Economista defende reverter o processo em andamento de privatização do metrô do Recife, com a retirada da empresa do Plano Nacional de Desestatização, e priorizar a recuperação do sistema.
"É urgente recuperar o metrô e ampliar a sua função social", afirma o economista Luiz Alves, doutor em geografia econômica e professor da Universidade de Pernambuco. Além de alertar para a necessidade de reverter o cenário de precarização atual do serviço de transporte público de passageiros sobre trilhos no Recife, que decaiu vertiginosamente após a entrada no Plano Nacional de Desestatização (PND) do Governo Bolsonaro, o docente destaca a relevância socioeconômica do setor dentro da gestão pública.
Os profissionais do sistema metroviário pernambucano realizaram ontem a primeira paralisação durante o terceiro mandato do Governo Lula, pedindo investimentos para recuperação do sistema e solicitando a retirada da empresa do Plano Nacional de Desestatização. A discussão, que já passou pelo Senado, pela Alepe e pela Câmara de Vereadores do Recife, trata do modelo de gestão do transporte de passageiros sobre trilhos, o único que sobrou dentro da gestão pública. O transporte de cargas no Estado foi privatizado no final dos anos 90, entrando em falência em poucos anos.
"O setor de transporte é muito importante. O metrô, especialmente no Recife, transporta trabalhadores e trabalhadoras de bairros populares. Se você observar nossas linhas, tanto Camaragibe, como Cajueiro Seco e Jaboatão, elas atendem áreas de muito adensamento populacional e de uma necessidade muito grande de transporte de qualidade e barato, pois são regiões populares. O Governo Federal deve avançar as conversas e diálogo sobre a CBTU no sentido de tirá-la do PND, não só por isso, mas por outros fatores. Há viabilidade técnica e financeira da CBTU de se manter viável", avaliou o economista.
O economista é crítico do modelo de privatização das empresas públicas com funções sociais e defende que a prioridade no caso do sistema pernambucano não é a transferência para uma administração privada, mas de recepção de investimentos públicos para sua recuperação. "O mais importante é a recuperação. Houve recentemente um acidente mais sério, com a quebra dos cabos, o que é indício de precariedade. Isso precisa ser urgente revertido, pois são vidas em deslocamento pelo metrô. Defendo também a permanência na gestão pública e a adequação para que cumpra a sua função social. Empresa privada não tem função social, tem lucro, eficiência a todo custo. Mas empresas como a Petrobras e a CBTU tem cláusulas relacionadas a sua função social".
Ele lembra que o sucateamento das empresas públicas é típico desses processos de privatização. "Tivemos num dado período de nossa história econômica, recente, essa estratégia de sucatear, deixar cair a um nivel precário dos serviços, para justificar uma possivel privatização. Essa precarização faz também o preço da empresa cair e venda se tornar mais fácil. Isso foi muito denunciado também no caso dos Correios. Infelizmente é uma prática deliberada".
FUNÇÃO SOCIAL
Além de melhorar a qualidade do transporte, uma das pautas em discussão dos movimentos em defesa do metrô é pela tarifa social. Até março de 2019 o preço das passagens do Metrô do Recife era de R$ 1,60, quando começou uma escalada de subida. O sistema foi incluído no PND em setembro daquele ano, o primeiro ano do Governo Bolsonaro. Em 2021, o valor da tarifa já era de R$ 4,25.
"O mais urgente é recuperar. Sua malha por inteiro está muito precária. Após a recuperação do metrô, é importante avançar na questão social. O Governo Federal tem o desafio de cumprir políticas sociais amplas, o que já tem feito, como o Bolsa Família e Brasil Sorridente. É preciso aprofundar a pauta social. Quanto menos a população gasta com escola, saúde e transporte, mais tem recursos para outros itens de consumo, isso impacta positivamente na economia, com a movimentação das feiras, mercadinhos e supermercados. Para isso precisa de dinheiro, que vai acontecer à medida que a renda sobe ou com o barateando dos custos dos serviços. O metrô é um instrumento poderoso disso. Temos que ter uma preocupação com a função social, que também é socioeconômica", afirmou Luiz Alves.
Nos Estados que já passaram por privatizações recentes ou antigas, o modelo de gestão tem resultado em tarifas elevadas nas passagens, como no Rio de Janeiro (R$ 7,40) e, recentemente, em Belo Horizonte (R$ 5,30). Além da inflação no bolso dos passageiros, as privatizações, concessões ou Parcerias Público-Privadas não conseguiram reverter o sucateamento no setor de transporte sobre trilhos, que enfrenta fortes crises em todo o País, como na Supervia, no Rio de Janeiro, e nas linhas 8-Diamante e 9-Esmeralda, da CPTM em São Paulo. Os sistemas têm acumulado falhas graves nos últimos meses, com um padrão de serviço inferior aos prestados pelos serviços públicos anteriores.