“É preciso mais investimentos em energia. É uma questão de segurança nacional.” – Revista Algomais – a revista de Pernambuco

“É preciso mais investimentos em energia. É uma questão de segurança nacional.”

Felipe Valença, Diretor-presidente da Copergás, detalha planos e ações para tornar o gás natural um indutor do desenvolvimento, em especial no interior, como nos Polos Gesseiro e de Confecções. Também ressalta a importância do GN na transição energética e alerta que o País necessita investir em fontes diversificadas

Há pouco mais de um mês, a Copergás anunciou que vai investir R$ 986 milhões até 2029, isso significa 65% a mais que o patamar previsto anteriormente, de R$ 596 milhões. Também planeja até 2025 levar o GN para o Polo Gesseiro na região do Araripe, num investimento inicial de R$ 6 milhões, e faz estudos para também beneficiar o Polo de Confecções do Agreste.

Seus planos preveem ainda a implantação do gás natural veicular no transporte público em Pernambuco, que já está em fase de testes, além de um projeto-piloto para um novo caminhão movido a GNV. Além disso, a partir de setembro, a Copergás passa a ofertar gás natural 100% renovável, o biometano, por meio da interligação, no Ecoparque da Muribeca, do supridor Orizon.

À frente desse arrojado planejamento da empresa está Felipe Valença que, há menos de um ano, assumiu a presidência. Para obter esse investimento de quase R$ 1 bilhão, ele mostrou a Commit Gás e a Mitsui Gás – sócios da Copergás juntamente com o Governo de Pernambuco – a vantagem de reduzir a distribuição dos dividendos a 25% para permitir que os 75% restantes fossem reinvestidos.

Nesta conversa com Cláudia Santos, Felipe Valença ressalta a urgência de ampliar a infraestrutura do gás natural como forma de induzir o desenvolvimento no Estado. Também salienta a importância dessa fonte energética como transição para uma matriz sustentável e para a própria segurança nacional.

A Copergás divulgou que, na sua gestão, pretende estimular o desenvolvimento econômico de microrregiões do Estado ou segmentos econômicos com foco principalmente na indústria. Como isso tem sido executado?

Nesse novo ciclo, em que buscamos alavancas de crescimento, percebemos que a Copergás deveria estar mais conectada como indutor de desenvolvimento do Estado e temos uma grande oportunidade no interior. Enxergamos que existe uma série de polos industriais em Pernambuco que ainda não são abastecidos pelo gás, entre eles, o Polo do Araripe que foi mencionado pela maioria das lideranças que ouvimos durante a revisão do nosso planejamento estratégico.

Hoje temos uma malha de gás que margeia a BR-232, vai pelo litoral até chegar a Belo Jardim. Mas há outras regiões em que precisamos atuar como, por exemplo, a área têxtil de Santa Cruz do Capibaribe e Toritama. É uma região que representa em torno de 20% do jeans do Brasil e, assim como o Polo do Araripe, não tem infraestrutura de gás.

A boa notícia é que conseguimos aumentar o investimento da Copergás nos próximos seis anos em 65%. Isso representa quase R$ 1 bilhão. No ano passado, com a revisão do planejamento estratégico, conseguimos a confiança dos sócios para reinvestir o resultado da empresa no Estado de Pernambuco. Até então, tínhamos uma política de distribuição de 100% dos dividendos, ou seja, sobrava menos dinheiro para investir. Hoje a política de dividendos é de 25%, que é o mínimo de uma S/A.

Boa parte desse recurso é para o interior, então setores, como o Polo Têxtil, serão contemplados. É um projeto de expansão que vai sair de Caruaru para o polo do Agreste. Mas isso não é para este ano porque os estudos só começam a partir do ano que vem.

Levar essa solução para as indústrias impulsiona o desenvolvimento porque traz economia para empresas como o Lafepe que acabou de virar nosso cliente e tem a expectativa de economizar R$ 1,2 milhões por ano. Além de ajudar na economia, o uso do gás natural faz com que as empresas possam participar ativamente na agenda de transição energética. Há muitas indústrias que ainda queimam óleo ou madeira, como o caso do Araripe. Isso arrasa a mata nativa e cria desertos. O gás natural é muito menos poluente, oferece uma economia de pelo menos 25% de CO2. Então é realmente sustentável.

Como tem sido a receptividade das empresas do gesso ao gás natural?

Muito positiva. Já temos cerca de 18 cartas de intenção de empresários locais manifestando interesse. De fato, existe uma demanda. Nosso cronograma está bem definido. Nunca um presidente da Copergás esteve lá e nós já estivemos várias vezes, sempre em companhia de diversos órgãos e lideranças estaduais, pois é um assunto de interesse de todos.

Na última vez, estivemos com a governadora do Estado, que anunciou a desoneração do ICMS para o Polo Gesseiro. Isso gerou confiança do empresariado local. Temos lá um projeto-piloto que começa em abril, em que um empresário está fazendo investimento e nós estamos atuando para colocar o gás em teste e, em seguida, montar a infraestrutura pra valer. Nossa previsão é que as obras sejam iniciadas até o final do ano e que, a partir do primeiro semestre de 2025, iniciaremos o fornecimento.

A Copergás anunciou que também vai intensificar o acesso em localidades que já contam com rede de gás. Ainda é baixo o número de conversões em locais que já contam com a oferta de GN?

Para se ter uma ideia, no ano passado, quando começamos a fazer a revisão do planejamento estratégico, identificamos que só existem nove clientes da Copergás em Caruaru e a empresa está há 15 anos lá. Queremos universalizar o consumo. Existem outras cidades que, como Caruaru, contam com uma malha de gás para uso de uma indústria ou posto de gasolina, mas não atende o pequeno e médio comércio, por exemplo.

Como está o projeto em relação ao consumidor residencial? O programa Morar Bem vai entregar as casas populares com gás natural?

O gás residencial no Brasil é muito elitizado. Hoje, em Pernambuco, há apenas 90 mil usuários, é um leque muito pequeno. Para ampliar esse número, fizemos uma parceria com a Secretaria de Habitação para inserir gás natural em empreendimentos do programa Morar Bem.

A preferência é instalar o gás nos empreendimentos que passam perto da nossa malha. Começamos a estudar, no ano passado e este ano, já identificamos três empreendimentos do programa nessa condição. São aproximadamente mil habitações. A realidade é que não conseguimos conectar todos, porque depende da distância e do perfil dos empreendimentos, mas estamos cada vez mais próximos de mudar essa realidade e a inserção do Morar Bem está ajudando.

Além disso, estamos tentando intensificar a conversão. Em Caruaru, por exemplo, havia apenas dois condomínios conectados à rede e, como disse, tínhamos na cidade apenas nove clientes. Demos um salto e agora estamos com mais de 30 em processo de contratação e estamos ligando bairros como Maurício de Nassau e outros. No Recife, temos vários empreendimentos comerciais na Zona Norte, por exemplo, que já aderiram ao gás natural e estão satisfeitos.

Vamos passando a rede, batendo nas portas, oferecendo o serviço, sempre nessa ótica de ter economia, segurança e otimizar espaço. Isso porque o gás natural é todo canalizado, não precisa de uma estação dentro do imóvel como acontece com o gás GLP, que é comumente usado em prédios.

A Copergás criou um grupo de trabalho para incentivar a mobilidade com o uso de gás natural veicular. Como estão as ações desse grupo e as articulações para implantação de ônibus movidos a GNV?

Dentro dos pilares desse novo ciclo da Copergás está a mobilidade. Assim como os carros elétricos, os veículos a gás também contribuem para a transição energética. Então, sugerimos à governadora a redução do IPVA para o usuário do carro a gás que, em sua maioria, são pessoas que usam o veículo para trabalhar, como motoristas de aplicativo e taxistas. Ela aceitou e tivemos a aprovação no decreto do ano passado reduzindo o IPVA em 40%.

Hoje estamos ampliando anualmente a oferta de gás GNV no interior do Estado, onde está 25% da nossa rede e onde o carro a gás é novidade. Também estamos incentivando novos usuários e acabamos de firmar parceria com o Sindicato dos Combustíveis e com o Sindirepa (Sindicato da Indústria de Reparação de Veículos e Acessórios) para que sejam concedidos vouchers aos novos usuários de carro a gás com desconto no abastecimento ou na compra do kit de conversão.

Em relação à implantação do GNV nos transportes públicos do Estado, estamos trabalhando junto à Secretaria de Mobilidade para inserir o ônibus a gás a fim de reduzir a emissão de CO2 e gerar economia para o sistema de transporte público. Já estamos na fase de testes, fazendo uma validação técnica e, em breve, traremos os resultados para implantar os ônibus a gás em Pernambuco.

Futuramente seremos um dos principais Estados do Brasil a usar essa inovação que também será realidade em outras partes do mundo, como em Bogotá na Colômbia, que tem mais de dois mil ônibus a gás. Isso é muito importante porque muito se fala da indústria, mas um grande emissor de gás carbônico no mundo é o transporte. Caminhões a diesel, por exemplo, são grandes poluentes. Por isso, além dos incentivos aos carros leves e a iniciativa voltada para os transportes públicos, temos um projeto piloto de um novo caminhão movido a GNV. Quando comparado ao diesel, o gás proporciona uma redução de 95% do particulado sólido (poluentes) e de 20% de CO2 em veículos pesados.

Então, em termos de transição energética da mobilidade, começamos com o gás natural em seguida, no mês de setembro, vamos consumir o biometano e, a partir do ano que vem, 8% da origem do nosso gás será totalmente verde.

O que é o biometano? Ele já é utilizado em outros Estados?

É um biogás que se origina de decomposição dos resíduos orgânicos encontrados, principalmente, em aterros sanitários. O acesso a ele se dá por meio do refino, que é a separação das moléculas. Em sua essência, a composição química é a mesma do gás natural, o CH4, a diferença é que ele não tem origem fóssil, então não libera gás carbônico.

Essa é uma prática que alguns Estados já fizeram. O primeiro projeto em escala no Brasil feito junto com a distribuidora de gás foi no Ceará. Em Pernambuco, será um salto de inovação e estamos estudando outras fontes possíveis além dos aterros sanitários.

De um modo geral, como o senhor analisa o papel do gás natural como combustível sustentável e para transição energética?

Quais são as perspectivas para o futuro? O Brasil tem que ter alternativas de matriz energética porque, hoje, 30% do nosso diesel é importado, boa parte da Rússia que está em guerra. Ou seja, corre-se o risco de ficarmos sem o combustível, o que impacta a economia. Então, mesmo o Brasil sendo destaque mundial em geração de energia limpa, é preciso mais investimentos, tanto em energia limpa, quanto no setor de óleo e gás, para não ficarmos refém de outros países. É uma questão de segurança nacional.

Nos EUA, por exemplo, há a exigência para que as novas habitações tenham energia renovável, pois eles importam óleo do Canadá, mas e se o consumo disparar? Eles vão comprar da Venezuela e da Rússia? Ou seja, para além da bandeira verde, é uma questão de segurança nacional.

Nosso papel é montar a infraestrutura para o gás, mas o que hoje é gás natural pode ser, amanhã, percentual de biometano, e, quem sabe, até hidrogênio verde. No Brasil, a infraestrutura de gás é extremamente acanhada. A Argentina tem, pelo menos, quatros vezes mais a quantidade de quilômetros que o Brasil tem em malha de gás.

O senhor mencionou o hidrogênio verde como perspectiva. Ele é uma realidade próxima? Como estão as pesquisas?

Essa é a entrega de amanhã. O hidrogênio verde é um assunto extremamente interessante e, como qualquer inovação, tem que ser pesquisado, tem que receber investimentos. Mas não é para agora porque o processo de eletrólise para fazer o hidrogênio verde é essencialmente com técnicas a diesel, assim como o carro elétrico, sobre o qual há um discurso que não impacta na emissão de CO2, mas muitas grandes siderúrgicas e indústrias automotivas utilizam o diesel como combustível.

Temos esse desafio da industrialização, muitas grandes indústrias ainda são à base de óleo. Por isso, reforçamos o uso do gás natural como transição energética que pode evoluir para uma série de outras fontes de energia. Daí a necessidade de aumentar os investimentos em infraestrutura.

O senhor veio do mercado financeiro e conquistou a confiança dos sócios da Copergás ao propor reverter boa parte dos dividendos para investir na ampliação da oferta de gás natural. Como foi esse processo?

Eu entrei no mercado financeiro com 19 anos, fui trainee de bancos, passei seis anos no antigo Unibanco atendendo empresas de médio e grande porte. No Rio de Janeiro, trabalhei no Banco Pactual. Em São Paulo, no Banco Safra. Depois virei empreendedor, entrei numa fintech, preparei empresas, levantamos dinheiro de fundo, fui presidente do conselho e depois presidente de uma empresa, aonde trabalhei nos últimos seis anos com tecnologia e inovação.

Aí, recebi o convite da Copergás, no início da gestão de Raquel Lyra, quando ela buscava pessoas de mercado com muita experiência em gestão de empresa. Para mim foi muito desafiador, mas conseguimos passar conforto para os sócios de que tínhamos um novo plano de voo. A primeira mensagem que recebi deles foi de que precisavam ter confiança na empresa e na gestão e se a gente conseguisse apresentar um bom projeto, eles mudariam a política de dividendos. Apresentamos o projeto e foi muito rápido para alinhar os sócios. Provamos para eles que o melhor investimento era investir na Copergás, investir em Pernambuco.

Em maio completo um ano na Copergás e, sinceramente, não imaginava que teríamos tantas colheitas em tão pouco tempo. Estou otimista. Conseguimos ampliar os investimentos, estamos tornando a empresa mais eficiente e fomos reconhecidos pelo mercado. No ano passado ganhamos quatro prêmios da Abegás (Associação Brasileira das Empresas Distribuidoras de Gás Canalizado): o prêmio de ESG pela iniciativa que prioriza a descarbonização, a parte de estratégia comercial, a parte regulatória, que é extremamente importante, e fomos o destaque do ano, a melhor empresa do ano.

Não foi fácil, mas conseguimos, nesse primeiro ciclo, entregas importantes. A gente tem um time excelente, tem um surpreendente nível de compromisso com a entrega. Acho que é muito importante registrar o alinhamento com órgãos do Governo do Estado e o apoio da governadora.

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