Uma garota destemida incomoda muito mais

*Por Beatriz Braga

Em Nova York, um touro reinava sozinho em Wall Street desde 1985.  A estátua do Charging Bull foi criada como símbolo de ataque após o crash da bolsa de valores. Este ano, em frente ao animal, ergueu-se a obra batizada de Fearless Girl (A garota destemida).

Sobre a menina valente de bronze devo falar que concordo com as críticas do que se chama feminismo corporativo. A estátua foi encomendada pela State Street Global Advisors para promover o debate sobre igualdade de gênero nas empresas.

Ela é, antes de tudo, uma ação de marketing em um mundo no qual as mulheres ainda são vistas como inferiores no mercado de trabalho. A verdade é que queremos mais representatividade, salários iguais e menos populismo e hipocrisia.

Mesmo sabendo disso, eu adoro a Fearless Girl. A arte cumpriu seu papel ao nos levar a uma discussão importante. E ao fazer centenas de garotas que passam por ali se reconhecerem na menina corajosa.

Se antes havia um touro imponente no centro das atenções, hoje, 127 centímetros femininos protagonizam a cena. Se estávamos acostumados com pouca roupa e muita bunda em comerciais de cerveja, agora veremos garotas emponderadas desafiando touros. Um começo, não é?

A estátua tem enfrentado também o outro lado da crítica, a do machismo. O criador do touro de Wall Street, Arturo Di Modica, está irritado com a presença da nova peça. Quer a retirada da pequena mulher o mais rápido.  Alex Gardega, artista americano em defesa de Arturo, fez uma intervenção onde um cachorro fazia xixi na obra.

Os homens alegam que a presença da Fearless Girl fere a integridade do touro. A menina desafiadora o colocaria, segundo eles, nas vezes de um vilão. Sem a sua nova adversária, o touro reinava. Agora ele está ameaçado e eu lhes pergunto: quem é o sexo frágil aqui?

Uma garota desafiadora incomodando homens adultos. Não é a metáfora perfeita? Não é o que enfrentamos na rua, no trabalho e nos nossos relacionamentos?

Homens intimidados por mulheres poderosas. Homens acusando feminismo de “desnecessário” porque, no fundo, não querem perder o território.

Suas toneladas agressivas foram ameaçadas por uma desafiante “peso pena”, como mostra as centenas de pessoas que tiram selfies com a garota todos os dias.  Assim como as mulheres de carne e osso que seguirão dizendo que estátuas não são suficientes. Não apenas na Ilha de Manhattan, mas nos caminhos por onde passarem.

Dizem que levará cerca de 170 anos para a paridade de salário entre os sexos ser uma realidade.  Até lá, acredito, os touros vão perder seus latifúndios pouco a pouco. Sobre os homens, alguns ainda precisam aprender a lidar com o incômodo diante dos passos lentos – e muitas vezes tortos – da chegada da igualdade.

Enquanto a garota destemida de braços nos quadris é assediada por bêbados na madrugada e alvo de críticas por machos ofendidos, a prefeitura da cidade cedeu à pressão social e estendeu o prazo da permanência da obra (ela fica até, pelo menos, fevereiro de 2018).  Eu não sei vocês, mas eu amo essa menina valente.

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