Sexo não é só para jovens
Quando o cineasta Cacá Diegues lançou o filme Chuvas de Verão, em 1978, causou grande espanto no público. O motivo? A cena de dois personagens na terceira idade tendo relações sexuais. De lá para cá o País mudou, mas muita gente ainda se espanta ao saber que existem idosos com vida sexual ativa. A sexualidade depois dos 65 anos ainda é envolta por mitos e preconceitos. “Tanto a educação repressora quanto a religião propagaram a ideia de que o sexo é algo errado e deve ser feito para fins da procriação, não por prazer. Por isso a sociedade acha que a mulher na menopausa não deva mais ter desejo”, analisa a sexóloga Silvana Melo. A ideia de que o sexo esteja presente na vida de pessoas de idade ainda é vista por muitos como um desvio. Até própria família encara a situação com certo constrangimento. “Filhos de pais idosos, muitas vezes, veem os pais como se eles não tivessem sexualidade. A sociedade ainda vê com ressalvas e um certo quê de perversão. Mas isso está mudando”, constata o geriatra do Hospital Jayme da Fonte Daniel Kitner. E não é para menos. Afinal, a expectativa de vida do brasileiro aumentou e a imagem do idoso mudou. Basta reparar nos avós de hoje em dia: em nada se parecem com as velhinhas que faziam tricô na cadeira de balanço ou com os senhorezinhos aposentados e de pijama. Quem tem 70 anos hoje pode ter sido o jovem contestador de 1968 que viveu a revolução sexual. Em 15 anos de consultório geriátrico, Kitner percebe um pouco mais de facilidade para falar de sexualidade os pacientes. Segundo o especialista, a disposição para o sexo nessa faixa etária é influenciada não só por questões físicas, mas também pela cultura e vivência sexual pregressa. “Por isso ela é variável. Idosos envelhecem de forma diferente e a percepção de como se envelhece também varia de pessoa para pessoa.” Assim, se um indivíduo tem uma visão mais aberta sobre o sexo e levou um vida sexual sem muitas repressões pode ter uma sexualidade ativa na terceira idade. O oposto também acontece. “Tenho pacientes de 70 anos que acham que sexo é coisa do passado e não faz falta”, exemplifica o geriatra. Como se vê não há um padrão rígido a ser seguido. Porém, há muita mitos que precisam ser esclarecidos. O primeiro deles é a crença de que a queda do nível de hormônios proveniente da idade interfere no desejo. Não é bem assim. O homem perde por ano 1% da produção de testosterona – responsável entre outras coisas pela libido - a partir dos 50 anos. “Isso significa que chegará aos 80 com 70% desse hormônio, ou seja, ainda está ativo sexualmente”, explica o urologista Misael Wanderley Júnior. Também não existe a tal “andropausa”. Apenas 10% da população masculina apresenta déficit de testosterona, conhecido como DAEM (déficit androgênico do envelhecimento masculino) tratado com reposição hormonal. “O Viagra nesse caso não é recomendável porque ele não estimula a libido, mas é indicado para a disfunção erétil”, diferencia Misael. Também chamada de impotência, a incapacidade do homem alcançar a ereção suficiente para a consumação do ato sexual pode ou não ocorrer com o passar dos anos. “Alguma doenças podem influenciar" , acrescenta o urologista. Motivos de ordem emocional também interferirem na potência masculina. “O homem recebe a educação para ser sempre viril, mas ele precisa entender que não terá sempre o vigor físico da juventude. Muitos demoram mais tempo para ter ereção. É uma questão de adaptação”, tranquiliza Silvana. MULHERES Quanto às mulheres, é bom esclarecer que a menopausa é a última menstruação. Antes dela vem o climatério, quando podem surgir sintomas como fogachos (sensação de calor), secura vaginal (que pode causar dor na penetração), perda de libido e até depressão. O grande vilão é a queda no nível de estrógeno, hormônio produzido pelo ovário. Ao contrário dos homens, a perda hormonal ocorre de forma abrupta por volta dos 50 anos. “Todas as mulheres passam pela menopausa, mas nem todas sofrerão os sintomas e sim 70% delas, que duram um período de 3 a 6 meses. Há quem sinta durante 2 anos e outras podem perdurar a vida toda”, informa o endocrinologista Ney Cavalcanti. Desde que estudos comprovaram que reposição hormonal eleva o risco de enfarte, recomenda-se a terapia apenas para as mulheres com sintomas intensos do climatério. Mas durante um curto período, desde que não haja contraindicação (problemas cardiológicos, diabetes, câncer na família). Nem tudo são más notícias para a ala feminina. Cavalcanti salienta ser mais importante como estímulo sexual os hormônios masculinos, os andrógenos, também produzidos pela mulher. “São secretados principalmente pelas glândulas adrenais que não se alteram com a menopausa. O resultado, é nessa fase da vida existem mais hormônios masculinos do que femininos. Por conta disso, algumas mulheres tem até exacerbação da libido”, surpreende Cavalcanti. Para os casos de secura vaginal estão disponíveis géis e cremes que facilitam a penetração e evitam a dor. Também é necessário investigar até que ponto a falta de libido é decorrente de déficit hormonal ou de ordem psicológica. Silvana lembra de uma paciente, de 60 anos, que tinha a crença de que quando entrasse na menopausa não teria mais desejo. “A libido dela desapareceu e não foi alterada nem quando passou a tomar medicação hormonal. Então, qual foi o peso dos hormônios?”, indaga a sexóloga. Nesses casos podem pesar valores sociais como o ideal de beleza feminina sempre associada à juventude. Por isso, muitas sentem vergonha de seu corpo envelhecido. “Trata-se de um padrão imposto pela sociedade. É preciso constatar que se pode ser bonita em qualquer idade e que o corpo ainda é sensível a carícias”, aconselha Silvana. Falta de desejo também pode ser sintoma de depressão, numa fase da vida cheia de perdas como a saída dos filhos de casa. Numa sociedade em que homens idosos querem ser viris e tomam Viagra e mulheres não se sentem dignas de ter desejo, o resultado pode ser “escapulidas”
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