Com a aproximação das eleições, a pesquisa Empresas & Empresários aponta o futuro da nova indústria pernambucana como tema estratégico a ser vencido na próxima gestão estadual. A sobrevivência do setor naval e a consolidação da Refinaria Abreu e Lima e da Hemobrás foram mapeados pelo corpo técnico do estudo como fundamentais para acelerar a retomada da economia pernambucana e o desenvolvimento regional. A E&E é realizada pela TGI e pelo INTG, com patrocínio do Governo de Pernambuco.
Com um renascimento veloz, a nova indústria naval brasileira teve em Suape um dos seus polos. Investimentos elevados, grandes contingentes de mão de obra empregada, muitos pedidos e expectativas de consolidação. Esse era o contexto otimista que foi sendo desmontado pouco a pouco nos últimos anos. Os estaleiros passaram a sofrer de forma mais aguda com a recente mudança abrupta na lei de exigência de conteúdo local na produção do setor.
Para o economista e sócio da CEDES Ecio Costa, a indústria naval é a que atravessa um período mais problemático entre os players elencados pela pesquisa. “Sem a lei que exigia conteúdo de nacionalização no setor e com a ausência de incentivos, os estaleiros estão fadados a fechar as portas”, sentencia.
Atualmente o Atlântico Sul e o Vard Promar empregam juntos em torno de 5 mil trabalhadores. No auge, o setor já empregou em torno de 18 mil pessoas. Além de absorverem muita mão de obra, segundo Ecio, eles são importantes para o setor metalmecânico pernambucano. “Seria fundamental a continuidade dessa indústria, pois demanda muitos serviços, inclusive de novas tecnologias que produzimos no Estado. Sem ela, haverá um sucateamento de todas as empresas que chegaram para fornecer insumos para a fabricação dos navios”.
O deputado Tadeu Alencar (PSB-PE) argumenta que a indústria naval brasileira merece a continuidade da política de conteúdo local nacional e tem defendido outros mecanismos de apoio na Câmara Federal. “Essa política ajudou a dinamizar esse segmento que já teve tradição nos anos 70 e 80. Na época, o Brasil foi o maior produtor de navios do mundo. O setor em Pernambuco está sobrevivendo com o Estaleiro Atlântico Sul e Promar com qualidade inquestionável. É preciso mobilizar esforços para mantê-los”, conclama. Ele defende que seja garantido por lei pelo menos 40% de conteúdo nacional.
A avaliação do ex-presidente de Suape, Marcos Baptista, é que o setor não teve tempo suficiente para ganhar competitividade frente aos concorrentes internacionais. E, portanto, não se consolidou de forma competitiva ainda. Por isso, ele também apoia a continuidade das políticas de incentivo do Governo Federal. “Os estaleiros pleiteiam um reconhecimento de que a sua atividade depende de um período mais longo para se desenvolver. China e Coreia do Sul têm capacidade e produção bem acima da nossa, mas passaram de 25 a 30 anos com políticas públicas que incentivaram sua indústria”. Fazendo uma comparação com o caso brasileiro, ele aponta que as empresas nacionais tiveram um período em torno de 10 anos para amadurecerem.
RNEST
Outro gigante que chegou ao Estado na década passada e que teve sua imagem e desempenho manchados com as denúncias da Lava Jato foi a Refinaria Abreu e Lima. A decisão da Petrobrás em trazer o investimento para Suape colocou Pernambuco na cadeia da indústria petroleira. Mas, mesmo após bilhões de investimento, a fábrica segue em obras.
A refinaria foi incluída no programa de desinvestimento da Petrobrás, que pretende vender 60% de sua participação acionária. De acordo com a assessoria de imprensa da empresa, “falta ser concluída a unidade de abatimento de emissões (Snox) e demais obras de complementação do trem 1. Além disso, ficará para o investidor e novo parceiro a obra do trem 2 da refinaria”. A Rnest, segundo a assessoria, tem capacidade para refinar 100 mil barris de petróleo por dia. Após a finalização do trem 2, o processamento chegará a 230 mil barris de petróleo por dia.
Consolidar a Rnest também é estratégico para setor logístico. “Quando se tem uma refinaria instalada aqui no Estado, há grandes demandas de logística internacional para importar o petróleo ou trazer equipamentos e plataformas. Além disso, há a comercialização interna e revenda para os demais Estados”, afirma Ecio Costa. Ele lembra que a unidade alimenta outras cadeias produtivas, como a petroquímica. Para o prosseguimento das obras, o economista afirma ser fundamental a chegada do investidor internacional.
BIOTECNOLOGIA
Esquecida do debate político e econômico dos últimos anos, a Hemobrás é apontada pelos especialistas como um dos empreendimentos mais estratégicos para Pernambuco. “A economia do século 21 é a da biotecnologia. Não se fabricará no futuro medicamentos novos a partir de substância químicas. As novas medicações serão a partir de fermentação bacteriana. A Hemobrás é o futuro”, defende o ex-secretário de Saúde de Pernambuco e do Recife, Guilherme Robalinho. No mundo, apenas sete players atuam no segmento de produção de medicamentos hemoderivados a partir do fracionamento do plasma.
A continuidade do parque industrial de hemoderivados de Goiana ficou ameaçada durante a recente passagem de Ricardo Barros, no Ministério da Saúde. A pressão política dos parlamentares pernambucanos impediu os planos do ex-ministro de construir outra fábrica no Paraná, que esvaziaria a Hemobrás.
A decisão da vinda da empresa para terras pernambucanas, ainda no Governo Fernando Henrique Cardoso, não foi apenas uma decisão política. De acordo com Robalinho, a história do Estado com o setor é antiga. “Pernambuco foi pioneiro em termos de hemocentro. O primeiro do País foi o Hemope. O Estado sempre teve uma liderança importante na criação dos bancos de sangue. Há muito tempo havia dentro do Hemope uma pequena unidade que fabricava albumina humana”. Ele afirma que a escolha por Goiana também foi técnica, porque a cidade tem no entorno três universidades federais (UFPE, UFPB e UFCG).
O ex-secretário revela que a proposta dessa fábrica vem de várias gestões, mas encontrou um alinhamento político no final do Governo FHC para a tomada de decisão da vinda do empreendimento para o Estado. A princípio foi criada como Empresa Pernambucana de Hemoderivados. Já com Luís Inácio Lula da Silva na presidência e Humberto Costa no Ministério da Saúde, o investimento foi confirmado. O processo, porém, foi reiniciado e foi criada a Empresa Brasileira de Hemoderivados e Biotecnologia.
Passados os governos de Lula e Dilma e já no segundo ano da gestão de Michel Temer, a fábrica está ainda com apenas 70% das obras concluídas. Já foram investidos R$ 846,5 milhões na implantação. De acordo com a assessoria de imprensa da estatal, a Hemobrás ainda não está produzindo os medicamentos, mas já realiza a triagem do plasma que é uma das etapas para a produção desses remédios denominados hemoderivados. Atualmente eles são fabricados no exterior por uma empresa que fará a transferência de tecnologia para que todas as etapas de produção sejam realizadas no Brasil.
“A produção nacional de hemoderivados e medicamentos biotecnológicos é de extrema importância porque reduz a vulnerabilidade científica e financeira do Brasil frente ao mercado internacional”, afirma Oswaldo Castilho, diretor-presidente da Hemobrás.
Se para o País é uma questão de saúde e de economia dos cofres públicos, uma vez que essas medicações são importadas, para Pernambuco o interesse vai um pouco além. Geração de empregos e a possibilidade de desenvolvimento tecnológico e de adensamento da cadeia produtiva estão em jogo no Estado. Hoje a empresa emprega 314 pessoas, das quais 100 são terceirizadas, sendo a maioria dos profissionais residentes na região da Mata Norte. Após anos de resultados negativos, a Hemobrás registrou, no ano passado, lucro líquido de R$ 172 milhões.
Na próxima edição, a pesquisa Empresas & Empresários destaca dois temas fundamentais para Pernambuco além da crise: a interiorização do desenvolvimento e a segurança cidadã.
*Por Rafael Dantas, repórter da Revista Algomais (rafael@algomais.com)