Respeitem os seios caídos (por Beatriz Braga)

*Por Beatriz Braga

Bruna Marquezine colocou os peitos de fora e a internet se chocou. O corpo natural feminino, esse famigerado inquilino do mundo. O susto veio do fato de que a atriz – que está longe de não se encaixar nos padrões de beleza – ter “seios caídos”. A verdade é que ela apenas não tem silicone e que aparentemente estamos desaprendendo o que é um corpo natural.
Impressiona-me que para milhares de pessoas, quando uma mulher mostra os seios, eles tem que ser turbinados, plastificados, empinados e todos os “ados” que o mercado nos ensinou a chamar de atraente.

Até quando vamos acreditar que o que se mostra na mídia é algo tangível? E até quando ficaremos de sentinela sobre os efeitos da gravidade ou do bisturi no corpo da mulher?

É carnaval e eu não queria falar dos peitos de Bruna Marquezine. Queria falar do carnaval que eu vi – dos últimos dias, da brincadeira, da rua cheia de gente misturada.

Queria falar do senhor de cabelos brancos que conheci esperando a orquestra do bloco Nem Sempre Lily Toca Flauta ressoar no Recife Antigo. “São 54 carnavais com minha mulher”, disse sorridente. E o segredo? “A parceria”, revelou no auge dos seus 79 anos. A esposa não demorou a chegar, rodeada de amigas que fizeram a alegria da minha sexta de abertura.
“Olhe, menina, a verdade é essa: envelhecer é uma merda. Cai tudo. Mas em compensação a cabeça fica livre”, disse uma das colegas do casal. “É verdade, hoje a minha cabeça é livre”, repetiu outra senhora de 63 anos, com um sorriso de orelha à orelha, o enfeite grande e verde na cabeça, desfilando no carnaval de rua.

Aprendemos a nos odiar, a exigir o inalcançável até que, quem sabe, a vida por sua natureza simplesmente nos diz: pare de tentar, é impossível. E, então, quiçá, nos daremos a permissão de sermos livres.

Estamos divididas entre o que é ser desejável ao homem – a mulher objeto de seio turbinado – e o corpo que serve ao filho – a mãe, vaca leiteira, cujo destino há de ser apenas isso. O nosso papel, neste mundo masculino, será sempre o de servir, garantido por essa eterna vigilância para que cumpramos nossos deveres.

Como dizia um cartaz que vi no carnaval: “não peça desculpas por ser esse mulherão da porra”. Vamos parar de nos culpar pela natureza dos nossos corpos e por estarmos começando a entender o que é nos aceitar por completo.

Este carnaval teve o de sempre. Teve, por exemplo, homem pegando na minha bunda sem permissão porque, para ele, um corpo não coberto é domínio público. Assim como tive, também, a oportunidade de distribuir as tatuagens da campanha “não é não” (contra assédio no carnaval) para as mulheres que encontrei. Eu sei que, para você aí, talvez esse gesto não signifique nada. Mas eis o que sinto: quando mulheres se conectam, uma rede poderosa começa a surgir dentro e fora da gente.

E quando uma mulher desafia – mesmo que minimamente – os padrões impostos pelo mercado, é resistência. Assim como sempre que uma mulher liberta sua mente é o mundo ficando um pouco melhor, como me disseram minhas amigas foliãs lá de cima. Há que se respeitar os cabelos brancos. Melhor dizendo: há que se respeitar os seios caídos.

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