--> Arquivos Artigos - Página 10 de 18 - Revista Algomais - a revista de Pernambuco

Artigos

Os partidos e a realidade sem coligações (por Maurício Romão Costa)

A evidência empírica das eleições proporcionais de 2020 no Brasil, sem as coligações, realçou três fenômenos na comparação com o pleito de 2016: (1) diminuiu o número de partidos em disputa; (2) diminuiu o número de partidos com representação nas Câmaras Municipais e (3) diminuiu o número de vereadores eleitos por siglas pequenas. Com respeito ao item (1), considerando uma amostra de cidades de diferentes tamanhos dos 26 estados da federação, constata-se que houve redução média global de 44% no número de partidos disputando as eleições entre 2016 e 2020, algo como de 22 para 14 partidos, conforme se depreende da Tabela abaixo: Chame-se à atenção que nos grupos de cidades de menor porte (40 mil habitantes, 15 mil habitantes, e as menores dos estados) 16 siglas, em média, disputaram as eleições de 2016, mas esse número caiu para sete em 2020, uma queda de cerca de 56%. Ainda com base no exposto nesta Tabela, é concebível inferir que há uma relação direta entre o número de partidos disputando as eleições e o tamanho das cidades: quanto maior o tamanho, maior a quantidade de partidos em concorrência e vice-versa. Por outro lado, na comparação entre 2016 e 2020, nota-se que à medida que o tamanho das cidades vai decrescendo, vai aumentando o percentual de partidos que deixou de concorrer às eleições. É oportuno mencionar ainda que no grupo de menores cidades de cada estado e naquele cuja população gravita no entorno de 15 mil habitantes as coligações eram destacadamente predominantes em 2016. Tanto assim é que nos 26 estados somente coligações disputaram as eleições em 15 cidades de cada grupo mencionado. Não houve nenhum partido isolado, em vôo solo. Isso só aconteceu em 11 cidades de cada grupo, quando uma ou duas siglas, no máximo, destoando do resto, todas coligadas, se aventuraram em competir isoladamente. Os dados retirados da Tabela projetam, assim, a perspectiva de que uma menor quantidade de siglas, aquelas mais sólidas e competitivas, é que subsistirão no emaranhado quadro partidário do país. Evidenciou-se também, ao fim do primeiro turno das eleições recém-findas, expressiva redução do número de partidos com representação nos legislativos locais dos municípios brasileiros, como estatuído no item (2). De fato, os dados mostram [Portal G1, 25/11/20] que as Câmaras com até seis partidos, que em 2016 respondiam por 50% dos municípios, agora são 82% do total. Em contrapartida, caiu a quantidade de municípios com mais de seis legendas nos Legislativos locais, de 50% em 2016 para 18% em 2020. Chamou à atenção, principalmente, o fato de que entre as duas eleições o total de cidades que tinha até três partidos com vereadores nas Câmaras sextuplicou, subindo de 262 para 1.565. Isso quer dizer que 28% das atuais 5.568 Câmaras de Vereadores do Brasil têm, no máximo, três siglas com representação. Essa queda na quantidade de partidos com vereadores eleitos sinaliza para redução da fragmentação partidária brasileira, considerada uma das maiores do mundo, ensejando melhor exercício da governabilidade por parte do executivo, maior racionalização dos trabalhos no Parlamento e conseqüente melhoria da qualidade legislativa. Por último, em relação ao item (3), o número de vereadores eleitos pelos 10 menores partidos (chamados de partidos nanicos) reduziu-se de 1.378 para 623 entre 2016 e 2020 [Poder360], uma queda de 55%, expondo as dificuldades dessas agremiações de pequeno porte de elegerem representantes nos legislativos quando são obrigadas a concorrerem isoladamente. Esses números, vistos em conjunto, mostram que o fim das coligações proporcionais pode estar ensejando um salutar processo de reconfiguração do arcabouço partidário brasileiro ao longo do tempo, com menos disputantes, maior compactação quantitativa de siglas (hoje são 33) e conseqüente diminuição de sua fragmentação. As causas que estão gerando este novo contexto partidário não são estranhas ao meio político. Com efeito, alguns desses partidos são meros expectadores do processo eleitoral. Não têm densidade de votos e muito menos representação parlamentar, exceto um caso esporádico ali, outro acolá (atestado disso é que em 2020 quatro partidos lançaram candidatos, mas não elegeram sequer um vereador nos 5.568 municípios brasileiros). Sobrevivem à custa do fundo partidário e de emprestar apoio a agremiações mais fortes. Como não há mais o exercício de poder dos grandes partidos em atrair siglas para o seu entorno, mediante concessão de vantagens em troca de cauda eleitoral, situação corriqueira na época das coligações, essas siglas ficam sem estímulos externos para concorrer. Ademais, sem absolutamente nenhuma chance de ascenderem ao Legislativo por seus próprios méritos eleitorais, tais siglas preferem não incorrer nos custos da disputa: os administrativo-financeiros, os contábil-fiscais e, pelos resultados inexpressivos nas urnas, os político-eleitorais. O fato é que o longo período do instituto das coligações proporcionais gerou uma perniciosa acomodação no sistema político-partidário-eleitoral do país, criando uma cômoda zona de conforto para a maior parte das agremiações, um verdadeiro jogo de ganha-ganha em que a estruturação, a qualificação e a solidez dos partidos não eram motivo de preocupação. Daí a histórica resistência no Congresso em acabar com o mecanismo das alianças, apesar de haver um quase consenso de que a fórmula era a grande distorção no sistema eleitoral de lista aberta em uso no Brasil. Enfim, mantido, como é de se esperar, o regramento da reforma eleitoral de 2017 - o fim das coligações proporcionais e a cláusula de desempenho partidário -, a solução para as agremiações com pouca ossatura de votos é enveredar pelo único caminho que lhes restam: o da fusão com outras siglas, através da qual podem ganhar envergadura para a disputa eleitoral e justificar a razão política de suas existências. *Por Maurício Costa Romão, Ph.D. em economia pela Universidade de Illinois, nos Estados Unidos (mauricio-romao@uol.com.br)

Os partidos e a realidade sem coligações (por Maurício Romão Costa) Read More »

A Operação Mãos Limpas e a Lava Jato: iguais do início ao fim?

*Por Amanda Ribeiro, especial para a Algomais A decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) de que o ex-juiz Sergio Moro não teve imparcialidade no julgamento do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no caso do triplex do Guarujá ocorreu no dia 23 de março, reacendendo debates antigos sobre a Operação Lava Jato, inclusive relembrando as suas semelhanças com a famosa operação italiana intitulada Mãos Limpas. As semelhanças passam por fatores como a grande atenção midiática, enormes escândalos de corrupção, políticos famosos investigados e grandes volumes financeiros. Como se não fossem suficientes todas as similitudes relacionadas ao processo das Operações, o ex-juiz Sérgio Moro e a Operação Mãos Limpas têm uma conexão antiga. Em 2004, quando ainda iniciava a sua carreira, o ex-juiz inclusive publicou um artigo intitulado Considerações sobre a Operação Mani Pulite, no qual a define como “uma das mais impressionantes cruzadas judiciárias contra a corrupção política e administrativa”. A Operação que desvendou um gigantesco esquema de corrupção na Milão da década de 90 foi um dos temas mais estudados por Sérgio Moro. Mas afinal, como aconteceu a Mãos Limpas, inspiração para a enorme investigação que mexeu com a política no Brasil? A grande Operação italiana Mani Pulite A Operação Mãos Limpas iniciou em 1992 e, até a sua época, foi a maior Operação que investigava um esquema de corrupção sistêmica já vista. O seu marco inicial ocorreu com a prisão de Mário Chiesa, membro do Partido Socialista Italiano e administrador de hospital público, com propinas de sete mil libras nos bolsos (cerca de US $5.000,00 com o câmbio atual). Supostamente, o dinheiro teria vindo de uma companhia de limpeza. Depois da sua prisão, mais de quinze bilhões de libras foram apreendidas em contas bancárias, imóveis e títulos públicos. Mário Chiesa confessou que exigia o pagamento de propina em cada contrato da instituição filantrópica no intuito de financiar ações do seu Partido e manter o cargo que ocupava no hospital. Ele expôs relações de corrupção sistemática em Milão que levou a novas investigações e prisões. Na prática, o sistema de propina estava tão generalizado que a expressão Tangentopoli ou Bribesville (em tradução livre: “cidade da propina”) passou a definir a situação. Ao final da Operação, 1.300 pessoas foram condenadas por corrupção, desvios de verbas, lavagem de dinheiro, etc. Foram revelados também esquemas de desvio de dinheiro para campanhas políticas. O que há de tão semelhante entre a Operação Mãos Limpas e a Lava Jato? As duas operações tiveram um sucesso estrondoso inicialmente, tanto da opinião pública quanto da mídia. Políticos poderosos e outros expoentes da sociedade foram investigados, julgados e condenados. A Operação Lava Jato também tem números que surpreendem: cerca de 80 fases e 550 pessoas denunciadas com 12 bilhões de reais que retornaram aos cofres públicos. Para que fiquem melhor esclarecidas as similitudes entre as operações, o advogado Leandro Felix*, especialista em Direito Público e membro do Centro de Estudos em Direito Eleitoral da ESA/PE, pontua alguns dos tópicos que expõem essa relação entre a Mãos Limpas e a Lava Jato: “Apesar das duas operações terem sido criadas em momentos e distintos da história, é possível concluir que as semelhanças mais evidentes entre elas são: combate a corrupção, grande exposição midiática, excesso na condução dos processos, inclusive na revisão de algumas penas condenatórias aplicadas e utilização da operação para fins políticos”. Uma das semelhanças mais interessantes é a trajetória de dois expoentes das investigações que foram do direito para a política: Antonio Di Pietro e Sérgio Moro. O primeiro, ex-promotor italiano, foi símbolo da Mani Pulite e grande protagonista da investigação. Sobre os fins políticos das operações, Leandro Felix acrescenta: “Antônio di Pietro alçou voos políticos, se tornando membro do parlamento italiano, assim como o ex-juiz Sérgio Moro largou a toga para assumir o Ministério da Justiça e Segurança Pública, que é um cargo político. O mais interessante deste exemplo que trago é que Moro é um entusiasta do trabalho de Di Pietro, na Operação Mãos Limpas, e isso acabou com que ele tomasse o mesmo caminho que o de seu “mentor”. Devido a repercussão de seus trabalhos ambos acreditaram possuir uma força quase irrestrita para levar adiante suas pautas políticas". O ministro Edson Fachin, do STF (Supremo Tribunal Federal), chegou a dizer que a suspeição do ex-juiz Sergio Moro podia significar que a Lava Jato teria o mesmo fim que a Operação Mãos Limpas: “em que o sistema impregnado pela corrupção venceu o sistema de apuração de investigação e de condenação dos delitos ligados à corrupção”. É uma preocupação no cenário atual que a Lava Jato acabe terminando como a Mãos Limpas, que chegou a ter um representante da Organização das Nações Unidas (ONU) para atestar a independência do Poder Judiciário italiano. Os investigadores foram até mesmo ameaçados de morte, enquanto a Operação perdia o apoio popular e tinha a sua condução investigada por órgãos de controle. Sobre o caso da suspeição de Moro, o advogado Leandro Felix acrescenta que “tanto Moro quanto Di Pietro acabaram fracassando no caminho político trilhado, sendo aos poucos esvaziados politicamente”. Mas o que a suspeição de Moro realmente significa para a carreira do ex-juiz? O que significa a suspeição do ex-juiz Sérgio Moro? A suspeição do ex-juiz Sérgio Moro significou afirmar a sua parcialidade no julgamento do ex-presidente Lula. Leandro Felix afirma que a suspeição é uma “cicatriz” na carreira do ex-juiz, e relembra que “a mesma 2ª Turma do STF” já havia se manifestado sobre a quebra de imparcialidade de Moro no Caso Banestado, “anulando a sentença condenatória de Paulo Roberto Krug, por ter tomado, na fase de assinatura do acordo de colaboração premiada, depoimentos de delatores, participando da produção de provas durante a fase de investigação”. O especialista em Direito Público Leandro Felix define que, durante o processo da Lava Jato, foi possível constatar um embate “quase que romano” entre a defesa do ex-presidente Lula e o até então juiz Sérgio Moro e, para explicar em quais momentos o ex-Ministro da Justiça teria sido parcial, cita o “caso

A Operação Mãos Limpas e a Lava Jato: iguais do início ao fim? Read More »

O que o mercado de cloud e inteligência artificial reserva para 2021?

*Por Diego Santos O ano começou acelerando as inovações tecnológicas e, ainda assim, temos muito o que evoluir neste ponto. As mudanças seguem em alto ritmo devido à pandemia, já que, com isso, muitas empresas tiveram que adotar novos métodos rapidamente para seguir atuando - e aqui vale uma reflexão: a vida mudou e o mundo corporativo virou de pernas para o ar, fazendo com que empresários mais conservadores tomassem decisões paliativas pensando apenas em um curto período de tempo. Essa "maquiagem digital", após um ano, começa a mostrar que não é efetiva e torna obrigatória a adoção de tecnologias que auxiliem no crescimento e dia a dia das equipes. Em parceria com o IDC, levantamos algumas tendências que merecem atenção. Nesta pesquisa, podemos notar, por exemplo, que para 2021 as empresas tendem a olhar mais para atração e retenção de clientes, bem como equilibrar o universo digital com o físico na experiência do consumidor. Já pontos como introduzir novos serviços e reduzir custos da organização devem registrar queda. Assim, ao falarmos de inovação, cada dia mais, poderemos observar termos como segurança, inteligência artificial, cloud computing, 5G e experiência do cliente conquistando espaço. Vamos abordar cada um deles? Inteligência artificial e segurança Conectividade é o termo da vez. Dispositivos móveis, smart homes, assistente virtual etc. O leque de opções é enorme e as facilidades que prometem e proporcionam, são maiores ainda. O uso crescente da IA gera maior conectividade, automação de processos e aceleram o processo de DX (a famosa transformação digital). Tudo isso propicia um modelo híbrido de trabalho, criando novas oportunidades às corporações que passam a olhar com mais atenção para os serviços de rede, permitindo uma conectividade que pode se estender a qualquer usuário e localização. Quanto mais conectados estamos, mais expostos estamos também, certo? Depende! Do ponto de vista do usuário, ao clicar em "aceitar e continuar", você oferece informações para que o aparelho reconheça suas preferências e faça indicações a partir disso. É fundamental saber o que está aceitando, uma vez que tudo isso passa a te moldar. Já do ponto de vista das empresas, é preciso planejar e analisar muito bem o serviço que se contrata para garantir que todo o processo seja seguro do começo ao fim. Cada dia que passa vemos mais casos de vazamentos de dados e, até mesmo, empresas realizando pesquisas de crédito solicitando informações confidenciais, como a senha do banco. Por questões assim, esperamos com grandes expectativas pela LGDP - Lei Geral de Proteção de Dados - que gera duas ações complementares: impacto nas empresas que precisam se adaptar às normas e garantia dos direitos dos consumidores. Cloud computing e infraestrutura em TI Pelo avanço da IA e conectividade, já podemos notar porque cloud computing será umas das grandes tendências de 2021, não? Os investimentos neste ponto podem ser determinantes ao pensar em direções de novas tecnologias para infraestrutura e segurança. Com as necessidades mostradas pela pandemia, a nuvem é um caminho rápido para empresas que precisam ampliar resiliência operacional, revelando uma necessidade de evolução em ambientes híbridos e multicloud. De acordo com pesquisa do IDC, cerca de 90% das organizações de grande porte dizem contar com Data Centers tradicionais, sejam eles próprios ou terceirizados. Destas, 49% afirmam utilizar também algum modelo de Cloud como parte da sua infraestrutura de TI. Ainda de acordo com o IDC, somando os gastos com infraestrutura (IaaS) e plataforma (PaaS) em nuvem pública, o Brasil deve atingir US﹩ 3,0B, o que representa um crescimento de 46,5% em relação a 2020. O modelo de nuvem privada também cresce em bom ritmo, totalizando US ﹩614M em 2021. O maior crescimento vem de nuvens privadas como serviço (DCaaS), que podem avançar 15,5% se comparado com 2020. 5G Este é o ano da massificação do 5G no Brasil e, com uma conexão mais rápida, podemos esperar portas abertas para a adoção de novas tecnologias. Isso porque o uso dos smartphones no B2B rompe barreiras para adoção de outros serviços. Outros fatores que colaboram para o sucesso são as questões regulatórias, econômicas, geopolíticas e do ecossistema de tecnologia, tanto do lado da oferta como da demanda. O IDC estima que nos anos 2021-2022, o 5G proporcionará a geração de US ﹩2,7B de novos negócios envolvendo AI, IoT, Cloud, Segurança e Robotics etc. Experiência do cliente Observando todos os tópicos deste artigo, podemos concluir que o cliente é o foco. Cada tecnologia que aponta como tendência proporciona melhor experiência para o usuário. Ou seja, não importa o seu segmento de atuação, se você oferecer um serviço de qualidade e que proporcione conforto, agilidade e segurança ao cliente, você está no caminho certo. Aqui, a dica é: ouça sempre o seu cliente para adaptar rotas e fique ligado nas novas tecnologias para otimizar pontos fortes, melhorar pontos fracos e seguir conquistando mercado. A inovação é uma chave importante quando se pensa em sucesso. Como um integrante do Ambassador Program da Amazon Web Services (AWS) no Brasil - uma comunidade de especialistas técnicos da comunidade de parceiros de consultoria da AWS, e apaixonado por compartilhar conhecimentos técnicos da AWS e do universo de cloud - reforço: o melhor caminho para uma empresa mergulhar na transformação digital começa com um bom parceiro que vai desenvolver um plano robusto, desde a estratégia mais adequada até a escolha das tecnologias adotadas, para juntos construírem e manterem uma boa gestão na jornada. Tendo conhecimento de tudo isso, te pergunto: o que você fará pela sua empresa neste ano? *Diego Santos é gerente de tecnologia e inovação da Nextios, unidade de negócios corporativa do grupo Locaweb, dedicada a soluções de negócio e serviços gerenciados para nuvens públicas, privada e híbridas.

O que o mercado de cloud e inteligência artificial reserva para 2021? Read More »

Félix, a Ditadura e as Lembranças. Três atos de uma tragédia brasileira

Por Luiz José de França* À propósito dos tempos que vivemos; À propósito do esquecimento e do seu polêmico direito;(de ser esquecido, de ser anistiado pelas atrocidades que afetam a vida de centenas, de milhares); À proposito do dia de ontem - 31.03.1964– que para muitos (sobreviventes, viventes, torturados e torturadores) não dá para esquecer - sem refletir; À propósito de uma Anistia que - à pretexto de reconciliar o Pais - foi incapaz de passar a limpo os erros do passado, para garantir e legitimar os próprios fundamentos que a Constituição de 1988 foi capaz de “positivar” (como dizemos no Direito – tornar imperativo categórico); Me vem as lembranças de um velho comerciante, nascido no Buíque, que fez fama e prosperidade em Arcoverde e consolidou um estilo de ser e de viver que tinha na Verdade e na Transparência, o seu Imperativo Categórico Máximo. Felix de França Galvão. Ato Um. Em 02 de Abril de 1964, no calor do ato adicional 01 (o primeiro ato do regime que se denominava salvador da moral, das liberdades e da “democracia”), onde as delações e entregas, a partir de memórias distorcidas (?) ou de mágoas pessoais era a regra, Félix começa a busca pelo seu cunhado, então Major ou Tenente Coronel (a memoria e as reminiscências das inúmeras conversas com meu Pai sobre estes tempos, me falham quanto a patente) – Solano – meu Tio – que fora preso nos primeiros dois dias do golpe por - segundo o seu “delator premiado” – estar a mando do então governador eleito (naquele momento já preso e deposto) Miguel Arraes – insuflando e armando os trabalhadores da mata norte e sul do Estado, para TOMAR na marra os bens, a dignidade e fidalguia dos nossos senhores da cana. Meu Tio, um homem religioso, era incapaz de um erro sequer. Sua formação evangélica não permitia isso. Era incapaz de um malfeito sequer. Ao contrário do seu “delator premiado” construiu sua carreira dentro do espectro da farda, com dedicação as instituições. Ao contrario da delação, ele ia sim a zona da mata, mas para preservar o Direito de Greve dos Trabalhadores e – ao mesmo tempo – preservar as propriedades privadas daqueles que – mais tarde – já tramavam pela sua prisão. Ou seja, preservar o ambiente democrático, garantir a plenitude do contraditório e assim assegurar consensos que somente se constroem a partir dos dissensos. Mas voltemos ao Ato. Felix então, juntamente com seu outro cunhado, Francisco, começam a perseguir informações. Desencontradas, diziam que Solano não estaria mais em Recife. As incertezas cessam pela intervenção forte e sempre altiva de João Roma (Avô do Atual Ministro do Governo Federal) dono de cartório e cujo pai era padrinho de Felix. Com a intervenção decisiva dele Solano é solto – e meu pai me disse diversas vezes – “Lula, ele pegou o telefone, ligou para o Comandante Cahu (então o comandante do exercito no NE) e disse a ele “que palhaçada é esta Cahu! Solano é um homem de bem!”. Uns 10/15 dias depois, um Solano triste e claramente depressivo, era solto. Isso lhe custou vergonha. Custou a incompatibilidade com a farda. Custou-lhe de forma voluntaria o pedido de aposentadoria, que lhe tolheu uma carreira brilhante. Ato 2. Em 1969, um jovem arcoverdense chamado Zé Áureo (ainda vivo e pode confirmar o relato) participava - nas imediações da praça Joaquim Nabuco - de ato contra os militares que cinco anos depois já não tinham pudores. O AI 5, cassando inclusive Ministros do STF, dava o tom do que Helio Gaspari chamou em sua obra de “a ditadura escancarada”. Por uma destas coincidências, Félix, amigo irmão de Zé Áureo Pai (o pai do Zé Estudante que gritava e protestava contra o regime, na condição de cidadão e acadêmico de Direito, da Faculdade de Direito do Recife) socorre o jovem Zé, retirando-o da encrenca e o escondendo – como de resto fez com mais alguns – por algumas horas e dias. Depois disso, com a intervenção do seu Pai, o jovem Zé Áureo – dali saiu para o auto exilio, para terminar sua formação em Portugal. Ato 3. 1976. Felix chega em casa. 05:30 da manhã de um domingo. Ao chegar no portão da garagem do Edf Apolo é abordado por duas pessoas. Eles não se identificam. Mas, como num passe de mágica descrevem toda a rotina de Félix. Onde ia, onde bebia (bar de seu Manoel) aos domingos, sobre o seu comércio e começam a descrever as pessoas do seu entorno. Seus parentes. No meio deles, um jovem brilhante, acadêmico de medicina, que como tantos, protestou e canalizou os seus protestos para aquilo que até mesmo Lenin, em sua obra doença infantil do comunismo, chamava de “esquerdismo”. Carlos, hoje Doutor e meu doutor também, era investigado pelo aparato. Mas, o comportamento e os hábitos dele não faziam dele – naquele momento – alvo para um sumiço. Era preciso pressionar. Destruir o psicológico para que se não funcionasse, ai sim se invocasse a LSN – Lei de Segurança Nacional – e se tomassem as providencias. A ditadura se sofisticava ou, me socorrendo de Helio Gáspari novamente, “se envergonhava” e criava “métodos” mais sublimes de coerção e de destruição de sonhos. Não sei se por este motivo ou não, meu primo saiu do Recife para o Rio de Janeiro, onde fez sua residência e concluiu com imenso êxito seu curso de medicina. Hoje, uma referencia no mundo, como médico na sua especialidade, não perdeu seu espirito critico. Epilogo. A ditadura passou por nós. Passou pelos nossos. Não há o que comemorar. Não há o que exaltar. A trajetória dos regimes de exceção, venha de onde vierem, é a trajetória das delações – que a pretexto de fazer justiça se travestem em benefícios pessoais – das perseguições infundadas, dos ranços presunçosos e da intolerância. Em tempos de rede social, de incapacidade de se mediar pelo outro, as pontes que levam a evolução social e econômica de qualquer Pais ou Povo –

Félix, a Ditadura e as Lembranças. Três atos de uma tragédia brasileira Read More »

Adeus, Gustavinho... (por Aluizio Câmara Jr)

Adeus Gustavinho... Gustavo era um menino sedutor, irreverente, de muito estilo e cheio de charme. Conheci-o na varanda da casa de Rubinho e Renato Canuto, quando tentou esconder que fumava, colocando o cigarro entre as pernas e recebeu um alerta do pai: Cuidado pra não queimar as calças. As farras naquela varanda eram intermináveis. Tínhamos entre 15 e 17 anos, não lembro bem. Parei de contar minha vida pela cronologia do tempo. Lá se vão uma eternidade em ritos de passagem e regozijo celebrando uma amizade construída na admiração mútua. Gustavinho era alguém preocupado com o amanhã. Logo cedo prestou concurso público e foi trabalhar na Fazenda Estadual lá pelas bandas de Petrolândia, salvo engano. Ficava impressionado com sua determinação. Seu Mestrado virou livro prefaciado pelo jurista Ives Gandra. Depois de certo tempo, deixou o cargo público para atuar enquanto advogado tributarista tornando-se sócio de escritório de renome no Recife. Largou tudo e foi para Londres continuar seus estudos. Largou tudo não, porque, nesse momento, já estava com a sua Babi, advogada igualmente brilhante que conseguira apaziguar seu coração. Passei a chama-lo de Mr. Coast, porque, doravante, ele havia incorporado não apenas seus estudos, mas alguns hábitos típicos da intelectualidade londrina, que sabe apreciar bons vinhos e fumar charutos em poltronas capitonés. Aos finais de semana sonhava soluções fenomenais para o Brasil e para o mundo, além de atacar com impaciência a mediocridade da política brasileira, sempre apoiada em bengalas populistas. Liberal, na economia e nos costumes, usava seu raciocínio com uma sagacidade assustadora. Um idealista pragmático, se ouso dizer, que acreditava que o problema do país “não será solucionado com voluntarismo, corações ingênuos e ideias ocas.” Dizia que a nossa “Ineficiência é resultado de decisões erradas.” Sempre tivemos discussões acaloradas, ele de um lado, eu do outro. Mas eu o respeitava sobremaneira. Ele não suportava a ideia de escutar “o som das algemas da mente”, como dizia o poeta William Blake. Sua partida dilacerante me invade com uma tristeza insuportável. Uma perda gigante sofre meu tosco e vilipendiado coração. Mas nada se compara a dor de Tia Sônia e Joel, porque não é usual se despedir irrevogavelmente de um filho. Tico e Mateus perdem um irmão amado, que sempre foi uma referência. Mas meu corpo chega a doer ao pensar em Babi, em Chico e em Bella. Será preciso muita resiliência para suportar essa ausência e deixar fluir a dor, porque a reinvenção do paraíso precisa aceitar a perda e viver o luto, para ver brilhar novamente, para além da terra das sombras, a reconfortante luz do amor. Gustavo Costa (1973-2021), Para sempre em nossos corações... *Por Aluizio Câmara Jr. Recife, 14 de março de 2021

Adeus, Gustavinho... (por Aluizio Câmara Jr) Read More »

Quem sou eu para escrever alguma coisa?

Por Marina Daineze, Diretora de Imagem e Comunicação da Vivo Um dos meus desafios atuais no trabalho é coordenar uma das frentes dos grupos de diversidade na Vivo. São grupos de afinidade, formados por colaboradores internos engajados em discutir e construir ações propositivas nestes temas. A experiência é sempre muito rica e transformadora, principalmente por estar à frente do pilar de gênero, que aborda as temáticas relacionadas às mulheres na empresa. Nestes encontros, posso estar junto das colaboradoras das mais diversas áreas da companhia, que possuem muito em comum: são inteligentes, preparadas, competentes, fortes, mas com muitas inseguranças. Venho percebendo que à medida que elas evoluem em suas carreiras dentro da Vivo, apresentam uma tendência a duvidar de si mesmas, como uma autossabotagem. Isso não é novo e tem nome: Síndrome da Impostora. Embora receba o nome de “Síndrome”, ela não é uma doença mental, mas é uma desordem psicológica cheia de sintomas. Os primeiros aparecem como uma dúvida sobre o merecimento por algumas realizações profissionais, depois vêm como rejeição a alguns elogios, medo ao mostrar seu trabalho, dificuldade de dizer não e até mesmo compulsão por agradar. A síndrome atinge seu ápice com o sentir-se uma verdadeira fraude, geralmente ao alcançar uma posição de destaque. Este conceito foi desenvolvido pelas psicólogas americanas Pauline Rose Clance e Suzanne Imes em 1978 e, ao que tudo indica, ainda não tem solução. Mulheres notáveis como Viola Davis e Michelle Obama poderiam facilmente participar do nosso grupo de diversidade e compartilhar suas histórias, pois elas também assumem sentir esta insegurança. É uma distorção na percepção de si mesma que culmina na falta de autoestima para atuar em espaços relevantes ou sem histórico de representatividade feminina. Isso pode levar a profissional a ficar constantemente tentando provar sua capacidade através de esforços exaustivos. Se não reconhecida, pode levar à inércia total. Ainda que não esteja exclusivamente vinculado ao gênero feminino, é mais frequente ocorrer entre mulheres por conta dos problemas estruturais que nós enfrentamos em todos os espaços da sociedade. Precisamos pensar em soluções para este problema estrutural e atingir um equilíbrio com a mobilização de todos. A flexibilidade nos estilos de liderança é essencial para essa transformação. É preciso questionar os modelos vigentes e fomentar uma cultura empresarial de conscientização e combate a todo tipo de preconceito, começando pelas altas hierarquias. A Jornada da Diversidade é um bom exemplo do que funciona. Na Vivo, selecionamos um tema por mês para ser debatido e para promover a conscientização de toda empresa, envolvendo todos os gêneros neste processo. Neste mês da mulher, a Síndrome da Impostora é o assunto, pois mesmo que não seja novidade, ainda não é amplamente conhecido, principalmente entre os homens. Teremos um dia de palestras com líderes femininas trazendo conscientização, acolhimento e abertura para debate entre todos. Além das discussões, queríamos realizar algo palpável para confirmar nosso comprometimento e fomentar a mudança. Elaboramos um treinamento interno em colaboração com a Impulso Beta, consultoria de diversidade focada na gestão de gênero, e vamos incentivar o trial do aplicativo Mulheres Positivas, projeto que aborda temas do universo feminino, já disponível para os colaboradores da Vivo. Acredito muito nestas ações porque, apesar de parecerem pequenas, são o início de um processo transformador. Quanto mais cedo a mulher compreender o ambiente, se preparar, entender a importância de sua autoconfiança, maior a chance de êxito. Com isso, ela percebe também que apropriar-se de sua história é a estratégia mais sólida para lidar com o mundo corporativo. Afinal, conforme conquistamos novos espaços, enfrentamos também a resistência dos velhos paradigmas e abrimos caminho para outras mulheres fazerem o mesmo. A insegurança geralmente aparece quando há uma oportunidade de crescimento. Entender a sensação de fraude como um indício de sucesso pode ser uma saída para enfrentar a inércia do medo. Falo isso porque já me senti assim e reconheço que foi o meu maior desafio profissional. A pergunta “Quem sou eu para escrever alguma coisa?”, por exemplo, é algo que eventualmente aparece em minha mente quando decido expor minhas ideias. Mas ela não me paralisa, pois me aproprio da minha história para continuar. Eu sou Marina Daineze, diretora de comunicação e marketing da Vivo, mãe, mulher e tenho, sim, muito a compartilhar. Que este artigo seja um incentivo para que todas as mulheres assumam a liderança, principalmente a de suas vidas. E, com isso possam empoderar e contribuir com muitas outras mulheres nesta jornada.

Quem sou eu para escrever alguma coisa? Read More »

“Lugar de mulher é onde ela quiser”

Você já ouviu falar em empoderar-se, empoderamento e empoderada? Esses e outros sinônimos fazem parte do dia-a-dia de todo mundo e principalmente da autoestima de uma mulher, ou quando uma amiga fala para a outra “Aceite seu corpo, ele é lindo”, “Você pode viajar sozinha sim, isso vai contribuir para a sua carreira” ou a expressão “Lugar de mulher é onde ela quiser”. Afinal o que é Empoderamento Feminino? Este é um ótimo momento para debater e discutir o tema, já que neste mês, celebramos o Dia Internacional da Mulher em (08) de março. Para que não haja equívoco ou comparação entre Empoderamento Feminino e Feminismo, aqui vai a diferença. Feminismo é um movimento que prega a ideologia da igualdade social, política e econômica entre os gêneros. Já o Empoderamento Feminino é a consciência coletiva, expressa por ações que visam fortalecer as mulheres e desenvolver a equidade de gênero. O primeiro termo é uma consequência do movimento feminista, mas ambos os temas diferem, mesmo estando interligados. Empoderar-se é o ato de adquirir poder sobre si, embora a mulher ainda lute bastante para conquistar o seu espaço nas organizações e provar serem capazes de fazer parte do crescimento destas empresas, muitas mulheres também precisam reconhecer que elas são capazes de chegar longe em carreiras profissionais e objetivos, para então poder começar as mudanças. Em 2010, a ONU lançou os princípios de empoderamento das mulheres, no intuito de colocar em prática um posicionamento positivo da mulher no mundo. Estes princípios são: • Estabelecer liderança corporativa sensível à igualdade de gênero, no mais alto nível. • Tratar todas as mulheres e homens de forma justa no trabalho, respeitando e apoiando os direitos humanos e a não-discriminação. • Garantir a saúde, segurança e bem-estar de todas as mulheres e homens que trabalham na empresa. • Promover educação, capacitação e desenvolvimento profissional para as mulheres. • Apoiar empreendedorismo de mulheres e promover políticas de empoderamento das mulheres através das cadeias de suprimentos e “marketing”. • Promover a igualdade de gênero através de iniciativas voltadas à comunidade e ao ativismo social. • Medir, documentar e publicar os progressos da empresa na promoção da igualdade de gênero. De lá para cá, estes princípios ainda precisam ser massificados e aplicados. O empoderamento está presente em grandes ações, como, por exemplo, quando empresas decidem seguir uma política interna de equidade entre gêneros e quebra de preconceitos contra as mulheres. Um exemplo a ser citado é o Grupo Alpha, um grupo educacional do Recife, idealizado por duas mulheres, as CEOs Luciana Vitor e Suelandre Gonsalves. O Grupo iniciou suas operações em 2012, e hoje detém de 90% da sua gestão liderada por mulheres, onde é coordenado com apenas 10% do público masculino. O Grupo empresarial vem dando certo, sob ótica feminina da qual é perceptiva e persistente, além de outros atributos, galgando dia a dia seu crescimento e conquistando resultados positivos no quesito educação de qualidade. Os cargos são estratégicos que vão desde diretores, gestores acadêmicos e gestores administrativos. Para Priscila Santana, Diretora de Marketing do Grupo Alpha, é muito gratificante fazer parte do quadro funcional da empresa. “Assumir um cargo de gestão tão importante no Grupo Alpha, é uma realização desafiadora, por isso, me sinto grata e realizada pelo trabalho que exerço com tanto afinco. É um orgulho saber que além de mim, temos na instituição outras gestoras empoderadas compondo o quadro da empresa, que ‘Case de sucesso’. A prova disso é o nosso crescimento gradual.” Ressaltou a gestora. Você mulher! Pode aplicar o empoderamento em sua vida, trabalhe a sua confiança, se fortaleça e busque com garra de dedicação os seus sonhos. Assim que se sentir empoderada, poderá encorajar outras mulheres: amigas parceiras e familiares com seu exemplo. Como surgiu o Dia Internacional da Mulher: Conta-se uma história que no dia 25 de março de 1911, um incêndio atingiu uma fábrica têxtil em Nova York. Neste incidente cerca de 130 operárias morreram carbonizadas. Por isso, foi criada a data “Dia internacional da mulher”, para lembrar e homenagear aquele dia que marcou a trajetória das lutas feministas ao longo do século XX, durante a Segunda Guerra Mundial. Bem antes do incêndio, durante a Segunda Guerra Mundial, houve lutas que também propiciaram na criação da data, no final do século XIX, grupos femininos de operárias protestavam em países da Europa e nos Estados Unidos por melhores condições de trabalho, redução na jornada de trabalho e salários justos além, do fim da exploração infantil. Desde 1960, a comemoração do dia 8 de março já era tradicional, mas só em 1975, o Dia Internacional da Mulher, foi oficializado pela ONU, declarando o Ano Internacional das Mulheres, para atuar no combate as desigualdades e discriminação de gênero em todo mundo.

“Lugar de mulher é onde ela quiser” Read More »

SBPC e as mulheres nos seus espaços de poder e decisão

*Por Maria do Rosário Andrade Leitão e Maria do Carmo F. Soares A Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) foi fundada em 8 de julho de 1948, na sede da Associação Paulista de Medicina, com aprovação do seu primeiro estatuto. A primeira Reunião Anual da SBPC, sob a presidência dos Professores Jorge Americano e Henrique da Rocha Lima, realizou-se em Campinas, SP, de 11 a 15 de outubro de 1948, no formato de Conferências e Simpósios, sendo um dos instrumentos de fortalecimento da sociedade pelo seu aspecto de contemplar trabalhos acadêmicos de todas as áreas do conhecimento. O objetivo da reunião foi o de tentar, pela primeira vez no Brasil e, talvez na América do Sul, a integração de todas as atividades científicas, em conjunto homogêneo, de maneira a facilitar troca de visitas, discussões e sugestões entre cientistas. A partir de então, a Reunião Anual, foi sendo construída de forma coletiva e se tornou o maior evento da SBPC, realizada de forma ininterrupta, desde 1949 a 2021, embora a 72a edição tenha sido realizada de forma virtual e remota, devido a Covid-19, mas prestando e trazendo muitos esclarecimentos científicos em todas as áreas do conhecimento científico. A trajetória da SBPC, uma instituição sólida, conhecida e respeitada no âmbito científico, vai ser aqui abordada a partir da inserção das mulheres, enquanto Presidentes e Secretárias, e mais particularmente sua participação na Regional de Pernambuco rumo aos seus 70 anos de existência. Para entender o processo de inserção e visibilidade das mulheres, na educação e na ciência, é necessário debruçar-se sobre a literatura fundamentada na epistemologia feminista, que vem sendo elaborada e publicada há algumas décadas, na qual as autoras vêm teorizando sobre o lugar das mulheres, nas ciências, nas profissões, nos espaços de poder e decisão, temas que tem sido objeto de pesquisa no Núcleo de Pesquisa-Ação Mulher e Ciência – NPAMC/UFRPE desde 2014, do qual as autoras são membros. Núcleo que se propôs a contribuir no resgate da história das mulheres, relacionar a educação superior às relações de gênero, aportar dados a um campo temático no qual a literatura ainda é insuficiente sobre as mulheres na academia, na ciência e nas sociedades científicas. Neste contexto, vale pontuar dados sobre o espaço ocupado pelas mulheres no prêmio Nobel: Física - total 216, sendo 212 homens e 4 mulheres; Química - total 186, sendo 180 homens e 6 mulheres; Fisiologia total 222, sendo 210 homens e 12 mulheres; Literatura - total 117, sendo 101 homens e 16 mulheres; Paz - total 135, sendo 121 homens e 14 mulheres. É importante também explicitar que há ações afirmativas desenvolvidas no Brasil, para visibilizar as mulheres na ciência, entre elas: 1) O Programa Mulher e Ciência, uma política pública criada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico -CNPq para “estimular a produção científica e a reflexão acerca das relações de gênero, mulheres e feminismos no País; promover a participação das mulheres no campo das ciências e carreiras acadêmicas e, 2) O Prêmio Carolina Bori Ciência e Mulher, criado em 2015 com os objetivos de fomentar a inclusão das mulheres na ciência e contribuir no aumento da participação das novas gerações de cientistas. Essas ações afirmativas, foram historicamente reivindicadas em pautas de inclusão das mulheres em todo o tecido social, um exemplo é o movimento sufragista, explicitado pela historiadora, Mônica Karawejczyk em sua tese de doutorado “A Igreja Católica e o voto feminino no Rio Grande do Sul (1891-1935)”; foi em 25 de outubro de 1927, que o movimento sufragista no Brasil alcançou sua primeira vitória: o reconhecimento do alistamento eleitoral feminino no estado do Rio Grande do Norte e tal vitória contou com a participação ativa da Federação Brasileira pelo Progresso Feminino (FBPF). Portanto, o voto feminino no Brasil tardou, mas veio com luta e pressão, que deram resultado, uma vez que as restrições ao voto feminino foram retiradas, quando da publicação do código eleitoral em 24 de fevereiro de 1932 e, foram então instituídos o voto secreto e o voto feminino eleitoral. O movimento sufragista surgiu como uma resposta à exclusão das mulheres na política. Portanto, muitas desigualdades legais, econômicas, educacionais e cientificas precisaram ir sendo vencidas paulatinamente e de forma contínua numa construção coletiva. Assim, ao longo da segunda metade do século XX foram configuradas outras pautas de lutas, nas quais a sociedade é questionada sobre papeis sociais dos homens e mulheres, é sobre este período que trata o texto escrito por Hildete Melo e Ligia Rodrigues (2006) e publicado inicialmente pela SBPC, o qual dá visibilidade a participação das mulheres na ciência, por meio da publicação “Pioneiras da Ciência no Brasil”. Posteriormente, foi divulgado no site do CNPq, cuja apresentação da obra chama a atenção sobre a legitimação das cientistas brasileiras, o reconhecimento de suas contribuições para o avanço da ciência, realizado por estas pioneiras que visibilizaram em suas contribuições à sociedade as conquistas das mulheres no que concerne ao acesso ao saber e ao poder Nesse contexto, baseando-se no Projeto Memória da SBPC e nas Estatísticas da Base de Currículos da Plataforma Lattes, o texto “As Relações de Gênero na presidência e diretorias da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência”, de autoria das docentes/pesquisadoras Maria do Carmo F. Soares, Juliana S. Lima e Mª do Rosário de F. Andrade Leitão, publicado em 2016 nos anais do 19º Encontro da Rede Feminista Norte e Nordeste de Estudos e Pesquisa sobre a Mulher e Relações de Gênero – REDOR, buscou apresentar subsídios para uma reflexão, a partir do conceito de relações sociais de gênero, na trajetória histórica dessa sociedade científica e no painel de doutores/as do país. Constatou-se a sub-representação das mulheres nos espaços de ciências, no caso, na SBPC, foi identificado nos dados que explicitaram num total de 34 gestões da SBPC, 6 (seis) foram presididas por um quantitativo de 3 (três) mulheres que ocuparam o cargo de presidente da SBPC. E dentre elas, uma reconduziu o mandato por mais uma gestão e, a última mulher presidente, por 3 (três) gestões consecutivas. A

SBPC e as mulheres nos seus espaços de poder e decisão Read More »

Distritão deve ser novidade nas eleições 2022

*Por Maurício Costa Romão A Câmara dos Deputados voltou a tratar de mudança do sistema eleitoral brasileiro, desta feita buscando substituir o proporcional pelo majoritário. A mudança seria uma forma de superar as dificuldades causadas para muitos partidos pelo fim das coligações proporcionais e pela instituição da cláusula de desempenho partidário. Como não há tempo hábil para implementar o modelo majoritário de voto no formato distrital puro ou misto, para viger em 2022, até porque seria necessário delimitar espaços geográficos distritais nos estados da federação, os debates iniciais têm convergido para a modalidade distritão, cuja proposta, aliás, já fora derrotada no plenário do Congresso Nacional, em 2017. O distritão é uma variante magnificada do distrital puro. Pelo mecanismo, a circunscrição eleitoral seria um grande distrito (o estado, o município). Pernambuco, por exemplo, conformaria um distrito com 25 cadeiras de deputado federal, cuja ocupação dar-se-ia pelos 25 candidatos mais votados da eleição (a chamada “verdade eleitoral”). O distritão é louvado (1) por eleger os mais votados do pleito; (2) pela sua simplicidade (inteligibilidade); (3) por respeitar a vontade do eleitor; (4) por fortalecer os principais partidos e evitar fragmentação partidária e (5) por impedir transbordamento (spillover) de votos de puxadores para candidatos de pouca dimensão eleitoral. O rol dos deméritos, todavia, é apreciável: (a) reduz o pluralismo político do Parlamento; (b) diminui a participação das minorias; (c) tem baixa taxa de renovação da representação, devido ao recall dos atuais eleitos; (d) concentra mais votos e representantes nos partidos grandes; (e) supervaloriza as pessoas famosas (extra partidárias) em detrimento da qualidade da representação; (f) aumenta a personalização da representação; (g) tem baixa accountability (pouca ligação entre o parlamentar e as bases eleitorais); (h) relega partidos a plano secundário; (i) estimula competição entre correligionários de um mesmo partido e (j) favorece a influência do poder econômico. Um argumento de convencimento expressado por alguns parlamentares é o de que o distritão seria implantado agora, mas como transição para o modelo distrital misto, que vigeria a partir de 2030. No mecanismo misto o eleitor vota duas vezes e uma parte dos parlamentares é eleita pelo sistema majoritário-distrital puro e a outra parte pelo proporcional de lista fechada. Um dos modelos mais complexos em uso nas democracias contemporâneas. A justificativa de que o distritão seria um aprendizado para o distrital misto não se sustenta. São dois sistemas que guardam entre si enormes diferenças. E tem uma questão lógica: se o distritão não serve para ser permanente, por que submeter o país a essa traumática temporariedade? Ademais, o argumento da transição pressupõe que o distrital misto é superior ao distritão - a ponto deste servir apenas de trampolim para aquele - ou ao proporcional de lista aberta – a ponto de este ser substituído por ambos. Todos os sistemas eleitorais têm vantagens e desvantagens e é sempre controverso se falar de superioridade de um sobre outro, pois “nenhum sistema de voto é justo, perfeito, ideal” (“Teorema da Impossibilidade de Arrow”). Note-se, enfim, que a proposta de mudança de modelo eleitoral ressurge de forma flagrantemente casuística: “facilitar a vida de partidos nanicos” (Poder360, 24/02/21). O propósito explicitado é o de desfazer o regramento constitucional de 2017, que diminui a fragmentação partidária e imprime qualidade ao sistema político. Uma propositura vazada em tais desígnios não pode prosperar. ------------------------------------------------------------------------ Maurício Costa Romão, é Ph.D. em economia pela Universidade de Illinois, nos Estados Unidos. mauricio-romao@uol.com.br

Distritão deve ser novidade nas eleições 2022 Read More »

Homenagem aos 110 anos de Zé Dantas

*Por Aluísio Lessa Zé Dantas é imortal. José de Sousa Dantas Filho, nasceu em Carnaíba. Filho de José de Sousa Dantas, fazendeiro, comerciante e ex-prefeito da cidade de Flores, e de Josefina Alves Siqueira Dantas. Sob pressão familiar, migrou para o Recife ainda jovem. Aos 17 anos. Com uma meta estabelecida: ser médico. “Virar um doutor”, como ainda se costuma dizer pelas bandas das cidades do interior do Estado. Aluno aplicado, concluiu o ensino médio e se formou em medicina. Fez carreira no Rio de Janeiro no exercício da profissão. Médico residente obstreta e depois diretor do Hospital dos Servidores. Foi casado com a também pernambucana Yolanda Dantas. Teve três filhos. Morreu em 1961. Seu principal legado: a poesia, a música, a cultura nordestina. Carnaíba integra o cinturão do Sertão do Pajeú, região que historicamente tem três características no seu DNA. O Rio Pajeú, a polarização política entre forças progressistas e setores conservadores e a cultura da poesia popular. E foi nesse ambiente que Zé Dantas, um dos compositores mais geniais da Música Popular Brasileira nasceu e se formou. Conheceu Luiz Gonzaga pessoalmente aos 26 anos, no Recife. Escreveu composições antológicas. Que não as assinava, a seu próprio pedido, temendo represálias de seus pais. A juventude consagrou autores como Geraldo Vandré, Chico Buarque, Caetano Veloso, Gilberto Gil, entre tantos outros, nas chamadas composições de protesto, no final da década 60. “Mas doutô uma esmola a um homem qui é são, ou lhe mata de vergonha ou vicia o cidadão”, versos de Vozes da Seca, Zé Dantas denuncia a injusta e criminosa desigualdade regional contra o Nordeste. Na década de 50. Ou seja, cerca de 10 anos antes. No próximo dia 27 de fevereiro de 2021 Zé Dantas faria 110 anos se vivo fosse. Infelizmente, para todos nós, a Pandemia não permite uma comemoração com muito forró, em Carnaíba, como havia pensado e programado o prefeito Anchieta Patriota. Mas Zé Dantas estará vivo em nossos corações e mentes para a eternidade. Ele é imortal como um bem cultural e imaterial do Nordeste, do Brasil. E se refletirmos sobre sua história de vida, que o destino lhe impôs decidir entre ser reconhecido como um doutor ou um poeta popular, fica a lição de que nada vale estar acima dos nossos sonhos. Viva Zédantas, imortal, imortal! *Por Aluísio Lessa é deputado estadual pelo PSB. Foi reeleito para o seu terceiro mandato consecutivo. O deputado é presidente da Comissão de Finanças na Alepe.

Homenagem aos 110 anos de Zé Dantas Read More »