“A padroeira da Argentina, Nossa Senhora de Luján, é brasileira”
Sergio Gomez Tey, padre argentino conta a história da imagem da Virgem, esculpida no Brasil e que se tornou conhecida por operar milagres, e do escravizado Manoel, trazido da África para o Recife, que cuidava da santa e que é alvo de um movimento para ser beatificado. Uma história ainda pouco conhecida de Nossa Senhora de Luján, a padroeira da Argentina, tem ligações com o Brasil, mais especificamente com o Recife, e envolve pessoas de diferentes nacionalidades. Ela começa com Manoel, um escravizado africano, comprado por André João, um mercador português que levava um carregamento de navio para a Argentina. Além de mercadorias, André levou Manoel e uma imagem de Nossa Senhora da Conceição, para atender ao pedido de um outro português que morava no país vizinho. Mas antes que a Virgem chegasse ao seu destino, ocorreu um milagre, que fez com que a imagem e Manoel permanecessem juntos numa localidade às margens do Rio Luján. O padre argentino Sergio Gomez Tey participa das ações para beatificar Manoel, a partir de relatos de que ele curava pessoas com o azeite da lamparina que iluminava a santa. Ele e outros religiosos argentinos realizaram uma peregrinação de Aparecida do Norte (SP) até o Recife para tornar a história do escravizado conhecida, para que mais pessoas invoquem a sua ajuda e, ao fazer isso, possam ocorrer mais milagres. Na capital pernambucana os peregrinos foram recebidos por Dom Paulo Jackson, recentemente empossado como arcebispo de Olinda e do Recife que, na ocasião, celebrou sua primeira missa na nova função em Jaboatão dos Guararapes. Nesse período o Recife e e Luján tornaram-se cidades-irmãs. Isso quer dizer que haverá cooperação mútua em áreas como turismo, cultura, comércio e desenvolvimento social. Nesta entrevista a Cláudia Santos, padre Sergio conta a história do milagre de Luján, diz estar agradecido pela acolhida no Recife e que está esperançoso com o processo de beatificação de Manoel. “Agora é um tempo favorável, o Papa Francisco tem uma imagem pequena de Manoel no seu altar (...) e tem uma forte preocupação com as novas formas de escravidão contemporâneas, que seguem sendo como uma peste na humanidade”. Gostaria que o senhor explicasse quem foi Manoel e qual a importância dele em transformar a Nossa Senhora de Luján na padroeira da Argentina. Manoel foi um escravo que veio da África para Pernambuco e foi comprado por um navegador português chamado André João. Em 1630, ao transportar mercadorias para a Argentina, André João levou Manoel que logo foi cedido a outro homem que se chamava Barnabé González Filiano. André João trabalhava com mercadoria, que muitas vezes era contrabando. Quando chegou ao Porto de Buenos Aires teve a mercadoria confiscada e apreendida. Filiano era um homem que tinha muito dinheiro, o que lhe permitiu pagar uma a fiança e liberar a mercadoria trazida do Brasil. É possível que essa ajuda que recebeu de González Filiano tenha incentivado André João a ceder o escravo para Filiano. O que sabemos é que o escravo Manoel passa a ser propriedade de González Filiano. Veja que a imagem da Nossa Senhora da Conceição é igual à de Nossa Senhora de Aparecida: tem 38 centímetros de altura e é feita de terracota. André João tinha que levar esta imagem, que lhe havia pedido outro português que vivia no interior da Argentina. Mas antes, passou pela fazenda [Rosendo] de González Filiano que ficava a 70 km de Buenos Aires junto ao Rio Luján. Lá eles pernoitaram e traziam muitas carroças de bois que levavam as mercadorias para o norte da Argentina. Pela manhã, quando quiseram seguir caminho, a carroça onde estava sendo levada a imagem de Nossa Senhora não se move, ficou parada. Tiraram algumas caixas pesadas, mas continuou sem se mover. Eles então tiram uma caixa pequena, onde estava a imagem. Quando a caixa com a imagem sai da carroça, ela começa a se mover. Mas quando devolvem a caixa com a santa, a carroça, outra vez, fica sem sair do lugar. Todos que estavam em volta da carroça disseram na hora: “Nossa Senhora quer ficar neste lugar”. E isso é o que se conhece como o milagre de Luján. A imagem permanece naquele lugar e junto com ela fica Manoel. Como foi testemunha do milagre, o deixam na fazenda para que cuidasse da imagem. Este é o vínculo entre Manoel e Nossa Senhora de Luján. A imagem passa a ser assim chamada, porque o milagre havia ocorrido junto ao rio que tem esse mesmo nome. Manoel ficou 40 anos cuidando da imagem. Quando os milagres operados por Manoel começaram a acontecer? Manoel colocava uma lamparina de azeite para iluminar a imagem, que sempre ficava acesa. Quando chegava gente enferma, Manoel ungia essas pessoas com o azeite da lamparina e elas se curavam. O milagre mais forte que se tem na história escrita foi quando recebeu um sacerdote chamado Pedro Montalbo, que chegou quase morto e Manoel com o azeite da lamparina o curou. Manoel lhe disse que a Virgem queria que ele fosse o sacerdote daquele lugar. Até esse momento não havia nenhum padre naquela localidade. Ele concordou. Este milagre acontece não na fazenda Rosendo, mas em outro lugar para onde a imagem foi levada. Isto porque uma mulher, Maria de Matos, compra a imagem e a transporta para sua fazenda a uns 30 km também à margem do Rio Luján. Mas, por duas vezes, a imagem volta ao lugar do milagre [fazenda Rosendo] de maneira extraordinária. Então, Maria de Matos disse: “Vou a Buenos Aires ver o bispo e vou lhe pedir conselho sobre a imagem”. E o bispo responde: “vamos fazer uma procissão desde o lugar do milagre até o local onde você quer que a imagem esteja”. Ela já havia feito a promessa de fazer uma capela em devoção à Nossa Senhora. A procissão teve a participação de muita gente, inclusive de Buenos Aires e dos arredores. Buenos Aires era uma pequena cidade nessa época. E nessa peregrinação foi também Manoel e, como ele vai, a
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