Um intelectual a serviço do Reino de Deus

Jerônimo Gueiros, nasceu numa família de 12 filhos, sendo o filho homem mais novo, do casal Francisco de Carvalho Silva Gueiros e Rita Francisca Barbosa da Silva. Nasceu no dia 30 de setembro de 1880, dia esse, dedicado a “São Jerônimo”, na localidade de Queimadas de Santo Antônio (Jurema), município de Quipapá (PE). O pai de Jerônimo descendia de uma antiga família pernambucana com raízes na região de Garanhuns. O avô de Francisco, Manoel da Silva Gueiros, foi o primeiro a ter esse sobrenome, uma possível corruptela de Queiros. Jerônimo assim como todos da família não teve uma vida fácil, pelo contrário, os filhos mais novos de Francisco de Carvalho Silva Gueiros, após a abolição da escravatura, e a perda da mão-de-obra familiar, foram obrigados a trabalhar como marceneiros, para o sustento da família.
Jerônimo também trabalhou de cigarreiro, chegando a fabricar 1,2 mil cigarros em um só dia. Além das condições humildes, Jerônimo assim como os seus irmãos, eram adeptos entusiastas das farras semanais e das bebidas alcoólicas. Na realidade, Jerônimo já no início da adolescência, tinha uma vida desregrada, entregando-se à bebida e aos jogos de azar. O historiador David Vieira lembrando dessa época, diz que, “sua frustração com a vida que levava, foi provavelmente o que levou ao vício das bebidas alcoólicas e a jogatina, tendo se tornado um jogador profissional, aos 13 anos de idade. Todavia, Jerônimo converteu-se ao Protestantismo, através dos esforços do trabalho realizado pelo Rev. George W. Butler e da sua esposa, Rena Butler, um casal de missionários norte-americano, os quais chegou em Garanhuns no final do século dezenove, mas especificamente, no ano de 1895. Na realidade, esses foram a primeira grande influência que Jerônimo Gueiros teve em sua vida, de evangélico e de intelectual. Após a sua conversão, Jerônimo passou a ter gosto pelos estudos e, foi aos pés dos Butlers que ele começou a sua carreira acadêmica.
Vieira lembra que: “Nos três primeiros anos que estudou com D. Rena Butler, de 1895 a 1898, entre outras matérias, aprendeu o inglês. Isto o habilitou a consultar livros naquela língua, que lhe abriram um amplo leque de informações, não disponíveis a alguém que fosse apenas monoglota, especialmente em um Brasil daquela época, tão carente de livros didáticos, e de literatura erudita de todos os tipos. […] Mrs Butler recordava como Jerônimo, ainda menino e estudando com ela, constantemente vinha buscar auxílio na leitura dos textos em inglês, perguntando: Mama Butler, o que quer dizer isso? Em seguida, continuou os seus estudos na primeira escola paroquial, criada pelo pastor Martinho de Oliveira […].”
A ordenação para o ministério pastoral, aconteceu no dia 15 de setembro de 1901, pelo presbitério de Pernambuco, como pastor da Igreja Presbiteriana do Brasil. Dr. Butler em uma de suas correspondências chega a mencionar a aparência física do seu discípulo e da sua postura no púlpito, pois, segundo ele, Jerônimo era “alto, esbelto, de pele alva, de maneira autoritária no púlpito, porém humilde”.
Devido a sua importância no mundo acadêmico, bem como, o seu destaque no âmbito ministerial, Jerônimo, por esses motivos, passou a ganhar alguns adjetivos que refletiam o seu perfil. Esses adjetivos dependiam da localização geográfica, por exemplo, entre os evangélicos do Norte era conhecido como A Águia do Norte. Entre os do Sul, talvez por ser pernambucano, era conhecido como O Leão do Norte. Ambas essas denominações sublinhavam o grande poder de suas palavras, como pregador e orador, jornalista e polemista.
Devido a sua grande influência e capacidade não tardou para que naturalmente, Jerônimo se destacasse e chamasse a atenção até mesmo do governador pernambucano. Em 1920, o então governador de Pernambuco, o Dr. José Bezerra Cavalcanti, o convida para dirigir a Escola Normal Oficial do Estado, da qual, além de diretor, foi docente de História da Civilização.
Quando eleito para ocupar uma das cadeiras na Academia Pernambucana de Letras, ocupada anteriormente pelo patrono, o general Abreu e Lima, Jerônimo, no seu discurso de posse, demonstra ter total consciência da relevância do seu papel social, relembra as suas origens, mas, não se furta de externar publicamente a sua missão primordial, que segundo ele mesmo, era pregar o Evangelho: “[…] Senhores acadêmicos: Há alguma coisa que nos irmana e nos vincula nesta oficina de luz. Somos todos sonhadores de alguma coisa além da vida com seus pendores subalternos. Vivemos do ideal com que sonhamos. Pelo menos, minha vida tem sido uma urdidura de sonhos em que sobressai minha tendência associativa com escopo superior. E todos os meus sonhos objetivaram-se em doces realidades, tanto quanto o permitiram a contingência e relatividade das cousas humanas. Sonhei, primeiro, na obscuridade da minha vida sertaneja, no meio da pobreza extrema de rude operário, com ilustrar-me para fazer-me afanoso obreiro espiritual, de modo a poder levar a minha gente o influxo do Livro que inspirou a civilização das maiores potências do Velho e Novo Mundo. E o sonho foi realidade. Através de trinta anos, desdobro, ininterruptamente, minha atividade espiritual com a profunda convicção que me levará ao seio de Deus e com esse entusiasmo crescente e insopitável que a fé inspira e me faz exclamar com o apostolo dos gentios: “Ai de mim, se eu não evangelizar!”.
Jerônimo Gueiros morrera no dia 07 de abril de 1953. A morte do Reverendo Jerônimo Gueiros foi sentida no meio intelectual pernambucano, não só porque pertencia à Academia Pernambucana de Letras, ao Instituto Arqueológico, Histórico e Geográfico de Pernambuco, além de várias associações culturais brasileiras e estrangeiras e, assim, conseguira firmar, com sua personalidade, o caminho de uma obra literária de grande valor e que, vale salientar, expressava forte teor humanista.
Após a notícia da sua morte, não custou para que todos os jornais locais, e ainda outros, até mesmo fora do estado de Pernambuco, lamentassem a sua triste partida. No Diário da Noite, datado em 7 de abril de 1953, encontramos a seguinte afirmação: “A sociedade do Recife está de luto. Faleceu o professor Jerônimo Gueiros, respeitável figura de homem de bem, espécie de patriarca austero, fundador de uma família ilustre e numerosa. Dizemos fundador no sentido da projeção social, porque o professor Jerônimo Gueiros teve uma origem humílima, que ele não escondia, mas de que falava com orgulho.”
Pinho Borges e Mirian Machado relembram em poucas palavras, quem foi Jerônimo Gueiros e as homenagens que lhe foram feitas: “[…] foi administrador, ativista, conferencista, contista, cronista, docente, educador, escritor, ensaísta, ficcionista, filólogo, jornalista, literato, memorialista, orador, pastor presbiteriano, pensador, pesquisador, poeta, polemista, produtor cultural, e tem seu nome mencionado no Dicionário Bibliográfico de Poetas Pernambucanos, de Lamartine Morais e no Dicionário Bibliográfico Regional do Brasil, de Mário Ribeiro Martins. O reverendo Jerônimo fez história e, como gratidão, a história reverencia o seu nome em instituições educacionais e vias públicas como: Escola Professor Jerônimo Gueiros localizada em Garanhuns (PE); Escola Professor Jerônimo Gueiros, em São José, também em Garanhuns; o Instituto Presbiteriano Jerônimo Gueiros; Grupo Escolar Jerônimo Gueiros, em Jagubarro Vermelho em Natal (RN); Escola Estadual Jerônimo Gueiros, em Natal (RN). Tanto em Pernambuco quanto no Rio Grande do Norte, logradouros públicos receberam o seu nome, como a Rua Jerônimo Gueiros, na Encruzilhada, em Recife; na Região Metropolitana do Recife, encontramos a Rua Jerônimo Gueiros, na cidade de Abreu e Lima; Rua Pastor Jerônimo Gueiros, em Tirol, na capital potiguar; e o Edifício Jerônimo Gueiros, anexo a Igreja Presbiteriana da Boa Vista.”
Durante meio século o Reverendo Jeronimo não foi apenas um exímio pregador, mas exerceu marcante e decisiva influência na vida cultural e social de Pernambuco, quer como professor, quer como diretor da Escola Normal, quer como presidente da Academia Pernambucana de Letras, quer como intelectual dos mais primorosos e destacados.

(Por José Roberto de Souza)

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