Nestes oito anos em que esteve à frente da Prefeitura do Recife, o prefeito Geraldo Julio teve que enfrentar um cenário de crise econômica, uma das mais profundas que o Brasil já atravessou. Também governou em meio a duas crises sanitárias: das arbovirores zika vírus – causadora de microcefalia em recém-nascidos – e chikungunya, além da pandemia da Covid-19, que vem causando prejuízos em todo o mundo. Nesta entrevista a Cláudia Santos, o prefeito comenta os momentos difíceis com os quais se confrontou nos seus dois mandatos e que, apesar dessa conjuntura desfavorável, conseguiu deixar uma série de realizações para a cidade. Geraldo Julio também analisa os desafios do seu sucessor João Campos.
Qual foi seu momento mais difícil na Prefeitura do Recife?
Quando se está diante da responsabilidade de ser prefeito do Recife, todo momento é desafiador. Nesse período de oito anos, passamos pela pior crise econômica da história do País, que desencadeou uma profunda crise social e forte instabilidade política. Some-se a isso duas crises sanitárias de caráter internacional, sendo uma delas uma pandemia sem precedentes para a geração atual, com a Covid-19, além do desafio das novas arboviroses com o zika vírus, causador da microcefalia em recém-nascidos, e a chikungunya. A cada um desses desafios, o Recife precisou dar uma resposta, seja para a questão do aumento da pobreza, com as ações do Chegando Junto, seja para o aumento da desigualdade também, com os Compaz, mas acredito que tomamos decisões especialmente acertadas nos enfrentamentos às crises sanitárias. Nas arboviroses, montamos um plano capaz de engajar toda a sociedade, que foi reconhecido pela OMS como referência global e, agora na Covid-19, montamos em tempo recorde uma rede com sete hospitais de campanha, equipada com mais de mil leitos, sendo mais de 300 deles de UTI, os quais fizeram com que o Recife pudesse atender a todas as pessoas que precisaram de atendimento. Aqui no Recife não houve cenas como vimos em outras cidades do Brasil e do mundo, a exemplo de falta de leitos, filas de ambulâncias, pessoas sem atendimento e igrejas sendo utilizadas como depósito de corpos. Garantir esse atendimento foi essencial e um marco para a cidade, sem dúvidas.
Como foi comandar a cidade num contexto de recessão da economia nacional e, em seguida, a crise da Covid-19?
Acredito que o mais importante a respeito do período turbulento que foram os últimos anos para o Brasil e para o mundo, é que o Recife soube enfrentá-lo com conquistas, avanços e muita capacidade de planejamento. Passamos pela maior crise econômica da história de maneira diferente de outras cidades e estados, que não conseguiram sequer fazer o pagamento dos seus servidores, com conquistas históricas para a população, como os Compaz, o Hospital da Mulher, o Hospital Veterinário, o crescimento no Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) e a Via Mangue. E, mesmo em meio à pandemia, quando mais uma vez o Recife soube fazer o enfrentamento da crise e continuar garantindo investimentos para o futuro da cidade, estamos entregando mais de 1.500 obras, como encostas, escadarias, corrimãos, nova iluminação em LED, pavimentação de ruas e algumas grandes obras. Mesmo neste ano desafiador, entregamos o Hospital Eduardo Campos da Pessoa Idosa, a nova Conde da Boa Vista, o novo Geraldão e o restauro do Teatro do Parque. Isso tudo gerando cerca de 5 mil empregos diretos diante da crise provocada pela Covid-19.
Qual o principal legado da sua administração?
Tivemos muitos avanços em todas as áreas. Construímos dois hospitais e criamos os Compaz, o melhor programa de
combate à desigualdade social do Brasil, entre tantos outros avanços e inovações, como o Parque Capibaribe, a Faixa Azul, a Via Mangue. Fizemos uma gestão olhando para as pessoas e com as pessoas. Mas, gostaria de destacar os avanços na área da educação, porque é pela educação que se constrói um futuro para quem mais precisa. O Recife foi a capital que mais cresceu no Ideb em todo o País nas duas últimas edições, ultrapassando a meta tanto nos anos
finais como nos anos iniciais. A rede pública municipal do Recife é tricampeã brasileira de robótica com quatro participações em torneios internacionais. Atualmente, temos 70 mil alunos beneficiados pelo programa.
Também tivemos uma preocupação com a educação especial, com um aumento de 80% no número de matrículas de alunos com deficiência, autismo e altas habilidades/superdotação. Entre os recursos dedicados especialmente aos alunos da educação especial, estão a Classe Hospitalar, a criação da Salas de Recursos Multifuncionais (SRM) e bilíngues para surdos, a distribuição de tablets para alunos com deficiência e o transporte escolar inclusivo, com veículos adaptados. Entregamos 21 novas creches, e oito novas escolas, além da requalificação de 27 unidades, todas dentro do padrão Escola do Futuro, no qual 99% da rede municipal está climatizada. Conseguimos também ampliar em 25% as vagas em educação infantil.
A sua gestão foi responsável pela implantação do Parque Capibaribe que é um projeto de longo prazo. O senhor acredita que as próximas gestões darão continuidade à iniciativa?
Acredito que sim, porque o Parque Capibaribe não é um projeto de governo, mas de cidade. Não foi construído dentro de um gabinete, por técnicos da Prefeitura, mas feito em parceria com a Universidade Federal de Pernambuco e participação da sociedade civil. Fomos para as ruas, ouvir as pessoas, fazer eventos de ativação no rio, espaços de discussão. Foi um projeto construído a muitas mãos e que é de toda a cidade. É um dos planos de futuro do Recife, que tenho a honra de ter iniciado em minha gestão, assim como também foram o Plano Recife 500 anos, o Plano Centro Cidadão e tantos outros. Iniciamos o projeto desde a sua concepção e colocamos em prática em dois espaços públicos que já estão fazendo o recifense viver a cidade de uma maneira diferente, da forma que ela foi pensada pelo Parque Capibaribe: o Jardim do Baobá e a Praça Otávio de Freitas, no Derby. Certamente, outros espaços serão
abertos e o Recife vai ser reinventado a partir da sua “alma líquida”, como os apaixonados pelo projeto chamam o Rio Capibaribe.
O que o senhor planejou e não conseguiu concluir?
Numa cidade como o Recife, complexa e cheia de desafios, sempre vai haver alguma coisa por fazer. Tenho a tranquilidade de dizer que, com a ajuda do povo, fizemos tudo aquilo e um pouco mais do que era possível pelo Recife. Avançamos em muitas áreas e temos hoje uma cidade mais moderna e humana do que aquela que encontramos em 2013.
Quais são os principais desafios que João Campos vai enfrentar como prefeito do Recife?
No próximo ano, devido à pandemia do novo coronavírus, o grande desafio será a geração do emprego e da renda. Esse é um desafio que não é só da nossa cidade, mas de todo o País. Tenho certeza de que João Campos está comprometido com esse tema, e, como ele tem dito, o Recife vai largar na frente a partir do ano que vem.
A crise causada pela pandemia aprofundou um cenário que já era muito grave, de aumento da pobreza e da desigualdade social. Começamos a enfrentar isso com o Chegando Junto, com ações de assistência à população e geração de emprego e renda diante da crise, e a nova gestão terá a oportunidade de avançar com novos projetos e ideias para um novo tempo.