A terceira via, o sudeste e as pesquisas eleitorais – Revista Algomais – a revista de Pernambuco

A terceira via, o sudeste e as pesquisas eleitorais

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Por Maurício Costa Romão

O quantitativo de eleitores brasileiros anda na casa dos 146,0 milhões agora em 2021, uma involução de 0,9% se comparado com 2018, quando registrava 147,3 milhões para o pleito daquele ano.

A região Sudeste (São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Espírito Santo) segue sendo o maior colégio eleitoral do Brasil, com 62,4 milhões de eleitores, equivalentes a 42,8% do total nacional, apesar de o eleitorado local ter decrescido 2,3% em relação a 2018.

Pela sua dimensão quantitativa o Sudeste é sempre decisivo nas eleições presidenciais do país. Cuidando de não retroceder muito no tempo, basta fazer referência ao 1º turno do pleito de 2018, por exemplo, no qual Bolsonaro ganhou de Haddad em todas as regiões do país, exceto no Nordeste, com uma diferença de 18,0 milhões de votos, sendo que 85% dessa diferença (15,3 milhões) foram obtidas na região Sudeste.

Estes 15,3 milhões mais do que compensaram a desvantagem de 24,7 pontos de percentagem de Bolsonaro no Nordeste, onde Haddad abriu uma margem a seu favor de 7,2 milhões de votos (no 1º turno Haddad ganhou em todos os estados do Nordeste, exceto no Ceará, onde Ciro Gomes venceu, mas no 2º turno o mapa nordestino foi todo petista)

Inobstante se esteja bem distante das eleições presidenciais de 2022, em fase preliminar de pré-candidaturas e campanha, com todas as incertezas conjunturais reinantes, é interessante, à guisa de exercício analítico, perscrutar as pesquisas de intenção de voto mais recentes, buscando realçar a região Sudeste, face ao seu protagonismo.

A Tabela 1 retrata a evolução das intenções de voto para presidente em pesquisas mensais do Instituto PoderData, na região Sudeste. Tirante o mês de junho, Lula lidera a corrida presidencial em todos os demais meses. Nota-se, de pronto, que a performance de Bolsonaro ao longo do tempo é bastante estável, com intenções de voto gravitando na faixa de 24 a 29 pontos, uma amplitude máxima de cinco pontos.

Diante dessa baixa variabilidade de pontuação do presidente, e considerando que os brancos, nulos e indecisos na região se têm mostrado também relativamente estáveis, no entorno médio de 12 pontos percentuais, a trajetória da terceira via (denominação para “outros”) varia em movimentos de gangorra com a de Lula: quando o ex-presidente mais pontua é quando a terceira via menos o faz e vice-versa.

A permanecer tal diapasão, constatado nesta pequena amostra baseada em dados de pesquisas de apenas oito meses no Sudeste, e fazendo uso de grande, não obstante perigosa, licença preditiva, pode-se inferir, ceteris paribus, que a terceira via tende a crescer na região, até por conta do clareamento das definições do seu entorno (entrada de Sergio Moro, candidato único pós-prévias do PSDB, candidatura de Pacheco, etc.).

Essa possibilidade se assenta na observação de que Lula, instrumento e beneficiário do desgaste de Bolsonaro e de sua relativa desidratação nas pesquisas, vai começar gradativamente a se defrontar com lembranças públicas e midiáticas de seu passado e da conturbada era petista em período recente.

É esperado, assim, em ambiente concorrencial mais adverso, que a imagem do ex-presidente seja afetada de tal sorte que possa vir a perder pontos nas pesquisas, não só no Sudeste, mas no Brasil como um todo (Essa extrapolação para o Brasil se fundamenta nos resultados das pesquisas nacionais nesse mesmo intervalo de tempo contemplado acima, conforme se apresentará mais à frente).
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É conveniente destacar entre as pesquisas mensais do PoderData o resultado do levantamento de outubro, o mais recente, tanto para o Brasil, quanto para as grandes regiões.

A Tabela 2 desfila as intenções de voto da última pesquisa do Instituto PoderData, realizada entre os dias 25 a 27 de outubro deste ano. A nível nacional, Lula leva uma vantagem de 4,5 pontos de percentagem sobre o atual presidente, resultado ligeiramente fora da margem de erro de 2,0 pontos de percentagem.

Por regiões, Bolsonaro está numericamente à frente no Sul, Centro-Oeste (empate técnico) e Norte, Lula lidera no Sudeste (empate técnico) e no Nordeste, aí com grande diferença.

Tenha-se em conta ainda que o Sudeste e o Centro-Oeste são as únicas regiões onde o conjunto de pré-candidatos que compõe a terceira via está numericamente à frente dos dois postulantes que polarizam a eleição brasileira nesta fase atual de pré-campanha.

A vantagem nacional de Lula de 4,5 pontos transforma-se em uma diferença de 4,9 pontos, em votos válidos, o que representa algo como 5,2 milhões de votos atualmente (supondo, que o percentual de não-voto, abstenção, votos em branco e votos nulos, de 2018 seja reproduzido neste ano de 2021).

Focando apenas no Sudeste, detecta-se que Lula abre uma frente de 1,3 milhão de votos sobre Bolsonaro nesta região, mas ficando atrás da terceira via por 500 mil votos . Quer dizer, da vantagem nacional de Lula sobre Bolsonaro, 25% devem-se à região Sudeste e 75% à região Nordeste.

A prevalecer a hipótese aventada antes para a região Sudeste de continuidade da estabilização das intenções de voto de Bolsonaro e de que a terceira via deve aos poucos crescer numericamente, segue-se que Lula pode perder posições na região e passar a depender do Nordeste para continuar liderando nacionalmente as pesquisas.

No contexto nacional, as pesquisas do PoderData também espelham certa invariabilidade das intenções de voto de Bolsonaro, conforme se pode visualizar na Tabela 3, a seguir:

Vê-se que a dispersão dos números do presidente, mês a mês, é de pouca monta (amplitude máxima de 7,5 pontos). Outra maneira de detectar essa estabilidade é verificar que as intenções de voto do mandatário nacional em março, mês inicial da série, são exatamente as mesmas do último mês, outubro, coincidindo também com a média geral do período em apreço.

Registre-se, por oportuno, que o atual presidente tem perpassado momentos extremamente adversos no cenário político nacional, sendo alvo de uma enorme profusão de críticas ao seu governo e à sua imagem. Como conseqüência, tem perdido popularidade e manifestações de voto.

Ainda assim, detecta-se uma incrível resiliência de suas intenções de votos nos patamares mostrados nas tabelas, o que suscita a plausibilidade da hipótese de permanência dessa invariabilidade nas suas pontuações por mais tempo ou, até mesmo, de haver variações positivas, se o presidente melhorar suas avaliações administrativa e pessoal.

Mais uma vez se observa (vide Tabela 3) que as intenções de voto do ex-presidente Lula e as da terceira via se comportam inversamente umas às outras, dando asas à especulação de que o eventual crescimento das forças de centro político vai impactar negativamente nas pontuações do líder das pesquisa, mantida essa pequena variância das manifestações de voto pró Bolsonaro.

Para que o argumento central deste texto não repouse pesadamente nas pesquisas de um único instituto, é desejável, mais que isso, é apropriado, trazer à tona outras referências empíricas. A Tabela 4 se encarrega de fazer isso, ilustrando as médias mensais de intenção de votos extraídas de várias entidades de pesquisa que fizeram levantamentos nacionais no período sob análise, de março a outubro.

Vislumbra-se, ab initio, a semelhança de números entre as médias gerais de intenção de votos das pesquisas oriundas de todos os institutos (células em cor verde) e aquelas derivadas da série do PoderData. Isso suscita uma importante conclusão: independente das diferenças metodológicas entre os diversos institutos, suas estimativas são convergentes quando aplainadas pela média aritmética de seus resultados.

Outra vez salta à vista, também na Tabela 4, a relativa invariância das intenções de voto de Bolsonaro (amplitude máxima de 6,3 pontos de percentagem) e, de novo, a evolução inversa entre as pontuações do centro político, centro democrático ou da terceira via, como são chamados os integrantes do conjunto “outros”, e as que são conferidas ao líder das pesquisas, o ex-presidente Lula.

Os números das pesquisas eleitorais mostrados no texto contam uma história dos tempos atuais, em um ambiente distante da eleição. As convenções partidárias não se realizaram, as candidaturas não se definiram, a campanha não começou, as alianças e apoiamentos estão em fase de desenho e conversação, o eleitor, alheio ao processo eleitoral nessa etapa do pleito, está mais preocupado é com sua sobrevivência nestes tempos difíceis.

Daí por que os exercícios preditivos com base na realidade desta época se assentam em alicerces muito movediços, que serão impactados pelas mutações sociais, econômicas e políticas que ainda vão ocorrer no Brasil até o pleito de 2022.

Ainda assim, não há nenhuma ofensa ao bom senso dizer, com base no que foi apresentado no texto, que o resultado da futura eleição vai depender enormemente do Sudeste, que os indicativos são de continuidade de resiliência de intenções de voto a Bolsonaro, em patamares ainda competitivos, que há grande chance de crescimento de pontuação do conjunto da terceira via e da conseqüente caída de Lula das posições que ostenta hoje nas pesquisas.
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Maurício Costa Romão, é Ph.D. em economia pela Universidade de Illinois, nos Estados Unidos.
mauricio-romao@uol.com.br

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