O desafio de ser mãe e profissional
Um número cada vez menor de mulheres tem o luxo ou pretensão de serem classificadas como belas, recatadas e do lar na sociedade brasileira. O meme que se espalhou pelas redes sociais no último mês entra em confronto com o contexto social em que 37,3% das mulheres são as principais responsáveis pelo sustento da casa, de acordo com o IBGE. Muitas delas dividem a trajetória de crescimento profissional com a maternidade. Pesquisa do Instituto Sophia Mind indica que 91% delas acredita que é factível sim ser uma ótima profissional e mãe ao mesmo tempo. Na prática, com todo um malabarismo de atividades e gestão dos horários, elas têm mostrado que realmente é possível. Porém pagam um preço alto com a sobrecarga de tarefas e a falta de estruturas de creche. O suporte vez da famílias, em geral das avós. Segundo a consultora da ÁgilisRH, Eline Nascimento, existe uma percepção de que hoje há uma maior divisão nas atividades domésticas entre homens e mulheres. Mas quando se trata das responsabilidades com os filhos, o peso sobre a mãe ainda é grande. “Essa divisão entre o papel de mãe e trabalhadora gera um processo de angústia. Mas a vida profissional é parte da vida da mulher e ela tem que se desculpabilizar”, diz. Para gerenciar com qualidade a carreira e ter o tempo necessário para o cuidado dos filhos, Eline destaca a relevância de mobilizar uma rede de apoio familiar, negociar bem com o parceiro a divisão das atividades e, quando possível, na própria empresa por alternativas como horários mais flexíveis e a possibilidade de realizar parte da carga horária em casa. A boa gestão do tempo é uma das características das mulheres que conseguem crescer profissionalmente sem abrir mão de estar presentes no crescimento dos filhos. A médica Carla Núbia Nunes Borges, 45 anos, já viveu a experiência de amamentar os filhos nos intervalos dos plantões. “Eles me acompanharam muito nos hospitais, principalmente nos finais de semana. Desde pequenos sempre combinamos muito os horários. Eles sofreram muito com essa rotina, mas sempre foram parceiros nessa minha caminhada”, conta a médica. Nessa trajetória, além do trabalho nos hospitais, Carla ainda passou pelo divórcio quando os filhos Lucas, Lara e Luiz tinham respectivamente 10, 8 e 7 anos. Se as responsabilidades aumentaram, ela seguiu crescendo profissionalmente e fez duas especializações e um mestrado em ciência da saúde em paralelo aos empregos. “Foi bem difícil, mas fiz uma escolha. Sofri muito, pois me achava ausente. Mas investi em tempo de qualidade. A vida ficou dividida apenas entre eles e o trabalho. As festas e saída com amigas ficaram em segundo plano, mas não me arrependo”. Mesmo com o tempo restrito, ela se esforçou para fazer ao menos duas refeições por dia com a família, além de aproveitar os finais de semana com os filhos. Férias, aniversários e Dia das Crianças eram motivo de festa. Duas bases de apoio nessa jornada foram a sua mãe e o colégio. Outra profissional da área de saúde que divide trabalho, estudos e a maternidade é Gabriela Félix de Souza, 32. Hoje ela está em transição. É fisioterapeuta, faz faculdade de medicina e tem uma filha de 11 meses, Laura. A chegada da bebê foi planejada. A angústia veio quando voltou à rotina de trabalho e estudante. “Retornar às atividades foi o momento mais complicado de transição. Voltei às aulas quando Laura tinha dois meses. Não sabia se iria dar certo, a criança depende muito da mãe. No começo para sair de casa era bem difícil. Mas sempre deixei com alguma das avós”, conta. Com a volta ao trabalho em paralelo aos estudos, ela só fica com a bebê no começo da manhã e no período da noite. “Reduzi minha carga horária profissional, saí de um hospital, mas mesmo assim me cobro muito pelo fato de estar ausente. A cobrança é muito maior minha que de outras pessoas”. A rotina da pequena hoje é no hotelzinho das 7h às 18h. A mãe, além do emprego e do tempo na faculdade ainda se desdobra para manter os estudos em dia. Muitas vezes usando as madrugadas. As preocupações com os cuidados com os bebês nos seus primeiros meses, quando associados ao acúmulo das funções profissionais e de casa levam muitas mulheres a tensões emocionais mais intensas. “As mulheres entraram no mercado de trabalho, mas os homens não entraram em casa, no cuidado com os filhos, na mesma intensidade. Recebo nos consultórios muitas mulheres com depressão pós-parto ou vivendo muitos conflitos na volta ao trabalho. Elas têm uma sensação subjetiva de responsabilidade do cuidado com o filho que o homem não tem”, afirma o médico Amaury Cantilino, que é professor adjunto departamento de psiquiatria da UFPE e membro da Comissão de Saúde Mental da Mulher da Associação Brasileira de Psiquiatria. Além dessa preocupação com os filhos, o médico relata que a competitividade no mercado profissional, pouco flexível às mães, também angustia as mulheres. “O receio de ter seu espaço preenchido pelo profissional que a substituiu na gestação é muito presente. Nessa volta ao trabalho, com frequência há uma sensação de ameaça no emprego. A necessidade de se ausentar no adoecimento dos filhos, por exemplo, cria nas mães uma impressão de vulnerabilidade da sua empregabilidade”, explica Amaury. Esse dilema dos possíveis prejuízos na competitividade profissional feminina se aqueceu neste ano com declarações do polêmico parlamentar Jair Bolsonaro que defendeu que as mulheres recebessem menos por engravidar. Apesar da chuva de críticas recebidas pelo deputado federal, sua opinião segue sendo uma realidade no mercado de trabalho no Brasil, em que as mulheres ainda ganham 30% a menos que os homens, de acordo com pesquisa do Banco Interamericano de Desenvolvimento. Esse preconceito com as mulheres tem retardado as gestações e levado também à recusa da maternidade. Resultado disso é que no Censo 2010, 20% das famílias não tinham filhos. No Censo 2000 eram 14% das famílias nessa situação. MÃE E PARLAMENTAR. A deputada estadual Priscila Krause dividiu os últimos anos da sua vida parlamentar
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