Por Francisco Cunha Ao falar recentemente no encerramento de uma homenagem que recebi, junto com Ana Paula Vilaça (Chefe do Gabinete do Centro do Recife), feita pela ADVB-PE (Associação do Dirigentes de Vendas e Marketing do Brasil, secção Pernambuco), tive oportunidade de dizer que o Centro do Recife tem jeito, sim! E disse mais: quem diz que não tem jeito é que não tem jeito. Digo isso com base na minha experiência pessoal de 25 anos, como consultor da CDL/Recife (Câmara dos Dirigentes Lojistas do Recife), de luta cotidiana, cidadã, sem quartel como dizem, pela recuperação da região central da nossa capital. Disse também que na maior parte desse percurso o sentimento que tínhamos era de frustração por não conseguir impedir a decadência. Talvez tenhamos apenas ajudado a frear um pouco o ritmo da queda… Então, depois de mais de meio século de um processo contínuo, intenso e progressivo de abandono e decadência, o Centro do Recife tem sido objeto, na atual gestão municipal, de uma atenção organizada em torno de, pelo menos, três vertentes: (1) um programa de incentivos fiscais para ações de recuperação predial (chamado de Recentro); (2) uma instância de gestão territorial da região central (chamado de Gabinete do Centro – Gabcentro); e (3) um plano estratégico de desenvolvimento integrado de médio e longo prazos (chamado de O Centro na Rota do Futuro). São vertentes que se completam na medida em que o Gabinete do Centro articula tanto as ações relacionadas aos incentivos como as demais relativas à zeladoria e à animação dos espaços decaídos (alguns “detonados”, mesmo). O que não é, diga-se de passagem, nada fácil por conta, não só do imenso passivo acumulado mas, também, por ser uma atuação totalmente contraintuitiva numa gestão municipal estruturada há séculos para agir verticalmente pela cidade inteira e, nunca, num território específico e delimitado como o Centro. Trata-se, em última instância, de uma contradição entre a chamada gestão funcional e a gestão territorial, o que resulta num problema de natureza cultural, de mindset como dizem os consultores americanófilos. No que diz respeito ao indispensável plano estratégico de longo prazo que está sendo ultimado, tive oportunidade de dizer também que o destino quis que eu me encontrasse presidente do Conselho de Administração da organização social Aries (Agência Recife para Inovação e Estratégia) quando ela foi demandada pela Prefeitura do Recife para, com base em sua experiência de ter coordenado a elaboração do Plano Recife 500 Anos, coordenar a elaboração do plano de longo prazo do Centro. Esse plano é justamente a peça-chave que ainda está faltando para que se complete o desenho do arranjo estratégico-organizacional capaz de colocar a recuperação do Centro numa trajetória virtuosa e, fazendo figa, irreversível. Neste contexto, o plano deve funcionar como uma espécie de software para o hardware do Gabinete do Centro. Isso porque é indispensável um instrumento que possa tratar de forma consequente, não só a orientação das ações relevantes para a construção do futuro da recuperação da região central da cidade como, também, possa dar conta do tratamento das assimetrias estruturais do processo em curso. O estágio de recuperação do Bairro do Recife, por exemplo, é completamente diferente daquele dos bairros da chamada Ilha de Antônio Vaz (Santo Antônio, São José, Cabanga e Joana Bezerra), em especial Santo Antônio que se encontra numa espécie de “fundo do poço” do processo de decadência. No que diz respeito ao Bairro do Recife, não é despropositado dizer que o “Cabo da Boa Esperança” da recuperação já foi cruzado. Que o digam os investimentos estruturadores que estão sendo feitos lá como, por exemplo, o Moinho Recife, ao norte, e o Hotel Marina e o Centro de Convenções, ao sul, que, ainda que situado tecnicamente no Bairro de São José, do ponto de vista de influência territorial pode ser considerado como englobado pelo Bairro do Recife. E tudo isso precisa ser adequada e estrategicamente endereçado para que o tratamento consequente dessas assimetrias possam resultar em maior sintonia da recuperação geral. É, justamente, por este conjunto de coisas e iniciativas virtuosas que disse no dia da homenagem (e reforço aqui também) que o Centro do Recife não só tem jeito como esse jeito está em curso na contramão da trajetória de degradação das últimas décadas. Disse ainda que, embora a recente trajetória esteja, de fato, em curso, a sua manutenção depende do apoio de todos os recifenses de boa vontade e que querem sinceramente o bem da cidade e do seu extraordinário centro histórico, talvez o mais extraordinário dos pontos de vista histórico, cultural e paisagístico do País, excetuando-se, talvez, o do Rio de Janeiro que foi capital da colônia, do Império e de boa parte da República. E disse que a primeira coisa a fazer neste sentido é não falar nem permitir que se fale depreciativamente que o Centro não tem jeito. Cheguei mesmo a dizer que, quando ouço algo do gênero, digo ao interlocutor que quem não tem jeito é quem diz que não tem jeito. Certamente não é uma atitude que se possa definir como um primor de etiqueta mas a causa é maior porque se muita gente ficar espalhando que não tem jeito, aí, de fato, não terá jeito mesmo e, então, teríamos perdido nosso extraordinário Centro para sempre. E não podemos deixar que isso aconteça, de jeito nenhum, sobretudo quando o círculo virtuoso da recuperação deu a partida que precisava ser dada. Precisamos fazer o que estiver ao nosso alcance para que ela seja, de fato, definitiva e irreversível. *Francisco Cunha é arquiteto, consultor empresarial e sócio da TGI