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JB Carolina Beltrao 1

60 anos do Grupo JB: "Sempre fomos um grupo inquieto"

Grupo JB chega aos 60 anos e sua diretora executiva, Carolina Beltrão, conta a trajetória da empresa que começou com um pequeno engenho produtor de aguardente e hoje atua no mercado de etanol, açúcar, energia e CO2, tem cinco mil empregados e operações em Pernambuco e no Espírito Santo. Saber perceber as oportunidades do mercado para impulsionar os negócios tem sido uma estratégia de sucesso de muitas empresas. Ao completar 60 anos este mês, o Grupo JB foi uma das companhias do setor sucroenergético que direcionou os investimentos de acordo com as novas realidades que se apresentavam na economia brasileira e global. De um pequeno engenho que fabricava aguardente, a atuação do grupo expandiu-se para a produção de etanol, impulsionado pela política do Pro-Álcool dos anos 1980. Com a Crise do Apagão, no início dos anos 2000, os negócios expandem para a cogeração de energia elétrica a partir de biomassa de cana. Em seguida, as preocupações com as mudanças climáticas e a oportunidade de abastecer a indústria de alimentos e bebidas, levou o grupo a fornecer o dióxido de carbono puro grau alimentício, em vez de jogá-lo na atmosfera. Hoje o Grupo JB engloba três empresa: a Companhia Alcoolquímica Nacional, a Carbo Gás (ambas em Vitória de Santo Antão) e a Lasa Bioenergia (em Linhares, no Espírito Santo) e emprega cinco mil pessoas. Para saber mais sobre a trajetória da empresa nessas seis décadas, Cláudia Santos conversou com Carolina Beltrão, diretora executiva do Grupo JB. Ela também abordou alguns gargalos enfrentados pelo setor sucroenergético, como a infraestrutura dos portos e a escassez de mão de obra. Fale um pouco sobre a trajetória da empresa. Como ela começou? Começou em 1964, com meu avô. No último dia 16, comemoramos 60 anos. Começamos, como muitas usinas de Pernambuco começaram: um engenho pequenininho que fazia só aguardente. Um dos nossos primeiros clientes foi um o Engarrafamento Pitú porque nossa usina fica em Vitória de Santo Antão. Também vendíamos para outros engarrafamentos que havia por perto. Quando meu avô faleceu muito jovem, meu pai e meus tios tiveram que tomar conta do negócio. Eu sou a terceira geração, com cara de segunda geração, porque o grupo cresceu mesmo na mão do meu pai e dos meus tios. Em 1980, quando aconteceu o Pro-Álcool, enxergamos o tamanho da oportunidade que se abriu. Foi um boom no negócio, tanto que, em seis meses, construímos uma destilaria nova com recursos próprios. Consequentemente, entramos também pesado no comércio exterior, exportando e importando muito álcool. Trazíamos um tipo de álcool, reprocessava, mandava embora outro tipo. Fazíamos isso junto com outras usinas de Pernambuco e da Paraíba. Devido a essa movimentação com o comércio exterior, construímos, junto com esse grupo de usinas do Nordeste, um terminal de graneis líquidos na Paraíba que impulsionou nossas operações de importação e exportação de álcool. Mas hoje, graças a Deus, esse terminal tem tantos clientes que não é possível mais fazer esse movimento de exportação lá. Nessa época em que abrimos essa destilaria de álcool, com muita importação e exportação, conseguimos nos capitalizar bem. Sempre fomos um grupo inquieto, que não se acomodou e sempre de olho em possibilidades que pudessem levar a JB a um novo patamar. No início dos anos 2000, quando o Brasil enfrentou a Crise do Apagão, já gerávamos nossa própria energia, éramos autossuficientes. Então, montamos uma nova termoelétrica com biomassa, a primeira de Pernambuco, queimando o bagaço da cana para gerar energia. E, assim, surgiu outro negócio dentro do que já tínhamos. Em 1996, adquirimos a empresa Lasa Linhares Agroindustrial, no Espírito Santo, numa estratégia para garantir que tivéssemos produção de álcool durante o ano inteiro, já que as safras da região Nordeste e Sudeste acontecem em períodos distintos, sendo complementares. O passo seguinte foi uma nova ampliação das nossas atividades. Fizemos investimentos em aquisição de terras e processos agroindustriais para entrar na indústria alimentícia por meio da produção de açúcar a granel. Com o bagaço da cana, vocês geram energia para o consumo próprio e para o mercado? Nos anos 2000, conforme mencionei, instalamos a termoelétrica para consumir nossa própria energia e sobrar para colocar no mercado. Hoje, a gente vende muita energia diretamente para a Eletrobras, temos um contrato de alguns anos, por meio do Programa de Energias de Fontes Alternativas [Proinfa]. A operação é daqui de Pernambuco e tudo que sobra vai para o Proinfa, lá no Espírito Santo, no mercado livre. É importante ressaltar que, na crise energética de 2001, quando o governo brasileiro conscientizou a todos de que não poderíamos deixar nossa nação sem energia, surgiram várias fontes alternativas, e fizemos parte disso. Ajudamos o Brasil a passar por aquela confusão em que era preciso diminuir e controlar o uso de energia elétrica em casa e também nas empresas, muitas tiveram que desligar máquinas, parar a produção. Outra iniciativa importante foi a primeira fábrica de CO2, a Carbo Gás que instalamos em Pernambuco. O insumo, matéria-prima essencial em diversos segmentos fabris, é um subproduto dos processos das usinas, oriundo da fermentação do álcool. Vimos que, numa era de debate intenso sobre o aquecimento global, poderíamos reduzir significativamente nossas emissões diretas, reaproveitando o dióxido de carbono. Assim, ao invés de lançar esse gás na atmosfera, ele é vendido para as fábricas, como a Coca-Cola, que precisam de CO2 de grau alimentício, usado no refrigerante, na água com gás e na cerveja. Também abrimos uma fábrica desse gás no Espírito Santo. Assim, com uma usina em Pernambuco e uma destilaria no Espírito Santo, cujas safras são invertidas por causa das chuvas, é possível produzir o CO2 alimentício o ano todo. Como é a produção desse tipo de gás? Na produção do álcool, esse gás escapava para a atmosfera, hoje a gente capta, purifica, limpa, liquidifica e vende. Então é mais um tipo de negócio inserido na nossa empresa, é um lindo exemplo de economia circular. A gente planta e colhe todos os anos, e o CO2 que antes iria para a atmosfera é revertido para

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Um bolo para homenagear o Recife

Gilberto Freyre: “Pode-se falar de um paladar brasileiro histórico e é possível também tropical ou ecologicamente condicionados e como tal ao que parece predisposto a estimar o doce e até o abuso do doce (...) um doce o de preferência brasileira, como que barroco e até rococó (...) é a arte mais sensual da sobremesa.” Pode-se dizer que Pernambuco tem uma forte relação com a criação de bolos. Bolos que trazem memórias ancestrais ibéricas, e bolos que são reinventados para formarem novas memórias. O bolo sempre acompanhou a história de Pernambuco, pois recebe nomes de lugares, de engenhos de açúcar, de famílias; marcam datas históricas; e revelam assinaturas, de doceiras e doceiros, de famílias ilustres à época da criação da recita do bolo. Assim, os bolos marcam a vida de uma sociedade marcada pelos contextos dominantes da cana-de-açúcar enquanto verdadeiras marcas heráldicas. Os bolos são quase brasões feitos de trigo, mandioca, ovos, leite, açúcar, diga-se muito açúcar; frutas frescas e/ou secas; e especiarias do Oriente. O bolo no Nordeste é principalmente uma invenção para expressar os sabores e as estéticas dos trópicos. Bolos para exibirem o glacê “mármore”, feito à base de açúcar e cítricos. Bolos para serem apreciados no dia a dia. Bolos para as celebrações dos santos de junho, com receitas com muito milho e canela. Destaque para Gilberto Freyre que em 2020 celebrou 120 anos de nascimento, e assim, do seu livro “Açúcar” (1939), trago alguns dos muitos nomes de bolos que marcam um sentimento nativo pernambucano. Bolos nomeados como pessoas: bolo Cavalcanti, bolo de milho D. Sinhá, bolo padre João, bolo D. Luzia, bolo Souza Leão, bolo Souza Leão - Pontual, bolo D. Pedro II, bolo de mandioca à moda Dr. Gerôncio. Bolos nomeados como lugares: bolo Guararapes, bolo de bacia Pernambuco, bolo paraibano, bolo de rolo pernambucano, bolo brasileiro, bolo Souza Leão à moda da Noruega.Há outros bolos com nomes diversos como: bolo Divino, bolo de São Bartolomeu, bolo engorda-marido, bolo de São João, bolo Republicano, bolo treze de maio. Trago um estudo de caso que vai além do livro “Açúcar”. É o bolo Recife, um bolo-homenagem à capital pernambucana. Tradicionalmente mantém a forma circular, que é características dos bolos caseiros e das padarias. Ainda, pode ser apresentado no formato retangular ou de “caixa”, e com recheio de doce de ameixa. É um bolo para o cotidiano, para acompanhar o café ou chá, ou mesmo acompanhar um generoso pedaço de queijo. Sem dúvida, o bolo acompanha a vida pernambucana.  

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Cachaça, limão e saúde

A nossa tão celebrada branquinha, purinha, ‘água que passarinho não bebe’, integra os melhores momentos de comensalidade enquanto abrideira de refeições, e ao mesmo tampo abre as relações sociais, aproxima as pessoas, e possibilita momentos para serem disfrutados nos rituais da alimentação. Refiro-me a nossa cachaça, que certamente faz parte de um dos hábitos mais brasileiros à mesa, seja em casa, no balcão de bar ou de botequim, numa banca de feira ou de mercado, quando se vive a tão gostosa ‘talagada’, aquele gole inteiro e único dessa bebida que nasce da cana-de-açúcar. A cachaça, quase sempre, é servida pura, em copos pequenos, dose simples ou dupla, de opções de cachaças novas e brancas; ou envelhecidas em barris, quando ganham um buquê especial que revela um amplo universo de cores, sabores e perfumes, que proporcionam um encontro com o bem beber. Pura, com um pedaço de limão, com uma colher de mel, ou na mistura com vermute, um tipo de traçado, o popular ‘rabo de galo’, são algumas das muitas opções de se relacionar com a cachaça. É uma bebida que aproxima as pessoas e as aproxima dos sentimentos sagrados. Porque as bebidas fortes, em mutas tradições religiosas, têm a propriedade de criar alianças com os deuses e os ancestrais. Por exemplo, Exu, para os Ioruba, é o orixá inaugurador do mundo, aquele que tudo come, e que tem preferência pelas bebidas alcóolicas. No nosso caso brasileiro, é a cachaça; no caso nigeriano, é o gin; e em Cuba, é o rum. Também, essa relação da bebida com a religiosidade é comum nos sistemas de fé por marcar um sentido masculino e sexual, que estão representados nessas bebidas fortes, além das suas muitas conexões com a vida. Ainda, nas tradições populares, a cachaça é uma boa amiga, porque funciona para celebrar, cultuar; e manter hábitos terapêuticos, como: para passar nas picadas de insetos; para prevenir e curar resfriados adiciona-se sumo de limão e uma colher de mel à cachaça. Há muitos outros usos considerados funcionais no cotidiano e integrados aos momentos de sociabilidades. Nesses cenários tão amplos, e de permanências culturais, outro uso social da cachaça é de uma mistura consagrada nacionalmente como caipirinha. Uma mistura clássica que nasceu, provavelmente, das receitas do uso da cachaça para curar os resfriados, nesse caso, substituiu-se o mel por açúcar. Assim, a partir do hábito cotidiano de misturar cachaça e limão surge a nossa patrimonializada caipirinha. Um verdadeiro símbolo de bebida nacional. Entretanto, a glamorização da caipirinha faz com que seja preciso estabelecer uma data, o dia e a hora do certificado de nascimento. É mais uma busca por apropriação do mercado de consumo. E trazer, neste atual momento da pandemia, a caipirinha como a recuperação de uma invenção de cura para a gripe espanhola, início do Século 20, é mais um casuísmo, visto que a tradição de utilizar a cachaça com limão para  constipações já está arraigada no imaginário popular. E com tantas qualidades dessa bebida nativa, a nossa cachaça tem mostrado novos estilos, marcas, técnicas e assinaturas de fabricação; e entrou no mercado globalizado. Esse vinho de borras, vinho da terra, a cachaça brasileira é o resultado da cana sacarina oriunda do sudoeste asiático que vem marcar uma verdadeira ‘Civilização do Açúcar’ no Brasil. É uma busca pelo espírito da cana-de-açúcar. Ela não necessita de defesa e sim de compreensão da gastronomia, pois ela já está integrada à vida e aos símbolos da cultura há muito tempo. A cachaça é uma bebida que está acima do bem e do mal.

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Para adoçar

"O Nordeste do Brasil, pelo prestígio quatro vezes secular da sua sub-região açucareira (...) Não só do açúcar: também a área por excelência do bolo aristocrático, do doce fino, da sobremesa fidalga (...) do bolo de rua , do doce e do bolo de tabuleiro, da rapadura (...) de saborear com farinha, juntando a sobremesa a alimento de substância .” (Gilberto Freyre, Nordeste) Da cana sacarina uma civilização marcada pelo que é doce. Açúcar mascavo, mais escuro, com a cor do caldo, do tacho que prepara a massa que é rapadura. Essa cor que traz o verde do caldo é referência visual e tradicional da nossa rapadura, que dá um doce à boca, faz o paladar lembrar que somos, também, herdeiros e filhos de um amplo processo social e econômico da saga dos engenhos que transformaram a Mata Atlântica em imensos oceanos de canaviais. As rapaduras chegam, na sua maioria, dos engenhos domésticos e familiares. O caminho de se fazer o açúcar é longo, exige além do bom caldo os conhecimentos adquiridos durante gerações, nas experiências de purgar, purificar o caldo no fogo profundo, que os mestres de rapadura sabem de olhar, no cheiro, na prova freqüente para conquistar a qualidade ideal, como uma assinatura, uma marca autoral. Assim, os engenhos, em especial os do Nordeste, continuam os seus rituais de moagem, de fabricarem os tijolos de rapadura, que ficam durante algum tempo nas formas de madeira para conquistarem a textura e qualidades necessárias, adquirindo o verdadeiro buquê tão marcante quanto o do vinho, do conhaque, ou mesmo da nossa tão querida cachaça, também filha dos engenhos. Em contextos de reconhecimento em âmbito e de valorização gastronômica, cada vez mais os processos artesanais e autorais dos engenhos, mesmo aqueles que combinam processos industriais, querem investir numa produção especial para o consumo de um público que valoriza o que é feito-à-mão, que busca o autoral, o saber artesanal que é a ação direta do saber tradicional sobre uma técnica, e por isso pode-se chamar, então, de tecnologia tradicional. Nada melhor do a prova da rapadura, daquela que saiu do tacho de cobre, ainda mole e quente, um verdadeiro manjar. A rapadura é de um doce tão saboroso e que se apresenta em inúmeras variações, é quando se vê, então, as marcas dos engenhos, marcas que se repetem à fogo no queijo-de-manteiga, no gado bovino, verdadeiras logos que identificam o lugar, o mestre, o próprio engenho. Assinaturas que fazem ‘terroir”. Assim, nas feiras e mercados, nas lojas, os consumidores vão escolher a rapadura como se escolhe o vinho. Ora pela procedência, cor, datação; ora pela prova, odor. O consumidor reconhece a marca, vê a cor, prova, realiza, então, o encontro com a memória do paladar, reconhecimento do paladar, e assim encontra o gosto desejado, ativa suas emoções diante do que é doce. A rapadura, também, é misturada com a farinha de mandioca _ jacuba. Acompanha o café com o tareco. É ingrediente indispensável no tão conhecido bolo pé-de-moleque pernambucano , entre tantos outros usos culinários.        

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Boleiras, doceiros , doceiras e outros ofícios do açúcar

Brasileiros de todas as localidades vivem dos ofícios culinários de fazer doces a partir do açúcar proveniente da cana-de-açúcar. Essa realidade vai muito além das indústrias, das fábricas regionais e familiares, que fazem caldo de cana, melado, rapadura e variados tipos de açúcar. Por isso, pode-se afirmar que há milhões de pessoas que vivem diretamente do trabalho de interpretar o açúcar em diferentes produtos alimentícios. São inúmeras receitas para o cotidiano e para as festas. Essa é a marca fundamental de que o doce, na vida brasileira, está na nossa formação social a partir de uma verdadeira civilização do açúcar. Civilização que começa com o estilo colonial lusitano que já traz a globalização em virtude das suas muitas relações comerciais e culturais entre o Ocidente e o Oriente, por causa das “Grandes Navegações”, nos séculos XV e XVI. Por tudo isso, há uma preferência nacional pelas comidas doces e em especial para o pernambucano. E para atender tão diverso e variado mercado, constata-se que há muitos ofícios domésticos do fazer doce, seja para consumo local, regional, nacional ou mesmo internacional. São notáveis as produções tradicionais de doceiras, boleiras, cozinheiras (os) especialistas em receitas com açúcar; juntamente com padarias, confeitarias; bancas de feiras, de mercados populares, e de vendas ambulantes; restaurantes, bares; e outros estabelecimentos que comercializam doces. As cozinhas tradicionais e domésticas trazem um dos mais notáveis acervos de técnicas culinárias de um verdadeiro artesanato da comida, no caso do doce. Muitas destas técnicas chegam da Idade Média, dos conventos ibéricos, onde se desenvolveu uma doçaria que até hoje é repetida em muitas cidades de Portugal e da Espanha. Refiro-me a uma doçaria à base de ovos, amêndoas, açúcar em diferentes “pontos” de caldas; e misturas de águas flor de laranjeiras ou de rosas, o que demonstra também uma forte e atuante presença do Magrebe. E por aqui, no Brasil, as frutas nativas, como: goiaba, abacaxi, pitanga, araçá, caju, buriti, pequi; e exóticas, na sua maioria do Oriente, tais como: manga, laranja, limão, jaca, carambola, maçã, pêssego; ganham novas interpretações nas formas de doces em calda, em massa, cristalizados; e como geleias. Estas bases ancestrais da doçaria ampliam-se em preparos de escala familiar, além de padarias e confeitarias, e com receitas que valorizam ingredientes da produção local, e também os profissionais desta tão rica cadeia produtiva do doce brasileiro. Já imaginou um aniversário sem bolo, seja especial ou mesmo um bolo de trigo. O que verdadeiramente importa é a presença simbólica do bolo, uma referência aceita pela cultura como uma comida doce que é um alimento que anuncia um rito de passagem, um ritual desejado pela sociedade. Os doceiros e doceiras preservam ainda as memórias e os valores patrimoniais que estão representados em tantas e diversas maneiras de receitas de fazer doces, e dar soluções estéticas que integram estes acervos de representação e de identidade dos nossos sistemas alimentares. As experiências vivenciadas nas casas como aprendizados familiares também buscam manter verdadeiras assinaturas de receitas e de estilos regionais de traduzir o açúcar na forma de “doce”. O aprendizado de fazer doces traz o entendimento de educação do lar, de formação social, de ofício, de possibilidades de trabalho, ora para seguir uma tradição familiar, ora para atender um momento de crise, como a que vivemos na atualidade. Desta maneira cozinhar é um recurso clássico para a complementação da renda familiar, ou como a principal renda da casa. Por tudo isso, fazer diferentes preparos doces garante o trabalho e a dignidade de milhões de brasileiros. E, assim, muitas famílias se mantêm, por gerações, com o ofício de trabalhar com o açúcar para realizar variados tipos de doces, que ganham categorias especiais conforme a região, a base étnica e a sociedade.

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Lody e o doce mais doce

“A monocultura da cana-de-açúcar foi a primeira grande ocupação colonial no Brasil”, diz o antropólogo e escritor Raul Lody em Doce Pernambuco. O título será lançado pela Companhia Editora de Pernambuco (Cepe) no dia 24 de agosto, dentro do projeto Tengo Lengo Tengo, no Museu Cais do Sertão. Antes dos autógrafos, Lody conversa com o escritor Frederico de Oliveira Toscano, autor do título vencedor do Prêmio Jabuti de 2015: À francesa – A Belle Époque do comer e do beber no Recife, editado pela Cepe. O debate intitulado Um papo doce acontecerá a partir das 17h. O 10º título de Lody focado no tema açúcar foi prefaciado por uma das maiores autoridades em antropologia da alimentação, Xavier Medina, presidente da Associação Internacional de Antropologia da Alimentação, sediada em Barcelona. A partir de uma abordagem histórica e etnocultural, em Doce Pernambuco o autor transcorre sobre o que chama de civilização do açúcar, especiaria desejada e rara no início dos caminhos que uniam Ocidente e Oriente. O antropólogo conta que o grama do ingrediente equivalia ao do ouro, de forma que chegava a ser ofertado como presente nobre. Nos 25 capítulos das 251 páginas Lody enumera cada uma dessas delícias do acervo gastronômico de Pernambuco, verdadeiros patrimônios como o alfenim, que o autor considera uma verdadeira expressão em arte popular feita de açúcar. Cita ainda o abacaxi e o caju como frutas telúricas emblemáticas do Brasil: “As frutas tropicais trazem um frescor nativo”, completa. Como num roteiro, o pesquisador traz receitas tradicionais nas páginas do Doce Pernambuco, título que amplia pesquisas e documentações antropológicas situadas nos contextos sociais e culturais. Desse modo, o leitor poderá fazer novas conexões entre as cozinhas orientais e as cozinhas tradicionais de Pernambuco. “O protagonismo do doce e do açúcar da cana sacarina são representações notáveis da identidade alimentar e do acervo gastronômico, que vive no cotidiano, nas casas, nas comidas de rua, nas padarias, e nas festas”, diz. Quem poderia imaginar que a rabanada tem procedência judaica ou que o filhós traduz uma receita muçulmana? “Dá-se ao que se come um sentido ampliado do lugar de feitura e do lugar do consumo”, salienta. A cartola, por exemplo, sobremesa tão pernambucana, nasce da combinação gastronômica da banana, “musa paradisíaca” da Ásia, com o queijo em sua versão de manteiga, culminada pela mistura de canela, que chegou do Ceilão pulverizada juntamente com o açúcar. É assim, de forma quase poética que o autor refere-se ao açúcar e suas combinações. No início das páginas de Doce Pernambuco, que contextualiza historicamente essa cultura, Lody discorre sobre a civilização do açúcar comoação coordenada pelos elementos: histórico, econômico, social, ecológico e cultural, que resultam na formação e no comportamento, identificando o homem brasileiro e, em especial, o homem nordestino. “Para Pernambuco, tudo isso é muito mais notável. A partir da plantation da cana-de-açúcar, não apenas à mesa se vive o açúcar; mas se vive no português que falamos, na arquitetura, nas tradições religiosas, nas festas populares, nos hábitos alimentares, nas escolhas estéticas, entre tantas outras”, explica. De acordo com o pesquisador, para a população do Nordeste há uma construção de imaginários e de maneiras de ver o mundo e de se autorrepresentar que transita pelos engenhos, que expõe desde o melado ou o mel de engenho até o açúcar moreno-mascavo. E com orgulho telúrico diz-se que “o doce de Pernambuco é o doce mais doce”. O AUTOR Raul Lody é antropólogo, museólogo, professor e pesquisador. Especialista em antropologia da alimentação com projetos de pesquisas no Brasil e no exterior, criador do Grupo de Antropologia da Alimentação (Fundação Gilberto Freyre), do Museu da Gastronomia Baiana. Também é um grande estudioso das religiões afro-brasileiras, com inúmeros livros publicados sobre o tema. Açúcar está fortemente presente na obra de Raul Lody, com nove títulos publicados sobre a temática: Caminhos do açúcar, Vocabulário do açúcar, À mesa com Gilberto Freyre, A doçaria tradicional de Pelotas, A cozinha pernambucana em Gilberto Freyre, Do mucambo à casa-grande, Desenhos e pinturas de Gilberto Freyre(Companhia Editora Nacional, 2007), e o mais recente que é o Museu Virtual do Açúcar, além de ter sido o organizador do Dicionário do doceiro brasileiro. Serviço Lançamento do livro Doce Pernambuco Data: 24 de agosto Horário: 17h às 19h Local: Museu Cais do Sertão Endereço: Avenida Alfredo Lisboa, s/n, Recife Antigo Preço do livro: R$ 40,00 (impresso) e R$ 12,00 (e-book)

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Açúcar: um caminho por Gilberto Freyre - Por Raul Lody

Indicador de caminhos e provocador nas suas questões, Gilberto Freyre possibilita uma permanente e sempre atualizada leitura e compreensão sobre o homem situado no Trópico. Inovador, trata da cultura material integrada aos contextos da casa, na rua, no trabalho, privilegiando o que a cana sacarina oferece de referências integradas e integradoras desse homem que vai formando sua casa seus sentimentos, apontando processualmente o que é e como é esse ser chamado brasileiro. em dúvida, uma grande aventura essa da culinária brasileira e, em especial, o doce, tema tão próximo em vivência e em análise por Gilberto Freyre. Nordeste e Açúcar dois textos intercomplementados, que trazem a vida cotidiana da sua região, o seu Pernambuco e amorosamente o seu Recife. Gilberto recorre à história e traça na antropologia transgressora, nova, tendo na coragem de ampliar fronteiras seu traço autoral e de sensibilidade, enquanto fundante na ampla e complexa sobre o brasileiro. Para compreender processos de chegada, de fixação, de ações coloniais no Brasil, sem dúvida o açúcar é o caminho preferencial da ocupação e da formação social e cultural do brasileiro. Assim, Gilberto escolhe também um caminho: o caminho do açúcar. Gilberto Freyre em Açúcar: em torno da etnografia, da história e da sociologia do doce no Nordeste canavieiro do Brasil, com numerosas receitas raras de doces e bolos da região e, para efeitos de comparação, algumas de outras áreas brasileiras e outras tantas de Goa (Índia Portuguesa), reunidas e selecionadas pelo autor, resulta em um texto farto como se oferecesse um cardápio de opções, dizendo que o ato de comer é um ato global. Come-se com o corpo inteiro. Inicialmente come-se com os olhos, depois come-se com o olfato; come-se com o tato, come-se finalmente com a boca, com o prazer, de um sentido tão aguçado que já é um sentimento. Contudo, ainda se come-simbolicamente, comendo-se a cultura, comendo-se a história, a civilização e de uma certa maneira come-se também o homem, uma metáfora antropofágica, pois come-se os valores e os significados plenos do que é oferecido em alimento e diria ainda, come-se a si próprio, como em um contato quase litúrgico e profundo da intimidade do eu individual com o eu coletivo, a própria cultura. Comer, um ato biológico, indispensável e principalmente um ato simbólico, ritualizado, seguindo os padrões da cultura, das ofertas do meio ambiente, das maneiras de misturar, preparar e servir, sendo certamente o ato mais pleno do homem, somente comparado ao sexual. O açúcar adoçou tantos aspectos da vida brasileira que não se pode separar dele a civilização. Para os anos 30, época da primeira edição de Açúcar, um homem interessado por receitas de bolo, doces de frutas e mais ainda por papel de seda recortado como se fosse renda para enfeitar pratos, tabuleiros foi um verdadeiro escândalo; como um sociólogo na cozinha? Sim, na cozinha, na intimidade da casa e mais ainda, na intimidade de quem fazia a casa pulsar, o fogão funcionar, as receitas reviver, as vendas e ganhos nas ruas por mulheres em condição escrava, das sobremesas dos restaurantes populares, aos hábitos de comer e de beber em casa, na rua, no cotidiano e no tempo da festa. Assim, pioneiramente Gilberto Freyre já traçava seus múltiplos caminhos para interpretar, conhecer, documentar e especialmente interagir com o homem regional – homem nordestino – em parentescos onde cabia o sangue, mas principalmente cabia a alma coletiva do povo. Falar de fruta, de açúcar, de canaviais, de receitas de bolos, falar da alta importância das diferentes culinárias do Nordeste, auferindo valor patrimonial tão patrimonial como os açucareiros de Macau, os brasões dos barões, as armas dos heróis oficiais e épicos. Forma Gilberto Freyre um olhar sensível e antropológico perante o homem nordestino, vivendo e etnografando esse mesmo homem; homem tropical, bi-africanizado, criativo, reunindo na mesa o Ocidente e o Oriente do mundo. Adaptando receitas dos mosteiros medievais, incluindo o caju e a pitanga, frutas telúricas, bem como o coco verde, a manga, a jaca, a fruta-pão todas exóticas ou nacionalizando mesas com toalhas de linho e bordados, ampliando o uso de louças da China, ampliando o uso de louças de barro, de madeira, comendo na esteira, comendo de mão, ou partilhando doce de araçá com o Menino Deus no altar doméstico da casa-grande. Manifestando profundo entendimento sobre o que come, como come, quando come, formando cardápios, cozinhas, ampliando os pratos de milho do São João, quiabos e dendê dos Xangôs, bolo Souza Leão servido em porcelana fina, sarapatel de feira e de mercado, doces, tantos e variados doces de um Recife ungido de açúcar, como é ungido de rios e de praias. Gilberto Freyre oferece em sua obra civilizatória inúmeras opções para provar em textos consistentemente bem temperados, gostosos, como um diversificado e sedutor cardápio das relações sociais, da formação da cultura brasileira. Assim, profundamente inspirado em Açúcar de Gilberto Freyre venho realizando sistemático trabalho de antropologia da alimentação desde a década de 1970, vendo, vivendo e provando pratos, inteirando-me dos cotidianos, das festas, da religiosidade, vivendo o meu projeto brasileiro, comprometido com o brasileiro. Agora em 2019 o livro Açúcar de Gilberto Freyre celebra 80 anos da sua publicação.

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Tratamento inadequado do diabetes afeta 18% dos idosos nos EUA; quadro é semelhante no Brasil

Aproximadamente 18% dos idosos com diabetes nos Estados Unidos são tratados de forma inapropriada; ou por excesso de medicamentos ou por subtratamento, revela um estudo publicado recentemente no Journal of General Internal Medicine. A pesquisa foi feita com base nos dados de 78 mil pacientes com mais de 65 anos em dez estados dos EUA – as informações são do Medicare, programa de assistência médica do governo federal americano. O vice-presidente da Sociedade Brasileira de Diabetes, Dr. João Eduardo Nunes Salles, afirma que um terço dos idosos apresenta algum tipo de alterações no metabolismo da glicose. “É fundamental atentar-se às particularidades que tangem o tratamento do diabetes, não apenas medicamentoso, mas comportamental e nutricional. Além do avanço do sedentarismo e da obesidade, o envelhecimento populacional também tem grande impacto no aumento dos casos de diabetes”, avalia. No Brasil, segundo levantamento da Pesquisa de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel), do Ministério da Saúde, o diagnóstico da doença aumentou 54% na população masculina entre 2006 e 2017, atingindo 7,1% dos homens adultos. Contudo as mulheres ainda são as principais vítimas da doença, com 8,1% no último ano. A SBD estima que 16 milhões de brasileiros foram diagnosticados com a doença. Salles alerta também para a importância do controle da doença, sobretudo para diminuir o risco de cardiopatias – segundo a International Diabetes Federation, pessoas com mais de 60 anos e portadoras de diabetes tipo 2 têm um risco de três a quatro vezes maior de morrer por doenças cardiovasculares. “Há alternativas terapêuticas capazes de controlar o diabetes e suas complicações. Conhecimento e acesso a tratamentos adequados são fundamentais para preservar a doença no idoso, aumentando sua expectativa e qualidade de vida”, atesta o especialista. O geriatra Renato Bandeira de Mello, diretor científico da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG), faz uma ponderação e explica a necessidade de avaliação ampla ao idoso diabético para racionalizar tanto o diagnóstico como o tratamento dessa condição. “Saber avaliar o idoso de forma multidimensional é fundamental para o processo de tomada de decisões clínicas. Por exemplo, em pacientes com Doença de Alzheimer com comprometimento cognitivo importante ou quando há limitações e vulnerabilidade físicas em decorrência de outras doenças graves, o excesso de exames e tratamentos, assim como o controle rígido do diabetes podem aumentar o risco de complicações e prejudicar a qualidade de vida desses pacientes”. O especialista também destaca que, por meio da Avaliação Geriátrica Ampla, é possível identificar em outro extremo os idosos robustos, em que a idade isoladamente, mesmo quando superior a 80 anos, não limita a indicação dos tratamentos com objetivo de controle de complicações a médio e longo prazo. “Nos idosos plenamente funcionais, mesmo que longevos, não se deve restringir tratamentos somente pela idade em si. Este é um equívoco que pode levar ao subtratamento de condições controláveis”. Sendo assim, recomenda-se que as indicações de exames, procedimentos e tratamentos sejam ponderadas individualmente de acordo com a funcionalidade daquele idoso. A SBGG, no documento “Escolhas Sensatas na Assistência ao Paciente Idoso”, aponta que o controle rígido dos níveis glicêmicos em idosos frágeis pode trazer mais riscos do que benefícios, sobretudo quando há hipoglicemias graves ou recorrentes. Baseado nesta ponderação, recomenda-se não prescrever medicamentos com intuito de atingir alvos de hemoglobina glicada menor que 7,5% em idosos diabéticos com declínio funcional e/ou cognitivo ou em extremos etários. Sobre a SBD Filiada à International Diabetes Federation (IDF), a Sociedade Brasileira de Diabetes é uma associação civil sem fins lucrativos, fundada em dezembro de 1970, que trabalha para disseminar conhecimento técnico-científico sobre prevenção e tratamento adequado do diabetes, conscientizando a população a respeito da doença e melhorando a qualidade de vida dos pacientes. Também colabora com o Estado na formulação e execução de políticas públicas voltadas à atenção correta dos pacientes, visando a redução significativa da doença no Brasil. Sobre a SBGG A Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG), fundada em 16 de maio de 1961, é uma associação civil sem fins lucrativos que tem como principal objetivo principal congregar médicos e outros profissionais de nível superior que se interessem pela Geriatria e Gerontologia, estimulando e apoiando o desenvolvimento e a divulgação do conhecimento científico na área do envelhecimento. Além disso, visa promover o aprimoramento e a capacitação permanente dos seus associados.

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Casa-Grande & Senzala – A comida como método social em Gilberto Freyre

  Gilberto se propõe a revelar “o seu” Nordeste ao leitor. Um Nordeste orientalizado a partir das matrizes lusas com os seus encontros com a China, Índia, Japão; e nas tradições moçárabes e judaicas. Um Nordeste da Zona da Mata de Pernambuco. Sim, Pernambuco como um foco possível e preferencial de Gilberto. O livro Casa-Grande & Senzala é também um depoimento vivencial de Gilberto, que mistura endoetnografias nos cenários do Recife. Assim, ele traz leituras e experiências familiares; também dá interpretações sentimentais; e ainda busca os sinais de uma região orientada pelo patriarcado que nasce na cana sacarina. É uma obra para muitas interpretações, para ser revisitada apontando-se para as cozinhas como experiências formais da identidade do brasileiro. Por ser um livro de vocação sensorial, sugiro ler algumas páginas ao sabor de um bolo de massa de mandioca, ou bebendo um boa cachaça, para que se possa assim ter um encontro hedonista ao gosto de Gilberto. Ele se revela hedonista quando traz de Ruth Benedict os seus conceitos de “apolíneo” e de “dionisíaco”. São encontros desejáveis e necessários ao tema açúcar, um tema nem sempre tão “doce”. Entender ainda que Gilberto tem suas preocupações literárias e estéticas com Casa-Grande & Senzala. Ele relata ambientes, festas, indumentárias, comidas, processos culinários, rituais de comensalidade. Gilberto tem um olhar iconográfico dominante, e recorre ao desenho e a pintura como processo de criação e de representação cultural. Estes imaginários estão nos textos, e se pode dizer que Casa-Grande & Senzala é um livro “cinematográfico”. E com este desejo visual, Gilberto mostra o melhor deste livro. Tudo acontece em contexto ecológico, na Mata Atlântica e nos canaviais, temas que mais tarde são aprofundados no livro Nordeste de Gilberto. Esta sociedade do século 19, exemplar em Casa-Grande & Senzala, é ampliada também em Sobrados e Mocambos, com um olhar mais urbano sobre a civilização que nasce do açúcar. Casa-Grande & Senzala mostra as histórias das “casas” e das pessoas que vivem nestas casas. Relata religiosidade, maneiras de fazer a comida, escolher os ingredientes; as muitas receitas de um Portugal já globalizado com as “grandes navegações” que aproximaram o Oriente do Ocidente. Esta obra de Gilberto mostra as festas, os rituais do plantio e da colheita da cana sacarina; os encontros de portugueses africanizados pelo Magreb, de povos nativos, de milhares de africanos da Costa, que revelam novos gostos e interpretações de sabores que se espalham pelas cozinhas, pelas mesas, num Brasil à boca. Gilberto quer apresentar um lugar possível do “trópico”.  Mostrar uma civilização onde o poder formal está no mando masculino. Contudo, este poder está também nas cozinhas, territórios consagrados ao mando feminino. Cozinhas na “Casa-Grande”, lugar onde as relações sociais são formalizadas na intimidade de espaços geradores de comidas, de um poder que se projeta no ato da alimentação. Gilberto revela os rituais das alimentações, inclusive dos “santos”, que são íntimos nestas relações sociais já à brasileira. O Menino Deus, para adoração e para o convívio com as crianças da “casa”, torna-se tão próximo que parece estar também se lambuzando de geleia de araçá. Outros doces são marcantes e, em especial, os “bolos”, tema que fundamenta o seu livro Açúcar, também dos anos 1930. Gilberto mostra o doce como um preparo feminino, marcado pela mulher lusa como uma atividade especial, pois o doce tem um preparo que vai muito além do açúcar. É um preparo de memórias ancestrais da história colonial lusa. O termo “doce” valoriza e qualifica aspectos sociais como, por exemplo, “você é um doce”; “te dou um doce”; tudo mostra o açúcar como formador de laços sociais, e isso também é retratado em Casa-Grande & Senzala. As referências dos sabores, a nova forma para se construir o paladar, o reconhecimento do que é o gosto gostoso, daquilo que chega de Portugal com os “gostos do mundo”, e se misturam com este Brasil de mandioca, de peixes, de milho, de pimentas frescas, e de muitos outros produtos da “terra”, produtos nativos. Gilberto, em Casa-Grande & Senzala, expõe uma sociedade que se revela à mesa. É assim que ele quer interpretar o brasileiro: “a partir da comida”. Casa-Grande & Senzala é uma construção formal de análise que está na tese Social life an Brazil in the middlle of the 19th Century para o título de Master Artium ou Master of Arts, Columbia University, 1922. Com certeza, em Gilberto, estão todos os sentimentos do gourmet, do antropólogo e do artista, todos reunidos na sua maneira pessoal de gostar do Recife. * Raul Lody é antropólogo.

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Água com açúcar acalma. Mito ou verdade?

Mito. Tomar água com açúcar para acalmar os nervos é crendice popular. Na verdade, o açúcar é metabolizado pelo organismo e se transforma em frutose e glicose, duas importantes fontes de energia, mas que não possuem nenhum poder tranquilizante. “A pessoa fica mais calma mesmo pelo poder da sugestão, efeito psíquico ou placebo, mas um simples copo de água teria o mesmo resultado”, explica o diretor médico do Hospital Esperança Olinda, o clínico Marcos Reis. Apesar da combinação água com açúcar ter esse efeito popular de acalmar, a prática não deve ser incentivada, principalmente quando oferecida a desconhecidos. “A ingestão de água com açúcar pode fazer muito mal em caso de pessoas diabéticas, hiperglicêmicas, que possuem alta taxa de açúcar no sangue”, alerta Reis.

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