Em recente almoço, um cidadão de bem que diz me querer bem, durante conversa sobre vacina em crianças, perguntou-me em tom desafiador e provocativo, se eu daria vacina aos meus filhos. O tom da pergunta e o papo que antecedeu a esta indagação, trazia uma carga política/ideológica na discussão, como tem sido comum. Mas o mais decepcionante, e daí o tom desafiador na indagação, é que o cidadão – membro de uma determinada seita bovina – conhece profundamente sobre algo particular na minha vida: o autismo no meu filho. Sabe ele também, porque já conversamos sobre isso, que existem estudos que indicam que vacina (especificamente a tríplice viral) pode ser um gatilho para aquelas crianças que possuem predisposição genética a desenvolver o autismo, tese que apesar de não encontrar aceitação na comunidade científica internacional, assusta qualquer pai que ame e cuide dos seus filhos.
Então, no fundo, o que estava por trás da discussão, além da defesa à política negacionista, era a tentativa de me constranger perante as demais pessoas, a fim de se levantar o tão sonhado troféu do “eu tenho razão” ou “o que fará agora este comunistazinho de merda?” Afinal, o que eu poderia argumentar ou fazer diante da minha fragilidade humana? Essa fragilidade emocional diante de tema tão caro a mim e a minha esposa, parecia ser o prato principal daquele almoço. Uma farta refeição para fascista se esbanjar e se lambuzar com o molho da minha dor e, de sobremesa, o meu sofrimento.
Esperava o cabeça branca que eu caísse no mesmo erro que ele: politizar o tema vacina. Mas eu me recuso a cair nessa. Eu tenho admiração por ideias de esquerda e tomei remédio de combate a verme lá no início da pandemia, amigo. Por aí você tira. Minha resposta, a qual ele provavelmente não conseguiu ouvir, porque como todo fascista não se interessou pelo diálogo, foi a de que eu não sabia o que fazer.
Ele aumentou o som e não ouviu eu dizer que realmente não sei o que fazer diante da possibilidade de vacinação dos meus filhos. A única coisa que eu sei é que vou seguir a ciência e me recuso a dar ou deixar de dar vacina aos meus filhos com base na opinião de miliciano. Eu quero ouvir a ciência! Somente a ciência.
Mas e quando nem mesmo a ciência se entende sobre o assunto? O que fazer? Neste mesmo almoço, um médico que estava presente me orientou a não vacinar as crianças em hipótese alguma, alegando inclusive problemas cardíacos que a vacina pode desenvolver nos rebentos. Uma semana antes, em sentido oposto, num encontro de amigos, outro médico me disse que seria uma irresponsabilidade caso eu não vacinasse meus filhos.
A Anvisa diz que eu devo vaciná-los. A Presidência da República, para ser ameno, parece não ter muita simpatia por essa orientação. O médico do meu filho, em Florianópolis, diz que eu não devo vacinar. A médica do meu filho, no Recife, diz que eu seria um idiota caso eu não vacinasse as crianças. Diante de tudo isso, só me resta pedir socorro à medicina, aos cientistas, ao Cremepe, ao Papa. Peço socorro a Deus. Ao cidadão que tentou me jantar em pleno almoço, peço perdão por não o ter amado suficientemente para dele merecer respeito e compaixão. Diante de tantas opiniões antagônicas e desencontradas no Brasil de hoje, em plena pandemia, peço a Deus que traga a cura para a maior de todas as canalhices já vistas, que é a de politizarmos esse tema tão crucial em nossas vidas: a vacina!