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Entrevistas

"Corremos o risco de um novo apagão"

T roca de lâmpadas incandescentes por fluorescentes, banhos mais rápidos e o desligamento de aparelhos eletroeletrônicos. Quem vivenciou, em 2001, o apagão no País, certamente recorda-se de ter tomado medidas como essas para reduzir o consumo de eletricidade em 20%. Caso contrário, sofreria aumento na conta de luz. Passados 20 anos, eis que estamos novamente numa situação de risco iminente de corte de energia elétrica em todo o País. Para saber sobre os motivos que levaram, mais uma vez, o Brasil a essa situação, Cláudia Santos conversou com Ricardo Baitelo, coordenador de projetos do Iema (Instituto de Energia e Meio Ambiente). Baitelo aponta gargalos como a falta de planejamento, a necessidade de ampliação do sistema de transmissão de eletricidade e a não realização de leilões de energia nos últimos dois anos. Mas o especialista reconhece avanços ocorridos nessas últimas duas décadas como a diversificação da matriz energética com fontes renováveis e destaca que o Nordeste passou de importador para fornecedor de energia para a região Sudeste. Ele adverte, porém, que a MP da privatização da Eletrobras, que tramita no Congresso, concede uma reserva de mercado às usinas termoelétricas, o que pode pesar no bolso dos consumidores na hora de pagar a tarifa, além de elevar em 25% a emissão de gases de efeito estufa do setor de energia. Confira a entrevista a seguir. Como chegamos a essa situação de crise hidrológica e energética? Temos enfrentado, nos últimos anos, um risco de racionamento em maior ou menor grau por uma série de fatores, como uma variação do regime hidrológico – menos chuvas, um nível menor dos reservatórios das hidrelétricas – e, principalmente, de planejamento. Depois do racionamento em 2001, podemos dizer que o sistema elétrico e as decisões governamentais se aprimoraram para evitar que aquela situação acontecesse de novo. O racionamento provocou esse trauma político e, a partir de então, procurou-se mudar o planejamento, diversificar a matriz energética e melhorar o sistema de transmissão de eletricidade. Nesse sentido, o Brasil está em vantagem, não existe outro país continental com um sistema interligado como o nosso. Apesar disso, ainda existem gargalos. Nos últimos anos, houve novamente um gap de planejamento. O reflexo disso é que, durante os dois últimos anos, o governo optou por não fazer leilões de energia porque a demanda estava baixa, em razão da crise econômica e da pandemia. Então se considerou, naquela época, que o sistema estava folgado e que não era necessário fazer leilões, pelo menos até a demanda se recuperar. Mas a questão é que os leilões contratam empreendimentos que vão ficar prontos depois de três, quatro, cinco anos, é um planejamento para o futuro. Os setores de energia renováveis – eólica e solar – pediram para que esses leilões acontecessem mas o governo resolveu pausar durante esses dois anos. Se esses leilões tivessem acontecido, teríamos um parque maior de eólica e solar que poderia atender o sistema. Como não aconteceram, continuamos usando as usinas térmicas cada vez mais nesses cenários emergenciais, inclusive importando energia da Argentina e do Uruguai. Somado a isso, é que agora temos uma matriz elétrica que é o dobro daquela de 20 anos atrás, mas temos novos gargalos de transmissão de eletricidade. Existem muitos empreendimentos, principalmente de energia solar, que querem ser contratados no mercado livre e estão tendo que esperar porque é necessário um reforço da transmissão. É possível resolver essa problemática, mas não dá para resolver para amanhã. Corremos o risco de um novo apagão? Sim, corremos o risco. Apesar de o governo afastar o risco de racionamento, a sua comunicação está sugerindo que as pessoas não consumam tanta energia nos horários de pico. Se o risco não estivesse aí, a comunicação não seria dessa forma, porque o governo é o primeiro interessado em que essa situação não aconteça porque tem impacto sobre a sociedade e a economia. É a restrição do uso de energia impedindo a retomada econômica que o Brasil precisa. Hoje há algumas medidas paliativas que podem ser adotadas. Dá para contratar mais térmicas, que são mais caras e têm um impacto direto na tarifa do consumidor, não mais na bandeira vermelha, mas bandeira vermelha patamar 2, que é ainda mais cara. Também é possível implantar a eficiência energética que é o último ponto a ser usado. Seria a adoção de um conjunto de medidas de uso racional, como a substituição de equipamentos, consciência de uso etc., que passam também pelo gerenciamento da demanda. Tem bastante gordura para evitar mas historicamente se lança muito pouco mão dessa alternativa. Como o sistema é interligado, todo o País sofreria o apagão. Mas existe uma diferença em relação ao racionamento de 2001. O Nordeste naquela época era um notório importador de energia e hoje, ao contrário, a região apresenta uma geração bem grande de eólica com a missão de destinar energia para os estados mas, também, enviá-la para o Sudeste, que é o grande polo de consumo. Mas há que se prestar atenção nos gargalos que mencionei, na dinâmica do sistema, porque a eólica e a solar são fontes flexíveis, que têm que despachar energia quando ela está sendo gerada pelo sol e pelo vento (elas não podem ser armazenadas), diferente das despacháveis, como as hidrelétricas com reservatório e as térmicas. Essa dinâmica também tende a afetar o cenário de racionamento. Para citar um exemplo, está sendo discutida agora pela MP da Eletrobras, a contratação de térmicas que operam o tempo todo e não de forma emergencial. Isso também tende a afetar de maneira negativa a eólica e a solar. Estamos num paradoxo no qual temos o risco de falta de energia mas desperdiçamos energia eólica e solar. Então, voltamos à questão da transmissão que precisa ser reforçada. Você poderia explicar melhor esse gargalo na transmissão? A questão é bastante técnica mas o foco é que a prioridade tem quer ser dada para essas fontes flexíveis. Quando há sol e vento, elas têm que escoar a energia para o sistema. E a gente vem de um sistema que foi durante

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"Quando retornarmos à normalidade, a universidade vai voltar diferente"

E m maio do ano passado, ainda na primeira onda da Covid-19, Marcelo Carneiro Leão foi eleito reitor da UFRPE (Universidade Federal Rural de Pernambuco). De lá pra cá, tem enfrentado muitas dificuldades. A principal delas originada do corte de 21% no orçamento da instituição e sobre esse valor cortado há ainda 13,8% bloqueado pelo MEC. Neste período, o reitor tem presenciado também aceleradas transformações no ambiente acadêmico provocadas pela introdução repentina do ensino remoto. Nesta entrevista a Cláudia Santos, o reitor da UFRPE fala sobre as mobilizações que as universidades públicas têm realizado junto ao Congresso Nacional e à sociedade para a recomposição orçamentária das instituições. Conhecido por sua grande interatividade nas mídias sociais, Marcelo Carneiro Leão também comenta os desafios para implantar o blended learning, ou ensino híbrido de qualidade no País. Esse é um caminho sem volta, segundo Carneiro Leão, que é pós-doutor no uso das tecnologias da informação e comunicação no ensino de ciências pela Universitat de Barcelona. “Quem esteve no dia 15 de março de 2020 aqui na Rural, vivenciou um dia histórico: o último dia em que a Universidade Federal Rural de Pernambuco funcionou naquele formato. Isso serve para todas as instituições superior de ensino. Teremos uma nova universidade, o impacto que a pandemia causou não permite retornar da mesma forma que antes”, vaticina o reitor. Quais as consequências desses cortes no orçamento da universidade? Já vínhamos sofrendo, desde 2015, um decréscimo orçamentário que se agravou nos últimos dois anos e, principalmente, neste ano. Comparativamente – vou informar os números específicos da Rural – tivemos um corte de 21% no orçamento em relação ao ano anterior e sobre esse orçamento cortado ainda tem 13,8% bloqueado pelo MEC. Nosso orçamento é dividido em duas grandes áreas: investimento e custeio. No investimento, estamos zerados, tínhamos R$ 16,6 milhões, hoje temos um recurso de R$ 42 mil que é para a acessibilidade, já vem carimbado, e duas emendas, uma para o Instituto Menino Miguel, R$ 250 mil, e R$ 150 mil para Parnamirim (Estação de Agricultura Irrigada de Parnamirim, um campus avançado). Ou seja, não tenho nada para fazer de investimento este ano se não for recomposto o orçamento. Isso é grave, mas ainda mais grave é a situação do custeio que inclui pagamentos de água, luz, bolsa, terceirizados etc. Tivemos que cortar vários postos de terceirizados nas áreas de limpeza, transporte, recepção, só não cortamos em segurança. Fizemos um corte grande. Mantivemos as bolsas dos alunos e vamos reavaliar daqui a dois meses porque esperamos que alguma coisa seja recomposta desses 21%, caso contrário, ficaremos sem condição. Com toda certeza, se hoje estivéssemos com aulas presenciais, talvez não chegássemos no próximo mês com condições de manter a universidade funcionando, com o restaurante universitário aberto, aumento de energia etc. Sem isso, ganhamos um fôlego de dois a três meses. Mas, se não houver recomposição, vai ser bem problemático. Que ações as universidades públicas têm feito para reverter essa situação? A única forma de reversão é no Congresso Nacional na forma de um projeto de lei. A Andifes (Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior) está mobilizada. Estamos mobilizando nossos senadores e deputados, conversando com eles sobre a possibilidade de uma recomposição orçamentaria por meio de um projeto de lei. Já fizemos o que preventivamente como gestor teríamos que fazer que são esses cortes para ganhar um certo fôlego. Estamos fazendo ações também junto à sociedade. Estamos participando de divulgações, de entrevistas, de mobilizações, para que a própria sociedade perceba a importância das universidades no seu cotidiano, no enfrentamento da pandemia e pressione os parlamentares para a recomposição orçamentária. Qual tem sido a receptividade dos deputados e senadores? Os parlamentares independentes e oposicionistas absorvem a ideia e estão participando e colaborando. Infelizmente, existe uma base negacionista muito complexa mas acreditamos que possa haver algum movimento favorável numa parte dessa base. É aquela base de políticos que, ao perceber que a sociedade está se mobilizando para um lado, eles vão junto. Então, estamos mobilizando a sociedade e as entidades para ver se eles se sentem pressionados e, como vai ter uma eleição ano que vem, talvez isso mude um pouco o pensamento deles sobre essa questão orçamentária. O senhor acha que as universidades deveriam estar mais próximas da população, inclusive para ela entender a importância dessas instituições? Com certeza. Essa é uma das questões que a gente tem sempre que pensar e as universidades têm que fazer um mea culpa. Nós passamos muito tempo sem nos comunicarmos bem com a sociedade e parte dela acha que a universidade é algo isolado, uma ilha, não percebe a importância da formação dos profissionais, da pesquisa que é desenvolvida e da extensão. E isso permitiu que pessoas inescrupulosas começassem a passar a visão de que aqui na universidade só havia balbúrdia, sexo, drogas, e que aqui ninguém fazia nada. Uma parte da sociedade se apropriou dessa informação de forma equivocada por culpa também da universidade. Hoje, temos trabalhado a necessidade de melhorar o nosso diálogo, nossa comunicação com a sociedade. Há uma cultura que precisa ser vencida nas universidades – que existe até pela questão de financiamento – que é se preocupar em publicar papers etc. e não ir, por exemplo, para as periferias. O que é que as periferias das cidades sabem da universidade? Como os projetos de extensão podem impactá-las? Então, isso está servindo como um subproduto bom da pandemia, dessa crise orçamentária, que é a necessidade de repensarmos essa relação sociedade/universidade. Leia a entrevista completa na edição 183.2 da Revista Algomais: assine.algomais.com

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O interior já tinha desigualdade, com a pandemia, houve um agravamento

Na semana passada, José Patriota, presidente da Amupe (Associação dos Municípios de Pernambuco) esteve presente em vários veículos de comunicação para falar sobre a iminente falta de oxigênio nos hospitais do interior do Estado. Apesar de resolvido o problema, Patriota ressalta outras dificuldades que há anos assolam os municípios – como falta de água, déficit habitacional, desigualdade econômica e social – que foram agravadas com a pandemia. Mas, nesta conversa com Cláudia Santos, ele aponta soluções para o desenvolvimento dos municípios na retomada pós-Covid-19: investimento em educação, saneamento básico, reestruturação da órgãos que hoje, segundo ele, estão “cambaleando”, como Sudene e Dnocs. Patriota ressaltar ainda a necessidade de suspender a MP que subtraiu R$ 11 bilhões dos Fundos Constitucionais do Nordeste (FNE), do Norte (FNO) e do Centro Oeste (FCO) para destinar a projetos de parcerias público privadas. Esses fundos são um dispositivo crucial para a geração de receitas dos bancos públicos regionais, como o Banco do Nordeste. “O BNB é extremamente importante para o desenvolvimento da região”, alerta Patriota. Confira a seguir a entrevista. Quais os problemas enfrentados pelos municípios do interior durante esta pandemia? São vários problemas. Não estávamos preparados para lidar com o vírus e uma pandemia dessa magnitude, com efeitos tão danosos na vida das pessoas. Além disso, a condução nacional atrapalha. Temos conhecimento de que no mundo inteiro quem conduz a política integradora com todos os entes federativos é o governo central que tem o papel de coordenar, dar as diretrizes e criar as estratégias, ajudar na implantação de ações que possam mitigar os efeitos da pandemia. Temos uma situação esdrúxula do governo central negar e em determinado momento boicotar os encaminhamentos da ciência. Isso deixa os municípios que estão na ponta numa situação mais exposta. Outra questão é que essa contrainformação gera desencontros, porque o presidente da República não deixa de ser um líder e a Não estávamos preparados para lidar com o vírus e uma pandemia dessa magnitude, com efeitos tão danosos na vida das pessoas. E temos uma situação de o governo central negar e até boicotar os encaminhamentos da ciência liderança dele tem que estar a serviço da vida, de uma orientação única. Mas ocorre o contrário. Essa situação reflete diretamente nas pessoas e as pessoas não moram na União, nem no Estado, moram no município, é com o governo local que se relacionam. É muito difícil uma autoridade dizer uma coisa e a autoridade maior dizer outra. Já tínhamos uma condição econômica de desigualdade muito grande, agora, com a pandemia, tivemos um agravamento. Subiram as taxas de desemprego, subemprego e suas consequências que é a violência, a fome. E como o governo não tomou providências, o caminho mais seguro – que era a vacina no tempo certo e adequado – não me resta alternativa senão providenciar estrutura hospitalar de internamento e UTI. Isso foi providenciado. Ao mesmo tempo, tivemos que promover o distanciamento social para reduzir a propagação do vírus, o que tem impacto na economia. Temos milhões de desempregados num mercado que cada dia se tecnifica, se especializa e já não vinha absorvendo essa mão de obra sobrante. Durante a história, os governos não promoveram a política mais importante para uma sociedade se desenvolver que é a educação. Hoje, enfrentamos a falta de investimento, as universidades passando dificuldades enormes, não temos pesquisas, nossos cérebros vão embora. O Brasil se descuidou muito e isso na corrida da competição com China, Bloco Europeu e Estados Unidos, ficamos como um país gigante adormecido, com toda a condição, com gente inteligente, mas fica difícil se não tiver uma política estruturante e permanente nessa área de educação e inovação tecnológica. A pandemia está aí e não temos produção própria de vacina. É muito difícil de separar a pandemia do contexto socioeconômico. Dois terços do Nordeste está no semiárido, com dificuldade de abastecimento regular de água potável, de acesso a saneamento e outras questões de infraestrutura como moradia. Aí, surge uma situação dessa, que é muito complexa, porque os prefeitos têm que redirecionar todo o seu orçamento para a saúde. Como está a infraestrutura nos municípios para atender os pacientes com Covid? As unidades de saúde estão adequadas para atendimentos dentro da nossa realidade e a integração do Estado com a regionalização das UTIs. Hoje, Pernambuco é o primeiro Estado do Norte/Nordeste que mais tem UTI e o terceiro no Brasil. Há um fluxo integrado da rede estadual com a municipal, desde os agentes de saúde até os laboratórios. Qual é a dificuldade? Insumos. E, aí, entramos no contexto nacional e internacional da falta de uma política séria voltada para a população. Não temos vacina e a também a infraestrutura de oxigênio, por exemplo, estourou. Mas há hospitais sem fornecimento de oxigênio? Não, houve uma ameaça. Tivemos um sinal amarelo, mas nos reunimos com o secretário de Saúde, com o governador e com as empresas produtoras. Temos uma produção de oxigênio suficiente para atender mas temos uma deficiência de logística para a entrega que poderia não suportar a demanda que aumentou muito. Inclusive a indústria não sofreu nada ainda, continua recebendo oxigênio. Tivemos que estudar com as empresas de logística que entendem do assunto. O Estado montou uma operação em que há uma central de plantão emergencial de fornecimento de gases hospitalares para normalizar o abastecimento e disponibilizou 30 mil metros cúbicos de oxigênio. A central é composta por membros da Amupe, do Estado, das empresas envolvidas, na qual monitoramos a situação 24 horas por dia. Em situação de emergência, todos os prefeitos estão sabendo quais as providências tomar, quem acionar, etc. Então isso está administrado. Como está a situação social das cidades? O interior reproduziu o modelo da capital e toda cidadezinha tem um cinturão de pobreza nos bairros em volta do centro. São pessoas que migraram do campo para a cidade, desempregadas, que não têm casa própria ou como pagar um aluguel. O Auxílio Emergencial chegou agora, mas entrou no lugar do Bolsa Família, não houve o acúmulo dos benefícios. Esse foi o

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"Dá para aplacar a fome e ganhar muito dinheiro com a biodiversidade brasileira"

Num momento em que se discute os caminhos para Pernambuco e o Brasil saírem dessa crise sanitária e econômica, a química de produtos naturais Cláudia Sampaio Lima aponta o uso racional e sustentável da biodiversidade brasileira como solução. Cláudia, que é professora da UFPE, alerta que existe um mundo de oportunidades em bionegócios que podem beneficiar de pequenos produtores às grandes indústrias, mantendo a floresta em pé. Para isso é necessária a união da sociedade, da academia e do governo. E é com essa filosofia que o ITCBio (Instituto Tecnológico das Cadeias Biossustentáveis) foi criado. Nesta conversa com Cláudia Santos, Cláudia Lima que é diretora do instituto, fala dos projetos da entidade, analisa os gargalos da inovação no País, cuja iniciativa privada não costuma investir em pesquisa, e aponta saídas com a bioeconomia. Na sua opinião quais os principais gargalos para o desenvolvimento da inovação no Brasil e, especialmente, em Pernambuco? No Brasil temos um problema muito sério de comunicação entre universidades e empresas. Fora do País, quem investe em inovação é a iniciativa privada. Tive a oportunidade de conhecer alguns centros de pesquisas, tanto na Europa quanto nos EUA, e o que observei é que a inovação é financiada pelas empresas que precisam se colocar no mercado e lançar novos produtos. E quem é que pode colocar as empresas à frente do mercado? São as universidades, são as cabeças pensantes que trabalham fazendo pesquisa básica, mas também pesquisa aplicada. Existe uma preocupação dos governos no exterior de também incentivar a pesquisa pública. Mas no Brasil, o que acontece é que o governo financia tudo: pesquisas básica e aplicada. Por que São Paulo tem um nível de comportamento empreendedor mais arrojado que as outras cidades brasileiras? É porque lá as universidades são financiadas pela Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo), existe um polo industrial muito forte e uma parte dos impostos das empresas vão para essa fundação, para as universidades, para financiar projetos de pesquisa. Ou seja: impostos são revertidos em ciência e inovação. O que impede uma maior participação da iniciativa privada nos investimentos de ciência e pesquisa e da academia em atuar com inovação com as empresas? Professor universitário tem a mania de achar que a sua pesquisa é a coisa mais importante do universo. Eles pensam algo como: “quem tiver interesse que venha até a mim porque eu tenho vários artigos publicados em revistas nacionais e internacionais”. Só que a comunicação dessa forma não funciona. Por outro lado, as empresas têm muita pressa, não financiam pesquisa básica, eles querem a solução pronta, não entendem que existem pesquisas que estão patenteadas, que levaram 15 anos, com muita gente trabalhando. É aquela história de tentativa e erro, tentativa e acerto. E, muitas vezes, a pesquisa leva 15 anos porque os recursos são minguados, não há como pagar uma equipe. Por que outros países do Brics, como a Índia, Rússia, China, desenvolveram vacinas contr a Covid e o Brasil, não? Ouvi uma frase, já conhecida, que me bateu muito forte esta semana: brasileiro tem síndrome de vira-lata. Não valorizamos o trabalho local. Será que o Brasil não tem condições de desenvolver a vacina? Ele tem e já tinha há muito tempo. E por que o Brasil não estava fabricando vacina e o IFA (insumo farmacêutico ativo)? Por falta de incentivos. Fazia-se o feijão com arroz, e muito bem- -feito, porque erradicamos muitas doenças com vacinas do Instituto Butantan, da Fiocruz. Veja, eu tenho mestrado e doutorado em farmácia, faço palestras há muito tempo sobre insumos naturais nas quais sempre digo: se houvesse um bloqueio internacional, o País iria morrer doente. O que é o ITCbio? O instituto foi concebido dentro da UFPE, com trabalhos multidisciplinares. Todavia, não foi muito bem na universidade porque um grupo de professores ficou incomodado com essa situação de a pesquisa ser levada para a sociedade. Eu digo para meus alunos: “temos a obrigação de devolver para a sociedade os investimentos que ela fez em nós porque o meu salário e a universidade de vocês quem paga é a sociedade”. Como a gente pode retribuir, ao menos, minimamente, esse investimento? É fazendo ciência de qualidade e levando para a sociedade. Com esse pensamento, aprovamos dois grandes projetos com a Sudene, envolvemos num deles mais de 60 pessoas e atuamos em três Estados – Pernambuco, Bahia e Piauí – com projetos colaborativos. Foi a partir deles que nasceu o ITCbio (Instituto Tecnológico das Cadeias Biossustentáveis). Focamos em bioeconomia. A proposta do ITCbio é atender a sociedade, sem discriminações, desde agricultores familiares que precisam de um apoio em inovação até grandes indústrias. A sociedade é quem precisa de ciência, tecnologia e inovação e a partir dessa demanda, o ITCbio busca, com especialistas das universidades e dos institutos de pesquisas, ferramentas para resolver os problemas demandados. Sempre digo que ao se reunirem três ou quatro pessoas de áreas distintas para analisar um mesmo problema, cada uma terá um toque diferente. Se você consegue trabalhar de forma colaborativa, ouvindo todos os parceiros, você consegue uma solução muito mais ampla. A essência da bioeconomia é utilizar ferramentas científicas tecnológicas para apoiar cadeias produtivas sustentáveis, desde o básico, a produção do alimento, do bioinsumo até o consumidor final, passando pelas empresas. Você poderia falar um pouco dos projetos que desenvolvem? Temos uma diversidade grande de projetos. Vou falar de um simples, mas que promoveu uma diferença para a sociedade: o Jequiá Sustentável. O Jequiá é uma área do Recife que tem a única torre intacta de atracação do Zepelim do mundo. Existem três comunidades com vulnerabilidade socioeconômica muito alta que habitam o entorno do parque, que tem um conteúdo histórico fabuloso, mas, por não ter investimento, parecia um local abandonado. O que as pessoas fazem com um terreno que parece abandonado? Normalmente jogam lixo. Fizemos um trabalho nas comunidades e instauramos hortas suspensas de espécies orgânicas e medicinais junto com a Secretaria de Meio Ambiente do Recife. Elas eram suspensas porque, dessa forma, ficam protegidas de animais, e o

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"A Transnordestina seria muito útil para o transporte de frutas"

A pandemia não arrefeceu o mercado de frutas. Pelo contrário, no primeiro quadrimestre deste ano o volume de mangas exportadas cresceu 24%, quando comparado com o mesmo período de 2020, e o de uvas, nada menos que 93%, segundo dados da Conab (Companhia Nacional de Abastecimento). O consumidor, em meio à crise sanitária, passou a adotar hábitos mais saudáveis, como incluir frutas na sua dieta diária. Ressalte-se que 90% da uva de todo o Brasil que é comercializada para o mundo sai do Vale do São Francisco, e 93% da manga também. Para falar sobre este bom momento da fruticultura, Cláudia Santos conversou com o presidente da Abrafrutas (Associação Brasileira dos Produtores e Exportadores de Frutas e Derivados) Guilherme Coelho. Esse bom desempenho não significa que os fruticultores do Vale estão colhendo apenas boas notícias em seus negócios. Eles enfrentam alguns gargalos como a infraestrutura do escoamento da produção, que poderia ser mais fácil e com menor custo se fosse realizada pelo modal ferroviário. Confira a seguir a entrevista. Quais as consequências que a pandemia trouxe para setor de fruticultura? Graças a Deus, a pandemia não afetou diretamente o setor de fruticultura do Brasil, nós continuamos trabalhando, porque o agro não pode parar, fornecendo alimentos para o Brasil e o mundo. Como está a exportação de frutas? A perspectiva deste ano é muito boa, nós estamos muito animados. Essa semana saiu um dado da Conab/Mapa (Ministério da Agricultura), que diz que no primeiro quadrimestre deste ano, nós crescemos cerca de 22% o volume de frutas exportadas e 32% em volume em dólar no Brasil. Neste mesmo período, foram 44 mil toneladas de manga e 12 mil toneladas de uvas exportadas, sendo que 90% da uva de todo o país que é comercializada para o mundo sai do Vale do São Francisco, e 93% da manga também. Então, estamos muito animados, entendendo que o mundo está  consciente de que a fruta é um alimento muito saudável e o consumo de fruta continua aumentando cada vez mais. Além da manga e da uva, quais são as outras frutas com potencial de grande produção e comercialização no Vale do São Francisco? Aqui se destacam a manga, como a fruta mais exportada, e a uva, que passou por grandes transformações nos últimos cinco anos no que diz respeito às novas variedades – uva branca, uva negra, uva vermelha – que têm despontado muito bem lá fora. O que tem crescido bastante aqui, no Vale do São Francisco, é o melão, hoje são 1.5000 hectares dessa fruta, que não é exportada, é vendida no mercado interno. Mas também tem crescido o mercado da acerola, da goiaba, do coco. Como tem sido o processo de produção para seguir os protocolos de segurança? É muito importante dizer que, para uma fazenda exportar fruta, ela tem que ter vários certificados internacionais. Então, é o certificado social para saber quem são os trabalhadores rurais, como eles trabalham, se usam EPI (que é o equipamento de proteção individual), se têm carteira assinada, se existem bons tratos para com essas pessoas, se há transporte adequado e tudo mais. Temos também certificações que tratam do manuseio do alimento, da fruta. Temos ainda certificados que falam da sustentabilidade. Então, em relação a isso, os consumidores no Brasil e no mundo podem ficar tranquilos, porque nós temos todos os certificados e as frutas são produzidas em ambientes sustentáveis. Como estão as vendas para o mercado interno? Nós somos o terceiro maior produtor de frutas do mundo e temos um mercado interno muito forte. A Organização Mundial de Saúde sugere que cada habitante do mundo coma cerca de 150 quilos de fruta por ano. No Brasil, o consumo é de 50 quilos de frutas/habitante ano, e precisamos cada vez mais melhorar. Com a pandemia e a conscientização de que a fruta é um alimento saudável, eu acredito que está crescendo a cada dia o consumo. Como vai a indústria de sucos de frutas no Vale? Em relação a essa indústria, temos várias empresas aqui de suco de uva, que é um suco fantástico, muito aceito no Brasil inteiro e no exterior, e eu creio que vem sempre crescendo. Existem também muitas indústrias de polpa de frutas, produzidas por agricultores familiares e pequenos agricultores, e de envasamento de água de coco que gera muito emprego e renda. Como está a infraestrutura de escoamento das frutas? Logo no começo da pandemia, houve uma paralisação dos aviões de passageiros para o exterior, principalmente para a Europa, e é muito importante dizer que a grande quantidade de fruta exportada por via aérea vai nos porões nos aviões de passageiros. Mas isso logo normalizou, essas frutas não foram perdidas, foram transferidas tanto para o mercado interno, como também enviadas de navio. Então, isso não houve nenhum prejuízo em relação a essa questão. O que a gente sofre bastante – e o Ministério da Agricultura tem trabalhado neste sentido – é quantidade insuficiente de fiscais agropecuários nos portos e aeroportos. A gente efetivamente precisa de mais fiscais porque, muitas vezes, existe uma demanda de contêiner para embarcar em tal porto e essa fiscalização não ocorre na rapidez e eficiência que a gente precisa. Mas o governo está tomando essas providências. Quais os gargalos que o setor enfrenta para crescer ainda mais? Um dos gargalos é o fato de algumas regiões do Brasil ainda não estarem livres da mosca da fruta [praga que ataca as plantações de fruticultura]. E isso impede algumas exportações, principalmente para os Estados Unidos, sendo necessário algum tratamento. Aqui, no Vale do São Francisco, o tratamento hidrotérmico da manga tem um custo maior e a fruta não sai com a qualidade que nós esperávamos. Mas, o governo brasileiro, através do gabinete de Segurança Institucional, está trabalhando bastante em irradiação de frutas, que é como se fosse um escâner que passa pelo palete onde está a fruta e, com isso, resolve-se qualquer dificuldade que tenha em relação a uma larva de mosca da fruta e também de outras

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"É preciso manter as medidas de prevenção mesmo para quem foi vacinado"

Enquanto a pandemia segue provocando estragos, a ciência, porém, não está parada. Além de realizar pesquisas que resultaram em vacinas reponsáveis pela contínua redução do contingente de doentes e de óbitos, uma outra vertente de pesquisas busca a descoberta de novos medicamentos. “Desde o surgimento da doença, milhares de ensaios clínicos têm sido desenvolvidos. Vacinas para prevenção, soros em pessoas infectadas e vários medicamentos têm sido estudados”, destaca Moacir Jucá, médico infectologista da Rede D’Or São Luiz em Pernambuco. Nesta entrevista a Cláudia Santos, o especialista, que é coordenador do Serviço de Controle de Infecção do Hospital Esperança, fala dessas pesquisas, das consequências no atraso da vacinação e de como enfrentar futuras mutações do coronavírus. Ele também alerta ser fundamental manter as medidas de prevenção, mesmo entre aqueles que já foram vacinados. Qual a sua perspectiva sobre a evolução da Covid-19 em Pernambuco e no País? Ainda estamos longe de resolver o problema da Covid-19. Devemos ainda enfrentar um período de grande número de casos até a estabilização. Essa expectativa é para o Brasil e também para Pernambuco. O senhor acredita ser inevitável enfrentarmos uma terceira onda da Covid-19? A ocorrência de uma terceira onda é possível e vai depender muito da velocidade com que a população está sendo vacinada. Quanto maior o número de pessoas vacinadas, menor a circulação do vírus e, consequentemente, a chance de termos uma terceira onda. No momento também estamos vivendo um novo surto de arboviroses? Temos visto neste momento um aumento no número de casos de arboviroses. Isso coincide com o período de chuvas e esses casos, muitas vezes, podem ser confundidos com a Covid-19. Apesar de habitualmente o paciente com Covid apresentar sintomas gripais, os sintomas podem ser semelhantes aos de uma arbovirose: febre, dor no corpo, dor nas articulações, dor de cabeça. A avaliação médica torna-se necessária para identificar com mais precisão se o paciente está com Covid ou não. Na velocidade em que caminha a vacinação, o senhor acredita que possam surgir novas variantes do novo coronavírus? Será preciso “redesenhar” essas vacinas para atingir essas mutações? A velocidade da vacinação e proteção da população serão fundamentais para reduzir a chance de novas variantes. O surgimento de mutações é um evento natural e esperado dentro do processo evolutivo dos vírus. Em relação às vacinas, para garantir eficácia contra toda as variantes, uma opção é desenvolver várias vacinas individuais, chamadas monovolantes, que atuam sobre um coronavírus específico e, a seguir, combinar várias vacinas monovalentes para obter uma única vacina polivalente, que atua sobre vários tipos de coronavírus. A outra opção é encontrar um código genético que seja suficientemente representativo dos coronavírus, a partir do qual uma vacina universal possa ser criada. O senhor gostaria de colocar mais alguma informação que considere importante? Mesmo com a vacinação, medidas de prevenção contra a Covid-19 seguem necessárias para oferecer proteção segura contra o vírus. As medidas de proteção funcionam para todas as variantes do vírus. Leia a entrevista completa na edição 182.2 da Revista Algomais: assine.algomais.com

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"O Recife precisa saber que o hub consular existe"

Isabella de Roldão é a primeira mulher eleita a ocupar o cargo de vice-prefeita do Recife e tem levado para campo político discussões sobre as dificuldades enfrentadas pela população feminina. Ela tem afirmado que a busca de soluções para a desigualdade de gênero passa, necessariamente, pela visibilização e valorização da chamada economia do cuidado. Isabella também tem se aproximado dos consulados presentes no Recife, cujo número só perde para São Paulo. Nesta conversa com Cláudia Santos, a vice-prefeita detalha as ações em prol de uma maior participação das mulheres no mercado de trabalho e as negociações com o hub consular para consolidar iniciativas de cooperação em diversas áreas. Como a senhora analisa a participação das mulheres na política brasileira e, especialmente, em Pernambuco? A avaliação que faço é um caminho crescente. A participação é ainda aquém do esperado, da potência de quantidade existente de mulheres com mentes pensantes, brilhantes, inquietas. Acredito que temos potencial para expandir mas os impedimentos da vida doméstica e pessoal para a vida profissional – na política, principalmente – são gritantes. A dificuldade a gente sente na pele quando ousa dizer sim à vida pública. E, nesse processo, vemos como é difícil, mesmo, para as mulheres terem esse espaço porque não nos é permitido. Até pelo horário de compromissos, das exigências que são feitos para o universo masculino. A senhora poderia detalhar melhor porque existem tão poucas mulheres na política? Eu tenho trazido muito à tona a temática da economia do cuidado que é uma coisa que a gente precisa descortinar. Para se compreender o que é a economia do cuidado, vou dar um exemplo: por que na Europa as pessoas não decidem casar tão cedo? Às vezes moram juntos, se separam, mas ninguém tem essa ansiedade, essa relação de namoros longos, noivar, casar e, logo depois, os filhos. A vida a dois, a vida doméstica é compartilhada. Ainda que as dificuldades que as mulheres europeias enfrentam, em tese, sejam muitos similares em decorrência da gestação, do parto e da amamentação, há uma parceria com o marido. No Brasil, especificamente no Nordeste, as exigências são grandes: você começa a namorar, perguntam logo quando você vai ficar noiva, aí quando você noiva, perguntam: “vai casar quando?” Quando você casa: “Vai ter filho quando? E quando é que vem o segundo? Ah! vieram dois meninos, e não vai tentar um terceiro pra ver se vem uma menina?” Então, é sempre muita exigência e eu tenho uma tese: essa exigência existe porque o cuidado doméstico está restrito à mulher. O ônus recai sobre a gente; é a tal história: “quem pariu Mateus que o embale.” A economia do cuidado é invisibilizada, ninguém discute as mais de 70 horas semanais que uma mulher em período de amamentação passa exclusivamente com o bebê no peito. Não estou aqui contando hora de botar para arrotar, de trocar fralda, de dar banho, de botar para dormir. Durante o período de aleitamento materno, preconizado pela OMS de seis meses, são mais de 650 horas só exclusivamente no peito. Fora essa mulher fazer comida e, quando volta a trabalhar, assumir os trabalhos fora e dentro de casa. A economia do cuidado precisa inicialmente ser materializada, ser identificada e ser, acima de tudo, monetizada. Uma mulher que casa e faz a opção junto com o marido de ficar mais em casa com o trabalho doméstico do que com o trabalho externo, quando há uma briga conjugal sobre dinheiro, a primeira coisa que o homem faz é bater no peito e dizer: “quem paga as contas sou eu, quem sustenta a casa sou eu e você tem que comprar o que eu quero e fazer o que eu mando”. Ou seja: nada do que essa mulher faz na casa é contabilizado. Aí eu pergunto a você: como é que a gente vai dizer para mais mulheres entrarem na política se o ônus desse cuidado continua sobre as nossas costas? Há um desafio para nós, mulheres: precisamos aprender a enxergar o nosso limite. Uma coisa básica: eu preciso fazer depilação. Homem não se depila e, no universo político, trabalha-se de segunda a segunda, de 6 horas da manhã até a meia-noite, se for preciso. E a gente precisa dizer: espera aí, mas eu tenho o meu tempo, eu preciso fazer a minha depilação, preciso ficar com meu filho, ter meu tempo de descanso e não entrar nesse embalo que masculiniza. E acho que até para os homens é ruim também porque robotiza. Temos necessidade de comer e dormir, descansar, amar, ler um livro, um dolce far niente, um ócio produtivo. A gente precisa dizer: eu sou um trator trabalhando mas preciso do meu tempo. Diante dessa realidade, quais as suas propostas para ajudar a reverter essa situação? Há um dado gritante: 42% das mulheres em idade produtiva estão fora do mercado de trabalho por causa desses cuidados domésticos que são tão restritos a esse ser mulher. Por isso, normatizou-se contratar homens – porque as mulheres engravidam – e se convencionou que as mulheres devem ficar em casa. O importante é falar, é trazer à tona essas questões. Esse espaço que ocupo hoje, democraticamente escolhido numa chapa construída a muitas mãos, é um espaço de abrir caminhos, de reafirmação para as meninas e para as mulheres de que, de fato, a gente pode seguir adiante mesmo com as dificuldades. Temos construído algumas coisas que são frutos dessas provocações. Por exemplo, você deve saber que embora tenhamos o nosso Porto Digital super mega equipado e visionário, enxergado pelo mundo todo como referência, temos, porém, um déficit de mulheres na área de TI. Apenas 15% de mulheres ocupam os espaços de tecnologia. Então, estamos estabelecendo parcerias junto com consulados para capacitarmos as mulheres para a área de TI, se for do desejo e da habilidade delas, contanto que a gente diga: isso não é um espaço só para homem, é para quem quiser. Um exemplo concreto de uma política pública que já foi sancionada, já é lei, é o Crédito Popular, que prioritariamente

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"É fundamental investir em educação e requalificação profissional."

Quando os profissionais, munidos com seus notebooks e smartphones, instalaram seus ambientes de trabalho nas residências, não tinham dimensão do quanto suas rotinas iriam mudar. Passado um ano, desde que a Covid-19 levou muitas empresas a fechar seus escritórios, o futuro ainda permanece meio nebuloso. Mas nesta entrevista a Cláudia Santos, o sócio da TGI, Fábio Menezes, vislumbra alguns cenários. Fábio, que é consultor em gestão estratégica de negócios, especialista em formulação e execução de planejamento estratégico empresarial, analisa as perspectivas do home office e dos impactos da tecnologia, como o 5G, além de alertar para a necessidade ainda maior de incentivar a educação no Brasil e requalificar os profissionais. Reflexões importantes para esta semana em que celebramos o Dia do Trabalhador. A pandemia impôs a necessidade do home office para muitas empresas e chegou-se a dizer que essa seria uma modalidade de trabalho que veio para ficar. No entanto, grandes empresas, inclusive da área de tecnologia como o Google, anunciaram o retorno ao escritório, mesmo que seja de forma híbrida. Qual o futuro do home office? Acho que o home office veio para ficar, não como substituto definitivo do trabalho presencial, mas como recurso, pelo menos para boa parte das empresas. Entendo que não necessariamente precisamos colocar a equação presencial x remoto, mas presencial + remoto. As análises que estão sendo feitas agora estão usando uma base muito específica, que é a pandemia. Muitas empresas saíram do 100% presencial para o 100% remoto, muito rapidamente, sem planejamento e sem nem mesmo desejo, foram obrigadas a se modernizar. Por isso, acho ainda cedo para avaliar se o home office funciona ou não. Aposto mais no modelo complementar: físico + remoto, com as adaptações necessárias a cada segmento de negócio, função dentro das organizações, perfis dos profissionais, entre outras características específicas. De certa forma, o avanço da tecnologia nas últimas décadas já foi construindo essa condição. Quantos de nós deixamos de ter computadores fixos (desktops) e telefones fixos em casa? Na medida em que usamos notebooks e smartphones já facilitamos muito a circulação do trabalho pelos ambientes corporativos e residenciais, literalmente nos bolsos e nas bolsas. Quando podemos checar o e-mail ou responder a uma mensagem em qualquer lugar, dia ou horário, usando uma ferramenta que está sempre conosco, ao alcance das mãos, isso significa que é cada vez mais difícil separar o home do office. Assim como tantas outras questões, a pandemia acelerou o que já estava em curso. Quais as habilidades que passaram a ser necessárias no trabalho com o surgimento da pandemia? Entendo que ninguém se preparou para enfrentar uma pandemia nas proporções como estamos vivendo. Talvez só consigamos analisar bem os impactos daqui a alguns anos, depois de sairmos do meio do furacão e após vários estudos complementares. No entanto, minha impressão é que a pandemia tem sido uma espécie de “pós-graduação” em planejamento estratégico para muitos empreendedores e profissionais. De fato, estamos vivendo um tempo em que é muito difícil projetar cenários e administrar as incertezas, estamos lidando com uma variável (o vírus) ainda muito desconhecida e surpreendente. E já que está difícil vislumbrar o futuro, um efeito quase que automático é a angústia gerada pelas incertezas, sobretudo quando os impactos envolvem o risco à saúde e à sobrevivência, tanto pessoal como empresarial. Por isso, outra competência importante é a capacidade de suportar pressões e ameaças, manter o equilíbrio e conseguir decidir com pragmatismo. Como a tecnologia vai continuar impactando o trabalho? O desenvolvimento tecnológico influencia a forma como as pessoas vivem de maneira abrangente – como produzem, estudam, consomem... Portanto, a tecnologia impacta também os modelos de trabalho na medida em que traz novas possibilidades, às vezes substituindo padrões antigos, outras vezes acrescentando recursos e ferramentas novas. Por exemplo, estamos nos aproximando cada vez mais do 5G e isso deve trazer novas possibilidades que mudarão a forma como muitas pessoas trabalham atualmente. Segundo um estudo da Nokia e da consultoria Omdia, a expectativa é de mais de US$ 1 trilhão de investimento até 2035, com potencial de agregar cerca de um ponto percentual ao ano no PIB brasileiro. A implantação do 5G vai acelerar as transformações que já estão em curso como IoT (internet das coisas), big data, analytics, entre outras. Vai possibilitar a conexão não só entre computadores, tablets e celulares, como também entre outros equipamentos, como carros, eletrodomésticos, drones e máquinas. Isso tudo muda a vida das pessoas e, consequentemente, aparecem novas demandas de trabalho. Afinal, quantas pessoas hoje trabalham diretamente com internet e mídias sociais ou usam, de alguma forma, essas ferramentas nos seus negócios? Leia a entrevista completa na edição 181.5 da Revista Algomais: assine.algomais.com

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Roberto Gusmão: "Nós vamos ter a Transnordestina aqui"

O presidente de Suape Roberto Gusmão está atento à votação de dois projetos de lei que estão próximo de serem votados no Congresso. Um deles é a lei chamada BR do Mar, que incentiva a navegação de cabotagem, feita nos portos dentro do País. Atualmente, só empresas brasileiras com navios próprios podem operar o serviço no Brasil. Pela BR do Mar, o mercado seria aberto a companhias sem frota própria, que poderiam alugar embarcações estrangeiras, desde que 2/3 da tripulação seja de brasileiros. O outro projeto é a PL 261, de autoria do senador José Serra (SP), que permite a uma empresa privada concluir obras de ferrovias, como a Transnordestina. Seria a oportunidade para Pernambuco concluir o trecho de Salgueiro a Suape, que está parado há anos. Grupos, como os que detêm as jazidas de minério de ferro, no sul do Piauí, que seriam transportadas pela Transnordestina, poderiam se interessar. Nesta entrevista a Cláudia Santos, no último dia 16, Roberto Gusmão comenta como essas novas legislações podem beneficiar o porto pernambucano. Gusmão também apontou soluções para tornar a movimentação de contêineres mais competitiva, a atração de players do setor metalmecânico para o complexo e a perspectiva de o Estado se tornar o principal produtor ensavador de gás de cozinha do Nordeste. Suape obteve o aval da Capitania dos Portos para receber navios de 366 metros de comprimento. De que forma essa autorização vai estimular a movimentação do porto? Esses navios apresentam um comprimento que é fundamental para que se tenha o maior número de contêineres carregados. São navios como o que interrompeu o Canal de Suez. Eles serão o futuro. O Panamá gastou US$ 3 bilhões para fazer uma outra passagem no seu canal que contemplasse o comprimento e a largura desses navios, que não estão ainda operando no Brasil. Um dos portos que primeiro conseguiu a autorização foi o de Santos, que é o maior da América Latina. Pela nossa estratégia de médio a longo prazos, precisamos já estar habilitados para quando houver essa demanda. Além disso, conseguimos, em março, do Ministério da Justiça e da Segurança a deliberação de que o Complexo de Suape está habilitado também quanto à segurança, no grau de risco dos portos. Muitos poucos portos têm essa certificação. O senhor mencionou o Canal do Panamá, e há uma expectativa que com a sua ampliação, Suape se consolidaria como um hub portuário. Os navios cargueiros provenientes principalmente da Ásia, trafegariam pelo canal e, em Pernambuco, passariam a carga para navios menores que a distribuiriam para outras localidades. Qual a perspectiva disso se tornar realidade? É uma perspectiva muito intensa. Hoje temos absoluta certeza que somos líder no Nordeste, principalmente nessa parte de cabotagem, que é a navegação no nosso próprio litoral. Existe uma lei que está sendo estabelecida que é a BR do Mar. Ela regulamenta essa questão da cabotagem, estabelecendo-a como prioridade, inclusive com uso de embarcações internacionais, salvaguardando a questão da mão de obra. Como somos líder em cabotagem, acreditamos, não só pelo Porto do Panamá, mas mesmo nas diversas rotas que há no mundo, que estamos habilitados e em condição de ser um hub. Já somos um hub de granéis líquidos, na parte de combustível, e nos habilitamos a ser também hub em todos os tipos de carga do Nordeste, pela localização privilegiada, pela profundidade do nosso canal (que tem quase 15,60 m e chegará em 20m), pela estrutura e infraestrutura do porto e do Complexo de Suape como um todo, mas principalmente pelo mercado. Estamos rodeados por cinco grandes capitais do Nordeste com 45 milhões de consumidores, num raio de até 800 km, o que faz com que Suape seja extremamente competitivo na parte logística, tanto do transbordo como você falou – isto é, os navios vêm carregados, deixam uma parte aqui e vai distribuindo em outros portos – como também a questão da carga completa aqui em Suape e a distribuição em caminhões para pequenas distâncias. Qual a sua expectativa para a votação no Senado do projeto BR do Mar? Acredito que serão aprovados agora neste primeiro semestre não só o BR do Mar, mas também o projeto de lei do senador José Serra (PL 261), que permite a um ente privado concluir os trechos que ainda estão faltando de ferrovias, como a Transnordestina. Hoje, se a decisão da conclusão da Transnordestina for técnica, não tenho dúvida de que Suape será o beneficiado (entre os trechos da obra que estão incompletos estão: de Salgueiro a Suape, que beneficiaria o escoamento de cargas pelo porto pernambucano, e da cidade de Missão Velha ao Porto de Pecém, que favorece o porto cearense). Mas, mesmo que a decisão não for técnica, nós nos habilitaríamos a fazer o trecho que está faltando de Salgueiro até Suape, por meio da iniciativa privada, com a chamada outorga autorizativa. Um ente privado, em vez de esperar que o governo faça uma concessão e essa concessão passe por uma licitação, ele faz uma proposição ao Governo Federal para autorizar fazer aquele trecho que ainda não foi feito. Hoje a concessão da Transnordestina está se arrastando há mais de 15 anos com um grupo que não tem uma estratégia muito bem definida como negócio. Agora, estamos falando de grupos que têm diversas jazidas de minério de ferro extremamente competitivos e que precisam de ferrovia para poderem se integrar a portos no Brasil como um todo, mas que hoje precisam de uma concessão, o que demanda um prazo muito grande, e agora vão poder fazer por meio de uma outorga de autorização. Assim, vamos conseguir ter a nossa Transnordestina para que possamos fazer um escoamento de cargas não só do Piauí, que tem diversas jazidas, principalmente de minério de ferro, mas também das outras mercadorias que Pernambuco também é líder nacional, como a gipsita (o gesso do Araripe) e as frutas do São Francisco. Será que finalmente a Transnordestina será concluída? ANTT (Agência Nacional do Transporte Terrestre) e o Tribunal de Contas sugeriram a caducidade da atual concessão da

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Sérgio Ferreira: "Precisamos incentivar a autoconsciência"

Sérgio Ferreira era um homem dos números e dos cálculos, mas foi fisgado pelas elucubrações filosóficas. Engenheiro e economista, fez doutorado em filosofia, com uma tese que unia os pensamentos de Viktor Frankl e Friedrich Nietzsche. Nesta entrevista a Cláudia Santos, ele conta um pouco dessa sua trajetória e analisa como a fusão desses dois grandes pensadores podem nos ajudar neste trágico momento da pandemia. O que o levou a estudar filosofia? Sou formado em engenharia e economia, sempre trabalhei com projeto econômico e adoro ser engenheiro também. Mas sempre gostei muito de filosofia, de pensar sobre a vida. Com as minhas filhas já criadas, resolvi voltar para a academia com o objetivo de entender melhor o mundo. Fiz meu mestrado em administração, especificamente em teoria institucional, que também nos dá uma certa ideia do mundo como um todo e das instituições. Fui presidente da AD Diper, no terceiro governo de Dr. Arraes. Quando saí de lá, nessa perspectiva de entender melhor o mundo, resolvi entrar para o movimento de cursilho de cristandade. Fui da igreja católica e esse foi um movimento trazido para cá por Dom Hélder. O interessante é que era um movimento somente dos leigos. Uma das mensagens do cursilho é sobre o sentido da vida, mas eu sentia que a resposta religiosa é boa quando se tem fé. Mas o mundo mudou de uns tempos para cá, quando Nietzsche falou que Deus estava morto. Ele não estava querendo dizer que Deus não existe mas que, como explicação do mundo, Deus não fazia mais sentido, porque na contemporaneidade, no mundo da ciência, essas explicações religiosas deixaram de existir. Durante muito tempo o mundo ocidental foi carregado de explicações dogmáticas que a gente aceitava, mas isso foi deixando de existir. É o que Nietzsche chama de morte de Deus. Eu tenho fé, mas consigo separar o conhecimento religioso do conhecimento filosófico científico que vive da crítica, de perguntas. No conhecimento religioso, você tem que aceitar as explicações que são dadas. Eu queria entender mais sobre o sentido da vida, não apenas sobre esse aspecto religioso. Nessa caminhada me deparei com um pensador chamado Viktor Frankl, que criou a logoterapia. Ele escreveu um livro muito famoso Em busca de sentido, sobre sua experiência como prisioneiro num campo de concentração. Ele nasceu em 1905 e morreu em 1997, era austríaco. Antes de ser preso, já com 16 anos, teve um artigo aceito na revista de Freud. Ele começou como freudiano mas, depois, foi achando que esse pensamento não explicava bem o que ele queria que era o sentido da vida. Ele achava que colocar o sentido apenas no prazer, principalmente sexual, não explicava. E onde entra seu interesse por Nietzsche? Estudando Frankl, reparei que ele de vez em quando citava Nietzsche e fiz meu doutorado unindo o pensamento dos dois. Nietzsche influenciou o mundo como um todo naquele período até a Primeira Guerra e depois também. Mas Nietzsche é amado e odiado. Muita gente acha que ele disseminou o suicídio porque esse pensamento da morte de Deus não é bem compreendido. Na verdade, Nietzsche é um crítico do niilismo mas muita gente acha que ele é niilista. Ele mostrou que as pessoas, ao quererem explicar o mundo a partir de Deus e se conscientizarem que isso não explica a realidade, vão ficar frustradas e verão que isso é “um nada” e o niilismo vem disso. Mas, para Nietzsche, os cientistas também acabariam niilistas por buscarem a verdade e ele afirmou que não existe verdade. Nietzsche diz que o mundo é aqui na Terra e temos que olhar para a Terra, não para os céus, para entender o mundo. Essa discussão foi cada vez me encantando mais ao longo da pesquisa. E Nietzsche tem um conceito importante que se chama vontade de potência. O que vem a ser vontade de potência? Nietzsche afirmou que o mundo está em eterna luta, tudo são lutas em movimento. Se você olhar para o cosmo como um todo, são asteroides batendo um com outro. Também na Terra os seres viventes querem ter mais força, querem progredir, permanecer, existir. A partir desse conceito eu respondo a uma pergunta que muita gente se faz nesta pandemia: se Deus só quer o bem do mundo, como é que está acontecendo tanto sofrimento? Acontece que coronavírus está querendo também permanecer, lutar, ele precisa infectar as pessoas para poder se reproduzir. E aí a partir desse conceito de Nietzsche, minha conclusão é que vai caber a nós, seres humanos, nos unirmos para vencer todas essas adversidades. Ou cooperamos mais, olhamos mais para a Terra, mais para o entorno, ou o mundo se acaba, porque o mundo é vontade de potência e se nós, seres humanos, não procuramos nos entender, nos organizar, ficarmos buscando explicações no céu, um vírus desse pode nos derrotar. Da mesma forma, tempos e tempos atrás, um asteroide bateu na Terra. Mas, ao contrário de Nietzsche, tenho minha religiosidade acredito que existem energias que nós não explicamos, não acho que tudo seja filosófico. Eu me considero um espiritualista. Essa união não parece pouco provável nestes tempos de tanta polarização política? Esse modelo de mundo dividido entre esquerda e direita, com partidos políticos, vem da Revolução Francesa, com os girondinos e jacobinos. Acho que até hoje existe uma crise de identidade porque logo depois disso chega Karl Marx, com a teoria dele desenvolvida em plena Revolução Industrial e ele não foi um crítico dessa revolução, dessa produção em massa. Ele foi contra o controle do capital que estava na mão de poucos, mas ele não criticou essa forma de ser do mundo, massificada. Nietzsche foi um crítico da Revolução Francesa. O que eu vejo – e talvez seja um sonho, uma utopia – é que nós precisamos nos unir porque desse jeito o mundo está acabando. E isso não é só no Brasil, o mundo todo é assim. Acredito que o modelo que foi criado até hoje está nos levando à destruição. A economia tem uma lei

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