Muita gente, ainda jovem, se preocupa em manter o corpo em forma para evitar doenças e chegar na velhice com tudo em cima. Mas poucas pessoas sabem que o cérebro precisa também se exercitar. Quanto mais precoce for essa “malhação cerebral”, mais chances de retardar a perda de neurônios e até evitar o surgimento de demências (quadro caracterizado por deficiência cognitiva persistente e progressiva). “Cada pessoa tem seu ‘relógio’ para que haja a morte de neurônios, um processo que acontece desde o nascimento, mas se torna mais acelerado a partir dos 50 anos”, explica Cláudio Falcão, neurocirurgião do Hospital Jayme da Fonte. A boa notícia é que hábitos de vida podem fazer com que a perda seja mais lenta ou até não percebida. A regra de ouro para evitar que o cérebro enferruje é mantê-lo estimulado com atividades que promovam as conexões dos neurônios (conhecidas como sinapses) em diferentes regiões do cérebro. Elas são importantes porque tudo o que pensamos, as reações motoras e emocionais, o processo de aprendizagem e a memória acontecem por intermédio dessa “conversa” entre as células nervosas. “Mas é importante oferecer sempre um novo desafio para que o cérebro possa renovar constantemente essas conexões”, alerta Anna Paula Paranhos, neurologista do Hospital Santa Joana. Para exemplificar, basta entender que, quando começamos a aprender uma atividade como dirigir um automóvel, uma série de sinapses entre as células nervosas é realizada. Mas quando já dominamos a técnica, o ato passa a ser automático e, portanto, não são formadas novas conexões neuronais. As artérias existentes no cérebro também são fundamentais para preservá-lo saudável. Se houver acúmulo de gordura no interior delas, pode ocorrer obstrução da passagem do sangue que leva nutrientes e oxigênio necessários para o seu bom funcionamento. O processo é conhecido como aterosclerose. Não por acaso, costumava-se chamar de “esclerosada” pessoas que tinham perdas cognitivas, como a falta de memória. “Podem acontecer pequenas obstruções que vão se somando ao longo do tempo, comprometendo a capacidade de cognição, podendo causar demências ou até um AVC (acidente vascular cerebral conhecido como derrame)”, esclarece Ana Paula. É um processo semelhante ao que acontece com as artérias do coração e que pode levar ao enfarte. Ressalte-se que problemas cognitivos não são exclusividade dos idosos. Não é raro, a médica atende jovens no seu consultório com queixa de falhas na memória. “Nesses casos deve-se fazer um diagnóstico para descartar causas que provocam o problema como doenças na tireoide, glicemia, déficit de atenção, alteração na taxa de sódio, Alzheimer e demências. Mas, muitas vezes, o quadro está associado ao estresse”, elenca a médica. A depressão também pode apresentar sintomas semelhantes aos das demências. “A pessoa deprimida requisita menos o cérebro”, explica Falcão. Não por acaso, quando a doença é tratada os sintomas cognitivos desaparecem. O importante é entender que existem maneiras para manter o cérebro ativo e retardar o declínio da sua atividade. Veja a seguir dicas fornecidas por especialistas, que podem ser seguidas por indivíduos de todas as idades. “São hábitos que devem ser incorporados desde cedo, mas nunca é tarde para começar”, recomenda Anna Paula. Então não perca tempo e comece já. SEMPRE É TEMPO DE FAZER GINÁSTICA LABORAL Maria José da Silva, 81 anos, é a prova de que a ginástica cerebral mantém a mente ativa, mesmo em pessoas com idades mais avançadas. Ela se queixava de estar “esquecida”, o que a deixava depressiva. Para tirá-la desse estado, Ana Cristina da Silva, sua filha, recorreu aos serviços da clínica Amigos da Memória, que oferece exercícios de estimulação cerebral. “As aulas são em grupo, por meio de atividades lúdicas como: jogos inteligentes, música, expressão verbal e corporal, psicomotricidade, pintura, desafios e raciocínio lógico”, explica a psicopedagoga Vania Ribeiro, sócia da clínica. “Agora minha memória melhorou uns 50%”, comemora Maria José, “e o bom é que essa melhora aconteceu num ambiente onde a gente brinca muito”. A filha também festeja os avanços da mãe. “Nos encontros ela se socializa e voltou a escutar música, o que mexe com a emoção e traz a memória”, constata Ana. Maria José está conseguindo reverter situações que levam os idosos a agravarem os sintomas dos problemas cognitivos, como a falta de interação social e de atividades que promovam as sinapses. “Com o passar do tempo as pessoas tendem a se acomodar e não estimulam mais o cérebro”, alerta a fonoaudióloga Lúcia Liberal, sócia da Amigos da Memória. Até indivíduos com Alzheimer se beneficiam da “ginástica cerebral”, retardando o agravamento dos sintomas. É o caso de Ivone Queiroz Silva, diagnosticada com a doença há dois anos. “Além de esquecida, ela estava muito apática”, conta sua nora Valéria Rueda. “Agora, com essas atividades ela está mais comunicativa e se lembrando das coisas. Ela se lembra até de querer participar das aulas”. DICAS Pegue leve com gorduras e açúcar Você tem mais um motivo para manter uma alimentação saudável, além de ficar de bem com a balança. Ao reduzir o consumo de colesterol, por exemplo, você evita o entupimento das artérias do cérebro que pode ocasionar até um derrame. Esqueça também o açucareiro. “O açúcar enfraquece os vasos cerebrais favorecendo a demência”, justifica Anna Paula Paranhos, neurologista do Hospital Santa Joana. Inclua no seu cardápio diário frutas, legumes, carnes magras e abuse das verduras. Um estudo científico realizado com idosos pela Rush University, de Chicago (EUA), mostrou que as pessoas que ingeriam de uma a duas porções de folhas verdes por dia estavam 11 anos mais jovens, em termos de função cognitiva, quando comparadas a quem raramente ou nunca consumia esses vegetais. Faça bom uso da TV, celular e computador Ficar na frente das telinhas, de forma passiva, não estimula as conexões entre neurônios. “A menos que seja um programa de TV que leve a um esforço cognitivo e faça o telespectador pensar. Do contrário, ele só vai utilizar uma parte do cérebro. O mesmo vale para o smartphone e computadores”, justifica Cláudio Falcão, neurocirurgião do Hospital Jayme da Fonte. Tente, também, não substituir a memória por esses aparelhos.