Ninho de Palavras

Ninho de Palavras

Bruno Moury Fernandes

Visita indesejada

O muro do Trump. Crossfit. Obsessão pela magreza. Aquecimento global. Os primeiros dias do governo Bolsonaro. A laicidade do Estado. Reforma trabalhista. Lava jato. Monteiro Lobato. Previdência dos militares. Esses e outros assuntos estão a estampar as folhas do jornal que ora leio e compõem um cardápio generoso de sugestões para que qualquer cronista explore suas divagações.

Contudo, o assunto que me fez correr para o computador, tal qual um leão faminto corre para atacar sua presa, foi um só: piolho! Isso mesmo, piolho!

Minha filha pegou piolho na escola, coisa absolutamente normal para uma criança da sua idade. Aliás, não foi minha filha que pegou piolho. Foram os piolhos que pegaram minha filha, nos últimos dias de aula do ano que findou. Tínhamos essa informação antes de sermos convidados por três casais amigos para veranearmos em uma casa, por eles alugada, que fica em uma praia aqui perto do Recife.

E agora? Declinaríamos do convite? Avisaríamos aos nossos amigos, donos da casa, que alguns outros amiguinhos iriam conosco? Mas, se fizéssemos isso, eles manteriam o chamado? As férias das crianças estariam prejudicadas? Preferimos acreditar que o Kwell agiria rapidamente. Ficamos de bico calado e, então, lá fomos nós de mala e cuia para a praia. Eu, mulher, três filhos e, claro, piolhos. Muitos piolhos.

A mala do carro, como sempre, abarrotada. Às vezes acho que minha mulher pensa que sou o David Coperfield. Ela quer levar tudo que acumulou ao longo de 13 anos de casado, no porta-malas de um carro pequeno, para passar uns dias na praia. Depois que está tudo arrumado, a surpresa. Antes de pegar a estrada, meu amor, só falta passar ali para pegar dois bolos, uma jaca, dois sacos de carvão e um berço para o bebê. Tranquilo!

Voltemos aos piolhos. O detalhe, meus amigos, é que os casais anfitriões possuem três filhos, cada. Então é como se estivéssemos levando os piolhos para passear na Disney. Foi um festival. Com três dias de convivência, começou o coça-coça. Menino para todo lado. E tome coça-coça. Até que uma das mães, atenta, percebeu que algo diferente pairava na cabeça da meninada. Mãe enxerga tudo. “Gente, acho que as crianças estão com pilho”. Calado estava, calado fiquei. Não iria me acusar a essa altura do campeonato, já com três dias de piscina, praia, barco, cerveja e rede. A essa altura aquela já era a vida que pedia a Deus. Não queria que nada atrapalhasse.

No cair da noite daquele mesmo dia, entretanto, enquanto tocávamos violão e cantávamos, um dos nossos amigos resolveu homenagear a todos, falando da importância da amizade em nossas vidas. Danei-me a chorar. Emocionado? Nada, arrependido. Não fui sincero com os anfitriões, amigos do peito. Então abri o jogo e contei o segredo que tanto guardara. Rimos de cair no chão. A amizade é mesmo linda, mas creio que jamais serei convidado novamente.

Deixe seu comentário

Assine nossa Newsletter

No ononno ono ononononono ononono onononononononononnon