A visita do presidente Jair Bolsonaro à Israel firmou de vez a aproximação entre os dois Países. Enquanto há uma expectativa de avanços nas parcerias acadêmicas, tecnológicas e militares, por outro lado há um incômodo dos Países Árabes que tendem a se distanciar do Brasil. A grande preocupação do mercado é o fato deles serem consumidores do agronegócio brasileiro. Esse imbróglio pode trazer problemas para Pernambuco? Para o vice-presidente do Iperid (Instituto de Pesquisas Estratégicas em Relações Internacionais e Diplomacia) e professor de relações internacionais da Unicap, Thales Castro a resposta é que o impacto é pequeno. "É um posicionamento político diplomático delicado, pois no Oriente Médio há uma relação muito polarizada entre os Países que tem a fé muçulmana e a identidade árabe, que geralmente se solidarizam com o povo Palestino e, naturalmente, tem Israel, com o apoio externo em forma de aliança com os Estados Unidos. Essa presença de Bolsonaro, inclusive no muro das lamentações, é uma quebra de paradigmas e finca a relação com Israel. Agora qual o dano colateral ainda não sabemos. Para Pernambuco não acredito que afete tanto, pois o Estado não é exportador de carne ou frango halal, que são aqueles que tem autorização religiosa para ser consumida no mundo árabe. O impacto, portanto, não é tão frontal. Mas impactará o agronegócio, a pecuária e a avicultura de corte que atua com o mercado internacional". Apesar de não exportar proteína (carne bovina ou de frango) para os países da chamada Liga Árabe, Pernambuco tem uma relação de exportações com essa região. Em 2014 ela foi responsável por 11% da fatia de exportações de Pernambuco, mas veio caindo nos últimos anos de acordo com os números levantados pelo consultor de comércio internacional e fellow do Iperid, João Canto. "A variedade de produtos exportados pelo Estado é alta, dentre outros, posso destacar produtos químicos, derivados de petróleo, plásticos, acumuladores elétricos, frutas, calçados, cereais e – principalmente – açúcar", afirmou. Hoje 30% do açúcar exportado por Pernambuco segue para os Países Árabes. Em 2018, Pernambuco exportou US$ 35,5 milhões para os países da Liga Árabe, segundo números do Ministério da Indústria e Comércio Exterior e Serviços. . Os destaques de bens do interior do Estado para exportação para a Liga Árabe são as uvas da região de Petrolina (que figuraram como terceiro maior produto importado nos anos de 2015, 2016, 2018 e 2019) e os acumuladores elétricos, de Belo Jardim (que até o mês passado, figurava na segunda colocação do presente ano). Os três principais destinos dos produtos pernambucanos nos Países Árabes em 2018 foram Marrocos, Líbia e Mauritânia. Nos primeiros meses de 2019, os líderes de importações do Estado são o Iêmen, o Líbano e os Emirados Árabes. A participação das demandas dos países que compõem a Liga Árabe nas exportações de Pernambuco apresentou queda entre 2014 e 2018. Em 2014, representava 11% e, em 2018 – último ano fechado –, passou apenas para 2%. Comparativamente, a participação de Israel nas exportações de Pernambuco, no mesmo período analisado, representava 0,05% e caiu para 0,04%. Naturalmente, o volume das importações israelenses é muito menor em relação às importações da Liga Árabe. "Embora Pernambuco não se encaixe com exportador de proteínas bovinas – que no cenário que se desenha, certamente será o segmento mais afetado – ainda assim poderá sofrer algum tipo de medida por parte dos parceiros árabes, que são grandes consumidores de nosso açúcar. Basta que os árabes passem a importar de países concorrentes, em detrimento do Brasil, e os exportadores pernambucanos, consequentemente, sofrerão baixas comerciais proporcionais em função desta mudança. Em 2018, o grupo de países da Liga Árabe foi responsável por cerca de 30% do açúcar exportado por Pernambuco." Tabela de Exportações de Pernambuco para os Países Árabes (2014-2019) Fonte: Ministério da Indústria e Comércio Exterior e Serviços Canto explica que uma eventual mudança de fornecedor pode ser mais ou menos ágil ou eventualmente nem ocorrer. A rapidez de uma possível mudança vai depender das características inerentes ao produto: agregação de valor, abundancia ou escassez em outros países concorrentes, complexidade, tecnologia, volume, safra, disponibilidade de fornecimento, etc. "É um tema de extrema importância para o exportador pernambucano acompanhar e se antecipar aos movimentos e acontecimentos. É justo lembrar que, na atual conjuntura, as economias mundiais são interdependentes umas das outras, em graus de aprofundamento diversos, e ações e decisões radicais podem apresentar reveses difíceis de contornar num curto prazo. Portanto, acredito que as autoridades brasileiras devem avaliar minuciosamente e racionalmente o risco de cada uma das ações e decisões que pretendem tomar acerca deste delicado tema, principalmente nas possíveis consequências comerciais. Caso contrário, grande parcela dos produtos que seriam destinados às exportações poderá permanecer estagnada no mercado doméstico". CENÁRIO NACIONAL Se Pernambuco deve ter um prejuízo relativamente pequeno com a política internacional adotada pelo presidente Jair Bolsonaro, o mesmo não pode se dizer do restante do País. "“ Do ponto de vista estritamente comercial, a aproximação do Presidente Jair Bolsonaro com o Estado de Israel – da forma que está sendo conduzida – pode custar uma importante parcela das exportações brasileiras. Apenas para contextualizar o leitor, o Brasil figura como maior exportador de carne Halal do mundo e, portanto, o mercado árabe é o maior importador deste produto. O Certificação Halal é, basicamente, a chave que abre os portões do mercado consumidor árabe, não somente no Oriente Médio, mas também de consumidores que seguem à risca a religião islâmica em outros continentes – principalmente na Europa", conta João Canto. O consultor explica que dentre outras indicações, a Certificação preconiza que os animais devem ser abatidos sem sofrimento e voltados para Meca, seguindo preceitos religiosos. Outros produtos brasileiros como minérios de ferro, soja, milho também são amplamente importados por estes países. Sobre as reações dos palestinos sobre a abertura de um escritório de negócios do Brasil em Jerusalém presidente Jair Bolsonaro respondeu que “É direito deles reclamar”. *Por Rafael Dantas, repórter da Revista Algomais (rafael@algomais.com)