Selton Mello: “Em tempos tão duros, quis fazer um filme sobre a memória”

Por Houldine Nascimento

Reconhecido pelo público graças a sua notável carreira como ator – são 35 anos no ofício –, Selton Mello também é um nome forte por trás das câmeras. Ele já dirigiu três longas: o intenso drama “Feliz Natal” (2008), “O Palhaço” (2011), uma produção mais otimista; e agora retorna à função em “O Filme da Minha Vida”, que tem estreia marcada para a próxima quinta-feira (3).

No último sábado (29), Selton esteve no Recife para uma pré-estreia do novo trabalho, realizada no UCI Plaza Shopping Casa Forte. Antes de a sessão ter início, participou de uma entrevista coletiva. Neste filme, uma adaptação do romance “Um Pai de Cinema”, de Antonio Skármeta, o diretor revela que buscou prestar uma homenagem à sétima arte. “Há um tributo ao cinema dentro do próprio filme”, aponta.

A trama de “O Filme da Minha Vida” se concentra nos dilemas de Tony Terranova (Johnny Massaro), um jovem professor de francês que tenta entender a razão de seu pai abandonar a família. Uma sala de cinema é o refúgio do protagonista. Os eventos são ambientados na Serra Gaúcha, em 1963. “Não é no Rio Grande do Sul, é um filme ao sul do Brasil, por volta dos anos 60. Era uma vez algo ali”, analisa.

É a primeira vez que Selton Mello parte de uma obra já existente para construir um roteiro, novamente escrito ao lado do parceiro Marcelo Vindicato. A responsabilidade era grande, uma vez que a publicação em questão é do mesmo autor do livro que originou o premiado filme “O Carteiro e o Poeta”. “Foi bem tranquilo. Talvez tenha dado sorte. Às vezes, adaptação não é tão simples assim como foi no meu caso, às vezes há autores mais apegados ao que fez. Encontrei um cara muito generoso, um senhor superdivertido. O barato é que Skármeta já viveu isso algumas vezes. Ele sabe que são linguagens distintas. Eu precisava ir além das páginas, criar conflitos, ter pontos de virada, ter atos. E ele confiou.”

Assim como havia feito nos trabalhos anteriores, Selton volta a dar chance a atores que estavam há muitos anos fora do ramo. Em “O Filme da Minha Vida”, o cantor e apresentador Rolando Boldrin é o nome da vez ao viver o maquinista Giuseppe. Desde o longa “O Tronco” (1999), o veterano ator estava afastado do audiovisual.

“É um país sem memória, é sabido isso. Como ator, identifico isso claramente, sou muito atento aos talentos que não estão no jogo, mas deveriam estar, e é um trabalho quase de resistência. O Moacyr Franco tem uma cena em ‘O Palhaço’ que foi um grande acontecimento, ele ganhou prêmio, começou a fazer mais show. O Rolando Boldrin também pode ter uma garotada que assista ao filme e fale assim: ‘Nossa, mas que figura bonita, aquele senhor que é o maquinista, quem é aquele cara?’, ir lá no Google, YouTube e ver que cara incrível. Porque o Boldrin, além de ator, cantor e apresentador, é um guardião da cultura brasileira, um cara que zela pelo cancioneiro popular”, comenta Mello.

Talvez por isso, a importância da memória seja ressaltada no filme, seja no enredo ou até mesmo fora dele. “Em tempos tão duros, quis fazer um filme sobre a memória”, diz ao público presente na pré-estreia. Já projetando uma batalha com superproduções para manter seu novo filme em cartaz, o diretor foi enfático. “A briga é dura, com ‘Planeta dos Macacos’, ‘Transformers’, o diabo a quatro. A única coisa que eu tenho para lutar contra esses filmes é a minha imaginação e minha sensibilidade e eu conto com a sensibilidade e a imaginação de vocês para completar esse filme”, pontua.

Um deleite no seu novo projeto é a cinematografia que ficou a cargo de Walter Carvalho. Com Selton, o renomado diretor de fotografia havia cruzado em alguns trabalhos, como “Lavoura Arcaica” e “O Auto da Compadecida”. “Walter Carvalho é o meu pai de cinema. O primeiro filme que eu fiz na vida, uma pérola do cinema nacional chamada ‘Uma Escola Atrapalhada’, foi fotografado por ele (risos). Anos depois, a gente se encontra em ‘Lavoura Arcaica’, um filme que marcou nossas vidas. Em ‘O Filme da Minha Vida’, a gente se emocionava constantemente, minha relação com ele foi puramente afetiva”, revela.

Consagrado dentro do Brasil, Selton Mello não descarta projetos internacionais. “Interesse eu tenho. O Rodrigo Santoro é o meu melhor amigo nesse meio, um camarada adorável. Acho muito corajoso o que ele fez, contra tudo e contra todos, super criticado em ‘As Panteras [Detonando]’, fez muitos testes para conquistar o terreno dele, mas é uma coisa que eu não faria. Eu o admiro muito por isso. Tenho um público aqui tão cativo, uma história tão sólida que não me vejo parando tudo que tenho aqui para começar do zero uma vida fora do país. O que pode acontecer é, se algo que eu fizer aqui ecoar fora, como Wagner Moura em “Tropa de Elite”, depois “Narcos”, e Alice Braga em “Cidade de Deus.”

*Por Houldine Nascimento

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