efeito esperado. O processo de digitalização, a adoção da inteligência artificial e dos robôs nas empresas, por exemplo, proporcionam redução de custo, aumento de produtividade e menor necessidade de mão de obra intensiva. De forma isolada, o crescimento econômico, portanto, não vai gerar nova vaga de porteiro para o porteiro que foi substituído pela tecnologia. O mesmo vale para o torneiro mecânico que perdeu o trabalho para o braço robótico. Para a atendente de telemarketing que foi trocada pela assistente digital. Essa lógica se aplica também ao vendedor que perderá seu posto para o comércio eletrônico. E até para o médico radiologista que terá sua função feita pela inteligência artificial embarcada nas máquinas de tomografia. Também não é revogando a reforma trabalhista de 2016 ou reduzindo direitos básicos para alguns tipos de trabalhador, como propõem alguns candidatos, que se vai garantir empregabilidade ou promover criação de novas vagas. Medidas corporativistas para profissões é outra estratégia que não funciona. Isso atrasa o avanço tecnológico e coloca o Brasil em posição crítica na qualidade e nos preços dos produtos no competitivo comércio internacional. O problema do desemprego é mais complexo do que os candidatos estão conseguindo enxergar. Em seu centro está o descompasso entre a formação técnica e a demanda atual do mercado de trabalho. Enquanto o sistema educacional forma trabalhadores para profissões que deixarão de existir, as empresas possuem vagas abertas para trabalhadores com novas habilidades que não existem. Já se pode notar essa defasagem atualmente em vários setores da economia, incluindo o Porto Digital, aqui no Recife. Reinserir no mercado de trabalho o porteiro, o torneiro, a atendente, o vendedor e o médico — e profissionais de outras atividades que a tecnologia pode fazer melhor, mais rápido e mais barato — exige treinamento em novas competências para as demandas do futuro. Não apenas as competências técnicas para encarar problemas mais complexos, mas também as emocionais para lidar com o desenvolvimento humano, já que os softwares e as máquinas poderão fazer o trabalho pesado por nós. A “economia do cuidado”, por exemplo, que dará conta do envelhecimento da população brasileira nas duas próximas décadas, será um dos pilares do mercado de trabalho que se projeta no horizonte. Isso vai exigir mais profissionais treinados e especializados em pessoas, tais como cuidadores, enfermeiros, educadores físicos, fisioterapeutas. A “economia verde” é outra área que vai exigir dos trabalhadores do futuro o aprendizado de novas competências. Mas não basta apenas treinamento. É preciso pensar também em políticas públicas de proteção social, pois nem todos os trabalhadores conseguiram fazer a transição para o futuro. Programas de auxílio temporários — e até mesmo permanentes — serão necessários. Contudo, não se deve confundir a profissão com o trabalhador. As profissões deixarão de existir, como já vimos. Por isso, o foco deve ser na transição das pessoas para outras atividades. Por todos esses fatores, buscar no passado soluções para o futuro não vai trazer os empregos de volta. Os candidatos precisam sair do discurso eleitoreiro, que promete o que não será cumprido, e se aprofundar nas soluções que farão a diferença. Precisam também parar de considerar que o eleitor não entende questões complexas. Trazê-los para o debate, com apoio dos empresários e governo, é a única forma de fazer a transição sem grandes percalços para o futuro. (Foto: Matheus Britto/Prefeitura Municipal do Jaboatão dos Guararapes)

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Vencer o medo será o grande desafio de 2022

Desemprego em massa, aceleração da inflação, dólar em ascensão, previsão de recessão, déficit público crescente, ameaça de nova onda da pandemia, agravamento da desigualdade educacional, aumento da pobreza e da fome. Esses são apenas alguns elementos do cenário para o próximo ano. Se tudo isso não bastasse, ainda teremos eleições em clima ideológico desagregador, transformando 2022 em mais um ano decisivo para o futuro do Brasil. Já vivemos outras situações como a que se desenha para 2022. Em 1989, a disputa eleitoral Collor-Lula dividiu o Brasil. Em 1990, ocorreu o chamado “confisco”, quando cerca de 80% do dinheiro em contas bancárias foi retido como proposta de conter a inflação. Em 1992, foi a vez do processo de desgaste e, em seguida, do impeachment de Collor, que deixou o Brasil em compasso de espera por quase 12 meses. Em 2002, o medo voltou sob a expectativa da vitória de Lula (PT) nas eleições contra Serra (PSDB). A principal ameaça era a descontinuidade do Plano Real. O temor não se concretizou, mas gerou um ambiente de incerteza por todos os lados. Mais recentemente, tivemos o embate Dilma-Aécio, em 2014, seguido pelo impeachment de Dilma, em 2016, que provocou uma recessão nos anos seguintes. Em 2018, a eleição de Bolsonaro criou um clima permanente de “guerra ideológica” e, desde 2020, vivemos uma pandemia que matou mais de 615 mil pessoas. A questão é que viver sob o medo altera nossa forma de pensar e agir. O psicólogo William Von Hippel, autor do livro A Evolução Improvável (Editora Harper Collins, 2018), mostra que a dose certa de medo preserva a vida e estimula a busca por soluções inteligentes. Por outro lado, quando em excesso e de forma sistemática, nos deixa mais sujeitos à procrastinação das decisões, à paralisação da evolução e, principalmente, à manipulação. Sob o domínio do medo, a tendência é adiarmos nossas decisões. Somos tomados pelo clima do “tudo vai dar errado”. Desde sair de casa, para não contrair o coronavírus, até diminuir o consumo, pelo temor da perda do emprego. Esse comportamento atinge diretamente a economia: menor consumo leva ao baixo crescimento, que não gera emprego, diminui a renda e aumenta a pobreza. Um círculo vicioso difícil de ser quebrado em um ambiente de dúvidas. Mais grave que a procrastinação, o medo também leva à paralisação. Temas importantes que afetam o futuro são, com frequência, postos de lado, tanto no plano do indivíduo quanto no coletivo. Deixamos de construir o futuro para pensar apenas na sobrevivência do presente. Um exemplo é a paralisação de reformas — política, administrativa, tributária — no Congresso Nacional. Prisioneiros do medo da não renovação dos mandatos, os políticos atropelam o debate das pautas importantes para o Brasil com medidas e negociações eleitoreiras. Juntas, a procrastinação e a paralisação nos fazem ter a sensação de que estamos indo em direção ao caos. De que nada avança e que precisamos de ações firmes e imediatas para nos tirar dessa situação. Aí entra outra consequência de viver sob o medo: a porta aberta à manipulação. Nesse momento, estamos mais propensos a aceitar transgressões morais e legais em nome da “salvação”. De uma maneira geral, tais medidas — que em situação normal não seriam colocadas à mesa, nem mesmo aceitas — se tornam uma opção tentadora. Isso nos leva, mais uma vez, a priorizar o curto prazo e não enxergar as verdadeiras ações. Os nazistas, por exemplo, usaram a falsa ameaça de invasão pela Rússia e a grave crise econômica para corromper a democracia alemã e transformá-la em ditadura, que ocasionou a Segunda Guerra Mundial. Aqui no Brasil, em 1937 e em 1964, foi a manipulação política do medo da falsa Intentona Comunista e do apoio da União Soviética à Cuba que resultou no Estado Novo e no Golpe Militar, respectivamente. Para não repetirmos o lado negativo da nossa história, chegou a hora de permitir que nosso racional entre em ação para ajudar a definir o futuro. Como apontado por William Von Hippel, não devemos nos abater pelo cenário de incertezas e dar espaço à procrastinação, à paralisação, à manipulação. Devemos usar o medo na medida certa para estimular nossa capacidade de compreender, aprender e criar o futuro desejado. Até porque, como a história também mostrou, o medo passa e a vida continua.

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