Poder público do Nordeste avalia ameaças ao Rio São Francisco
*Por Marcos Miguel Há quase seis meses do rompimento da barragem B1 da empresa Vale S.A., em Brumadinho (MG), os olhares do Poder Público voltam-se agora para uma vítima em potencial da tragédia: o Rio São Francisco. Estudos da Fundação Joaquim Nabuco e da organização não governamental SOS Mata Atlântica apontam para a contaminação do leito do Velho Chico; hipótese negada pelos órgãos oficiais que acompanham o caso, como o Instituto Mineiro de Gestão das Águas (Igam) e a Agência Nacional das Águas (ANA). Para apurar a questão in loco, foi criada uma Comissão Parlamentar na Câmara de Vereadores de Petrolina, Sertão de Pernambuco. Lá, o rio exerce um papel central na economia: são as águas do Velho Chico que irrigam mais de 120 mil hectares de terra, nos quais são produzidos, predominantemente, uvas e mangas. Entre os dias 16 e 23 do último mês de março, o grupo de trabalho foi às Câmaras de Vereadores de Brumadinho, Três Marias e Belo Horizonte para provocar as autoridades mineiras. Integrante do colegiado, a vereadora Cristina Costa (PT-PE) avalia o cenário encontrado na visita técnica como “gravíssimo”. “O que mais me chamou a atenção foi o estado dos rios de Minas Gerais. Vários afluentes que desaguam no São Francisco estão comprometidos, como o Paraopeba. Observamos uma grande quantidade de resíduos, oriundos do rompimento da barragem”, lamenta a parlamentar. Segundo ela, o problema tem ainda um viés político. “Quem manda no Estado de Minas Gerais é a Vale. Infelizmente, o Parlamento Estadual e as prefeituras estão vinculadas à empresa. Todo mundo fica esperando os royalties dos minérios”, denuncia Cristina. Também vereador do município, Gilmar Santos (PT-PE) criticou a atuação do Poder Público em prol do São Francisco. “A maneira como os governos têm, historicamente, tratado o rio é motivo de diversos questionamentos. Parte dele foi privatizada. Diversas empresas estão interferindo na qualidade da água. O nosso modelo de desenvolvimento está focado mais em negócios, tendo a água como recurso, do que em responsabilidade social. Não é um projeto inclusivo e responsável”, avalia Santos. As casas legislativas dos Estados que compõem a Bacia Hidrográfica do São Francisco também estão se mobilizando em torno do tema. A Assembleia Legislativa de Pernambuco (Alepe) instituiu, em fevereiro deste ano, uma Frente Parlamentar em defesa do rio. Ao longo do primeiro semestre, a equipe promoveu quatro audiências públicas em diferentes cidades pernambucanas: Recife, Cabrobó, Floresta e Petrolina. Os debates podem contribuir para o endurecimento da legislação ambiental em vigor, na avaliação do coordenador da Frente, deputado Lucas Ramos (PSB-PE). Todo o material coletado até o momento será compartilhado com os demais governadores da região Nordeste. “Além disso, vamos acionar outras assembleias para que discutam a saúde e o futuro do rio em um colegiado exclusivo. As câmaras municipais também serão contactadas. Os vereadores têm um papel fundamental nesse processo de cobrança e de fiscalização do Poder Público, quando esse deixa de realizar ações de preservação do meio ambiente”, avalia Ramos. Em Alagoas, a Comissão de Meio Ambiente do Poder Legislativo estadual (ALE-AL) está engajada no assunto. O colegiado vai ouvir especialistas e representantes da sociedade civil em audiência pública, em data ainda a ser definida. Para o presidente do colegiado, deputado Davi Maia (DEM-AL), cabe à casa legislativa avaliar soluções para que as comunidades ribeirinhas sejam o menos afetadas possível pela contaminação do rio, bem como o ecossistema. Já na Bahia, a Comissão de Meio Ambiente, Seca e Recursos Hídricos da Assembleia Legislativa (ALBA) vistoriou a barragem de Pinhões, em Juazeiro, no dia 15 de abril deste ano. Situada na Bacia do São Francisco, a obra está em estado de atenção, de acordo com o Relatório de Segurança de Barragens (2017), da ANA. Na visita de inspeção, o colegiado concluiu que a estrutura do empreendimento está íntegra e não oferece risco. Porém, o Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (Dnocs), órgão gestor da barragem, alega não possuir recursos para as manutenções necessárias. O presidente da Comissão, deputado José de Arimatéia (PRB-BA) deve arrecadar o capital por meio de emendas parlamentares. A saúde do Velho Chico ainda vem sendo tratada pela Assembleia Legislativa de Sergipe (Alese) nos últimos quatro anos. Em março de 2016, a instituição fez um levantamento sobre a realidade do rio, em audiência pública. Em maio do mesmo ano, a então presidente da Frente Parlamentar de Meio Ambiente, Segurança Alimentar e Comunidades Tradicionais, deputada Ana Lúcia Vieira (PT-AL), denunciou os impactos do assoreamento do rio para o abastecimento hídrico da Grande Aracaju. Outros problemas foram evidenciados, como a grave proliferação de vermes, em 2017. Em setembro daquele ano, a Frente Parlamentar Ambientalista promoveu audiência pública no município de Canindé do São Francisco, no qual avaliou desafios e alternativas para garantir a sustentabilidade do rio. Após a tragédia de Brumadinho, a deputada Maria Mendonça (PSDB-SE) expressou, em Plenário, preocupação com a contaminação da Bacia. “O São Francisco é responsável pelo abastecimento de alguns Estados e pelas vidas de todos os seres vivos que precisam de sua água”, advertiu a parlamentar, à época. Em Minas Gerais, tramitam na ALMG dois projetos de lei que podem contribuir para a preservação do Velho Chico. Um deles é o PL nº 79/2019, de autoria da deputada Ana Paula Siqueira (REDE-MG), que institui o “Corredor Ecológico do Vale do Mutuca”. A proposta cria unidades de conservação que interligam as Bacias do Rio das Velhas e do Rio Paraopeba – este último, um dos principais afluentes do São Francisco. Tais unidades incluem a vegetação florestal, a mata ciliar e o lençol freático da Bacia do Córrego do Mutuca. Ainda segundo a matéria, o zoneamento dessas áreas deve estabelecer medidas que assegurem o manejo adequado, além das proibições e restrições de uso já previstas em lei. Publicado no último 2 de fevereiro, o projeto foi distribuído para as comissões de Justiça e de Meio Ambiente e aguarda parecer desses colegiados. O outro é o PL nº 98/2019, apresentado pela mesma parlamentar, que altera a redação da Política Estadual de Recursos Hídricos de
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