O setor imobiliário passou nos últimos anos por importantes mudanças legais, que impactaram os preços e aumentaram também a segurança do negócio. O advogado Thiago Bezerra, especialista no setor, enumera essas alterações e traz uma projeção das perspectivas para o próximo ano. Embora ele considera que ainda não seja possível cravar que as construtoras e incorporadoras terão um crescimento a partir de 2023, ele avalia que "se o dever de casa for feito pelo novo governo, as expectativas dos construtores e incorporadores é de um crescimento robusto e para os consumidores com mais opções". O maior volume de instituições financeiras fornecendo crédito e a expectativa por uma retomada mais forte do Minha Casa Minha Vida compõem esse cenário mais otimista. Quais as principais mudanças recentes que os compradores de imóveis devem estar atentos? Recentemente, quando eu falo isso é referente aos últimos cinco anos, tivemos uma série de alterações na legislação que os compradores (consumidores) precisam ficar atentos, assim como na jurisprudência (julgados dos tribunais superiores), que acabam servindo como base para os julgamentos das instâncias inferiores e pela ordem cronológica podemos enumerar as seguintes: A) Uma das leis que trouxe mais clareza para ambos os lados (compradores e vendedores – construtoras e incorporadoras), foi a famosa Lei 13.786, de 2018, popularmente conhecida como a lei do distrato, pois passou a estabelecer o percentual de devolução, forma de pagamento e percentual máximo da multa em caso de rescisão, tendo em vista que, antes da promulgação tínhamos decisões bastante contraditórias no Judiciário. B) Outra lei que veio para facilitar muito a vida do comprador foi a 14.382 de 2022, ao informar que o comprador não tem mais aquela obrigação de fazer a famosa due dilegence, que era todo o check list com as certidões do vendedor. Agora, o comprador só tem a obrigação de solicitar a certidão de inteiro teor e ônus reais, do imóvel e caso o credor do vendedor não solicite a inclusão do débito nessas certidões, futuramente não poderá executar esse imóvel por falta de pagamento. Segundo pesquisas realizadas, isso pode gerar uma economia de até R$ 700,00 por CPF pesquisado. C) Um julgado do STJ (Superior Tribunal de Justiça), que deu grande repercussão aos compradores foi referente ao Tema 1.113, pois estabeleceu que a base de cálculo do ITBI é o valor declarado pelas partes, não devendo estar vinculado à base de cálculo do IPTU. Ou seja, o valor da transação declarado pelo contribuinte goza da presunção de que é condizente com o valor do mercado e somente poderia ser afastada pelo fisco mediante a regular instauração de processo administrativo próprio (artigo 148 do Código Tributário Nacional). Já tivemos caso de uma redução de 50% do valor da avaliação com base nesse julgado, se levarmos em conta que a alíquota do ITBI no Recife está em 3%, pode-se dizer que estamos falando de valores bastante consideráveis. Insta observar que, o Prefeito do Recife, João Campos, ainda tomou a iniciativa recentemente de dar um desconto de 30% sobre a alíquota do ITBI e parcelamento em até 21 vezes, por meio de cartão de crédito, pois é uma forma de incentivar a regularização dos “contratos de gaveta”, que são os documentos da propriedade que não foram formalizados em cartório. Ou seja, está colocando em prática aquele jargão jurídico que diz: Só é dono, quem registra!!! Além de gerar mais receita para o município. D) Houve mais um julgado da Quarta Turma do STJ interessante aos compradores, pois deu mais uma garantia para os compradores que gostam de adquirir imóveis na planta. Para o colegiado, o fato de o devedor não residir no único imóvel de sua propriedade, que ainda está em fase de construção, por si só, não impede sua classificação como bem de família. Ou seja, o Tribunal entendeu que a impenhorabilidade do bem de família, pode ser estendido aos imóveis de futura moradia e até o imóvel que é alugado para propiciar renda necessária à subsistência da família do devedor ou ao custeio de sua moradia, com base na Súmula 486 do STJ. E) E, por fim, ainda houve definição no Tema Repetitivo 1095, perante a Segunda Seção do STJ, ao afirmar que: Em contrato de compra e venda de imóvel com garantia de alienação fiduciária devidamente registrada, a resolução do pacto na hipótese de inadimplemento do devedor, devidamente constituída em mora, deverá observar a forma prevista na Lei 9.514 de 1997, por se tratar de legislação específica, afastando-se, por conseguinte, a aplicação do Código de Defesa do Consumidor. Em síntese, está informando que em caso de atraso do financiamento imobiliário, o comprador não fará jus ao recebimento de nenhum valor por parte do vendedor, devendo o imóvel primeiro ir para leilão para pagamento do débito. E, se após o pagamento da dívida, houver algum valor remanescente, aí sim o comprador fará jus ao recebimento de alguma quantia. A grande questão nesse julgamento era sobre a validade do artigo 53 do Código de Defesa do Consumidor ao informar serem nulas as cláusulas contratuais que estabeleçam a perda total das prestações pagas em benefício do credor e o STJ entendeu que não deve haver a incidência do CDC, pois trata-se de uma lei geral e que já temos uma legislação, mais recente, tratando sobre o assunto. Aparentemente, essa decisão pode até parecer injusta com o comprador ao perder 100% do valor que foi pago ao credor, só vindo a ter direito a restituição se após o leilão e pagamento da dívida, houver um saldo remanescente. Mas, percebam que, segundo a Abrainc (Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias), mais de 92% dos contratos registrados em 2020 foram garantidos por alienação fiduciária, isso quer dizer que o comprador solicita o financiamento ao banco e transfere a propriedade do imóvel para o credor até que toda a dívida seja quitada. Caso os bancos perdessem a garantia de 100% do imóvel, em caso de inadimplência, com a prevalência do CDC, poderia haver redução de crédito e aumento de juros (lembrando que já estamos com uma taxa de juros