Rafael Dantas, Autor em Revista Algomais - a revista de Pernambuco - Página 435 de 435

Rafael Dantas

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Minhas fotos do Recife e a esperança

Sempre gostei de tirar fotos. No início, usava uma máquina não sofisticada em viagens. Já na era digital, troquei por uma pequena sem filme mas me via invariavelmente entediado e, não raro, exasperado, às voltas com negativos, revelações e álbuns, e, depois, com os terríveis arquivos digitais, sempre desaparecidos em disquetes, HDs, CDs, pen drives e nuvens ermas... Até que, às vésperas de uma viagem ao oriente, recebi um iPhone 4 e viajei com ele e minha câmera digital. A partir dessa viagem, a câmera convencional foi definitivamente aposentada. Mais ou menos na mesma época, o amigo Bruno Queiroz, praticamente me forçou a entrar nas redes sociais alegando, diante da minha desconfiança, que eu tinha muito o que dizer nelas... Primeiro o Twitter, depois o Facebook e, por fim, o Instagram. Isso, aliado ao meu gosto pelas caminhadas na cidade, terminou produzindo o composto que levaria a uma inusitada ousadia: iPhone, fotos de locais e coisas do Recife visto a pé, filtros e publicação no Instagram e no Facebook e amigos virtuais elogiando as fotos postadas e pedindo uma exposição... Até que o amigo de infância, companheiro das Caminhadas Domingueiras e dos livros sobre o Recife, doutor em Física e artista plástico, Plinio Santos Filho, me convida a fazer uma exposição no seu Espaço Vitruvio no Poço da Panela. Com ele como curador e outro amigo de infância, Paulo Gustavo, poeta, mestre em Literatura e recém acadêmico pernambucano de letras, como apresentador, e vou eu fazer uma exposição fotográfica patrocinada pela TGI Consultoria em comemoração aos seus 25 anos de vida. Um alinhamento improvável de eventos e lá está um não fotógrafo (para me autorizar a sê-lo, seriam necessárias dedicação e aplicação que nem de longe tenho), fazendo uma exposição fotográfica... Penso que a principal contribuição da exposição é trazer à luz (não por acaso o título dela é “O Recife Tomado à Luz – Fotografias de um Caminhante”) um Recife habitualmente não visto e concordo plenamente com as palavras de Paulo Gustavo: “O resultado é um diálogo com a poesia silenciosa da cidade. Uma agenda de esperança”. Sim, esperança de uma cidade melhor, cuidada por pessoas que gostem dela, estimuladas por uma beleza incomum que ousei tentar revelar com um iPhone 5S pelas redes sociais. Reconheço que meu mérito é esse: continuar tentando.

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A batalha que se fez barro

Nem o progresso com sua pressa irrefreável, seu desapreço pela contemplação, seu trânsito nervoso e seus edifícios que, a cada dia mais altos, parecem querer arranhar os céus, conseguem obscurecer a tradição de Casa Forte. Ali, por onde quer que se ande, as marcas do tempo estarão impressas nas ruas e nos antigos casarões que parecem falar. A Avenida 17 de Agosto, por exemplo, é homenagem a uma das datas mais importantes da nossa história. A Praça de Casa Forte, por seu turno, é um capítulo especial da história a ser contada. É obra paisagística de Burle Marx, um paulistano que amou Pernambuco e espalhou o seu talento por todo o Recife. As belezas daquela praça, contudo, não significam que a história do bairro é alcatifada de flores. Há também espinhos. Falar de Casa Forte também impõe falar de Anna Paes, filha de Jerônimo Paes de Azevedo e Izabel Gonsalves Paes, proprietários de um dos mais importantes engenhos pernambucanos. Foi nele que, no dia 17 de agosto de 1645, aconteceu a Batalha de Casa Forte, um cruento embate em que pernambucanos e holandeses escreveram com sangue uma das páginas mais marcantes da vida de Pernambuco. Foi, de fato, uma das mais notáveis vitórias na luta contra o domínio holandês. Aconteceu assim: derrotado na Batalha das Tabocas, em Vitória de Santo Antão, no dia 3 de agosto de 1645, quando regressava ao Recife, o exército holandês acampou no Engenho Casa Forte, pertencente a Anna Paes. Porque a situação se agravava a cada momento, no dia 16 de agosto o comandante holandês, coronel Henrique van Haus, mandou o major Carlos Blaer revistar as casas do povoado da Várzea, onde residiam as famílias de chefes revolucionários pernambucanos. O objetivo era prender suas mulheres. A missão foi prontamente cumprida, tanto que, no mesmo dia, voltou com muitas prisioneiras, inclusive Isabel de Góis, mulher de Antônio Bezerra; Ana Bezerra, sogra de João Fernandes Vieira, e Maria Luísa de Oliveira, mulher de Amaro Lopes. Foram todas encarceradas na casa-grande do engenho, levando João Fernandes Vieira, André Vidal de Negreiros, Henrique Dias e Felipe Camarão, chefes do exército pernambucano, a reunir as tropas e resgatá-las. Desafiaram a chuva, a lama, a inviabilidade dos caminhos, mas, finalmente, no amanhecer do dia 17 de agosto cercaram o engenho de Anna Paes. Atônitos ante a fúria dos pernambucanos, os holandeses se refugiaram na casa-grande e logo colocaram as mulheres prisioneiras nas janelas, para que fossem vistas pelos combatentes. Interpretando o ato como uma rendição, os líderes das tropas pernambucanas suspenderam o fogo e enviaram um oficial para negociar os termos da rendição. Para surpresa de todos, no entanto, o emissário foi assassinado, o que despertou enorme indignação. Tanta que, esquecidos de que entre os inimigos estavam as mulheres, os pernambucanos atacaram com ferocidade e sedentos de vingança atearam fogo à casa. Vendo-se cercado e sufocado pela fumaça, o coronel Henrique van Hous, empunhou uma bandeira branca e o cabo de uma pistola, desta feita um claro sinal, e capitulou. Foram 37 holandeses mortos, muitos feridos e mais de 300 prisioneiros, incluindo expoentes da oficialidade neerlandesa, além da grande apreensão de armas, cavalos e víveres. A partir daquele dia, os invasores ficaram tão atemorizados que, a pretexto de garantir a segurança do Recife, mandaram vir reforços dos fortes Sergipe, São Francisco e Porto Calvo. Em vez de garantir a segurança, no entanto, aumentaram a insegurança, arrasando, em atos de demonstração de força, as casas do Recife e as árvores do Parque de Maurício de Nassau. Para encurtar a história, os prisioneiros holandeses foram transferidos para a Bahia, inclusive o coronel Henrique van Hous, que de lá foi mandado para Portugal e encarcerado no castelo de São João, na Ilha Terceira, até a ida para Lisboa. Ali, tendo se recusado a servir a Portugal, foi enviado para a Holanda, e tempos depois voltou a Pernambuco, morrendo na primeira Batalha dos Guararapes, ocorrida em abril de 1648. Foi esse o cenário para os momentos mais marcantes da acidentada existência de Anna Paes. Como dote matrimonial ela herdara o Engenho Casa Forte, mas com a morte do seu pai, e com seu irmão morando na Bahia, ela, por força das circunstâncias, foi compelida a administrar o engenho, fazendo-o com muita energia e determinação. Competiu com os homens que administravam outros engenhos, e conseguiu manter o Casa Forte entre os dez melhores do Estado. Aos 18 anos, ficou viúva do capitão Pedro Correia da Silva, que enfrentando os holandeses tomou parte na defesa do forte São Jorge e morreu em virtude de ferimentos recebidos durante os combates. Quando enviuvou, entretanto, não emigrou para a Bahia como fizeram algumas famílias pernambucanas por conta da invasão holandesa. Optou por ficar no seu engenho e a ele se dedicou. Educada sob os princípios, métodos e costumes portugueses, vivia com a mãe, dividindo-se entre o engenho e a casa da Rua do Bom Jesus. Além do português, falava e escrevia em latim e alemão, e possuía extrema beleza. Em 1637 rendeu-se ao amor e, ousada como era, casou-se com Carlos de Tourlon, capitão do exército holandês, com quem teve uma filha, Isabel de Tourlon, que também viria a casar-se com um holandês, Virgilio Gaspar de Kroyestein, oficial da infantaria. Não se sabe o motivo, mas, por determinação de Maurício de Nassau, Carlos de Tourlon foi mandado de volta para a Holanda. Mais uma vez Anna ficou só e, anos depois, com a confirmação oficial da morte do marido, casou-se, novamente com um holandês, Gilberto de With, conselheiro de justiça do governo daquele país, nascendo da união Kornelius e Elizabeth, que, como Isabel, foram batizados na religião calvinista. Os holandeses estavam derrotados e Anna Paes, por ser casada com um deles, foi considerada igualmente holandesa, pelo que teve todos os seus bens imóveis confiscados, deixando, então, o Brasil. Resultante da sua conduta avançada para a época, das suas atitudes em relação aos holandeses e da sua conversão ao calvinismo, Anna Paes passou a ser execrada, mas há que se considerar

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