Ao longo dos últimos 25 anos, a expectativa de vida média para homens aumentou em quase 4 anos e a idade de detecção de câncer de próstata recuou em média 10 anos, com diagnóstico cada vez mais frequentemente realizado em fase precoce onde a terapia curativa é possível. Tais mudanças nas tendências da idade e extensão da malignidade no diagnóstico revelaram limitações nas terapias curativas convencionais para a doença, incluindo um risco significativo de recorrência agressiva do câncer e o risco de morbidade geniturinária de longo prazo e seu impacto prejudicial sobre a qualidade de vida do paciente (QVP). Uma maior conscientização sobre as deficiências na prostatectomia radical, radioterapia externa e braquiterapia levou à busca de terapias curativas alternativas que ofereçam taxas comparáveis de controle do câncer e menor morbidade relacionada ao tratamento para melhor preservar a QVP.
O ultrassom focalizado de alta-intensidade (HIFU) possui características que o tornam uma opção de terapia curativa importante. Trata-se de uma abordagem não invasiva que usa energia de ultrassom aplicada com precisão para atingir a necrose das células tumorais sem radiação ou excisão cirúrgica. Na oncologia urológica atual, o HIFU é utilizado clinicamente no tratamento do câncer de próstata em diversos países com diversos estudos¹ comprobatórios de resultados altamente positivos.
“Ainda que alguns tratamentos convencionais apresentem índices de cura e de controle satisfatórios, ainda geram efeitos colaterais importantes de transtornos urinários e sexuais e que, no caso do uso do HIFU, são bem inferiores“, relata o uro-oncologista Marcelo Bendhack, Doutor em Uro-oncologia pela Universidade de Düsseldorf, Presidente da Sociedade Latino-Americana de Urologia e especialista pela Sociedade Brasileira de Urologia (SBU).
O HIFU foi desenvolvido nos Estados Unidos, entre 1951-53, e, posteriormente, a pesquisa clínica para câncer de próstata estudado na Alemanha, em meados dos anos 90. Mais de 65.000 pacientes com câncer de próstata foram tratados com a técnica. A ressecção transuretral neoadjuvante da próstata tem sido agora combinada com o HIFU (concomitante) desde 2000 para reduzir o tamanho da próstata, facilitar a destruição de tecido e minimizar os efeitos colaterais.
No Brasil, o procedimento foi aprovado pela Anvisa em 2008, porém tem sua aplicação muito aquém do que deveria. “Ampliar a técnica para os serviços públicos e colocá-la no rol da ANS é primordial para difundir e ampliar a cobertura de assistência dos pacientes brasileiros”, contextualiza Dr. Marcelo, que ainda acrescenta um fato importante para a técnica não avançar: a avaliação em andamento pelo Conselho Federal de Medicina (CFM), que ainda considera a técnica experimental, o que não se ancora em nenhum argumento técnico e científico. Até o momento, apenas um conselheiro do CFM emitiu opinião, de forma monocraticamente, o que não representa um posicionamento definitivo da autoridade máxima do órgão, a sessão plenária.
A Associação Latino-Americana de Uro-Oncologia (UROLA), que discute cientificamente o assunto desde 2006, entende e declara desde 2016 que o HIFU é uma técnica aceita para uso clínico nos pacientes com o câncer da próstata.
O HIFU pode não ser visto como um substituto da terapia clássica, mas sim como uma primeira escolha terapêutica em doenças localizadas, primárias ou recidivadas. O uso inicial do HIFU pode ajudar a adiar a necessidade de terapias invasivas associadas a uma maior morbidade, como cirurgia ou radiação, permitindo ao paciente um período mais longo sem o risco de viver com efeitos colaterais geniturinários relacionados ao tratamento.
A recorrência local do câncer de próstata ocorre em 10% a 50% dos pacientes, independentemente da abordagem curativa, e o tratamento evoluiu de singular para uma abordagem sequencial e multimodal que acomoda muito o uso de terapias minimamente invasivas, como o HIFU. A técnica pode ser repetida em casos de recorrência local, o que não é uma opção com outras modalidades de tratamento para câncer de próstata localizado, como cirurgia, radiação externa e braquiterapia.
O HIFU transretal deve ser considerado seriamente como uma terapia curativa em doenças localizadas, bem como uma terapia adjuvante paliativa em todos os outros estádios tumorais. As melhorias contínuas em tecnologias de imagem qualificam ainda mais a eficácia do HIFU. “Ainda é preciso conscientizar a população masculina da importância dos exames preventivos. A partir disso, dependendo do diagnóstico, o paciente e seu médico devem avaliar a escolha do tipo de tratamento, priorizando a qualidade de vida e os menores efeitos colaterais, que estão cada vez mais reduzidos com o emprego de técnicas avançadas como o HIFU”, diz o médico Marcelo Bendhack.