O coronel que virou história

Um resgate de parte da história pernambucana está sendo feito pela arquiteta Juliana Cunha Barreto. Ela pesquisa a vida do coronel Othon Lynch Bezerra de Melo, industrial que marcou época ao construir um império de fábricas têxteis. Othon também ergueu a rede hoteleira de alcance internacional que levou seu nome. Além da biografia, Juliana prepara uma pesquisa sobre o casarão onde morou o coronel e sua família localizado na Av. Rui Barbosa, no bairro das Graças. O palacete, por sinal, será a sede da edição da Casa Cor deste ano em Pernambuco, badalado evento da área de arquitetura e decoração.
A incursão da arquiteta na vida do arrojado empresário começou quando realizou, pelo governo do Estado, o projeto de restauração da antiga Fábrica da Macaxeira que pertenceu ao coronel. A edificação foi recuperada para abrigar a Escola Técnica Estadual Miguel Batista, um trabalho em que Juliana precisou mergulhar no Recife de fins do Século 19 e das primeiras décadas do Século 20 para não perder as características arquitetônicas e históricas do local. Afinal, elas representam a memória de uma indústria emblemática que deu origem ao bairro da Macaxeira. “A pesquisa resultou no livro Nos teares da história- Entre a fábrica e a escola, uma restauração, lançado na Fliporto no ano passado. Na ocasião a família do coronel Othon se interessou em continuar a pesquisa e me pediu para fazer a biografia dele”, conta a arquiteta.
Nascido em Limoeiro, Othon já trazia no DNA a vocação para o ramo têxtil. Seu pai construíra um patrimônio graças aos negócios de armazém de algodão e tecidos naquela cidade do Agreste. Juliana ainda não sabe precisar ao certo porque o chamavam de coronel. “Uma das hipóteses é que era dessa maneira que se referiam às pessoas influentes da elite nas décadas de 1910 e 20”, supõe.
Ao chegar ao Recife em 1905, Othon abriu a primeira loja de tecidos na Rua da Cadeia (atual Marquês de Olinda). Os negócios foram prosperando e em 1925 adquiriu a Fábrica de Apipucos. “Era pequena e obsoleta. Mas ele comprou 50 hectares do seu entorno para ampliá-la”, revela a arquiteta. No terreno, o industrial construiu a vila operária para a residência de seus trabalhadores. Também montou um aparato urbanístico de apoio aos trabalhadores, como escola, igreja, clube de recreação, lojas de armazém, cinema, posto médico e dentário. “A infraestrutura representava um mecanismo de controle da mão de obra fabril, contribuindo para que o operariado permanecesse próximo à fábrica”, explica Juliana, acrescentando que a iniciativa também garantiu admiração dos empregados ao coronel Othon.
Ele teve ainda outras três fábricas no Recife, além de unidades em outros Estados. Carismático, influente, membro do Instituto Arqueológico, Othon costumava escrever artigos para os jornais. Seu império foi erguido ao longo da linha férrea que ligava Limoeiro, onde ficavam as plantações de algodão, ao Recife. O trem passava pela Av. Norte onde se localiza a Macaxeira e seguia para Forte do Brum e de lá se distribuía para as linhas do Centro onde estavam seus armazéns.  Num deles, em seus andares superiores, Othon montou em 1917 o primeiro empreendimento voltado para hospedagem. Ao se mudar para o Rio de Janeiro, investiu no setor, criando a rede Othon, com atuação em várias cidades do País e no exterior. “Mas ele gostava do Recife”, ressalta Juliana. Em 1948 volta à capital pernambucana porque queria morrer em Pernambuco. “No dia em que ele morreu quis fazer um passeio pelo Recife para levar na memória as suas paisagens”, relata a arquiteta.
CASA. Em paralelo à biografia de Othon, Juliana pesquisa o casarão onde o empresário morou com a mulher Maria Amália e seus 11 filhos. Dados preliminares da pesquisa foram encaminhados à organização da Casa Cor. Uma curiosidade é o fato de o palacete representar um período no qual o Brasil – Pernambuco incluído – queria se modernizar. Assim, casarões coloniais eram reformados e transformados em residências no estilo eclético, o que mereceu críticas de algumas vozes regionalistas da cidade.
Além da modernização, a mudança também tinha como objetivo atender as premissas do Plano de Saneamento do Recife, de autoria do engenheiro Saturnino de Brito, cujas medidas previam sistemas de abastecimento d´água e de esgotamento sanitário para a cidade e, consequentemente, para as habitações. “O imóvel foi submetido a obras de reforma e ampliação, para fins de modernização estética, mas também de higienização dos compartimentos internos, dado as demandas de saneamento, vigentes com os novos códigos municipais”, explica a arquiteta.
Para realizar a mudança, Othon contratou o arquiteto de Giácomo Palumbo. Graduado na Academia de Belas Artes da França, Palumbo tem entre seus projetos o Palácio da Justiça e o prédio da antiga Escola de Medicina, no Derby.  Colunatas centrais, arcadas laterais ao gosto eclético e uma varanda foram introduzidas, camuflando a imagem primitiva do sobrado. A residência recebeu ainda ladrilhos no piso, com estampas e combinações diversas para cada ambiente, além de vitrais nas paredes, e uma escada monumental.
Cenário de fotografia, de encontros familiares e eventos festivos, o casarão chegou a receber os irmãos Kennedy, nos anos de 1960, quando os políticos norte-americanos receberam a bênção do bispo. O casarão tem sido conservado pelos descendentes do coronel, embora hoje esteja desabitado. Mas com tantas histórias que a edificação evoca, seria interessante que fosse alvo de um projeto cultural que propiciasse a visita pública para além da Casa Cor.

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