Por Rafael Dantas
Os gastos com academias, moda esportiva e com suplementação alimentar subiram em torno de 35% em 2023 no Brasil, segundo pesquisa do Itaú Unibanco. O setor fitness, relacionado ao desejo da população em estar saudável e em boa forma física, cresce há anos e ganhou mais atenção após a pandemia. Em Pernambuco, ele movimenta uma infinidade de segmentos relacionando a atividade física com o lazer.
O avanço do segmento fica mais visível com a proliferação de academias e de alunos ocupando esses espaços, seja malhando, praticando esportes ou nas aulas coletivas de uma diversidade de modalidades. A rede pernambucana Selfit, por exemplo, já construiu mais de 100 unidades no País e percebe um crescimento mais acelerado após a pandemia.
“Nós planejamos as nossas academias para ter aproximadamente 3 mil clientes por loja. Antes da pandemia, a gente tinha uma taxa de ocupação na casa de 80% a 85% da capacidade das nossas unidades. E agora, no pós-pandemia, a gente está batendo na trave dos 100% e em várias lojas já superamos essa meta”, afirmou o CEO da Selfit, Fernando Menezes.
O executivo explica que a rede tem alunos de todos os perfis e idades. Passada a turbulência da Covid-19, um dos públicos que cresceu foi de alunos com idades entre 70 e 80 anos frequentando as academias da Selfit. Mesmo com o crescimento recente da marca e do setor como todo, ele avalia que o aumento do interesse da população por mais qualidade de vida pode fazer até dobrar o número de clientes do setor no futuro.
O interesse da população em cuidar da saúde movimenta muitos negócios, segundo Juliana Medeiros, produtora da feira Recifitness. Embora as academias e toda a sua infraestrutura sejam o principal símbolo da força do setor nas cidades, ela destaca que há uma infinidade de segmentos relacionados. “As empresas estão em constante evolução, na medida em que a tecnologia avança, novos equipamentos chegam para atender esse mercado. Há um crescimento da procura pelas bikes e equipamentos para correr também. A cada ano percebemos que todos os segmentos vêm com novidades. Há uma infinidade de negócios no setor fitness, que envolve moda, acessórios, calçados, nutrição, entre outros. Realmente é um mercado que engloba um leque amplo de empresas”.
O Recifitness, que acontece em paralelo ao Recife Nutrition, por exemplo, espera receber até 10 mil pessoas na edição deste ano, que acontece em julho, com movimentação esperada de R$ 7 milhões em negócios fechados. “Principalmente no pós-pandemia, as pessoas ficaram mais criteriosas, exigentes com a saúde. Esse comportamento do consumidor deixou o mercado aquecido, em constante crescimento”, analisa Juliana Medeiros.
Além dos cuidados com o corpo, essas práticas relacionadas com a saúde estão ligadas ao lazer da população, segundo Rodrigo Lacerda, head coach do Box WE. “As pessoas estão mais conscientes da importância da atividade física para a saúde, mas não só isso. Elas têm procurado atividades físicas como forma também de lazer. Em meio a isso, diversas práticas estão surgindo como alternativas para as pessoas se movimentarem, como academias de musculação, academias de crossfit/crosstraining, arenas esportivas com esportes de areia”, avalia.
ALÉM DAS ACADEMIAS LOW COAST
O boom do setor nos últimos anos aconteceu com a abertura de muitas academias classificadas como low coast. No Recife, marcas como Selfit e Smart Fit se multiplicaram. No entanto, o segmento tem também outras modalidades que fazem sucesso, como as academias boutique (com um atendimento mais “gourmet”, com a proposta de ser um centro de lifestyle e saúde), full service (que oferecem simultaneamente uma grande variedade de modalidades e horários) ou, mesmo, as de nicho (que atendem um tipo específico de cliente ou se especializam em uma modalidade). A tendência de crescimento é para todos.
A educadora física e empresária Paula Pinheiro fundou há três anos o Unne Estúdio Funcional. O espaço tem a proposta de oferecer para pequenos grupos um serviço mais individualizado, apesar de coletivo. “Já tenho 15 anos de formada, tive academia convencional e percebi a necessidade de oferecer um atendimento mais personalizado. Entendi que o método que aplicava no personal poderia ser expandido para uma aula coletiva, porém com treino individual”, afirmou a profissional.
No estúdio são, no máximo, oito pessoas por hora, contando com dois treinadores para atender a demanda dos alunos de orientação, correção dos movimentos e estímulo. “Isso não se consegue em academias convencionais, com um volume grande de pessoas sem prática e que não gostam desse ambiente”.
Embora haja alunos que têm o interesse de performar em alguma modalidade esportiva ou mesmo mais preocupados com a estética, a qualidade de vida, mobilidade e a preocupação com a saúde são os principais motivadores de quem procura esses espaços que primam pela “gourmetização” da orientação no exercício físico.
Os espaços dedicados ao crossfit também estão em alta no País. Rodrigo Lacerda considera que o crescimento do segmento é anterior à pandemia. “O crossfit/crosstraining se destaca também nesse meio de atividades que tem tido um bom crescimento devido à dinâmica de aulas. São aulas que possuem por sua característica movimentos funcionais, constantemente variados, dessa forma a rotina se torna uma inimiga pois os alunos sempre estarão realizando atividades/movimentos diferentes, tornando assim uma dinâmica mais favorável e mais aderente”.
ESPORTE AO AR LIVRE
Há ainda nesse boom dos cuidados com a saúde o público que gosta de praticar modalidades esportivas. O beach tennis, o futevôlei e a procura por treinamento de vários esportes começa a ser visível também pela cidade. Quem fez história nas praias como atleta e hoje se dedica ao cuidado com a saúde dos recifenses por meio do vôlei é Fabiano Melo.
Ele conta que ao se aposentar dos torneios profissionais, há aproximadamente 10 anos, decidiu investir na modalidade. Formado em educação física, ele montou o CTFM (Centro de Treinamento Fabiano Melo). “Hoje temos mais de 150 alunos na pegada de gerar saúde e promover o bem-estar”, conta o treinador.
Embora o CTFM mantenha atletas de alto rendimento, focados em disputar competições, a maior parte do público é de alunos interessados em cuidar da saúde, emagrecer ou mesmo de buscar interação. Como os treinos são realizados na praia, ao ar livre, esse contato com a natureza é outro atrativo para os pernambucanos que querem uma higiene mental.
Após a reabertura com o fim da pandemia, Fabiano conta que houve um crescimento acelerado de 30% a 40% na quantidade de alunos. Passados alguns meses do boom, o público reduziu um pouco e se estabilizou, mas é bastante regular.
BUSCA POR INTERAÇÃO NO CARDÁPIO DE ATRATIVOS
Além de cuidar diretamente do corpo, a atração por buscar academias dos mais diversos formatos ou mesmo integração em equipes esportivas também se deve à busca por fazer novos amigos. Essa é a percepção de todos os segmentos. A solidão da pandemia e mesmo a vida mais digital e em home office tem induzido um número cada vez maior de pessoas a decidirem ter seu momento de lazer e atividades físicas em grupo.
“Percebemos que muita gente procura uma academia não porque quer fazer treinos de força apenas, mas porque gosta de uma aula coletiva. Quer fazer uma dança em grupo, ou quer praticar yoga, fazer uma aula de jump. Deseja aquele ambiente social, se sentir em comunidade. É muito legal ver essas comunidades se criando”, afirma Fernando Menezes, da Selfit.
A rede, por sinal, está abrindo praticamente uma academia por semana. O executivo conta que a marca tem hoje 107 unidades e espera chegar até o final do ano com 140 ou 150 lojas. Se a princípio eram as capitais os alvos desses investimentos, hoje municípios de médio porte no interior também recebem empreendimentos. Nesta semana, por exemplo, a Selfit chegou em Belo Jardim.
Rodrigo Lacerda, do Box We, lembra que essa característica do trabalho em grupo também é uma das marcas do segmento do crossfit. “Por se tratarem também de aulas em grupo, é possível notar um sentimento de comunidade entre os praticantes que, muitas vezes, passam a não faltar e a aumentar sua frequência nos treinos só pelo fato de estar treinando junto aos amigos que fizeram no Box”.
NUTRIÇÃO SAUDÁVEL NO RADAR
Cuidar do corpo passa também pela reeducação alimentar e por encaixar na dieta o maior número de produtos naturais e saudáveis. Foi para atender esse público que nasceu a Organno Jaqueira. O diretor administrativo da loja, Emílio Sukar, afirma que o público que busca suplementação alimentar é cada vez mais amplo e com motivações distintas nos cuidados com a saúde. Desde atletas de alto rendimento até idosos em busca de uma vida mais longa e saudável, que estão presentes nas academias, também se tornaram consumidores da loja.
“Há dois anos a gente aceitou o desafio de abrir essa loja orgânica aqui na unidade Jaqueira justamente para atender a tendência de cuidar da saúde. A pandemia ajudou a acelerar essa conscientização devido à descoberta de que uma pessoa mais saudável consegue evitar doenças e reduz a frequência de ir aos hospitais. Já tínhamos o público de alto rendimento, que são aqueles que têm esporte como profissão. Isso aumentou com aquelas pessoas que fazem esporte por lazer, que correm no final de semana. Para ter um bom resultado e para se sentirem bem, eles também suplementam a alimentação. Além disso, há toda uma preocupação hoje com a entrada na fase da longevidade”, conta Emílio Sukar.
Como se trata de um consumidor interessado em mudar seus hábitos, o diretor menciona que a missão da empresa é mais ampla que apenas vender produtos que atendam as demandas dessa clientela exigente mas, também, de promover uma educação alimentar saudável. “A nossa perspectiva aqui na loja não é simples mente vender o produto, porque se fosse assim a gente deixava um caixa eletrônico, a pessoa entrava aqui se serviria e iria embora. Mas a gente tenta fomentar essa perspectiva da mudança de hábito, de incentivar as pessoas a terem uma vida mais saudável”.
Com o aquecimento do setor, há ainda um aumento da quantidade de produtos focados na linha fitness. Desde os itens voltados aos veganos a produtos para pessoas com diabetes ou hipertensão, as prateleiras que se propõem a promover a saúde vão ficando mais cheias de novidades.
Mais que uma moda, os investimentos e a maior dedicação no cuidado com a saúde são tendências que devem permanecer na sociedade diante da preocupação com a longevidade. O envelhecimento da população e o maior acesso às informações e aos serviços fitness – muitos gratuitos – contribuem para fortalecer o setor mesmo em meio às turbulências da economia.