“Crescimento da IA, de carros elétricos e das ondas de frio e calor podem causar apagão” – Revista Algomais – a revista de Pernambuco
OBSERVATÓRIO DO FUTURO

OBSERVATÓRIO DO FUTURO

Bruno Queiroz Ferreira

“Crescimento da IA, de carros elétricos e das ondas de frio e calor podem causar apagão”

Imagens criadas pelo Bing Image Creator

Por Bruno Queiroz Ferreira

O Brasil possui uma das matrizes elétricas mais sustentáveis entre as grandes economias do mundo. Diferentemente dos EUA e da China, por exemplo, que geram grande parte da energia por meio do carvão e de combustíveis fósseis, mais de dois terços da energia nacional provêm de fontes limpas, como hidráulica, solar e eólica. Por outro lado, se não houver um planejamento adequado para a transição energética, fatores tecnológicos e climáticos podem impactar o sistema e causar a insuficiência de energia no futuro.

Um desses fatores é a adoção crescente da inteligência artificial pelas empresas e pelos usuários. Segundo a Agência Internacional de Energia, uma pergunta respondida por inteligência artificial consome 2,9 watts-hora (Wh), cerca de 10 vezes mais do que uma pesquisa no Google, por exemplo. O maior consumo de energia pelo uso dessa tecnologia se dá também pela necessidade de refrigeração dos data centers, que são responsáveis por hospedar as aplicações de IA e funcionam 24 horas por dia.

Um estudo do Governo Federal mostra que a evolução da carga prevista para os data centers terá um grande crescimento na próxima década, chegando a 2,5 GW até 2037, apenas considerando novos projetos nos estados de São Paulo, Rio Grande do Sul e Ceará. Atualmente, existem 12 projetos de data centers que precisam de acesso à rede de transmissão de energia elétrica, de acordo com o Ministério das Minas e Energia.

Outro fator tecnológico que pode impactar o sistema elétrico nacional é o aumento do uso de baterias. Não só pelos equipamentos eletrônicos, que cresceram ao longo das últimas décadas, mas principalmente pelos carros elétricos. Se a tendência de crescimento nas vendas desse tipo de veículo registrada nos dois últimos anos for acelerada, em consequência haverá aumento de demanda por energia. A questão é se a oferta pelas geradoras poderá acompanhar o mesmo ritmo da demanda.

Fatores climáticos também entram nessa conta. A tendência de alta da frequência e da intensidade dos eventos climáticos extremos, que estão sendo registrados em todas as regiões do Brasil e provocam ondas de calor e frio, por exemplo, indica a possibilidade de aumento contínuo do uso de condicionadores de ar e aquecedores, entre outros equipamentos, nas residências e nos escritórios nos próximos anos.

Para resolver a questão da eventual falta de energia no futuro, não basta produzir mais energia. A questão é mais complexa. Isso porque data centers, condicionadores de ar e aquecedores, por exemplo, necessitam de fornecimento estável, um tipo de fonte que é capaz de gerar energia de forma contínua, sem depender de variações de horários e condições climáticas.

Mas esse tipo de energia, fornecida principalmente por hidrelétricas, está limitada atualmente no Brasil quando se trata da geração em grande escala. A legislação ambiental atual impõe muitas restrições ao licenciamento de usinas de energia hidráulica que se baseiam na inundação de grandes áreas para a formação de reservatórios de água, como vistos nas décadas passadas no curso do Rio São Francisco, por exemplo.

Por outro lado, o aumento da produção de energia solar e eólica também não resolve o problema. Como dependem da incidência do sol e dos ventos, são do tipo intermitentes. Em outras palavras, não possuem a capacidade de geração contínua, como as hidrelétricas. À noite, por exemplo, quando o consumo é maior, a geração de energia estável das hidrelétricas pode não ser suficiente para atender a todos em um cenário de demanda crescente por energia.

Além disso, ainda não há – do ponto de vista tecnológico, econômico e ambiental – uma solução em grande escala que armazene a energia intermitente para ser usada nos horários que não pode ser gerada. Atualmente, as baterias não conseguem guardar o suficiente para prover altas demandas, seu custo de aquisição é muito alto e o processo de produção e descarte dos acumuladores é poluente.

Uma solução é o uso do gás para expandir as termelétricas, que podem gerar energia do tipo estável. Apesar de ser menos poluente do que outras matrizes que emitem carbono, as discussões para implementação da reforma tributária indicam que combustíveis fósseis podem ter uma taxação adicional à alíquota padrão do IVA. O Imposto Seletivo, nessa direção, se torna um componente para o aumento do preço da conta de luz e para o desestímulo econômico à construção de novos empreendimentos de produção de energia estável à base de emissão de carbono.

O que se pode concluir, a partir desses elementos, é que as próximas décadas apontam para um provável cenário de insegurança energética e com aumento de preço. Essa combinação tem o potencial de causar um efeito dominó na economia. Isso porque a energia é um dos principais insumos de produção e de comercialização de produtos e serviços. E pode vir a ser também de distribuição, se for confirmada a tendência de substituição dos veículos movidos a combustíveis fósseis por veículos elétricos.

Portanto, assim como será necessário enfrentar, nas próximas décadas, as consequências do rápido envelhecimento e da diminuição da população brasileira, da substituição de empregos pela IA e dos impactos dos eventos climáticos extremos, há também uma grande questão para o Brasil do futuro: a transição energética e o desafio de produzir e distribuir energia limpa, estável e de baixo custo.

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