*Houldine Nascimento
A fria recepção no Festival de Cannes, em maio deste ano, quando foi exibido fora de competição, já era um indicativo sobre o resultado de "O Grande Circo Místico", novo filme de Cacá Diegues, que retorna ao cinema após hiato de 12 anos. Para construir a produção escolhida pelo Brasil para lutar por uma vaga no Oscar em 2019, ele toma como ponto de partida o poema homônimo de seu conterrâneo, o alagoano Jorge de Lima.
Os personagens do texto que lhe serviu de base estão ali. A trama perpassa por cinco gerações da família Knieps, dedicada ao circo. Cacá Diegues vai numa direção contrária do que se espera de um filme com o universo circense como fio condutor. A magia e o encantamento dão lugar à melancolia e à degradação do ser humano em diversos níveis.
Não por acaso, o centenário circo que integra a história vai esvaziando com o passar do tempo e, na mesma proporção, o filme perde força. O desfecho sem propósito sacramenta o desapontamento causado pelas opções que a direção toma e abre espaço para suscitar acusações de machismo. Uma das cenas exibe por quase cinco minutos uma dupla feminina nua em diversos ângulos. É como se Cacá, tão – e merecidamente – festejado no audiovisual brasileiro, estivesse preso a ideias dos anos 1980, anacrônicas portanto.
Se serve de consolo, os pontos altos estão na fotografia de Gustavo Habda e na música, esta assinada por Chico Buarque e Edu Lobo. A história, inclusive, já tinha sido musicada pela dupla em um balé bem sucedido de 1983. Vários temas acabam ganhando uma releitura neste longa, que, sem dúvida, é o melhor trabalho de Cacá quanto à estética.
Também há alguns personagens que chamam atenção, como a Agnes/Beatriz de Bruna Linzmeyer e a sofrida Margarete de Mariana Ximenes. As duas atrizes entregam boas interpretações. Mas outros atores entram e saem sem deixar marcas, revelando deficiências do roteiro e da própria direção. A situação mais gritante é a do português Nuno Lopes, que mal tem uma fala. O elenco ainda reúne nomes como Juliano Cazarré, Antônio Fagundes e Jesuíta Barbosa, o qual encarna Celavi, figura-chave e responsável por conduzir a narrativa.
O caso de Diegues é semelhante ao que acometeu Arnaldo Jabor em "A Suprema Felicidade" (2010), quando o diretor carioca de sucessos como "Toda Nudez será Castigada" e "Tudo Bem" voltou a realizar longas depois de parar por 24 anos. A extensa pausa contribuiu para que ambos "perdessem a mão". Uma pena porque "O Grande Circo Místico" era um dos projetos mais ambiciosos de Cacá. Com isso, o Brasil deve ficar (com justiça) mais um ano fora da disputa pelo Oscar de Melhor Filme Estrangeiro.
*Houldine Nascimento é jornalista
**Visto como cortesia no UCI Kinoplex Shopping Recife em 20 de novembro de 2018