Com uma tradição de empreendedorismo e uma economia pulsante, Caruaru vive o desafio de profissionalizar seu capital humano e de transformar empreendedores em gestores. Mas a Capital do Agreste já deu largos passos nessa direção com a chegada das universidades e de jovens empresários. Eles preservam os ensinamentos dos pioneiros – que transformaram a cidade num polo econômico da região – e reinventam soluções para o atual momento. Luverson Ferreira, o novo presidente da Acic (Associação Comercial e Empresarial de Caruaru) faz parte dessa geração. Nesta entrevista a Cláudia Santos e Rafael Dantas, ele fala das suas ações à frente da entidade, das perspectivas econômicas da Capital do Forró diante da recessão e da concorrência com os produtos chineses.
Quais os planos para sua gestão?
O grande desafio da Acic, hoje, é o mesmo que qualquer empresa enfrenta: continuar sendo relevante na vida dos clientes, no nosso caso, dos associados. Com toda a velocidade das mudanças na economia, muitas pessoas estão se reinventando e as associações também precisam se reinventar. Antigamente uma associação vendia produtos, como comunicação, informação ou network. Antes, você precisava ocupar certo cargo para ter acesso à informação. Hoje, você a tem em abundância. O que você precisa ter para continuar sendo relevante? Essa é uma das perguntas que a gente precisa responder. Antigamente você via até 15 grandes grupos na região. Hoje vemos 50 pequenos e médios que fazem um movimento maior do que aqueles grandes, muitos dos quais nem existem mais. Então, existe essa pulverização do capitalismo. A Acic tem uma vantagem que são as câmaras setoriais. A da construção civil, por exemplo, reúne empresas do ramo e faz com que elas saiam da percepção de concorrência para abrir um leque de parcerias, porque existem muitos assuntos comuns que não dizem respeito à mecânica do negócio, mas à mecânica do setor. Ao conversar com um órgão público você tem muito mais efetividade em se apresentar como uma câmara setorial do que como CNPJ. Os ganhos da Acic e das câmaras setoriais dos últimos dez anos foram enormes, desde redução de impostos a novas normas municipais ou estaduais. As câmaras têm sido responsáveis por alguns grandes eventos na região. Hoje a nossa associação comercial é a maior do Norte/Nordeste, com mais de 2 mil associados e é destaque até nacional. Alguns produtos nossos são nacionais, como por exemplo, o estágio da Acic.
Ao todo são quantas câmaras setoriais?
São 20. Claro que umas são mais desenvolvidas que outras, porque os setores têm características muito diferentes. O de beleza, por exemplo, me chamou a atenção pela união. Eles começaram a fazer uma feira com cerca de dez expositores e hoje já estão planejando outra com cerca de 70 e patrocínio nacional. Nosso grande desafio é resgatar o associativismo numa conotação mais moderna. Eu, enquanto presidente, tenho como característica a gestão compartilhada. Temos hoje seis vice-presidentes – estou trazendo essa novidade por causa do tamanho em que se encontra a Acic – e uma nova diretoria, que tentamos compor da forma mais diversa possível, trazendo gente da Acic Jovem, da Acic Mulher. Nossa ideia é ampliar ainda mais as câmaras setoriais, que oferecem conhecimento técnico, oportunidade de interação com os agentes públicos e de negociar eventos e ações em bloco. É como se fossem miniaturas da Acic.
Qual seu ramo de atividade?
Venho de um grupo de empresas familiares que tem origem na feira. Meu pai começou a aprender o empreendedorismo com 8 anos na feira e criou o Grupo Avil para fornecer produtos para o iniciante Polo de Confecções. No início, pessoas como o meu pai e outros dois ou três começaram a trazer os aviamentos e tecidos do Sul para começar a financiar a indústria local. Já existia a feira da Sulanca, mas a profissionalização do polo, com a ampliação das indústrias, foi mais ou menos criada nessa época. Inicialmente éramos só revendedores e depois passamos a ser importadores de tecido (a importação ainda representa muito para nós) e começamos a produzir um volume pequeno de malha para atender o mercado. Em 2009 abrimos outro braço do grupo com a compra do terreno e desenvolvimento do Shopping Difusora. Criamos, então, uma série de empresas e negócios ou para dar apoio ou que complementasse o shopping. Temos também empresas imobiliária e de tecnologia que foi criada, inicialmente, para dar suporte ao shopping e hoje atendemos em nossa rede 60 mil pessoas. Temos ainda empresas de água mineral, que também tem sinergia com shopping pelo fato de a região ter falta d´água, de franquias, para atuar com a Sérgio’s e a Delta, além da construtora que praticamente usamos para construir, reformar e adaptar os imóveis que a nossa imobiliária adquire. Somos quatro filhos, três fazem parte do negócio e o outro é advogado e atua como prestador de serviço. Estudei e morei no Recife durante oito anos e vim para Caruaru. Aqui estou desde então e não quero sair. Fiz economia e gestão de varejo e no meio do curso tive que voltar para desenvolver o shopping, que vai fazer dez anos em maio. Em Caruaru não havia fast food há dez anos. A gente trouxe o primeiro McDonalds e o primeiro Burguer King. Até a publicidade do interior mudou. Como você vai apresentar a uma marca um shopping no interior do Nordeste? A gente teve que estudar bastante, fazer muita pesquisa para mostrar que aqui é um polo que congrega várias cidades e que Caruaru tem infraestrutura para atender todas elas: cinema, lojas, restaurantes, hotéis, empreendimentos imobiliários. As outras cidades se abastecem em Caruaru. Fizemos uma pesquisa num raio de 60 km e tínhamos um milhão e meio de pessoas, contingente que inclui a população flutuante, atraída pelo movimento da feira, colégios, universidades.
Qual a consequência da vinda das universidades para a cidade?
Somente a Maurício de Nassau possui 8 mil alunos, a Favipe, 11 mil. Essas pessoas estão adquirindo conhecimento, tendo vivência na cidade. Caruaru sempre foi uma terra muito fértil para negócios, mas muita gente saía daqui para estudar no Recife e acabava ficando por lá. Hoje as pessoas se formam aqui, inclusive as que moravam nos municípios vizinhos, e desenvolvem empreendimentos na cidade. A gente nota a pulverização do capitalismo. A grande gama de pequenas empresas surge por conta disso. As pessoas têm o conhecimento e a vivência da teoria e da prática nas faculdades, acabam desenvolvendo raízes e fazendo negócios na região. A consequência é que Caruaru é a última a entrar numa crise e a primeira a sair, porque temos esse fervor e esse movimento econômico. A gente vê a dificuldade que Suape teve por causa de uma refinaria. Duas ou três empresas pararam uma cidade. Aqui a gente vê o contrário disso. Já temos uma boa indústria, uma ótima construção civil. O comércio também é muito avançado, temos dois shoppings para 350 mil habitantes. Isso se viabiliza porque Caruaru não é só dos caruaruenses, é uma cidade líder dessa microrregião.
Como a economia da cidade enfrentou a crise?
Há seis trimestres o desemprego tem diminuído no Brasil e aqui também. O que preocupa é que cai o desemprego, mas também o emprego formal. Em dezembro fui à prefeitura e o secretário de Desenvolvimento Econômico apresentou taxas de empregos formais muito baixas, apesar do desemprego estar caindo. Pela característica da região de feira, como a nossa, essa situação é ainda mais acelerada. Sabemos que os negócios existem, que as pessoas estão trabalhando, mas o grande desafio do poder público neste ano é transformar o informal em formal.
Como concorrer com os chineses. Investir em moda é uma saída?
Caruaru tem vários cursos de moda e tem muito apoio do Sistema S. A Acic também tem trabalhado, junto com outras associações, na profissionalização da confecção. Uma calça, por exemplo, que se vendia a R$ 20, pode-se colocar uma lavagem que vai custar mais R$ 2 e você consegue vendê-la por R$ 30. Ou seja, agrega um valor a mais que não só o valor do produto físico. Os cursos voltados para a moda, o próprio Armazém da Criatividade, que tem hospedado muitas empresas desse segmento e o trabalho eficiente dentro das confecções contribuem muito para o mercado. O setor de lavanderias, por exemplo, vem se adequando às normas ambientais e realmente fazendo o bom uso da água. A Acic faz a rodada de negócio do setor com um grande movimento. Os confeccionistas que fazem esse assessoramento com as entidades se destacam. Aqueles que participam da rodada conseguem ser muito mais eficientes em sua empresa e até mesmo vender para os grandes mercados. O segmento tem melhorado e crescido muito. O diferencial é justamente o conhecimento e a técnica aplicados à produção eficiente. É isso que sustenta o mercado de confecção.
Universidades são fundamentais para o avanço do setor?
Sim. Aqui nós temos Universidade Federal, grandes órgãos estaduais e muitas faculdades privadas. Ainda acho que não chegamos ao ponto ideal, mas a gente consegue enxergar no dia a dia que a mão de obra de Caruaru tem ficado mais qualificada. É preciso uma velocidade maior, mas já ficamos satisfeitos porque na prática o negócio está funcionando bem melhor.
Como anda o desempenho da indústria da cidade?
Caruaru tem um distrito industrial bem consolidado. As indústrias sofreram com a crise e com a guerra fiscal, levando as empresas para Petrolina, Alagoas e Paraíba. Mas acho que Caruaru já tem hoje um parque industrial bem consolidado, inclusive com projetos da prefeitura para ampliação. O parque industrial têxtil tem crescido muito, mas têm aparecido também empresas de maquinário pesado, de estruturas metálicas, de pré-moldados, alumínio, móveis.