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Mercado da Boa Vista: do queijo, da fava, do sarapatel

Um mercado tradicional é aquele que se apresenta com muitos anos de vida naquele território, naquela região; e, traz histórias; e é, sem dúvida, um lugar para se viver uma cidade, uma região, um povo. As relações sociais realizadas no mercado possibilitam introdução à cultura do território, e isto traz uma ampla e rica experiência para o consumidor. O mercado mostra um expressivo cenário social, mostra também um conjunto de ingredientes, de produtos, de pessoas, de ofícios quando juntos revelam a identidade do território. Trago o Mercado da Boa Vista, no bairro da Boa Vista, no Recife, um mercado que eu frequento, aonde vou buscar queijo de coalho, de manteiga, aonde também quero fava verde, feijão de corda, batata doce, inhame, cará, banana -da -terra e quero ainda encontrar identidade e peculiaridade de território. Também para viver um caldinho de feijão, caldinho de peixe, um prato de sarapatel acompanhado de limão, de muita farinha de mandioca_ um verdadeiro manjar_ que é ampliado com uma “talagada” da “branquinha”,da boa e generosa cachaça. As ofertas de comida são muitas, e mostram um verdadeiro memorial das receitas tradicionais pernambucanas que são ali experimentadas e oferecidas ao sabor e ao reconhecimento do público. Comer no mercado é um ritual especial, uma espécie de interação entre os ingredientes “in natura” e as interpretações dos cozinheiros e cozinheiras com seus temperos, com suas técnicas que se apresentam como verdadeiras assinaturas culinárias . O mercado da Boa Vista, do século XIX como também o mercado São José juntam-se a outros 24 mercados municipais do Recife e ainda 27 feiras livres, e assim fazem uma ampla oferta de produtos e de testemunho da biodiversidade. O mercado consagra-se enquanto um território para encontros, conversas, celebrações, e muitos outros rituais de sociabilidades. Nos mercados tradicionais é possível provar os produtos, escolhe-se não só visualmente o que se deseja, mas também se experimenta. Farinha, queijo, frutas, e tantos outros. No momento da prova acontecem vários diálogos, um verdadeiro ritual de aproximação entre o vendedor, o mercado e o cliente. Há uma interação com as possibilidades do produto que revela e orienta o consumo. A sensação de experimentar algo que só a biodiversidade do lugar pode oferecer é uma confirmação de terroir, de que se está num lugar, de que se está no território do mercado. As memórias estão nos mercados, e lá com os ingredientes, produtos e ofícios, contam as suas histórias e trazem um sentido de vida. O mercado tem uma função legitimadora de consumo, de ofertas de produtos da região, de poder exercer alteridade. E assim, há sempre uma maneira peculiar de unir o consumo com a afetividade, de viver os rituais da humanização no comércio interativo no mercado. O mercado não é apenas um conjunto de produtos, de pessoas, de processos tradicionais de comunicação ; o mercado é uma ampla possibilidade para se experimentar relações sociais. Para observar diversas representações do meio ambiente. Para valorizar um sentimento patrimonial de pertença e de soberania alimentar.

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Amaro Freitas: sopro de renovação do jazz chega em Serra Negra

Por Yuri Euzébio Desde o Movimento Manguebeat, a música de Pernambuco se notabilizou pela mistura de ritmos e sons. A revolução sonora promovida pelos caranguejos com cérebro deixou um forte legado para as gerações seguintes de músicos do Estado. O pianista Amaro Freitas é um dos nomes da nova música local que honra a tradição pernambucana de mistura sonora, ao unir o jazz com elementos afro-brasileiros e regionais. O músico vem renovando o gênero e sendo celebrado pela exigente crítica especializada. Prestes a embarcar para Serra Negra, onde iria ministrar uma oficina e depois realizar um show dentro da programação do Festival Nuvem, o generoso artista atendeu a coluna e falou sobre sua trajetória, música instrumental e as influências que o levaram a construir essa sonoridade. Ainda criança, quando vivia no bairro de Nova Descoberta, teve seu primeiro contato com a música a partir da igreja e seus passos iniciais a partir de uma formação musical informal. “Meu pai é multi-instrumentista, ele não é músico profissional, mas foi quem primeiro me ensinou a tocar um instrumento”, relembrou. “Quando eu completei 15 anos, eu entrei pro Conservatório e ganhei um DVD do Chick Corea e isso mudou a minha vida, porque eu só tinha contato com a música da igreja e quando eu ouvi Chick Corea eu pensei: ‘Caramba, como é que pode existir uma música dessa velho?’”, detalhou o instrumentista. O tempo do músico do Conservatório foi curto por falta de condições financeiras, mas isso não o fez desistir da carreira musical. “Foi aí que eu percebi que eu deveria trabalhar pra poder pagar meus estudos, passei um tempo vendendo pão nas escadarias de Nova Descoberta, paralelamente ia tocando em casamentos, festas, aniversários”, explicou. “Depois fui trabalhar de call center, passei a tocar com banda autoral, músicos sertanejos”, detalhou. Foi perseguindo seu sonho de realizar um trabalho de música instrumental, que o músico estudou Produção Fonográfica na Aeso Barros Melo e trabalhando numa pizzaria, conseguiu produzir seu primeiro disco “Sangue Negro”, que despertou a atenção da crítica especializada. De acordo com Amaro sua música é a representação do tempo em que vivemos. “Eu acho que a música autoral e atemporal tá totalmente relacionada ao seu tempo”, definiu. “Quando você escuta Beethoven, Chopin ou quando você escuta Tom Jobim, Villa Lobos ou Moacir Santos, você percebe nessas músicas a representação de um período. Tom Jobim, por exemplo, aquela música representa um Rio de Janeiro”, continuou. “E eu acho que a minha música traz a tona o tempo de hoje, em que vivemos, de certa forma, a paisagem sonora ruidosa das áreas urbanas, o caos, a agonia, o frenético”, destacou o músico. A música de Amaro Freitas reflete o modo que ele enxerga o mundo, sem distinções ou etiquetas. “Na verdade música erudita e popular são só rótulos que se inventam. Tudo é música, velho”, defendeu. “Eu acho que essa coisa da música nordestina com os instrumentos que são considerados eruditos e elitizados foram uma junção natural do instrumento que foi me dado e da influência do lugar onde eu vivo, da cultura, porque nós somos um estado onde o ritmo é muito forte”, explicou. E, ao contrário do que se pode pensar, o músico destaca que há um espaço crescente para a música instrumental na cidade. “Eu acho que falta, uma certa organização e isso partindo de vários setores, pra que a música instrumental do Recife tenha lugar toda semana, com público toda semana. Mas existe sim um público pra esse tipo de música aqui, tem o Panela Jazz, o Gravatá Jazz, o Riomar Jazz, o Mimo e todos lotados”, pontuou. O pianista se mostra animado em tocar no Festival Nuvem, encontrando no evento uma oportunidade de romper novas fronteiras com a sua música. “Esses pequenos e médios festivais acabaram sendo muito importantes, principalmente pra uma galera que tá chegando da música instrumental, porque possibilita agenda e o contato com um circuito que talvez não acessasse o interior”, celebrou. “Eu circulo muito em São Paulo, então é muito importante pra mim também estar nesses lugares que não são tão convencionais, onde eu acredito que o público vai estar muito feliz e receptivo”, comemorou o instrumentista. “Na oficina eu falo um pouquinho sobre a minha história, sobre gerenciamento de carreira, sobre harmonia e polifonia, de tudo um pouco”, explica. Para o futuro, Amaro coleciona planos e desejo de seguir trilhando pelo seu próprio caminho, levando sua sonoridade até onde for possível. “O que mais eu fico pensando é fazer um trabalho social que atenda a pessoas que não tenham acesso a esse tipo de música. Informar as pessoas sobre o valor de um piano, o que é um baixo acústico, tocar pra essas pessoas”, confidenciou. “No fim das contas, se essas pessoas não se sentirem tocadas é um direito delas, mas eu acho que a minha missão é dar acesso a uma música que não chega às pessoas e por isso não tem direito de escolha”, finalizou. Expoente da renovação do jazz brasileiro, Amaro Freitas emana a força e a potência de sua música. Ao mesmo tempo transmite a serenidade de quem tem certeza de que o caminho traçado é o único a seguir. Vem da periferia de Pernambuco, a mistura que revigora o jazz. SERVIÇO - FESTIVAL NUVEM Sexta-feira, 27/08 – Shows Local: Polo Cultural de Serra Negra DJ LêMer (19h30 – 20h) Arrete (20h – 21h) Radiola Serra Alta (21h20 – 22h20) Isaar (22h40 – 23h40) DJ LêMer (23h40 – 00h40) Sábado, 28/09 – Shows Local: Polo Cultural de Serra Negra DJs Clássico dos Clássicos (19h – 19h30) Amaro Freitas (19h30 – 20h30) Lucas Torres + Ciel Santos (20h50 – 21h50) Banda de Pífanos Zé do Estado (22h10 – 23h10) Em Canto e Poesia + Tonfil (23h30 – 00h30) DJs Clássico dos Clássicos (00h30 – 01h)

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