*Por Bruno Moury Fernandes
Dizem que a morte e os impostos são as únicas certezas da vida. No Brasil, contudo, parece que a morte continua democrática, mas os impostos andam muito seletivos na escolha de suas vítimas.
Veja o trabalhador comum: acorda cedo, enfrenta ônibus lotado, carrega o peso do mês nas costas – e ainda devolve ao estado, religiosamente, 27,5% do que recebe. É um pacto sem discussão, um confisco automático, quase tão inevitável quanto o sol nascer no Sertão.
Do outro lado, no andar dos ricos, tem ar-condicionado central. Ali não se fala em alíquota de 27,5%, nem de 15%, nem de 5%. Fala-se, com naturalidade, em alíquota zero. Lucros e dividendos, essa fonte mágica que alimenta a minoria, não conhecem a tesoura do Imposto de Renda. São rendimentos abençoados pela invisibilidade fiscal, um milagre brasileiro.
Eis a ironia: não é que a carga tributária nacional seja insuportável em si. O problema é que ela foi desenhada para ser mal distribuída, como um cobertor curto que só aquece quem já dorme na cama king size. Sobre o pobre, pesam impostos no arroz, no feijão, na conta de luz, no botijão de gás. Sobre o rico, cai a leveza de um sopro: nenhuma mordida sobre seus milhões multiplicados no pregão da Bolsa, por exemplo.
Chamam isso de sistema. Eu chamo de escárnio. O caixa do supermercado, que mal dobra o salário-mínimo, financia o Estado mais do que o acionista que brinda dividendos em taças de cristal. A regressividade é tamanha que parece piada – mas é piada sem/graça, dessas que terminam com a gargalhada do privilegiado e o silêncio constrangido da maioria.
Muitos abrem a boca para acusar o Bolsa-Família de gasto excessivo para o estado. Muitos dos que bradam esse inconformismo, recebem o “bolsa lucro”: é o 1% mais rico da população brasileira que paga 0% de alíquota sobre seus lucros e dividendos. É como se houvesse um auxílio permanente para a elite mais rica desse País.
Por aqui, uma professora, um pedreiro ou um auxiliar de escritório pagam bem mais – proporcionalmente ao que ganham – do que um milionário que reside da Avenida Boa Viagem.
E assim seguimos, num país em que a justiça fiscal é uma quimera, e o privilégio, política de governo. Morremos todos, sim. Mas, até lá, uns morrem pagando 27,5% e outros vivem imortais na redoma dourada da alíquota zero.