Futuro dos bairros de São José e Santo Antônio em debate – Revista Algomais – a revista de Pernambuco

Futuro dos bairros de São José e Santo Antônio em debate

Nas ruas e edificações dos bairros de São José e Santo Antônio foram escritos os primeiros capítulos da história do Recife. Do protagonismo inicial à situação de abandono dos dias atuais, há diversos desafios econômicos, sociais e urbanísticos a serem superados. No encerramento da série Região dos Contrastes, apresentamos algumas sugestões dos especialistas, entidades de classe e representantes do poder público para sua revitalização. O interesse de expansão do Porto Digital e o avanço do uso universitário dos prédios antes desocupados são novos vetores de desenvolvimento que contribuem para esse movimento de revitalização.

O futuro dos bairros centrais do Recife foi discutido em uma audiência pública em 2018 na Câmara Municipal promovida pelo vereador Jayme Asfora (PROS). Mesmo com o diagnóstico negativo do retrato atual do Centro, a arquiteta Amélia Reynaldo defendeu que “a região é muito mais uma oportunidade que um problema”.

A especialista propõe uma governança exclusiva para o local. “Com o rico patrimônio arquitetônico, cultural e humano, o nosso Centro é uma oportunidade, desde que se instale uma gestão própria para ele. Não só para Santo Antônio e São José, mas para o centro histórico e antigo do Recife. Um plano de ordenamento sistêmico, além dos quatro anos de gestão do poder municipal”, defende Amélia, mencionando que seria um escritório de reabilitação e conservação integrada.

A insegurança, as dificuldades de mobilidade e o desordenamento do comércio informal são os calos que incomodam o dia a dia dos lojistas que atuam nas movimentadas ruas desses bairros. Para solucionar essas questões, a Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL Recife) defende também um plano de longo prazo para a região e até já elaborou o projeto nesse sentido. “Temos um plano feito junto com outras instituições para a região que compreende os bairros de Boa Vista, São José e Santo Antônio, que já foi entregue para a prefeitura”, afirmou Cid Lobo, presidente da entidade.

Conectada à atual discussão sobre o Plano Diretor do Recife, a CDL realizou um pedido para que conste no documento um dispositivo que obrigue o poder público a realizar um estudo amplo sobre os problemas e soluções para esses bairros em um ano. “Essa seria uma forma de termos um diagnóstico das vocações e do que fazer para que o Centro do Recife possa renascer”, explica o presidente da câmara.

Já a arquiteta e professora da Unicap Clarissa Duarte defende que um plano específico para a região de Santo Antônio e São José é fundamental e urgente. “Esses bairros guardam hoje muito mais vestígios da origem do Recife do que qualquer outro, inclusive o Bairro do Recife, que sofreu grande reforma no início do século 20 e perdeu grande parte de seu patrimônio urbano-arquitetônico colonial”, ressalta a arquiteta.

A principal intervenção sugerida por Clarissa para reorganização desses bairros seria na Avenida Dantas Barreto. “Dentre tantas iniciativas importantes para se implementar nesse território, a mais estratégica e eficaz a ser priorizada é a reabilitação e humanização integrada de toda a Avenida Dantas Barreto e de suas ruas transversais que dão acesso direto aos principais elementos patrimoniais do lugar, incluindo seus espaços públicos (vegetados ou não) e seus edifícios notáveis (religiosos, antigos e modernos). Uma vez reabilitada e humanizada, essa avenida terá valorizado seu potencial de indução e articulação do território, estimulando fortemente o encontro qualitativo de toda a população da cidade com os tesouros ali esquecidos”.

Clarissa Duarte defende a reabilitação e humanização do bairro a partir da Avenida Dantas Barreto. Foto: Diego Nóbrega

Estudos da arquiteta apontam que a partir da Dantas Barreto é possível se ter acesso de modo fácil a mais de 50 elementos notáveis do nosso patrimônio urbano-arquitetônico, como as 14 edificações religiosas que se encontram nesses dois bairros. O desenho acima faz parte da pesquisa da arquiteta no ano de 2002 e já foi Capa da Algomais em 2014, que sugeria transformar a avenida em um boulevard. Praticamente nenhuma das propostas elencadas no estudo para essa via saiu do papel.

O arquiteto José Luiz da Mota Menezes defende que as intervenções tenham uma preocupação funcional para o público que já circula na região. “É importante preparar a cidade para o uso pela gente comum. Não podemos exigir que essa parcela da população, que não teve uma educação estética aprimorada, deseje uma cidade bonitinha. Eles querem uma cidade utilitária”, adverte.

O especialista afirma que a renovação urbana já começou com a chegada das faculdades na região e deve ser perseguida pela realocação dos ambulantes. “O melhor seria negociar com eles para que pudessem ocupar as casas desabitadas ao longo da Avenida Dantas Barreto”, afirma o arquiteto. Mota Menezes também propõe a retomada do caráter habitacional do bairro. Sobre a vocação acadêmica, Uninassau, Centro Universitário Joaquim Nabuco, Universidade Estadual Vale Do Acaraú (UVA) e um polo de educação à distância da Rede Laureate já estão em funcionamento na Avenida Guararapes.

Ao participar da audiência pública na Câmara dos Vereadores, o secretário de Desenvolvimento Urbano do Recife Antônio Alexandre afirmou que diante de muitos projetos e experiências de revitalização já realizados para a região histórica da cidade, é necessário desenvolver uma estratégia que garanta a efetividade e sustentabilidade do que está sendo proposto nas discussões. Mais do que uma questão estritamente urbanística, o secretário defendeu ser necessário garantir a vitalidade econômica dos bairros e incentivar a reocupação também para moradias. “A dimensão socioeconômica é um dos pontos de partida para a recuperação dessa região. Nossa preocupação é com a reocupação do Centro e a diversidade de uso para a área continuar ativa e dinâmica”.

PORTO DIGITAL
A necessidade de expansão do Porto Digital poderá beneficiar a região. O atual presidente Pierre Lucena disse em entrevista à Algomais ter como meta dobrar o faturamento (que atualmente é de R$ 1,8 bilhão) em cinco a seis anos. Para tanto, planeja duplicar o número de empresas embarcadas no parque tecnológico passando das atuais 300 para 600, além de dobrar a quantidade de pessoas que trabalham no local, chegando a 20 mil profissionais.

Pierre Lucena, presidente do Porto Digital, fala sobre a intenção de expansão para o Bairro de Santo Antônio. Foto: Tom Cabral

Portanto, o setor de TI pernambucano vai requerer mais espaço físico. “Existe uma ideia nossa de expansão do projeto do Porto Digital para outros bairros, eu vejo Santo Antônio com uma característica especial até por conta dessa movimentação de comércio que não é a mesma do passado”.

Lucena afirma, porém, que a ampliação para Santo Antônio depende de uma conjunção de fatores do setor privado, do segmento imobiliário e público em reformar o bairro depreciado. “Esse é o momento para a gente aproveitar e refazer basicamente o que foi feito no Bairro do Recife. É uma oportunidade de induzir essa ambiência criada no Porto Digital justamente em razão desse desenvolvimento econômico e social que tivemos. Temos uma área central histórica, no bairro de Santo Antônio, que é onde podemos dar um tratamento de cidade mais adequada a partir do Porto Digital”, afirma o presidente.

O interesse do parque tecnológico e a chegada das universidades são novos fatos que trazem ao bairro, no curto prazo, investimentos privados e a circulação de um novo público. Novidades que contribuem para dar impulso ao almejado plano de longo prazo para a região.

A experiência de transformações urbanas simples, testadas com sucesso pelo próprio poder municipal, como o programa Mais Vida nos Morros, por exemplo, bem que poderia criar um movimento de Mais Vida no Centro, com maior engajamento da população pela recuperação desses bairros.

*Por Rafael Dantas é repórter da Algomais  (rafael@algomais.com). O jornalista assina a coluna Gente & Negócios no site da Algomais

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