Recife tem mais de 100 riachos, sabia?

Quem anda pelas ruas do Recife não se dá conta de que a cidade possui mais de 100 riachos urbanos. Mas esse desconhecimento não ocorre por acaso. Cortada por três grandes rios (Capibaribe, Beberibe e Tejipió), a cidade viu nas últimas décadas vários dos seus pequenos cursos d’água serem canalizados. Transformados em esgotos, alguns a céu aberto, eles são um dos primeiros lugares a alagar em dias de fortes chuvas.

Integrantes do Grupo de Pesquisa de Recursos Hídricos da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco) estudam, há 11 anos, a possibilidade de renaturalização e revitalização desses riachos. Revitalizar todos seria uma tarefa para 30 anos, na análise dos pesquisadores. No entanto, alguns trechos estão sendo priorizados no estudo para uma resolução de prazo mais curto. Os riachos do Parnamirim (que corta o bairro de mesmo nome), do Cavouco (que passa pela UFPE, na Várzea) e o do Sítio dos Pintos (vizinho à UFRPE, passando pelas comunidades de Sítio dos Pintos e do Córrego da Fortuna) são estudados para um projeto piloto de recuperação.

De acordo com o engenheiro civil e professor da UFPE e da UPE (Universidade de Pernambuco), Jaime Cabral, a pesquisa avaliou a qualidade da água, fauna e flora, possibilidade de uso para transporte, estética, entre outros aspectos. “No século 19, os nossos rios e riachos eram respeitados. No século 20, com a priorização da cidade para o carro, eles foram massacrados. Hoje o nosso desafio é revitalizá-los e reverter esse processo que foi negativo para o Recife”, comenta o coordenador do grupo que tem integrantes com formação multidisciplinar.

Riacho do Parnamirim. Para revitalizar esses cursos d’água, grupo de pesquisadores lança projeto de recuperação. Foto: Tom Cabral

O especialista lembra que esse fenômeno não foi apenas local, mas que cidades do mundo inteiro passaram por experiências de canalização dos seus cursos d’água, chegando até a cobri-los com laje em alguns casos, como na Alemanha e França. Em muitos desses lugares, no entanto, o poder municipal conduziu um processo de reversão dessas medidas, devolvendo ao espaço público o seu leito natural.

Poluídos, sem vegetação costeira e, na maioria das vezes, sem calçadas nas suas margens, esses riachos são invisíveis para a população enquanto ativos ambientais. Ou, ainda pior, são vistos apenas como local de destinação de lixo e dejetos e conhecidos pelo mau cheiro. Apesar do estágio de degradação elevado em que se encontram atualmente, Cabral chegou a fotografar quelônios (tartarugas ou cágados) no trecho do riacho ao lado do Shopping Plaza. Um sinal de que, mesmo diante de toda contaminação, ainda há vida neles.

SEM ESGOTOS
A transformação desse quadro, na análise de Cabral, perpassa principalmente por iniciativas de limpeza, educação ambiental e de intervenções urbanísticas que humanizem esses lugares. A construção de ciclovias e calçadas, a dotação de pequenas áreas com grama nas margens e o fim da descarga de esgotos nos canais são algumas das medidas reivindicadas pelo grupo de pesquisa. Parte delas já conta com articulações sólidas junto ao poder público e a iniciativa privada.

O riacho que está em estágio mais avançado em proposições de intervenção é do Parnamirim, que tem cerca de um quilômetro de extensão correndo a céu aberto. As diretrizes desse projeto têm o objetivo de melhorar a calha de forma a auxiliar a drenagem das águas pluviais, qualificar o transporte de ciclistas e pedestres nas suas margens, recuperar a fauna e flora local, possibilitar uma área de lazer e criar um espaço de educação ambiental.

O especialista avalia que se trata de um trecho com grande possibilidade de ser revitalizado. “Há condições muito favoráveis, passa por um lugar nobre da cidade. Seria muito bom conseguir deixá-lo com vegetação, possibilitando às pessoas caminharem nas suas margens. Há uma comunidade carente que mora no percurso do riacho, mas que foi contemplada com um habitacional construído na região”, conta o especialista sobre a comunidade Lemos Torres.

O projeto contempla a área que começa na Rua Jerônimo de Albuquerque (que passa ao lado da Igreja de Casa Forte), cruza a Rua Samuel Lins (que é continuação da Rua da Harmonia), chegando à comunidade Lemos Torres e à rua do mesmo nome. Por fim, o riacho passa ao lado do McDonald’s, Shopping Plaza e deságua no Rio Capibaribe. Com essa extensão, não é difícil compreender o significado do seu nome em tupi: mar pequeno (paranã = mar e mirim= pequeno).

Já houve uma reunião entre o grupo e a Compesa há dois anos para retirada do esgoto no trecho. Houve uma promessa da companhia para resolução do problema por meio da PPP do Saneamento, de acordo com o professor.

Esse riacho, que dá nome ao bairro da Zona Norte, foi inclusive utilizado no século 17 pelos holandeses, na ocasião da Batalha de Casa Forte. Nas suas margens está também o Largo do Holandês, que é alvo de um movimento popular de revitalização do espaço, que fica na confluência das ruas Samuel Lins, bairro de Casa Forte, e Harmonia, em Casa Amarela.

“O Riacho Parnamirim pode ser um projeto piloto de revitalização que pode posteriormente ser aplicado em outros riachos resgatando o meio urbano da cidade de Recife”, defende Jaime Cabral. Ele projeta fortalecer a defesa da revitalização desses cursos d’águas da capital pernambucana em sintonia com outros projetos de longo prazo, como o Recife 500 anos e o Parque Capibaribe.

*Por Rafael Dantas, repórter da Revista Algomais (rafael@algomais.com)

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