Entrevistas – Página: 4 – Revista Algomais – a revista de Pernambuco

Entrevistas

“Acreditamos no mercado local e queremos participar da transformação do Centro do Recife”

Edson Cedraz, Sócio líder da Deloitte para o Nordeste, explica por que a empresa escolheu o Recife para instalar o seu segundo centro tecnológico, comenta a adesão ao programa Embarque Digital e analisa o ambiente de negócios no País e os impactos da reforma tributária e da inteligência artificial. Em 1917, a Deloitte chegava ao Bairro do Recife, junto com os ingleses que vieram para ampliar a malha ferroviária no Brasil. Em janeiro passado, 107 anos depois, a empresa retornou ao seu local de origem na capital pernambucana, instalando-se no Moinho Recife, no Porto Digital, realizando um verdadeiro upgrade ao abrigar na nova sede um centro tecnológico. Nessa sua trajetória de inovação durante mais de um século, hoje, além dos serviços tradicionais de consultoria empresarial, a empresa constrói soluções customizadas para os clientes com o uso de tecnologia. “Se a gente continuasse fazendo o que o Sr. Deloitte, fundador da empresa, fazia há 180 anos, não estaríamos aqui para contar a história”, ressalta Edson Cedraz, sócio líder da Deloitte para o Nordeste. Nesta entrevista a Cláudia Santos, ele explica os motivos que levaram a empresa ao escolher o Recife para sediar o centro tecnológico (é o segundo do País, o primeiro fica em Campinas) e a participar do projeto Embarque Digital, financiado pela Prefeitura do Recife e liderado pelo Porto Digital, que forma jovens de baixa renda para atuar na área de tecnologia. Edson Cedraz também analisa o atual ambiente de negócios no País e os impactos da inteligência artificial e da reforma tributária. A Deloitte está há quase dois séculos no mercado. A que se deve essa longevidade? Fundada em 1845, a Deloitte tem quase 180 anos de existência. Em relação ao faturamento, é a maior firma de serviços profissionais do mundo. Para se manter nesse ritmo, a Deloitte vem ajudando os clientes a superarem desafios que os novos tempos trazem. A empresa já nasceu inovadora pois praticamente criou a profissão de auditoria. Ao longo de todos esses anos, continuamos com o mesmo DNA inovador. Cinquenta por cento do que a Deloitte fatura no Brasil são serviços que não existiam anos atrás. Se a gente continuasse fazendo o que o Sr. Deloitte, fundador da empresa, fazia há 180 anos, não estaríamos aqui para contar a história. Então, metade do que produzimos é referente a demandas que provavelmente nossos clientes nem sabiam que tinham cinco anos atrás, pois o dinamismo dos negócios é muito mais acelerado hoje. Dessa forma, conseguimos manter nossa liderança e sobreviver nos próximos 180 anos ou mais daqui para frente. A Deloitte inaugurou recentemente um Centro de Tecnologia no Recife. É o segundo do Brasil e o primeiro do Nordeste. Fale um pouco desse novo espaço e por que o Recife foi escolhido para sediá-lo? A manutenção do nosso espírito de inovação passa por iniciativas como centros de tecnologia dedicados a prover serviço ao cliente, trazendo todo processo de pesquisa e desenvolvimento. Afinal, consultores só entram em cena quando o cliente precisa de algo novo. O Recife foi escolhido como segundo centro de tecnologia da Deloitte por alguns motivos, o primeiro deles é a conexão com todo o ecossistema que foi formado a partir do Porto Digital. Enxergamos aqui um celeiro de oportunidades para nos aproximarmos de empresas e startups bastante promissoras. O segundo motivo é o capital humano, a capacidade que a região tem de prover profissionais qualificados, pessoas que, além de conteúdo, bagagem e capacidade técnica, têm um engajamento muito maior do que em outras localidades. Além disso, acreditamos na região, a Deloitte está no Recife desde 1917, são 107 anos de presença física. A empresa não está aqui para se aventurar ou apenas para servir como ponto de apoio para atender clientes de fora. Estamos fortalecendo investimentos. Queremos contribuir com o desenvolvimento econômico local apoiando as empresas daqui, ajudando-as a prosperar. Acreditamos no mercado local e queremos participar do processo de transformação do tecido urbano do Centro do Recife, que é uma área próspera e estamos fazendo a nossa parte para requalificá-la. Outro motivo para escolhermos o Recife é a possibilidade de contribuir ativamente com impactos sociais. Há também a questão emocional, a Deloitte tem a oportunidade de se instalar no Centro da cidade, o mesmo local onde se instalou em 1917, quando desembarcou aqui junto com os ingleses que vieram ao Brasil para ampliar o número de ferrovias. Isso é uma questão emblemática, simbólica de voltar para as nossas origens. E está dando muito certo. Antes da pandemia, quando esse centro ainda não estava na pauta, tínhamos um terço da quantidade de profissionais que temos hoje. Nós triplicamos de tamanho e acreditamos que esse número irá crescer muito, dará saltos maiores em curto prazo. Estamos aqui para reforçar o compromisso que temos de, há 100 anos, investir e estar sempre presente. Agora a gente vai viver talvez o melhor momento dessa história com um aporte de investimentos e confiança para continuar contribuindo com a economia, com a sociedade e com as empresas locais. O senhor falou em capital humano e em contribuir socialmente com o Recife. A Deloitte participa de algum projeto social nesse sentido? Sim. Há um projeto de educação muito bonito, do qual a Deloitte faz parte, chamado Embarque Digital, financiado pela Prefeitura do Recife e liderado pelo Porto Digital. Nós compramos essa ideia, estamos totalmente dentro e trazendo para a Deloitte profissionais que foram formados nesse projeto. Grande parte deles vem da escola pública, tem origem humilde e fatalmente não teria chance de ingressar no mercado de trabalho numa área privilegiada, de alto nível profissional, se não fosse por esse programa. Quantos profissionais a Deloitte tem e quantos foram ou serão contratados no programa Embarque Digital? No Brasil, temos um pouco mais de sete mil profissionais, dos quais, cerca de 500 são da região Nordeste, onde há bases com 50 a 100 pessoas em Salvador e Fortaleza, mas o grande volume na região está no Recife devido ao Porto Digital, onde temos em torno de 400 profissionais. O

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“Mais da metade das famílias chefiadas por mulheres negras está em insegurança alimentar no NE”

Vitória Régia da Silva, presidente da Associação Gênero e Número fala dos resultados da pesquisa Caminhos da Alimentação que se baseou em dados do IBGE associados ao acompanhamento do cotidiano de quatro integrantes da população feminina e negra da Região Metropolitana do Recife, chefes de família. Estatísticas são muito importantes mas, nem sempre conseguem abarcar os diferentes aspectos de uma realidade. Foi o que mostrou a pesquisa Caminhos da Alimentação, realizada pela Associação Gênero e Número que investigou a insegurança alimentar no Nordeste, de forma diferenciada, indo além dos dados numéricos. A partir da POF (Pesquisa de Orçamentos Familiares) elaborada pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), a organização comparou os seus resultados com o cotidiano de quatro mulheres negras, chefes de família, residentes na Região Metropolitana do Recife, que foram acompanhadas por jornalistas no seu dia a dia. Desse convívio, resultou um trabalho híbrido, composto por audiovisual, fotos, texto, artigo, entrevistas com especialistas e informações que revelam as condições que levam à insegurança alimentar desse segmento da população. Entre elas, a mais perceptível é a falta de renda. Mas a pesquisa foi além. Mostrou como a ausência de uma rede de apoio e a sobrecarga de trabalho dessas mulheres impedem que tenham uma alimentação saudável. Mas o projeto revelou também as soluções para enfrentar o problema, como a importância das hortas urbanas e das cozinhas solidárias. Para conhecer os resultados da pesquisa Caminhos da Alimentação, Cláudia Santos conversou com Vitória Régia da Silva, presidente e diretora de conteúdo da Associação Gênero e Número. Antes de falar dos resultados da pesquisa Caminhos da Alimentação, gostaria que você explicasse a metodologia empregada, que é bastante incomum. Na Gênero e Número, trabalhamos com dados na cobertura especializada de gênero e raça. Enquanto uma organização de jornalismo, buscamos sempre trabalhar em rede, debatendo com especialistas, pessoas relevantes na área e com a academia. Nesse projeto, contamos com o apoio do Instituto Ibirapitanga, que também atua com sistemas alimentares sustentáveis. Os dados são necessários para que haja políticas públicas, e nosso papel é fomentar esse trabalho a partir de levantamentos e análises. Levamos quase um ano para chegar aos resultados, em meio a barreiras envolvendo transparência e falta de dados oficiais no Brasil para trabalhar alguns temas como alimentação. Por isso, na Caminhos da Alimentação, trabalhamos de forma híbrida em relação à apresentação da narrativa e aos dados, utilizando, como principal base, a última atualização da POF (Pesquisa de Orçamentos Familiares) do IBGE, que aborda a alimentação e é referência no País. Apesar de ter guiado nosso trabalho e de ajudar a tomar decisões como os territórios pesquisados, a POF em si não conseguia trazer os rostos e as histórias das mulheres, e queríamos trabalhar especificamente com mulheres negras do Nordeste, que é a região com a cesta alimentar mais rica e diversa do País, com uma grande quantidade de alimentos in natura ou minimamente processados. Assim, além de olhar para o Brasil e comparar com o Nordeste, o projeto tem diferentes abrangências trazendo também um olhar específico para Pernambuco e para a Região Metropolitana de Recife, que é onde a gente acompanha as histórias de quatro mulheres negras: Gercina, Claudecir, Conceição e Lindalva. Escolhemos composições familiares diferentes e acompanhamos a alimentação completa dessas mulheres, observando, por exemplo, onde elas adquiriam alimentos, se em supermercados, hortas ou por meio de doações, se elas se alimentavam no trabalho, enfim, vimos todos os alimentos que elas consumiam. Construímos uma pequena nova base de dados inspirada nas rotinas dessas mulheres negras, também como uma forma de nos inspirar a pensar para além dos dados oficiais, entendendo que, a partir dessas histórias, é possível criar dados e inspirar outras iniciativas em escalas maiores. Você mencionou que o Nordeste tem a cesta alimentar mais rica e diversa do Brasil, o que contrasta com a ideia de pobreza e escassez da região. Fale mais sobre isso. É interessante isso. Por esta razão nos questionamos como uma região que tem uma cultura alimentar tão rica, tem esse imaginário de pobreza alimentar, de escassez? O que acontece que leva a esse cenário no Nordeste? Por isso, na nossa pesquisa, também escolhemos analisar um dos três estados na região – Pernambuco, Sergipe e Rio Grande do Norte – que tinham uma cesta alimentar mais variada. Optamos por Pernambuco porque liderava a aquisição de alimentos in natura e apresentava a maior população. E os dados mostram que a gente tem, sim, questões de segurança alimentar em que as mulheres negras são as principais afetadas. Mais da metade das famílias chefiadas por mulheres negras está em insegurança alimentar no Nordeste. Uma das causas da insegurança alimentar que afeta mulheres negras, chefes de família, detectada pela pesquisa é a renda. Qual é a realidade financeira dessas famílias hoje, em especial, diante da realidade de programas sociais como o Bolsa Família? A renda das famílias chefiadas por mulheres negras é menos da metade daquela das famílias chefiadas por homens brancos no Brasil. A renda realmente é muito relevante para que a população possa se alimentar melhor, comendo produtos in natura ou minimamente processados, pois alimentação está relacionada a escolhas, e a baixa renda leva à falta de opções para as mulheres negras como Conceição, que é mãe solo de duas crianças autistas, está desempregada e sobrevive apenas com o Bolsa Família. Por isso, conforme diversas pesquisas, programas de transferência de renda são tão importantes para garantir parte da alimentação das famílias. É nesse sentido que nosso projeto reforça, por meio das histórias, dos dados e da conversa com especialistas, como as políticas de combate à fome e de transferência de renda, no Brasil, precisam priorizar as mulheres. São elas que, no dia a dia, chefiam as famílias e tomam as decisões sobre alimentação, o cuidado e a vida das pessoas que residem naquela residência. Levando em consideração o exemplo de Conceição, com o valor de R$ 700 do Bolsa Família, ela praticamente faz milagre para pagar as prestações do barraco onde mora, comprar alimentos e

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“Queremos que pacientes com diabetes do SUS tenham acesso a medicamentos disponíveis na rede particular”

Rui Lyra, presidente da Sociedade Brasileira de Diabetes, defende que diabéticos atendidos pelo serviço público de saúde tenham acesso a fármacos mais avançados no controle da doença que atinge mais de 14 milhões de brasileiros e que tende a aumentar a prevalência nos próximos anos. Pessoas diabéticas que não recebem um tratamento adequado e condizente com o mais avançado arsenal terapêutico desenvolvido pela medicina, podem evoluir e sofrer problemas renais e cardiovasculares. No Brasil, pacientes assistidos pelo SUS (Sistema Único de Saúde) não têm acesso a esses medicamentos e insumos, o que levou a Sociedade Brasileira de Diabetes a atuar para tentar reduzir a diferença existente entre o tratamento na rede privada e pública. Esse tem sido um dos principais objetivos do endocrinologista pernambucano Ruy Lyra, à frente da presidência da Sociedade Brasileira de Diabetes, que assumiu em 19 de janeiro. Nessa entrevista a Cláudia Santos, o médico conta como tem sido a receptividade do Ministério da Saúde a essa reivindicação e ressalta que a doença, que hoje atinge entre 14 milhões a 16 milhões de brasileiros, tem apresentado um crescimento no número de casos e a perspectiva é de aumentar ainda mais. Uma das metas da sua gestão à frente da Sociedade Brasileira de Diabetes é diminuir a diferença entre o tratamento oferecido nas redes de saúde pública e privada. O senhor poderia explicar essa diferença e como pretende eliminá-la? No serviço privado, muitas vezes, os pacientes têm plano de saúde e acesso a toda parte laboratorial que facilita o diagnóstico. Pela condição socioeconômica, esses pacientes, geralmente, podem comprar os melhores medicamentos para o diabetes, que não causem hipoglicemia, têm um efeito neutro no peso ou que levem ao emagrecimento que podem trazer benefícios cardiovasculares, renais, entre outros. No serviço público, embora já haja melhora, infelizmente, existe uma escassez de medicamentos gratuitos. Então, nossa proposta, junto ao governo, ao Ministério da Saúde e organismos que militam na área de tratamento, é que os pacientes do SUS tenham acesso aos mesmos medicamentos e insumos que estão disponíveis na rede particular. É tentar colocar novos fármacos que não estejam na cesta que é disponibilizada para as pessoas com diabetes no serviço público. Eu me sinto muito desconfortável ao fazer uma medicina no setor público e outra no privado, pois o médico é treinado para dar o melhor ao paciente, as ferramentas de tratamento adequadas para que se evitem complicações. É um grande desafio mas acho que somos movidos a desafios, sobretudo quando se tenta favorecer os mais pobres que, muitas vezes, sequer têm dinheiro para o transporte, quiçá para comprar um medicamento de melhor produção. Então, essa é uma proposta nossa. Já começamos nossas viagens à Brasília e estamos sentindo, nos primeiros contatos com os parlamentares e com alguns organismos governamentais, uma sensibilidade, uma perspectiva de buscar alternativas interessantes para os nossos pacientes. Que consequências são colocadas às pessoas que não têm acesso a esses medicamentos de última geração? Geralmente, complicações renais e cardiovasculares relacionadas ao ganho de peso. Entre 85% a 90% das pessoas com diabetes tipo 2 têm sobrepeso e obesidade. Hoje há medicamentos que proporcionam aos diabéticos uma redução de glicose sem risco de hipoglicemia, levando a não ganho de peso e, eventualmente, à perda de peso. Esses são medicamentos que trazem benefícios cardiovasculares e renais. Hoje, um grupo desses fármacos de última geração é disponibilizado a diabéticos com doença cardiovascular prévia com 65 anos ou mais. Recentemente já tivemos um posicionamento positivo do Ministério da Saúde para reduzir essa idade para 40 anos. E, para o paciente que recebe o Bolsa Família, esses medicamentos serão totalmente gratuitos. Os que não recebem Bolsa Família vão pagar uma parte do valor e o restante será subsidiado pelo governo, ou seja, uma coparticipação. Esse é um avanço, mas há muitos outros sendo trabalhados pela Sociedade Brasileira de Diabetes, em termos de monitorização de glicose, entre outros aspectos pertinentes ao benefício à população carente. Além de trazer qualidade de vida e prevenir morte de pacientes em casos mais graves, essas iniciativas também podem diminuir os números de hospitalizações e trazer economia para o governo? Sim. Um estudo publicado há alguns anos analisou o impacto socioeconômico das pessoas com diabetes e mostrou que se gasta menos tratando bem o diabético do que com o tratamento das complicações. Entretanto, tratar muito bem esse paciente não é só cuidar da glicose mas, também, da pressão arterial. Em termos das drogas antidiabéticas, é preciso usar as anti-hipertensivas, as drogas de redução do colesterol. Assim, ao disponibilizar medicamentos para cada uma dessas situações, as complicações vão reduzir e, consequentemente, vai se gastar menos onde hoje se gasta mais. Mesmo em relação à farmacoeconomia, há um custo-benefício em tratar bem os pacientes. Quantas pessoas diabéticas vivem no Brasil? Esse número tem aumentado nas últimas décadas? Infelizmente, sim. Hoje há cerca de 14 milhões a 16 milhões de pessoas com diabetes no Brasil e, segundo dados da Federação Internacional de Diabetes, as projeções são alarmantes, não só para o Brasil, mas para o mundo todo. E a perspectiva é de um crescimento grande até o ano de 2045. Então, infelizmente, apesar do conhecimento efetivo do risco da pessoa com diabetes, em termos de morbidade e de mortalidade, nós não estamos conseguindo prevenir essa doença. E não me refiro apenas aos médicos, mas à população que ainda não percebe a importância de evitar sobrepeso, de ter uma alimentação adequada, de praticar atividade física, ou seja, hábitos saudáveis recomendáveis a todos, sobretudo às pessoas com histórico familiar de diabetes. Então é fundamental que haja um envolvimento de todos, não só dos profissionais de saúde e do governo mas, também, das pessoas em geral para prevenir esse incremento da doença. Então esse aumento se deve ao diabetes tipo 2? Sim. Nove entre 10, ou seja, 85% a 90% dos diabéticos no mundo têm o tipo 2. É por isso que o impacto é grande. A presença de diabetes tipo 2 presume histórico familiar de diabetes, sobrepeso ou obesidade. Então essa

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“É preciso mais investimentos em energia. É uma questão de segurança nacional.”

Felipe Valença, Diretor-presidente da Copergás, detalha planos e ações para tornar o gás natural um indutor do desenvolvimento, em especial no interior, como nos Polos Gesseiro e de Confecções. Também ressalta a importância do GN na transição energética e alerta que o País necessita investir em fontes diversificadas Há pouco mais de um mês, a Copergás anunciou que vai investir R$ 986 milhões até 2029, isso significa 65% a mais que o patamar previsto anteriormente, de R$ 596 milhões. Também planeja até 2025 levar o GN para o Polo Gesseiro na região do Araripe, num investimento inicial de R$ 6 milhões, e faz estudos para também beneficiar o Polo de Confecções do Agreste. Seus planos preveem ainda a implantação do gás natural veicular no transporte público em Pernambuco, que já está em fase de testes, além de um projeto-piloto para um novo caminhão movido a GNV. Além disso, a partir de setembro, a Copergás passa a ofertar gás natural 100% renovável, o biometano, por meio da interligação, no Ecoparque da Muribeca, do supridor Orizon. À frente desse arrojado planejamento da empresa está Felipe Valença que, há menos de um ano, assumiu a presidência. Para obter esse investimento de quase R$ 1 bilhão, ele mostrou a Commit Gás e a Mitsui Gás – sócios da Copergás juntamente com o Governo de Pernambuco – a vantagem de reduzir a distribuição dos dividendos a 25% para permitir que os 75% restantes fossem reinvestidos. Nesta conversa com Cláudia Santos, Felipe Valença ressalta a urgência de ampliar a infraestrutura do gás natural como forma de induzir o desenvolvimento no Estado. Também salienta a importância dessa fonte energética como transição para uma matriz sustentável e para a própria segurança nacional. A Copergás divulgou que, na sua gestão, pretende estimular o desenvolvimento econômico de microrregiões do Estado ou segmentos econômicos com foco principalmente na indústria. Como isso tem sido executado? Nesse novo ciclo, em que buscamos alavancas de crescimento, percebemos que a Copergás deveria estar mais conectada como indutor de desenvolvimento do Estado e temos uma grande oportunidade no interior. Enxergamos que existe uma série de polos industriais em Pernambuco que ainda não são abastecidos pelo gás, entre eles, o Polo do Araripe que foi mencionado pela maioria das lideranças que ouvimos durante a revisão do nosso planejamento estratégico. Hoje temos uma malha de gás que margeia a BR-232, vai pelo litoral até chegar a Belo Jardim. Mas há outras regiões em que precisamos atuar como, por exemplo, a área têxtil de Santa Cruz do Capibaribe e Toritama. É uma região que representa em torno de 20% do jeans do Brasil e, assim como o Polo do Araripe, não tem infraestrutura de gás. A boa notícia é que conseguimos aumentar o investimento da Copergás nos próximos seis anos em 65%. Isso representa quase R$ 1 bilhão. No ano passado, com a revisão do planejamento estratégico, conseguimos a confiança dos sócios para reinvestir o resultado da empresa no Estado de Pernambuco. Até então, tínhamos uma política de distribuição de 100% dos dividendos, ou seja, sobrava menos dinheiro para investir. Hoje a política de dividendos é de 25%, que é o mínimo de uma S/A. Boa parte desse recurso é para o interior, então setores, como o Polo Têxtil, serão contemplados. É um projeto de expansão que vai sair de Caruaru para o polo do Agreste. Mas isso não é para este ano porque os estudos só começam a partir do ano que vem. Levar essa solução para as indústrias impulsiona o desenvolvimento porque traz economia para empresas como o Lafepe que acabou de virar nosso cliente e tem a expectativa de economizar R$ 1,2 milhões por ano. Além de ajudar na economia, o uso do gás natural faz com que as empresas possam participar ativamente na agenda de transição energética. Há muitas indústrias que ainda queimam óleo ou madeira, como o caso do Araripe. Isso arrasa a mata nativa e cria desertos. O gás natural é muito menos poluente, oferece uma economia de pelo menos 25% de CO2. Então é realmente sustentável. Como tem sido a receptividade das empresas do gesso ao gás natural? Muito positiva. Já temos cerca de 18 cartas de intenção de empresários locais manifestando interesse. De fato, existe uma demanda. Nosso cronograma está bem definido. Nunca um presidente da Copergás esteve lá e nós já estivemos várias vezes, sempre em companhia de diversos órgãos e lideranças estaduais, pois é um assunto de interesse de todos. Na última vez, estivemos com a governadora do Estado, que anunciou a desoneração do ICMS para o Polo Gesseiro. Isso gerou confiança do empresariado local. Temos lá um projeto-piloto que começa em abril, em que um empresário está fazendo investimento e nós estamos atuando para colocar o gás em teste e, em seguida, montar a infraestrutura pra valer. Nossa previsão é que as obras sejam iniciadas até o final do ano e que, a partir do primeiro semestre de 2025, iniciaremos o fornecimento. A Copergás anunciou que também vai intensificar o acesso em localidades que já contam com rede de gás. Ainda é baixo o número de conversões em locais que já contam com a oferta de GN? Para se ter uma ideia, no ano passado, quando começamos a fazer a revisão do planejamento estratégico, identificamos que só existem nove clientes da Copergás em Caruaru e a empresa está há 15 anos lá. Queremos universalizar o consumo. Existem outras cidades que, como Caruaru, contam com uma malha de gás para uso de uma indústria ou posto de gasolina, mas não atende o pequeno e médio comércio, por exemplo. Como está o projeto em relação ao consumidor residencial? O programa Morar Bem vai entregar as casas populares com gás natural? O gás residencial no Brasil é muito elitizado. Hoje, em Pernambuco, há apenas 90 mil usuários, é um leque muito pequeno. Para ampliar esse número, fizemos uma parceria com a Secretaria de Habitação para inserir gás natural em empreendimentos do programa Morar Bem. A preferência é instalar o gás

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“Não basta ser craque na advocacia, tem que ser também um cidadão”

João Humberto Martorelli, sócio-fundador de uma das mais reconhecidas bancas de advocacia de Pernambuco, conta como desistiu do sonho de ser diplomata ao se apaixonar pelo direito, fala da trajetória do escritório, do uso da IA e defende o papel do advogado em prol das causas sociais e da democracia Uma das bancas de advocacia mais conhecidas de Pernambuco, a Martorelli Advogados, festejou no final de 2023, sua trajetória de 40 anos voltados para o direito empresarial. Mas a atuação do seu sócio-fundador, João Humberto Martorelli, também esteve voltada para as causas sociais. Ele participou das diversas campanhas de resistência contra a ditadura militar e ajudou a fundar a organização Causa Comum, em que trabalhava de forma voluntária defendendo, na Justiça, diversos mutuários do Sistema Financeiro da Habitação. Foi também um dos pioneiros a adotar a política de inclusão para contratar pessoas negras, LGBTQIA+, com idade acima dos 55 anos e com necessidades específicas. Para João Humberto Martorelli o exercício da advocacia deve ser encarado como uma função social e não apenas uma atividade geradora de lucro. Nesta entrevista a Cláudia Santos, ele conta como desistiu do sonho de ser diplomata ao se apaixonar pelo direito, fala das causas sociais nas quais se engajou e como a inteligência artificial tem facilitado o trabalho do escritório. Como começou a Martorelli Advogados? A empresa começou com um estudante de direito que não estava fadado a fazer direito, estava construindo sua vida para ser diplomata. Na época, era exigência do Instituto Rio Branco cursar até o segundo ano de direito para, só então, fazer o concurso para diplomata. Quando eu estava no segundo ano de direito, meu pai, que era engenheiro, pragmático e não acreditava muito em diplomacia, pediu um estágio para mim em um escritório de advocacia do Recife. Comecei a estagiar no escritório de Vicente Gouveia só para satisfazer ao desejo do meu pai, mas acabei me apaixonando pela advocacia. O escritório era muito atuante, eu aprendi muito com eles e fiz um bom curso de direito, me esforcei, me dediquei bastante e, quando me formei, fiquei no escritório como advogado. Como muitos profissionais que estão em grandes bancas e têm o sonho de fazer a própria carreira, eu atendi o convite de Luiz Piauhylino e saí para montar, junto com ele, o meu escritório em 1983. Eu já tinha seis anos de formado e aí começamos uma carreira de advocacia muito interessante. Ampliei os setores em que atuava, que eram o comércio varejista e atacadista de uma forma geral e, com Piauhylino, entrei em outros setores, como o sucroalcooleiro, atuando junto a usinas na área tributária, ambiental e contenciosa. Com isso, crescemos bastante. Piauhylino seguiu na carreira política e, em 1997, o escritório que era Piauhylino e Martorelli passou a ser só Martorelli Advogados. A partir daí, sem um sócio sênior junto comigo, eu comecei a desenvolver uma filosofia de crescer o escritório por meio da formação de estagiários. Então, ao invés de buscar sócios no mercado, comecei a, praticamente, desenvolver uma grande escola de advocacia no escritório e, hoje, quase todos os meus sócios são ex-estagiários. Então a formação de pessoas foi essencial para o crescimento do escritório? O escritório cresceu bastante com essa filosofia e acho que vai crescer mais ainda porque continuamos com essa prática. Muitos escritórios que estão hoje no mercado foram formados aqui dentro. São advogados que repetiram a minha trajetória: ficaram um pouco trabalhando conosco e, depois, saíram para montar os seus escritórios. Além disso, eu sempre fui muito cidadão, muito envolvido em política, não política partidária, mas eu sempre gostei muito de defender as causas populares. Eu entendo que a advocacia, antes de tudo, é uma função social, tanto que hoje o advogado é inscrito na Constituição como indispensável à administração da Justiça. Por isso, me engajei em alguns movimentos políticos, participei das diversas campanhas de resistência contra a ditadura, e da eleição de Marcos Freire ao Senado. E, depois da derrota de Marcos Freire para o Governo do Estado, em 1982, começamos a desenvolver m trabalho na sociedade civil e fundamos uma associação, junto com João Braga (ex-secretário municipal de Infraestrutura e ex-secretário estadual de Justiça e Direitos Humanos), que se chamava Causa Comum, em que nós trabalhávamos de forma voluntária defendendo na Justiça diversos mutuários do sistema financeiro de habitação que não conseguiam mais pagar a prestação da casa própria. Patrocinamos voluntariamente mais de 15 mil mutuários aqui em Pernambuco. Então, gosto de assinalar que, ainda hoje, apesar de sermos voltados para o setor empresarial, visamos sempre à função social da advocacia. Por isso que hoje nós desenvolvemos, aqui no escritório, diversos trabalhos de efetiva inclusão. Hoje é uma tendência mas, há muito tempo, já praticávamos a defesa das causas sociais, a defesa de gênero, a postura antirracista veemente e a criação de cotas para estudantes negros, estudantes transgêneros, para idosos, etc. Temos sempre uma prática de muita diversidade dentro do escritório. De que forma é realizada essa inclusão? Aqui no escritório, nós temos cotas nas nossas seleções de estagiários de advogados. Destinamos uma cota para incluir negros, idosos e outras iniciativas de inclusão. Além disso, o escritório tem a postura de intransigente defensor dos direitos individuais, das causas sociais e isso é indispensável para o advogado. Hoje em dia se pensa muito assim: o estudante sai da faculdade querendo ganhar o primeiro milhão no primeiro ano. Temos que construir uma atividade com a prática baseada na seriedade, na ética, no respeito às causas sociais. Não basta ser craque na advocacia, ser bom em direito civil, tem que ser também um cidadão. Quais os benefícios que essa diversidade traz para o escritório? Traz muitos benefícios. O olhar diverso é muito importante e, na prática da advocacia, temos que ter esse olhar. Não me refiro somente à sigla ESG (responsabilidade social, ambiental e governança), que tem sido muito usada hoje em dia apenas como rótulo. Mas aqui no escritório isso traz grandes benefícios. Temos que saber que, no mundo, há diversos

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“A Reforma Tributária pode melhorar o ambiente de negócios e evitar a guerra fiscal”

Ricardo Alexandre, Procurador-geral do Ministério Público de Contas de Pernambuco, explica as transformações que vão acontecer na cobrança dos tributos no Brasil. Ele também aborda as ações do MCP-PE para tornar o direito tributário mais compreensível para a população. O direito tributário é um assunto árido e difícil, ainda mais no Brasil, onde há um complexo sistema de cobrança de impostos. Interessado em tornar o tema mais compreensível para a população, o procurador-geral do MPC-PE (Ministério Público de Contas de Pernambuco), Ricardo Alexandre de Almeida, tem feito programas na TV MCP-PE (o canal do Youtube do ministério), e palestras sobre o assunto. O objetivo, segundo ele, “é a população entender como funciona o direito tributário e até intervir no funcionamento e na elaboração das leis que vão interferir na sua vida, como no caso da Reforma Tributária”. Sua didática já é conhecida por muitos candidatos a concursos públicos que assistiram às suas aulas em cursos que ministrou. Nesta entrevista a Cláudia Santos, ele mostra o seu talento pedagógico ao explicar, de forma simples, as mudanças instituídas pela Reforma Tributária, tema do mais recente livro escrito em conjunto com sua mulher Tatiane Costa Arruda. Ricardo Alexandre de Almeida também falou sobre as ações do MCP-PE, em especial neste ano eleitoral. O livro que o senhor lançou é voltado para o público geral ou específico para advogados tributaristas? Fale um pouco sobre ele. Devido às mudanças da Reforma Tributária, lancei, junto com minha esposa, um livro mais técnico, sobre a reforma propriamente dita. É um livro um pouco mais complexo voltado para quem já é da área do direito tributário e quer entender o que está mudando. Mas também tenho feito algumas lives (https://www.youtube.com/@ TVMPC-PE) e palestras para que a população possa entender como funciona o direito tributário e até intervir no funcionamento e na elaboração de normas e leis que vão interferir na sua vida, como no caso da Reforma Tributária. É necessário que as pessoas saibam, por exemplo, que vários Estados brasileiros aumentaram o imposto sobre consumo. Nos países socialmente mais desenvolvidos, cobra-se menos imposto sobre consumo e muito imposto sobre renda e patrimônio, que são as duas coisas que mostram que a pessoa tem mais recurso. Claro que quem consome mais tem mais condição financeira, mas os mais pobres gastam todo o dinheiro que recebem e, geralmente, não têm condições de fazer uma poupança. Então, quem gasta todo o dinheiro que tem, será muito mais atingido por uma tributação de consumo elevada. Em Pernambuco, por exemplo, cobra-se 20,5% de ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços). Assim, um pernambucano, ao comprar uma mercadoria, paga 20,5% num só tributo, além dos outros impostos que existem no País. Por isso, é necessária a informação acessível. Seria muito importante que a população tivesse participado mais da elaboração dessa Reforma Tributária, não deixasse nas mãos dos grupos de pressão que surgem no Congresso. É importante que a população saiba que esses grupos existem e se informe para saber pedir e ter voz e vez. Um exemplo desses grupos de pressão são os prestadores de serviço de profissões regulamentadas, que possuem conselhos como contabilidade, economia, direito, que pressionaram o Congresso Nacional e conseguiram que as alíquotas que venham a pagar sejam 30% menores. Para os prestadores de serviço mais pobres, que não exercem essas profissões, a diminuição não aconteceu porque, geralmente, são categorias com menos acesso à informação. Mas ainda há possibilidades de mudar a regulamentação da Reforma Tributária, porque a emenda à Constituição não cria os impostos, ela autoriza que sejam criados e, nessa criação, há grupos de trabalho que ainda estão discutindo. O que o senhor achou da unificação dos tributos de consumo instituída pela Reforma Tributária? Achei boa porque simplifica o sistema. Agora vamos ter uma legislação única e não uma para cada Estado, o que pode facilitar, principalmente, as vendas entre os Estados. Por outro lado, essa unificação poderia ser melhor se seguisse o modelo de alguns países europeus, criando um só um IVA (Imposto de Valor Agregado), que é um valor adicionado cobrado pela União Federal com a fiscalização de Estados e municípios. Mas os municípios e Estados brasileiros não queriam ficar sem um imposto “para chamar de seu”, então foi criado o IVA dual, com a CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços) que é federal e o IBS (Imposto sobre Bens e Serviços), que é municipal e estadual. Então agora será uma legislação única e, apesar de terem sido criados dois tributos, as regras aplicadas vão ser iguais, o contribuinte só vai precisar apurar a base de cálculo que vai valer tanto para a esfera estadual, quanto para a federal. Acho que isso pode melhorar o ambiente de negócios no País, evitando guerra fiscal entre os estados. A Reforma Tributária também modificou outros tributos que não são associados ao consumo, como o IPVA. Quais foram essas modificações e o que o senhor achou delas? São muito boas. Aeronaves e embarcações vão passar a pagar IPVA. É um absurdo quem tem uma moto simples pagar o imposto e quem tem condições de comprar uma moto aquática, um iate, um helicóptero ou um avião, não pagar. Isso é uma questão de justiça, aumenta a arrecadação cobrando normalmente de quem tem maior potencial de pagamento. Outro ponto positivo é o imposto de transmissão sobre herança e doação, que passa a ser obrigatoriamente progressivo. Isso é importante porque não se pode tratar quem recebe uma herança de milhões de reais da mesma forma de quem recebe uma de milhares de reais. É preciso cobrar de acordo com a capacidade que cada sujeito tem, espremer mais as laranjas que dão mais suco, é essa a ideia. Algumas mudanças são positivas, outras tendem a ser, dependendo de como será a regulamentação. Por exemplo, foi criado um mecanismo, chamado cashback que fará com que o Poder Público devolva parte do imposto pago por famílias de baixa renda. Será registrado no CPF da pessoa o valor que ela está pagando em impostos

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Vamberto Maia Filho: “É importante pensar em congelamento de óvulos.”

Vamberto Maia Filho, Especialista em reprodução humana, comenta o livro que acaba de lançar com relatos de pacientes sobre as dores e os desafios de engravidar e no qual conta como ele e sua mulher também passaram por essa situação. O médico faz um alerta para as pessoas planejarem seu futuro reprodutivo. O ginecologista Vamberto Maia Filho realiza uma média de 15 procedimentos de reprodução por mês, número que tem crescido uma média de 15% ao ano. A maioria dos casais que chega ao seu consultório com o desejo de ter um filho desconhecia que a fertilidade diminui com o passar do tempo. “À medida que a idade da mulher aumenta, há menos reservas ovarianas e, com isso, há infertilidade e cada vez mais casais buscam tratamento”. Uma situação provocada principalmente pelas mudanças de comportamento da população feminina, que posterga a gravidez para se dedicar aos estudos e ao trabalho. Mas existem soluções. Nesta entrevista a Cláudia Santos, o especialista orienta que pessoas, principalmente a partir dos 30 anos, avaliem sua fertilidade por meio de dois testes simples: espermograma para os homens e avaliação da reserva ovariana (feito com um exame de sangue) para as mulheres. E que elas pensem na possibilidade do congelamento de óvulos. Vamberto Maia Filho também falou sobre o lançamento do seu livro Filhos – Histórias Inspiradoras, que traz relatos de 11 pacientes suas que contaram as dores e os obstáculos enfrentados até conseguir engravidar. Uma situação emocional difícil à qual o próprio médico e a mulher, a endocrinologista Maíra Passos, vivenciaram ao serem surpreendidos por um diagnóstico de infertilidade sem causa aparente. Ele relata em um dos capítulos como se sentiu vivendo na pele o desafio de suas pacientes e a felicidade de presenciar o nascimento das filhas trigêmeas Alice, Clara e Júlia. O livro hoje está disponível nas plataformas online e livrarias físicas e o valor das vendas será revertido para casais que não podem pagar pelo tratamento. A dificuldade para os casais terem filhos tem aumentado? Sim. Tanto que, ano passado, a Organização Mundial de Saúde fez um memorando trazendo o alerta de que uma em cada seis pessoas deverá ter problemas de fertilidade. É um número bastante expressivo, significa que cerca de 15% da população poderá apresentar essa dificuldade. O memorando, inclusive, sugere que esse assunto seja pauta presente nas organizações, nas estruturas do Ministério da Saúde mundo afora, pois o número só tende a aumentar. E quais são as principais causas da infertilidade entre os casais? A principal causa são as mudanças da vida moderna. Com o aumento da renda das mulheres e uma parte expressiva delas entrando no mercado de trabalho, o planejamento familiar muda. Minha avó, por exemplo, teve 10 filhos; minha mãe me teve com 25 anos e teve dois filhos, e a mulher hoje, com 35 anos, não está pensando ainda em engravidar. Nossa geração cresceu ouvindo que é possível engravidar a hora que quiser. Isso também influencia a natalidade. Em 2019 ou 2020, o IBGE mostrou pela primeira vez que nós chegamos a menos de dois filhos por casal, e a incidência de mulheres engravidando acima de 35 anos nunca foi tão alta. À medida que a idade dela aumenta, há menos reservas ovarianas, menos folículos, os problemas vão se acumulando e, com isso, há infertilidade e cada vez mais casais buscam técnicas de reprodução humana. Além da questão comportamental, fatores ambientais, como poluição, alimentação, rotina mais intensa, podem contribuir para a infertilidade? Há muitas pesquisas sobre isso. Estamos tendo mais acesso a agrotóxicos, à comida com hormônios, à alimentação ultraprocessada, então há, sem dúvida, uma mudança. As meninas estão menstruando cada vez mais cedo. A gente tem que pensar também em hábitos de vida. Antigamente a mulher nascia para ter um casamento, hoje a mulher tem uma liberdade maior, tem muito mais parceiros. A mudança de comportamento feminino teve ônus e bônus, e acho que o principal ônus é essa postergação da gravidez. Por isso é tão importante pensar em congelamento de óvulos porque nos dá a possibilidade de traçar perspectivas de um futuro reprodutivo para a mulher, mesmo que ela não tenha um parceiro. O senhor acredita que há pouca informação por parte dos casais sobre a idade fértil? Muitos casais têm a ideia de que conseguem engravidar quando quiserem porque suas gerações anteriores conseguiam. Por isso, muitas vezes, não se informam. Hoje estamos conseguindo mudar isso, conscientizando sobre a importância de buscar um ginecologista para entender o que acontece com o corpo da mulher, avaliar se ela terá ou não dificuldades para engravidar, se teve algum problema como endometriose ou cirurgias que dificultem a gravidez. Essa busca por esclarecimento está melhorando, mas ainda precisamos caminhar muito. No ano passado, a Agência Nacional de Saúde liberou, através de uma judicialização, que mulheres que tenham câncer de mama consigam, pelo seguro de saúde, o congelamento de óvulos. Mas será que as mulheres sabem disso? Será que os colegas oncologistas estão favorecendo essas mulheres? E quanto aos ginecologistas? No caso da avaliação sobre a quantidade de óvulos, por exemplo, será que ela é oferecida às mulheres pelos especialistas? Você tem toda a razão. É preciso que os ginecologistas, durante as consultas, perguntem às suas pacientes, principalmente às que estão com 30 anos ou mais, se pensam em ter filhos para avaliar como está sua reserva de óvulos. A pesquisa de reserva ovariana tem que fazer parte da avaliação das mulheres. Hoje ela é realizada de uma forma muito simples: com exame de sangue em que é feita a dosagem do hormônio antimülleriano, que não fornece a quantidade exata de óvulos que a mulher possui, mas nos dá uma ideia de como está sua reserva ovariana. Qual o percentual de homens e de mulheres inférteis? Ele é bem equilibrado. O masculino e o feminino são percentuais muito semelhantes. A diferença é que, nas mulheres, a avaliação deve ser muito mais ampla, porque elas podem ter um problema no útero, na trompa, no ovário, de hormônios e

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“Corbiniano é um artista ímpar e merecia estar em espaços sacralizados como os museus”

Bruna Pedrosa, curadora da exposição sobre o artista plástico conhecido por suas esculturas de figuras longilíneas em alumínio e pelo painel Revoluções Pernambucanas, fala da trajetória dele e da importância da sua obra. Também ressalta a necessidade dele ser mais reconhecido no Estado e no País. (Foto: Arnaldo Carvalho) A exposição 100 anos de Corbiniano Lins – A Festa! que está no shopping RioMar é uma excelente oportunidade para conhecer um pouco mais esse que é considerado um dos mais talentosos e importantes artistas plásticos de Pernambuco e do País. Negro, de origem humilde e nascido em Olinda, ele trabalhou com desenho, pintura, azulejaria, obra em arame, entalhe, gravura, serigrafia, tapeçaria, mas é mais identificado por suas esculturas. Elas foram produzidas com uma técnica muito particular, em que esculpia no isopor com faca de cozinha que era enterrado numa caixa de madeira, onde derramava o alumínio fundido. Os recifenses que não ouviram falar de Corbiniano, mas veem no dia a dia, monumentos criados por ele como Revoluções Pernambucanas, na Av. Cruz Cabugá, ou O Mascate, na Praça do Diário, ou mesmo algumas esculturas de mulheres na entrada de prédios da cidade, certamente vão reconhecer nas peças expostas seu traço fino e figuras longilíneas característicos do artista. Cláudia Santos conversou com a curadora da exposição Bruna Pedrosa, que falou sobre a mostra e a vida de Corbiniano. Ela destacou a participação dele no Ateliê Coletivo nos anos 1950, liderado por Abelardo da Hora, e que contava com artistas como Zé Claudio, Brennand e Samico. Apesar de sua importância, Bruna ressalta que Corbiniano ainda não desfruta de um reconhecimento como os demais colegas de seu tempo e credita isso ao racismo. Salienta, por exemplo, a lacuna existente em relação a livros sobre ele e o fato de suas obras não serem expostas em locais como museus. O que o público vai conferir nessa exposição, 100 anos de Corbiniano Lins – a Festa? Trouxemos um pouco de cada linguagem, uma pequena amostra de cada uma das técnicas desse artista que é conhecido pelas esculturas, mas tem outras linguagens e era bom em tudo. É impressionante! A festa — do título da exposição — remete à celebração do seu centenário e a um texto de Hermilo Borba Filho em um álbum com 10 serigrafias de Corbiniano que encontramos durante a pesquisa de curadoria. Neste álbum, intitulado Recife, de janeiro a janeiro, são retratadas manifestações da cultura popular, frevo, maracatu, caboclinhos, mostrando que somos um povo festeiro. Além do texto curatorial explicando essa temática, a exposição traz uma linha do tempo com marcos biográficos e principais obras, um texto chamado Técnicas e Temas e, em seguida, mostramos pelo menos uma obra de cada técnica usada por Corbiniano: desenho, pintura, azulejaria, obra em arame, entalhe, gravura, serigrafia, tapeçaria até chegar às esculturas. A figura feminina é bastante representada em suas esculturas em formas sinuosas e elegantes. Qual a relação das mulheres com a arte de Corbiniano Lins? O primeiro acesso dele ao universo artístico e artesanal da manualidade foi por meio das mulheres da família, que eram costureiras e trabalhavam com tapeçaria. Filho de um holandês que morreu quando ele tinha meses de vida, Corbiniano foi criado pela mãe e pelas tias e irmãs em Olinda. Começou a ajudá-las na tapeçaria aos 8 anos de idade e passou a se interessar pelo desenho copiando as gravuras dos tapetes. As mulheres foram importantíssimas nessa primeira formação, por isso ele tem uma relação forte com a representação da figura feminina. Quando adulto e mesmo casado, Corbiniano se relacionou afetivamente com muitas mulheres, era um boêmio como a maioria dos homens e artistas da época. Havia também as mulheres que posavam para seus desenhos e esculturas. Daí a diversidade de corpos em sua obra, mesmo predominando as figuras longilíneas, pernudas, de bumbum e seios fartos. Conviveu com mulheres artistas como Teresa Costa Rêgo e Ladjane Bandeira. Sempre expressou sua gratidão reconhecendo a importância de ter convivido com mulheres que também eram artesãs, artistas, em uma época ainda mais difícil que hoje, quando os homens sempre estavam à frente ocupando os espaços, sobretudo nas artes. Acho que tem essa admiração dele pelas mulheres dessa forma mais ampla possível, da mãe, às esposas, filhas, às modelos, às artistas, a todo o universo feminino com que ele conviveu tanto. Então, pelo fato dele estar rodeado de mulheres, de ouvi-las e observar suas personalidades conseguiu captar o universo feminino de forma profunda. Como foi sua trajetória artística? O primeiro contato com a arte foi, então, com a família, em Olinda? Sim, em Olinda, na primeira infância com as mulheres da casa, ele começa com tapeçaria e desenho. Na segunda infância, vai para o Recife e aprende outras técnicas, estudando em uma instituição pública federal, a Escola Técnica de Artes e Artífices. Na década de 1950, quando chega no Ateliê Coletivo, junto com Abelardo da Hora e outros artistas da época como Celina Lina Verde, passa do desenho para a arte tridimensional. Então, experimenta a escultura no barro, depois em terracota, em gesso e cimento até chegar à técnica da forma perdida, pela qual ele é mais conhecido. Nessa técnica, ele esculpia em tamanho natural no isopor usando uma faca de cozinha e palitos de churrasco, enterrava esse isopor numa caixa de madeira e derramava o alumínio, que ocupava o lugar do isopor se transformando nas famosas esculturas de alumínio fundido. Essa técnica vem da Europa, outros artistas já a usaram, mas poucos se identificaram tanto com ela quanto Corbiniano. Ele apaixona-se por ela, dando continuidade de forma mais profunda. Como um homem pobre, negro de Olinda, tornou-se um dos mais importantes artistas plásticos de Pernambuco e do Brasil? Por mérito da sua arte. Apesar de seu talento, sua trajetória é marcada por apagamentos do racismo. Há uma lacuna bibliográfica impressionante sobre ele, mesmo tendo esculturas e obras públicas espalhadas no Recife e em outros Estados que são cartões postais como A Sereia em Maceió e a Iracema em Fortaleza. É comum encontrarmos

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“Solano Trindade é um grande expoente da literatura negra e as pessoas pouco o conhecem”

Mário Ribeiro, Historiador da UPE, fala da vida e obra do autor do poema Tem gente com fome, que foi pioneiro na militância contra o racismo e na criação de uma arte voltada a retratar a realidade da população negra e que este ano completa cinco décadas da sua morte. Poeta, folclorista, pintor, ator, teatrólogo, cineasta e militante do movimento negro, o pernambucano Solano Trindade tem uma biografia densa. Foi um dos organizadores e idealizadores do 1º Congresso Afro-Brasileiro, realizado em 1934 no Recife e liderado por Gilberto Freyre. No Rio de Janeiro fundou, com o ator, escritor e sambista Haroldo Costa, o Teatro Folclórico Brasileiro. No ano seguinte participou do antológico Teatro Experimental do Negro, projeto idealizado por Abdias Nascimento com a proposta de valorizar o negro e a cultura afro-brasileira e também lançar um novo estilo dramatúrgico. Com o amigo Abdias, criou ainda o Comitê Democrático Afro-brasileiro que se estabeleceu como o braço político do TEN. Sua poesia, forte e criativa, aborda a condição da população negra e retrata uma realidade que permanece atual. Apesar de toda a importância da sua obra e do seu pioneirismo no combate ao racismo no País, Solano Trindade permanece desconhecido no Brasil, mesmo em sua terra, o Recife. Para analisar a importância do poeta pernambucano, Cláudia Santos conversou com o historiador e professor da graduação e pós-graduação da UPE (Universidade de Pernambuco) Mário Ribeiro. Quando Ribeiro estagiava na Casa do Carnaval – situada no Bairro de São José, onde Solano Trindade nasceu – conheceu a escritora negra Inaldete Pinheiro, que lhe apresentou a história de Solano Trindade. Hoje, ele recorre ao poeta em suas aulas, criticando e combatendo o apagamento do protagonismo negro na literatura, na história, na cultura, na política, na vida social como um todo. “A gente precisa investir nesse canal de transformação que é a escola”, propõe. Solano Trindade é um dos pioneiros na valorização da cultura afro-brasileira e da militância no movimento negro. Fale um pouco sobre a vida dele no Recife. Ele nasceu em 1908, no Bairro de São José. Localizado na zona portuária, próximo ao mercado público, à antiga Prainha de Santa Rita, o bairro é o mais preto do Centro do Recife, principalmente no contexto em que Solano nasceu. Por ali circulavam pescadores, vendedores ambulantes e pessoas desempregadas. Até hoje, há ecos dos tempos em que se vivia de pesca naquele entorno, como pescadores vendendo peixe e camarão na beira do rio e na entrada de algumas ruas. O Recife está mergulhado em mangue, no bairro de São José, há ruas e becos com nomes de peixes. Foi nesse contexto que Solano Trindade nasceu, um ambiente de trabalhadores pobres, pessoas pretas, na sua maioria, vivendo a grande efervescência das manifestações culturais. Muitos clubes de frevo, caboclinhos e maracatus surgiram ou tinham sedes por ali. O pai dele era sapateiro e tinha paixão pela cultura popular, a brincadeira do bumba meu boi, o presépio, ele era o velho do pastoril. Então, Solano se aproxima dessas culturas populares por meio do pai. A mãe, para quem Solano lia literatura de cordel, segundo algumas versões, era dona de casa e, de acordo com outras, trabalhava numa fábrica. Ele é um dos percussores do movimento negro no País. Era um estudioso que lia, pesquisava e trazia essa relação de África com o Brasil por meio do seu trabalho, e isso está presente em vários de seus poemas. Em vida, publicou quatro livros, um deles, O Poema de Uma Vida Inteira, foi apreendido pelo Estado Novo num período de grande perseguição e cerceamento daquelas pessoas e práticas consideradas desordeiras ou prejudiciais à ordem e ao bom funcionamento do Estado. Em um de seus poemas chamado Sou Negro, ele diz assim: Sou negro/ meus avós foram queimados/ pelo sol da África/ minhalma recebeu o batismo dos tambores/ atabaques, gongôs e agogôs/ Contaram-me que meus avós vieram de Luanda/ como mercadoria de baixo preço/ plantaram cana pro senhor de engenho novo/ e fundaram o primeiro Maracatu/ Depois meu avô brigou como um danado/ nas terras de Zumbi/ Era valente como o quê/ Na capoeira ou na faca/ escreveu não leu o pau comeu/ Não foi um pai João/ humilde e manso/ Mesmo vovó não foi de brincadeira/ Na guerra dos Malês/ ela se destacou/ Na minhalma ficou/ o samba/ o batuque/ o bamboleio/ e o desejo de libertação. Há muito da ancestralidade e da vivência em sua obra? Sim. Percebe-se um conhecimento dessa ancestralidade e oralidade na obra de Solano, porque muito do que ele escrevia era fruto do que ouvia e via. Então, a vivência e a memória estão muito presentes. O poema Pregões do Recife Antigo, por exemplo, traz o que ele ouvia passando pelo bairro de São José. Há um trecho que diz assim: Ei munguzá/ tá quentinho o munguzá/ istá bom, ispiciá/ de manhã bem cedinho a preta gingando enche de música o bairro de São José/ lá vem o cuscuzeiro/ cuscuz, cuscuz de milho/ e quando o sol vem iluminar a cidade/ as ruas se enchem de balaieiros/ enchendo de ritmo a beleza da terra/ é doce, é doce o abacaxi/ é doce, é doce e é barato. E aí segue falando do vendedor de banana, de manga, de sapoti, de jaca, de cajá. Ele traz, nos seus poemas, esses pregões que eram cantados por trabalhadores da rua, e isso garante sonoridade, musicalidade, presentes até mesmo em obras de denúncia, de crítica, como no poema Tem gente com fome, em que o trem sujo da Leopoldina vai passando pelas estações no Rio de Janeiro, de Caxias até os lugares para os quais ele se deslocava. E vai mostrando pessoas com semblante triste, com fome. É uma grande denúncia da desigualdade social e racial, pois não há como falar de relações étnico-raciais separando o social do racial, a cor da fome é preta, a gente sabe disso. Esse poema, por mais forte que seja, traz essa musicalidade com uma sequência de repetições. Tanto é que esse poema

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“Não vendemos só o maltado, nós proporcionamos boas lembranças”.

Fundada por Fidélio Lago, um imigrante de Cuba, As Galerias funciona há 95 anos no Bairro do Recife. O neto do fundador, Jorge Gomes, conta como uma bebida e um bolinho de receita cubana conquistaram o paladar do recifense a ponto de a lanchonete se tornar patrimônio da cidade. Uma bebida, originária de Cuba, ostenta a proeza de ser patrimônio cultural, gastronômico e imaterial do Recife. Mas é um reconhecimento bastante compreensível e justo, afinal o maltado, produzido na lanchonete As Galerias desde 1928, faz parte da memória afetiva de muitos recifenses e se incorporou ao paladar da cidade tanto quanto uma tapioca. Sua receita, trazida na bagagem do imigrante cubano Fidélio Lago, tem como segredos o malte retirado da amêndoa do cacau e o sorvete de baunilha, ambos produzidos na lanchonete. Outro sucesso é o bolinho cubano, que traz uma cobertura de malte, castanha e amendoim granulados. Boêmios, assíduos frequentadores da agitada noite do Bairro do Recife de décadas atrás, eram os principais clientes d’As Galerias, quando ela ainda funcionava no edifício conhecido como “Ferro de Engomar” (que sediou o Instituto Cultural Santander). Hoje, a lanchonete está na praça do Arsenal, mas Jorge Gomes, neto do fundador Fidélio, sonha em retornar ao antigo endereço. Nesta entrevista a Cláudia Santos, ele fala da trajetória do empreendimento que atrai uma clientela em busca do famoso maltado e até turistas interessados na sua história, ilustrada em antigas fotografias que adornam as paredes da lanchonete. Emocionado, Jorge também ressalta o significado de manter a tradição do negócio – “eu atendo famílias por várias gerações: o avô trouxe o pai, o pai trouxe o seu filho e o filho está trazendo o neto”. Um negócio que tende a se perpetuar com as filhas Vanessa e Vitória. “Elas já sabem fazer muito bem o Maltado”, assegura, orgulhoso. Como teve início As Galerias? A lanchonete foi fundada pelo meu avô, Fidélio Lago, que veio de Cuba e chegou no Recife em 1928 e, como um bom cubano, trouxe suas “especiarias”, entre elas, o maltado que até hoje sobrevive e é o nosso carro-chefe. Inicialmente a lanchonete era localizada numa construção histórica do Bairro do Recife conhecida como “Ferro de Engomar”. O imóvel liga as avenidas Marquês de Olinda e Rio Branco. As Galerias ficava no número 58 da Marquês de Olinda, no piso térreo, era uma passarela ligando uma avenida à outra. Daí vem o nome. Ficamos nesse local por 74 anos. Em 2003, tivemos que entregar o prédio à seguradora a quem o edifício pertencia e fomos para a Rua do Bom Jesus. Em seguida, mudamos para a Rua da Guia, nº 183, onde permanecemos até o imóvel ser vendido após o dono falecer. Mudamos, então, para a Rua da Guia, nº 207. Estamos aqui há quatro anos, mas meu desejo é, em algum momento, voltar ao primeiro endereço, na Marquês de Olinda. Este retorno seria importante não só para As Galerias enquanto empresa, mas para os clientes e para a cultura e lembrança do Recife. Eu assumi a lanchonete em 2008, ao lado do meu pai, Antonio Gomes, que faleceu em 19 de outubro de 2012 com o desejo de transformar As Galerias em patrimônio. Em 2014, conseguimos tombar a lanchonete como patrimônio cultural, gastronômico e imaterial do Recife, resistimos à pandemia da Covid-19 e seguimos sempre trabalhando com respeito à nossa história e à tradição da cidade do Recife. Levamos isso muito a sério, é tanto que estamos aqui há 95 anos, exercendo essa atividade com muito respeito, muito carinho, atravessando gerações de pai para filho, abrindo mão de vida social, trabalhando quase todos os dias do ano, pois aqui só fecha no dia 1º de janeiro e na Quarta-Feira de Cinzas. Trabalhamos de domingo a domingo, sempre servindo o tradicional maltado. Qual o segredo do sucesso do maltado? De que ele é feito? Tem gente que pergunta “esse maltado é aquele que tem leite, Nescau, gelo e açúcar”? Eu respondo que não, isso é achocolatado. O maltado, por sua vez, se faz misturando leite com sorvete de baunilha e malte, que vem da semente do cacau. O malte é quase um xarope da semente do cacau, por isso tem essa saborosidade de chocolate, mas não é enjoativo, você pode tomar um litro tranquilamente e não enjoa. São vocês que produzem o malte? É uma receita nossa bem peculiar de fazer. A gente faz esse malte que leva um pouco de açúcar. O sorvete de baunilha também é uma receita nossa. Quando misturamos o sorvete, o leite, o malte e açúcar, fazemos essa bebida que é uma delícia. Você pode tomar todos os dias e não enjoa. É refrescante, saborosíssimo, por isso se mantém até hoje. O bolinho cubano é outro sucesso. De onde vem essa receita? O bolinho também é uma receita que nossa família trouxe de Cuba. Aqui na lanchonete, vendíamos sete ou oito dúzias desse bolo por dia. Sempre vendemos junto com o maltado. É uma receita da época em que não existia hambúrguer, x-burguer, por isso vendíamos muito. Como também não existia refrigerante. Além do maltado, vendíamos o ice cream soda, que era uma bebida gaseificada. Com o surgimento do refrigerante, as vendas do ice cream soda caíram, mas o maltado continuou persistente. E, nesse período, quem eram os clientes que frequentam As Galerias? De 1928 até meados dos anos 1960, o Bairro do Recife tinha vida noturna, nós tínhamos o Porto do Recife vivo e isso atraia o público à noite. O Recife Antigo era um bairro de baixo meretrício, até os anos 1960 ainda havia vestígios dos cabarés. Aqui era o que se conhecia por “zona”, termo originário de Zona Portuária, que culturalmente passou a ser associado a prostíbulo. Os frequentadores eram as pessoas da boemia. Eram os portuários, embarcadiços, despachantes, estivadores, os gringos que vinham para cá e também as pessoas daqui do Recife que queriam ter uma vida noturna e buscavam alguma forma de prazer. Vinham escondidinhos por aqui, faziam a farra, dizendo que

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