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Romance narra o caminho sem volta da escravidão

Na casa em que Yaá foi criada, cada um era encarregado de uma tarefa doméstica. A criança negra africana gostava de cuidar dos ovos e das galinhas. Muito melhor do que capturar animais na selva para comer. Yaá tinha pena dos bichos. Nunca imaginava a pobre criança que seria tratada como um animal ao ser capturada para se tornar escrava. Ela é a narradora em primeira pessoa do romance Penélope Africana, assinado pelo escritor pernambucano André Resende e editado pela Cepe em parceria com a Cubzac. O lançamento da obra ocorre dia 6 de junho, às 19h, na Livraria Jaqueira. André romanceou e deu continuação ficcional à história real de Cândida Maria da Conceição, cuja solicitação para ser liberta está arquivada no Instituto Arqueológico, Histórico e Geográfico de Pernambuco, com o título Apelação Crime do Juízo de Direito do Crime de 1ª. Vara do Recife, 1843–1844. Naquele tempo, para sair da condição de ‘arrendada’, ou seja, escrava, Cândida precisava provar que podia se sustentar - como ‘vendeira’ - sem a ajuda da família que a arrendou. Em 196 páginas, Yaá (André) relata o triste percurso - que foi também o de muitos negros africanos - em navios negreiros para viverem como escravos, numa rotina de medo, angústia e morte. Na travessia até a terra que a protagonista chama de ‘fim de mundo’ -  que fica no Recife- , os dias tristes e injustos estavam apenas começando. Além da liberdade, lhe roubaram também o idioma e o nome: foi Cândida, foi Penélope, foi principalmente injustiçada. “Tento recriar a vida de Cândida nesse cenário do século 19”, explica o escritor, autor de 11 livros, sendo quatro romances. “De pessoa cândida eu não tinha mais nada naqueles dias em que a justiça estava cega a meus pedidos (...) Uma vez na terra, escravo. Uma vez escravo, miséria (...) Na terra eu não colocaria uma árvore, um filho, um sentimento de carinho”. Cento e trinta anos depois da abolição da escravidão, os grilhões ainda prendem de maneira política, social e cultural a população negra. O escritor é idealizador do Instituto Casa de Yaá, que visa solicitar ao Superior Tribunal de Justiça a emancipação tardia de Cândida e promover ações de apoio a mulheres negras pobres que sustentam famílias e precisam trabalhar cerca de 14 horas por dia. “As mulheres estão livres, mas não emancipadas”, atesta André.   SERVIÇO Lançamento do livro Penélope Africana (editoras Cepe e Cubzac) Data:: 6 de junho Horário: 18h Local: Livraria Jaqueira Endereço: Rua Antenor Navarro, 138, Jaqueira Valor do livro: R$ 35,00 e R$ 12,00 (e-book)

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Por que os escritores vão às salas de aula? (Por Paulo Caldas)

*Por Paulo Caldas Para a escritora Jussara Kouryh aproximar os autores do leitor, muitas vezes crianças e adolescentes, é fascinante. “Acham que somos pessoas distantes, que vivemos num mundo diferente, mas quando percebem que somos iguais, que possuímos os mesmos sonhos e inquietações, começa um processo de desmistificação. É muito interessante”. Ela acrescenta que outra motivação é constatar o quanto nossa presença nas salas de aula, além de provocar discussões produtivas sobre o texto, sua compreensão e interpretação, desperta interesse pela leitura, além de estimular a própria produção textual dos alunos. “Os estudantes e profissionais da educação, nos trazem elementos extraordinários para o enriquecimento de nossa escrita. São observações, exigências que acrescentam positivamente e abrem leques para nossas futuras produções. Em suma, é uma troca maravilhosa”. Garante. Perguntada sobre se a sua visita contribui para incentivar o hábito da leitura, Jussara Kouryh tem dúvidas. “Se os alunos são impulsionados cotidianamente à produção textual, nossa presença será mais um elemento motivador. Se, ao contrário, a nossa visita, ficará apenas a lembrança e sem maiores consequências. Nossa presença pontual não tem a força de operar um milagre que só acontece quando a escola compreende a importância do ato de ler”, afirma. Sobre os seus títulos mais indicados às escolas, ela detalha. “Alguns infantis como O Grande Festival das Cigarras, Biu – o passarinho maluco, Liberdade, o sonho dos Palmares... Os infantojuvenis como O dono dos pés, Desafio no asfalto, Jogo de máscaras... entre os romances Sophia e Na palma da mão”. Os livros de Jussara contemplam também outros temas. “Produzi duas coleções que estimulam discussões nas salas de aula: Conceitos sem preconceitos, em seis volumes nos quais podemos conversar com os adolescentes sobre uso de droga, internet e redes sociais, tráfico de pessoas, bullying, as doenças sexualmente transmissíveis e o HIV/aids. Na coleção Histórias do Brasil Afro-indígenas, formada por quatro volumes, atendendo exigências do Ministério da Educação, abordamos histórias e culturas afro-indígenas. O escritor Fernando Farias tem uma visão diferente dos seus colegas. “Faço um trabalho de militância literária, incentivando mais a arte de escrever do que motivando novos leitores. Tenho dito que lugar de escritor é nas escolas. São eles que podem falar sobre a importância da leitura e da arte de escrever. Mesmo que não sejam escritores de histórias infantis e para adolescentes”, define. O seu trabalho, praticamente, começou na Escola Estadual Rodolfo Aureliano, em Jaboatão, para fazer oficinas aos sábados, dentro do projeto Escola Aberta. “Isso sem qualquer remuneração; a experiência inicial não foi muito boa, pois eu apenas transferia o conteúdo das oficinas que eu assistia com Raimundo Carrero. A primeira turma durou mais de um ano e eles serviram como minhas cobaias. Tive que aprender empiricamente a fazer exercícios motivadores, buscar técnicas mais simples, textos leves e incentivar a leitura de livros da biblioteca. Tomei gosto e fiz proposta para a Prefeitura de Jaboatão, onde há mais de seis anos faço palestras e oficinas. Sou remunerado por este trabalho. Depois fui convidado pelo SESC onde já fiz oficinas e palestras em várias cidades. Também faço palestras em escolas do Recife e nas bibliotecas comunitárias”. Farias acrescenta que é bem recebido pelos alunos, “mas nem sempre pelos professores caretas que se incomodam com meu método descontraído que estimula a criatividade, a quebra de padrões e busca o pensamento livre. O aluno percebe que tudo é uma brincadeira, podem sair da sala, usar celulares e conversar. No estímulo à imaginação vem o debate de temas transversais: drogas, gravidez na adolescência, consciência da temporalidade e morte. O que sempre gera mote para os contos”, comenta. Ele observa que as oficinas e palestras só estimulam os alunos que possuem predisposição à leitura. “Não há mágica, é preciso um ambiente de leitura em casa. A experiência com adultos, das turmas do EJA, (Educação de Jovens e Adultos), durante dois anos, motivou mais retorno, criando-se até uma biblioteca no bairro de Barra de Jangada. Detectamos que houve um aumento de mais de 100 jovens inscritos na biblioteca quando as oficinas foram realizadas na Biblioteca Central de Jaboatão, ou seja, dentro do ambiente de livros. As escolas não têm bibliotecas, nunca vimos um professor de português que incentivasse a leitura, são poucos os que se aliam ao projeto das oficinas. A maioria aproveita para sair da sala nessas horas”, critica. “Há uma ideia falsa de que apenas quem escreve para crianças deve ir às escolas, na verdade, eles usam as escolas apenas para vender livros. Por outro lado, nem todos os escritores se comunicam com jovens, sabem escrever bem, mas são péssimos para falar com as turmas. Principalmente pela vaidade e egocentrismos, escritores que acham que são importantes e falam tudo de suas vidas e nada sobre a leitura e a arte”, conclui. *Paulo Caldas é escritor  

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Sobre os livros que ensinam a escrever (1) (Por Paulo Caldas)

O recente lançamento do livro “Escrever ficção não é bicho papão” (Autoajuda Literária), cujo conteúdo propõe dicas de como dar os primeiros passos na carreira literária, abriu espaços para discussão sobre o tema.  No prefácio do “A arte da ficção” John Gardner (Civilização Brasileira), um dos textos mais elogiados do gênero, o autor escreve: “Este livro propõe-se a ensinar a arte da ficção ao principiante que pretende levar seu ofício a sério. Antes de tudo, admito que o aprendiz de escritor, potencial e virtual usuário deste livro, tenha efetiva capacidade de tornar-se um autor de sucesso se assim o desejar, uma vez que a maioria das pessoas que conheci e que queria isso – sabendo o que realmente significava – alcançou, de fato, seu objetivo. Tudo o que se exige do candidato a escritor é uma nítida compreensão do que pretende ser e do que tem a fazer nesse sentido. Se, por mais que se esforce, isso não for possível, esta obra o ajudará, pelo menos, a concluir que não foi posto no mundo para escrever livros”. Assim, convidamos autores pernambucanos para opinar sobre este tipo de publicação. Opiniões “Ensinar a escrever não é ensinar técnicas. As técnicas podem e devem ser ensinadas e estudadas. Para ensinar a escrever é preciso mostrar como fazer. Assim como na literatura existe o autor que diz ‘Em vez de mostrar, alguns autores ensinam a escrever dizendo como fazer e outros mostram como fazer’. É o caso de ‘A preparação do escritor’,  de Raimundo Carrero. Ali ele vai conduzindo um processo de intertextualidade e o leitor vai vendo como um texto original se forma a partir de dois parágrafos distintos de Joyce e Thomas Mann. Só não aprende quem não quer”. João Gratuliano. “Já usei ‘Como resolver problemas de roteiros’, de Script Doctor Syd Field, autor especializado em roteiros de cinema, mas cujas ideias sempre criam boas saídas, também, para impasses literários. Como pensar no passado dos personagens para resolver uma questão do presente”. Marcelo Trigo. "São ótimos para disciplinar o processo de criação, estimulam a pensar. Dos que consultei ‘Os segredos da ficção’, e ‘Preparação do escritor’, ambos de Raimundo Carrero. ‘Sobre a escrita’, de Stepham King, me agradou  pela objetividade e por alinhar conceitos que vemos em Carrero. É interessante observar que não devemos usá-los como manual”. Roberto Beltrão. "Foi depois de ler 'Para ler como um escritor', de Francine Prose, liguei para a Editora Zahar e eles sugeriram a oficina de Criação Literária de Raimundo Carrero e com ele comecei a carreira de autora. No momento pretendo ler ‘Como funciona a ficção’ de James Wood". Camilla Inojosa. “Um livro dos melhores, uma síntese das principais teorias está em ‘Cartas a um jovem escritor’, de Mário Vargas Llosa, inclusive tem na internet uma versão em PDF gratuita, em espanhol. Há tradução em português e ofertas de usados/novos também na internet. Por aqui, Carrero está revisando um dos seus livros nesta área, ‘Os segredos da ficção’ ou ‘A preparação do escritor’, ambos muito interessantes”. João Carlos Barros.  

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