Arquivos Z_Destaque-principal - Página 28 De 59 - Revista Algomais - A Revista De Pernambuco

Z_Destaque-principal

edicao 236

Municípios no Vermelho: entenda os motivos da greve dos prefeitos

A crise crônica das finanças das prefeituras se tornou aguda no segundo semestre de 2023. O questionamento da divisão de recursos entre a União, estados e municípios é antiga e está nas raízes do almejado Pacto Federativo. Porém, no atual trimestre, um combinado de queda de arrecadação e aumento das obrigações orçamentárias levou os prefeitos a um movimento “grevista” por um socorro federal. Em Pernambuco, a Amupe (Associação Municipalista de Pernambuco) estima que 80% das cidades sobrevivem do FPM (Fundo de Participação dos Municípios) e ficaram em uma situação de maior fragilidade nos últimos meses. Entender a briga pelo orçamento nesse caso não é fácil. Existem diferentes fontes de receitas dos municípios, como o ISS (Imposto sobre Serviços), o IPTU (Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana) e uma parcela do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços). Porém, as pequenas cidades, de forma geral, dependem muito do FPM para realizar seus serviços. O fundo é composto por 22,5% da arrecadação líquida da União da soma do IR (Imposto de Renda) com o IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados). O resultado dessa sopa de letrinhas que deixou os prefeitos em pânico foi que houve uma redução das receitas vindas do IR das pessoas jurídicas, ao mesmo tempo em que aconteceu um aumento das restituições do Imposto de Renda. O resultado final é que houve uma diminuição da arrecadação da União e, consecutivamente, queda do repasse municipal. O impacto veio no início do segundo semestre. Os repasses do FPM são feitos três vezes ao mês. A queda do primeiro decêndio de julho foi de 32,4%, enquanto que nos meses de agosto e setembro, no mesmo período, foram respectivamente de 20,3% e 28,2%. “Se já temos um Pacto Federativo injusto aos municípios, perder cerca de 30% da receita prejudica muito os serviços que a gente presta para a população e a forma que temos de pagar os servidores. Somado a isso, tivemos queda de outras arrecadações, como o ICMS. Esses dois fatores fizeram com que muitas prefeituras se encontrassem em situação de calamidade”, destacou a presidente da Amupe e prefeita de Serra Talhada, Márcia Conrado. O processo de desindustrialização do País, intensificado nos últimos anos, e as mudanças mais recentes nas regras do Imposto de Renda tiveram uma relação com essa queda das receitas, segundo o economista e professor da UPE (Universidade de Pernambuco), Sandro Prado. “Enquanto nos anos 1980 chegamos a ter em torno de 30% do PIB da indústria, no Governo Bolsonaro chegou a 11%. Tivemos uma queda percentual desse setor que fez com que o IPI murchasse. Essa desindustrialização é um processo longo, que teve um agravamento muito forte nos últimos anos. Além disso, houve uma restituição maior do Imposto de Renda. É uma luta importante para a população, mas traz um complicador que é a diminuição desse repasse nos meses de agosto e setembro, fazendo com que os municípios ficassem enlouquecidos”, afirmou Sandro Prado. A proximidade com as eleições municipais do próximo ano se tornou um agravante nesse cenário, pois cria dificuldade para a máquina pública das prefeituras, na análise do economista. CRESCIMENTO DAS DESPESAS NO RADAR Além da queda das receitas, outra queixa forte dos prefeitos, capitaneada no País pela CNM (Confederação Nacional dos Municípios), é o aumento de despesas obrigatórias, sem uma fonte definida. Em outras palavras, são leis que elevam, por exemplo, salários, sem que haja a indicação de quem pagará a conta e tudo vai acabar nos cofres municipais. O aumento do piso dos professores, por exemplo, entra nessa conta. “Temos visto e revisto o Pacto Federativo porque é muito injusto com os municípios. As demandas só chegam, mas contrapartida financeira não chega para fazermos o melhor, que é cuidar das pessoas. Temos um grave subfinanciamento na saúde, na educação e na assistência social. É preciso rever a distribuição desses recursos”, afirmou a presidente da Amupe. Ela destaca que o subfinanciamento dos serviços não é um problema recente, mas algo que já atravessa pelo menos uma década, com graves prejuízos aos cofres municipais. De acordo com o estudo recém-publicado pela CNM, 53% das pequenas cidades do País e 38% dos municípios de médio e grande porte estão com déficit – despesas maiores que as receitas. “No primeiro semestre de 2023, a cada R$ 100 arrecadados nos pequenos municípios, R$ 91 foram destinados para pagamento de pessoal e custeio da máquina pública”, afirmou o estudo Avaliação do cenário de crise nos municípios. A pesquisa foi realizada a partir de dados do Siconfi (Sistema de Informações Contábeis e Fiscais do Setor Público Brasileiro) e elaborada pela CNM. O economista Sandro Prado avalia que são justas as reivindicações das categorias profissionais e que deveriam haver outros pisos instituídos em lei. No entanto, vê com preocupação a ausência de comunicação entre os legisladores e o Poder Executivo na definição dos recursos. “Essa falta de diálogo entre os dirigentes municipais, estaduais e federais é uma coisa muito séria. Quando o Congresso aprova uma legislação que vai afetar 5.570 municípios é algo muito grave. Obviamente as categorias são merecedoras. Algumas mais fortes conseguem. O piso dos professores e dos profissionais de saúde aumenta as despesas do município. Deveria haver, por parte dos gestores, um remanejamento dos recursos para esse pagamento, mas muitos colocam isso como algo que ele não conseguiu pagar e algo que fez com que dificultasse ainda mais a sobrevivência desses municípios”, disse o economista. No primeiro semestre, os municípios de Pernambuco tiveram um aumento de despesas com pessoal na ordem de 7%, em comparação com o mesmo período de 2022. Os gastos de custeio avançaram em 23% e os investimentos subiram em 24% nos primeiros seis meses de 2023. Já a arrecadação no primeiro semestre registrou um aumento de 7% do FPM e uma queda de 4% do ICMS. Uma redução abrupta, no entanto, foi das execuções de emendas parlamentares, que alcançaram o patamar de 63% a menos que em 2022. Diante do baque do começo do segundo semestre, Márcia Conrado destacou que os prefeitos

Municípios no Vermelho: entenda os motivos da greve dos prefeitos Read More »

avenida onibus boa vista recife

Todo dia pode ser um dia sem carro

Em artigo, o jornalista Du Dias explica a origem e as motivações do Dia Mundial Sem Carro, neste 22 de setembro. Um dos motivos é o clima, que dá sinais de fadiga (Do Mobilize Brasil) Era o ano de 1956 quando Israel, com o apoio da França e do Reino Unido, declarou guerra ao Egito, após o país que liga o nordeste da África ao Oriente Médio nacionalizar o Canal de Suez, importante rota de comércio da região. Foi assim que se iniciou a Guerra de Suez, que só foi encerrada após pressões de Estados Unidos, União Soviética e das Nações Unidas para a retirada de tropas invasoras. A esta altura, você deve estar se perguntando o que um conflito armado no final dos anos 1950 tem a ver com o Dia Mundial Sem Carro. Não foi a guerra propriamente dita, mas a crise de abastecimento de combustíveis em diversos países europeus, decorrente do conflito no canal de Suez, que levou, por exemplo, a Bélgica e a Holanda a racionar o uso de combustíveis e proibir a circulação de automóveis aos domingos. Naquela época, estes países também sofriam severamente com a poluição atmosférica e o aumento das mortes no trânsito, inclusive de crianças, causadas pela popularização do automóvel. O embrião do Dia Mundial Sem Carro estava nascendo e se reproduziria em países como a Dinamarca e a Suíça, que também restringiram o uso do carro durante a crise do petróleo de 1973. Estes eventos foram transformadores para alguns destes países, que a partir de uma medida emergencial para enfrentar uma crise econômica, revolucionaram para sempre seus padrões de mobilidade. As experiências de enfrentar as crises decorrentes da guerra, da escassez de petróleo e suas consequências a partir da restrição do uso do carro haviam sido relativamente bem sucedidas na Europa, mas a redução do uso de automóveis já vinha ganhando força nos Estados Unidos desde os anos 1950, quando moradores de Nova York protestavam contra a extensão da 5ª Avenida, uma das mais importantes da cidade. A vitória dos nova iorquinos nas manifestações contra a obra que cortaria um importante parque da cidade ao meio (a Washington Square Park), é frequentemente creditada à jornalista e urbanista Jane Jacobs, que naquela época já denunciava as consequências catastróficas para o meio urbano, do uso irrestrito dos veículos individuais motorizados. Bem antes disso, no início do século 20, cidades dos Estados Unidos realizaram intensas campanhas para evitar a entrada de automóveis em suas ruas, até então muito ocupadas por pessoas de todas as idades. A indústria reagiu: uma intensa campanha foi realizada para "organizar" o trânsito, limitar os espaços destinados aos "pedestres" e liberar a circulação dos carros. E assim, a vida nas cidades foi inteiramente transformada, conta Peter D. Norton, historiador da Universidade de Virginia e autor de Fighting Traffic: The Dawn of the Motor Age in the American City. Mas, no final do século, quando as cidades já estavam entupidas e intoxicadas de carros, os ensinamentos de Jane Jacobs, Jan Gehl e Jeff Speck, entre outros, ganhavam popularidade e conquistaram corações e mentes também no velho continente quando, em outubro de 1994, o economista Eric Britton fez um importante discurso durante evento sobre cidades acessíveis na Espanha, conclamando a sociedade a adotar medidas restritivas severas para o uso de automóveis. Nos anos seguintes ao chamamento de Britton, há registros de dias livres de carro promovidos extraoficialmente em cidades da Islândia, do Reino Unido e da França, entre outros. Em 1996, um grupo de ativistas holandeses começou uma campanha por dias livres de carro com abrangência nacional para aquele país. O grupo organizou mensalmente manifestações informais nas ruas, quando paravam os carros e ocupavam as vias com festas, pic-nics, brincadeiras para as crianças, manifestações artísticas e pinturas. Essa estratégia seria utilizada posteriormente em manifestações pacíficas no mundo todo, inclusive em São Paulo, quando movimentos sociais (o Mobilize estava lá!) pressionaram a prefeitura municipal para fechar a avenida Paulista para os carros aos domingos.   O que é o "dia sem carro"? O primeiro dia sem carro celebrado por um país oficial e nacionalmente, no entanto, se daria na Inglaterra, que foi seguida pela França, em 1997. Foi só a partir do ano 2000 que se estabeleceu o dia 22 de setembro como Dia Mundial Sem Carro, a partir de uma campanha que se estenderia oficialmente por todo o continente europeu. Hoje celebrado em cidades do mundo todo, o Dia Mundial Sem Carro é uma oportunidade de refletir sobre os prejuízos sociais, ambientais e econômicos da cultura do carro e seus impactos nos territórios. Cada cidade adota medidas distintas, sempre tentando conscientizar a população de que outras formas de deslocamento não são apenas possíveis, como também eficientes, baratas e sustentáveis. Há cidades que restringem o uso do carro em algumas vias, outras fazem campanhas de conscientização e em alguns casos, ampliam a oferta de transporte público e coletivo. Na cidade de São Paulo, são realizadas atividades de conscientização sobre o uso excessivo de automóveis no dia 22 de setembro desde o ano de 2003, com pedaladas/bicicletadas; interlocuções com o poder público municipal; fechamento de vias para os carros e atividades culturais, quase sempre promovidas por movimentos sociais ou decorrentes da pressão realizada por eles. A partir de 2010, os dias sem carro passaram a ser celebrados em diversos estados do Brasil. Mas, o carro é mesmo um vilão?Se analisado individualmente, o automóvel não parece ser um grande problema: ao contrário, a facilidade e o conforto de se deslocar em um carro são sedutoras; a crescente tecnologia e segurança para os usuários também não ficam atrás. E não podemos deixar de lembrar que a indústria automobilística também é responsável pela geração de milhões de empregos e de movimentar fortemente a economia. Mas então, porque os carros hoje são vistos como ameaças? A resposta tem a ver com o uso que se faz dos automóveis. Além das altas velocidades praticadas nas vias urbanas, provocando acidentes e mortes que poderiam ser evitados, os custos de implantação e manutenção de

Todo dia pode ser um dia sem carro Read More »

edilson beberibe

"A resolução da habitação e do saneamento pode aliviar a pressão ambiental do Rio Beberibe"

Edilson Junior, mestre em desenvolvimento e meio ambiente pela UFPE e doutor em geografia pela UFES, pesquisou o Rio Beberibe durante a sua dissertação Nas Trilhas da Floresta Urbana: Gestão ambiental e conflitos na Mata do Passarinho. Mais que uma questão natural, relacionada aos efeitos das mudanças climáticas, o cenário vivido na comunidade emblemática vizinha ao rio é um problema de ordem social. O pesquisador destaca que os indicadores sociais dos bairros que convivem com o Beberibe são comparáveis aos países mais pobres da África. Nesta entrevista concedida ao jornalista Rafael Dantas para a série 3 Rios, 3 Comunidades, 3 Desafios, Edilson Junior trata ainda dos possíveis caminhos para recuperação do Rio Beberibe e das comunidades do seu entorno, mas alerta para o agravamento da situação social nas últimas décadas, com o crescimento demográfico das comunidades ribeirinhas. (Fotos: Midiã Tavares, especial para a Algomais) Qual a relação entre o poder público, a comunidade que vive na região e o Rio Beberibe? A relação entre o poder público e a comunidade é de abandono; entre a comunidade e o rio é de desprezo; e entre o rio e o poder público é de serventia. Explico: se traçarmos um panorama com indicadores de renda, saúde e educação, que são utilizados no Índice de Desenvolvimento Humano, dentro de um município, veremos que os bairros que margeiam essa porção do Rio Beberibe estão historicamente atrelados a resultados similares aos de países africanos pobres. São décadas de desamparo, falta de equipamentos urbanos e oportunidades de trabalho. A desigualdade é muito violenta, o que torna secundária a pauta da conservação ambiental. A exemplo da Reserva de Floresta Urbana (FURB) Mata do Passarinho, que foi seu objeto de pesquisa, como se caracteriza a pressão ambiental nessa região? Ninguém vai pensar nos impactos ambientais de derrubar a mata para construir sua casa, de retirar lenha para poder cozinhar suas refeições, ou nos problemas de lançar esgoto e lixo diretamente no rio, enquanto o poder público não atende sequer as demandas sociais básicas. É uma situação triste, pois o Beberibe e as Reservas de Floresta Urbana que o margeiam são, de certa forma, patrimônios vivos da nossa terra e estão diariamente sofrendo com este tipo de ação. Portanto, por necessidade, a população faz uso desses recursos naturais e não há ação de conscientização que possa impedir isso. Apenas a resolução das demandas de habitação e saneamento, anulando a necessidade de fazer uso desses espaços naturais, pode aliviar a pressão ambiental do Beberibe e das FURBs. Há mais de uma década a região foi alvo do Prometrópole. Esse programa era voltado para a Bacia do Beberibe e inclusive retirou a população da Vila do Tetra, que fica entre a FURB e o Rio. Mas a área foi reocupada e não foi construído o habitacional. O que aconteceu para esse projeto não ser executado? O programa Prometrópole, que este ano completa duas décadas desde o grande aporte financeiro recebido do Banco Mundial, é um caso emblemático, tanto pelo seu escopo quanto pelo seu resultado. Em teoria, ele iria garantir uma transformação urbanística completa das margens do Beberibe, servindo de vitrine para Pernambuco numa época em que diversas organizações intergovernamentais, como as Nações Unidas, estavam financiando projetos de urbanização no Brasil. No entanto, o que tivemos foi a fragmentação do programa em obras sem a devida efetividade, pouco integradas entre si ou fora dos fundamentos de saneamento e combate à pobreza do programa. Isso é completamente diferente do que foi apresentado à população. Até hoje, os habitantes dos bairros contemplados pelo Prometrópole lembram do projeto com frustração. Muitas das áreas de lazer propostas não foram construídas, o quantitativo de habitações entregues ficou aquém da demanda, a pavimentação e o esgotamento sanitário das ruas se arrastaram além do necessário, e o abastecimento de água ainda é deficiente. Isso sem falar na rede de serviços públicos, que não foi ampliada como anunciado. Sobre a Vila do Tetra, pode-se dizer que a questão até triplicou de tamanho, tanto no quantitativo populacional quanto na área ocupada. Isso ocorreu porque, diante do atraso ou da inexistência das obras, novas frentes de ocupações foram se formando ao longo do Beberibe, a exemplo do terreno no antigo endereço da Rádio Olinda. Acredito que o Prometrópole sofreu muito pela visão engessada de um "kit de urbanização" que não atendia às especificidades do povo atendido e do espaço que habitavam. A população vive numa situação de extrema vulnerabilidade social e sem saneamento básico. Quais os possíveis caminhos para encontrar uma solução que seja satisfatória para a população e para o Rio Beberibe? Não há solução efetiva que não seja através de um grande projeto integrado entre urbanização e demais questões sociais. Em uma situação ideal, a realocação da população para moradias mais adequadas e a consequente proteção das margens seriam o melhor caminho. No entanto, isso tem um custo político e orçamental que pouquíssimas gestões municipais estão dispostas a enfrentar. Além disso, desde a Lei 14.285/2021, os municípios detêm competência para regularizar todas as ocupações urbanas nas margens dos rios, chancelando a transformação do que deveriam ser áreas de proteção em tecido urbano consolidado. É esse caminho que tem sido adotado, normatizando a precarização das margens dos rios. Dessa forma, temos o próprio poder público a "planejar" desastres, como os provocados por enchentes. O que fica claro é que qualquer projeto precisa contemplar as dimensões sociais e ambientais, pois não é possível pensar em recuperar um rio enquanto a população sofre necessidades mais urgentes como emprego e habitação. A história do Prometrópole mostra isso. A população se queixa da maior intensidade de eventos de enchentes nos últimos anos. Podemos inferir alguma relação com as mudanças climáticas e a maior intensidade de chuvas, num período mais curto de tempo? Não apenas as mudanças climáticas estão propiciando mais eventos hidrológicos extremos, mas também as características da suburbanização a partir do médio curso do Beberibe estão contribuindo para as situações de enchentes. Na verdade, as questões relacionadas a como produzimos a nossa cidade

"A resolução da habitação e do saneamento pode aliviar a pressão ambiental do Rio Beberibe" Read More »

flavia suassuna apl

"Uma das coisas que literatura faz é criar laços"

Flávia Suassuna, nova integrante da Academia Pernambucana de Letras fala da sua produção literária e conta como seu tio Ariano Suassuna contribuiu para tornar-se escritora. Ela também é professora e analisa o impacto da internet no ensino e afirma que a ficção pode ajudar a reduzir a polarização atual. É comum os alunos de Flávia Suassuna se encantarem com a maneira como ela oferece os conteúdos das suas aulas de História da Literatura. Prova disso é que esta entrevista, que ela concedeu a Cláudia Santos no café de uma livraria no Recife, foi interrompida por uma ex-estudante que não se conteve para abraçar e fazer elogios à antiga mestra. Talvez esse talento se deva à maneira envolvente como Flávia conversa e que pode ter origem no DNA que compartilha com o tio Ariano Suassuna. Além da prosa boa — que pode ser constatada nesta entrevista — a professora também herdou do tio o ofício de escritora e seu trabalho foi reconhecido ao ser recentemente eleita para integrar a Academia Pernambucana de Letras. Nesta conversa, ela fala da sua trajetória pedagógica e literária, da relação com Ariano, do impacto da internet no aprendizado das crianças e na polarização ideológica que, para ela, pode ser revertida com a leitura de romances. Ao se identificar com os personagens, muitas vezes, o leitor, segundo Flávia, desfaz preconceitos e amplia seus conhecimentos. Parafraseando Contardo Calligaris, ela assegura: “a literatura, a ficção, tem uma mágica complementar porque ensina também a identificação como ser humano”. Como surgiu seu interesse pela literatura? Quando eu era muito pequena, as pessoas me perguntavam: o que você vai ser quando crescer? Eu dizia que queria ser mãe e escritora. Não entendia por que todo mundo achava graça da resposta, eu estava falando sério. Talvez tenha organizado isso na minha cabeça a partir da existência de tio Ariano, que era escritor, porque uma menina de 5 anos provavelmente não saiba o que seja um escritor. E como era Ariano como tio? Ele foi perfeito comigo. Um dia papai disse a tio Ariano: tem uma pessoa lá em casa que gosta desses livros que você gosta. Tio Ariano ficou todo entusiasmado e começou a me mandar livros no Natal, no aniversário. Quando fiz 11 anos, ele me deu As Minas do Rei Salomão, um livro de aventura que eu amei. Depois passou a me dar livros que tinham a ver com a minha idade. Foi um orientador perfeito das minhas leituras. O que acho lindo de tio Ariano é que ele é uma pessoa muito forte, muito incisiva, mas nunca me orientou para eu ser armorial, por exemplo. Ele deixou que eu seguisse meu caminho. Perto de morrer, ele disse: “as pessoas vêm me perguntar o que é que eu sou de Flávia. Aí eu digo que eu sou tio e todo mundo diz que você é uma professora muito adorável. E eu fico muito orgulhoso”. Vê que coisa bonitinha! Uma das coisas que literatura faz é isso: criar laços. É você contar e discutir a história de Capitu, ver como cada geração enxerga essa a história, trazer o filme de Capitu, trazer uma adaptação do livro Dom Casmurro. Tudo isso vai criando laços entre as pessoas de uma sociedade. Esse é um dos motivos por que existe essa história da criação de uma identidade nacional com aqueles livros. Nunca conheci um russo, mas eu amo os russos por causa de Tolstói. É nesse sentido que a literatura cria esses laços de identidade e fraternidade mais amplos. Li um artigo do psicanalista Contardo Calligaris, em que ele diz que quando leu O Caçador de Pipas se identificou com o narrador, apesar de o romance se passar num espaço político, social, ideológico totalmente diferente do dele. Calligaris disse também que num documentário sobre o Afeganistão, você aprende muito, mas você aprende a diferença, as particularidades do país. Já a literatura, a ficção, tem uma mágica complementar porque ensina também a identificação como ser humano. Você percebe que uma pessoa que mora no Afeganistão é tão humana quanto você. E a história é muito linda, fala de um menino de 8 anos que viu um amigo sendo violentado e correu. Esse artigo de Contardo Calligaris me bateu muito porque eu pensei a mesma coisa que ele: se eu tivesse 8 anos e visse uma amiga sendo violentada, eu acho que eu correria… Como você decidiu atuar como escritora e professora? Isso foram os desastres da vida porque eu queria ser mãe. Tive três filhos, mas fui abandonada pelo pai deles e precisei sustentá- los. Eu tinha o curso de Letras e me tornei professora por uma necessidade básica de sobrevivência. Acho, inclusive, que ser professora dificulta um pouco ser escritora, porque a gente tem muita coisa para fazer em casa, mas não tinha outro jeito. Somos pagos pela hora dada, mas quando chegamos na sala de aula, já gastamos um tempão preparando a aula, corrigindo trabalhos. Você começou sua carreira como escritora ao lançar Jogo de trevas (1980), que foi o primeiro romance a ser publicado por uma mulher em Pernambuco. Como foi essa produção? Eu ainda era solteira. Esse romance foi publicado pelas Edições Pirata em 1980. Eu tinha um professor maravilhoso chamado José Rodrigues de Paiva e eu fiz uma proposta indecente a ele. Eu disse: se eu lhe der o meu romance pronto, você perdoa o meu último trabalho? Porque eu não conseguia conciliar o trabalho e fazer o romance. Ele aceitou. Dei os originais do meu romance, e ele me deu uma nota, me livrei do trabalho dele e consegui terminar esse livro. Depois participei do concurso literário para marcar os 450 anos do Recife, instituído por Jarbas Vasconcelos, que era prefeito. Eu ganhei e esse foi meu segundo romance chamado Remissão ao Silêncio. Comecei com prosa que exige uma disciplina. Para fazer esse segundo romance, eu saía da minha casa, ia para a casa da minha mãe toda quarta-feira de tarde, deixava meus filhos para poder escrever. Depois passei

"Uma das coisas que literatura faz é criar laços" Read More »

SANTOS MARTIRES DO RIO GRANDE DO NORTE

Santos mártires imolados pelos holandeses no Rio Grande do Norte em 1945

*Por Leonardo Dantas Silva Quando das Guerras com a Holanda (1630-1654), se transportou para o Nordeste do Brasil, os propósitos da Guerra Religiosa, que grassava em Flandres e nos Países Baixos, entre católicos, calvinistas e luteranos desde a segunda metade do Século 16. Em 16 de julho de 1645, na localidade de Cunhaú, no hoje município de Canguaretama, no Rio Grande do Norte, uma tropa holandesa de 200 homens, comandados pelo alemão Jacob Rabi, juntamente com um grande número de índios tapuias e potiguares, dizimaram 69 habitantes locais que assistiam à missa dominical na igrejinha de Nossa Senhora das Candeias. Matança semelhante veio se repetir, dias depois, no povoado próximo, Uruaçu. Ali também foram dizimados Mateus Moreira e dezenas de outros homens; repetindo os índios os mesmos atos de antropofagia de Cunhaú devorando, ainda vivos, os corpos de suas vítimas, retirando deles os olhos, a língua, o pênis e outras partes. Por causa de tais atrocidades, os portugueses passaram a fio de espada cerca de 200 outros índios que lutaram ao lado dos holandeses, quando da Batalha de Casa Forte (Recife), em 17 de agosto de 1645. Esses fatos motivaram um longo processo de canonização por parte da Igreja Católica, concluído recentemente pelo Papa Francisco, em solenidade acontecida no domingo 15 de outubro do ano de 2017, quando declarou santos os 30 Mártires de Cunhaú e Uruaçu, massacrados no Rio Grande do Norte em 16 de julho de 1645. A cerimônia de canonização foi presidida pelo Papa Francisco e contou com 450 concelebrantes, assistida por aproximadamente 50 mil pessoas, que lotavam a Praça de São Pedro em Roma. Na ocasião, o Papa Francisco declarou santos os mártires potiguares, após o pedido oficial durante a cerimônia celebrada pelo cardeal Angelo Amato, prefeito da congregação da Causa dos Santos. “Que estes que agora são santos indiquem a todos nós o verdadeiro caminho do amor e da intercessão junto ao Senhor para um mundo mais justo”, declarou o Papa Francisco, em sua homilia. Por causa desses episódios, a história nos relata o sentimento de abandono que veio a tomar conta dos habitantes de Pernambuco que, em outubro de 1645, resolveram redigir um longo manifesto narrando o clima de terror que estavam vivendo sob o domínio holandês. Manifesto dos cidadãos de Pernambuco publicado para sua defesa sobre a tomada de armas contra a Companhia das Índias Ocidentais, dirigido a todos os príncipes cristãos e particularmente aos Senhores Estados dos Países Baixos Unidos. Numa das versões do documento, escrito em espanhol, como se depreende da cópia original, pertencente ao Instituto Ricardo Brennand do Recife, são descritas algumas das atrocidades perpetradas pelos holandeses e índios antropófagos, seus aliados, que a eles eram entregues, para alimentação, os corpos das vítimas dos seus soldados. "Sendo bem servidos pelos selvagens tapuias a quem animavam [os holandeses] como a tigres e lobos sangrentos, que diante dos seus olhos comiam os corpos mortos daqueles que haviam matado, feito tão abominável que nem os antigos tiranos cometeram tal crueldade. Nas praças onde paravam para repousar e comer os que os recebiam amigavelmente em suas casas eram mortos e como recompensa da sua cortesia e pagamento pela comida que aqueles cristãos haviam dado a cristãos, davam-se seus corpos como comida para os selvagens." No ano seguinte (1646), o embaixador Francisco de Souza Coutinho, de posse de cópia desse manifesto, bem como dos relatórios de funcionários da Companhia, descontentes com o clima de terror insuflado pelo Governo do Recife, fez publicar uma série de panfletos, traduzidos para o holandês, denunciando a triste situação em que viviam os habitantes de Pernambuco. "Não há infâmia tão grande nem descortesia que não tenham usado contra as mulheres; depois de terem abusado delas desonestamente, e as filhas aos olhos dos pais e as mulheres casadas na presença de seus maridos as davam como regalo aos selvagens, que depois de satisfazerem seus intentos bestiais, as matavam e comiam. É verdade que não era a maior crueldade matá-las, porque depois da infâmia de desonrá-las e violá-las, elas mesmas prefeririam a própria morte por acharem- -se privadas de sua honra. Os ouvidos humanos têm horror de escutar tais coisas, mas os da Companhia tiveram olhos para vê-las e permitir tais crueldades, não apenas a um, mas a muitas de nossas pequenas crianças arrancaram os selvagens dos seios de suas mães. Assados e guisados como prato muito delicado. Comum entre eles um provérbio que dizia que os holandeses vieram ao Brasil para castigar os pecados dos portugueses, no que também concordamos e confessamos diante de Deus que bem merecemos tal castigo por nossos pecados, mas que tenham conosco segundo sua grande misericórdia e como um pai benigno que após haver castigado seus filhos lança o açoite ao fogo. Nossa perdição não foi apenas termos caído nas mãos de senhores cruéis e que tinham ódio mortal contra a nação [portuguesa], mas também extremamente apegados ao dinheiro; e passada toda a fúria sangrenta dedicaram-se com afinco a tomar-nos nossos bens justa ou injustamente." Esses panfletos eram impressos em oficinas apócrifas e distribuídos nas ruas, de modo a levantar a opinião pública contra os dirigentes da Companhia das Índias Ocidentais, com sede em Amsterdã. Esta, por sua vez, incomodada com tamanho noticiário, veio à forra [levar a efeito uma vingança; desforrar-se, vingar-se], denunciando, pela imprensa, a deslealdade de Portugal e a duplicidade de D. João IV ao apoiar, de forma escusa, o movimento separatista de Pernambuco.

Santos mártires imolados pelos holandeses no Rio Grande do Norte em 1945 Read More »

padre sergio gomez tey

“A padroeira da Argentina, Nossa Senhora de Luján, é brasileira”

Sergio Gomez Tey, padre argentino conta a história da imagem da Virgem, esculpida no Brasil e que se tornou conhecida por operar milagres, e do escravizado Manoel, trazido da África para o Recife, que cuidava da santa e que é alvo de um movimento para ser beatificado. Uma história ainda pouco conhecida de Nossa Senhora de Luján, a padroeira da Argentina, tem ligações com o Brasil, mais especificamente com o Recife, e envolve pessoas de diferentes nacionalidades. Ela começa com Manoel, um escravizado africano, comprado por André João, um mercador português que levava um carregamento de navio para a Argentina. Além de mercadorias, André levou Manoel e uma imagem de Nossa Senhora da Conceição, para atender ao pedido de um outro português que morava no país vizinho. Mas antes que a Virgem chegasse ao seu destino, ocorreu um milagre, que fez com que a imagem e Manoel permanecessem juntos numa localidade às margens do Rio Luján. O padre argentino Sergio Gomez Tey participa das ações para beatificar Manoel, a partir de relatos de que ele curava pessoas com o azeite da lamparina que iluminava a santa. Ele e outros religiosos argentinos realizaram uma peregrinação de Aparecida do Norte (SP) até o Recife para tornar a história do escravizado conhecida, para que mais pessoas invoquem a sua ajuda e, ao fazer isso, possam ocorrer mais milagres. Na capital pernambucana os peregrinos foram recebidos por Dom Paulo Jackson, recentemente empossado como arcebispo de Olinda e do Recife que, na ocasião, celebrou sua primeira missa na nova função em Jaboatão dos Guararapes. Nesse período o Recife e e Luján tornaram-se cidades-irmãs. Isso quer dizer que haverá cooperação mútua em áreas como turismo, cultura, comércio e desenvolvimento social. Nesta entrevista a Cláudia Santos, padre Sergio conta a história do milagre de Luján, diz estar agradecido pela acolhida no Recife e que está esperançoso com o processo de beatificação de Manoel. “Agora é um tempo favorável, o Papa Francisco tem uma imagem pequena de Manoel no seu altar (...) e tem uma forte preocupação com as novas formas de escravidão contemporâneas, que seguem sendo como uma peste na humanidade”. Gostaria que o senhor explicasse quem foi Manoel e qual a importância dele em transformar a Nossa Senhora de Luján na padroeira da Argentina. Manoel foi um escravo que veio da África para Pernambuco e foi comprado por um navegador português chamado André João. Em 1630, ao transportar mercadorias para a Argentina, André João levou Manoel que logo foi cedido a outro homem que se chamava Barnabé González Filiano. André João trabalhava com mercadoria, que muitas vezes era contrabando. Quando chegou ao Porto de Buenos Aires teve a mercadoria confiscada e apreendida. Filiano era um homem que tinha muito dinheiro, o que lhe permitiu pagar uma a fiança e liberar a mercadoria trazida do Brasil. É possível que essa ajuda que recebeu de González Filiano tenha incentivado André João a ceder o escravo para Filiano. O que sabemos é que o escravo Manoel passa a ser propriedade de González Filiano. Veja que a imagem da Nossa Senhora da Conceição é igual à de Nossa Senhora de Aparecida: tem 38 centímetros de altura e é feita de terracota. André João tinha que levar esta imagem, que lhe havia pedido outro português que vivia no interior da Argentina. Mas antes, passou pela fazenda [Rosendo] de González Filiano que ficava a 70 km de Buenos Aires junto ao Rio Luján. Lá eles pernoitaram e traziam muitas carroças de bois que levavam as mercadorias para o norte da Argentina. Pela manhã, quando quiseram seguir caminho, a carroça onde estava sendo levada a imagem de Nossa Senhora não se move, ficou parada. Tiraram algumas caixas pesadas, mas continuou sem se mover. Eles então tiram uma caixa pequena, onde estava a imagem. Quando a caixa com a imagem sai da carroça, ela começa a se mover. Mas quando devolvem a caixa com a santa, a carroça, outra vez, fica sem sair do lugar. Todos que estavam em volta da carroça disseram na hora: “Nossa Senhora quer ficar neste lugar”. E isso é o que se conhece como o milagre de Luján. A imagem permanece naquele lugar e junto com ela fica Manoel. Como foi testemunha do milagre, o deixam na fazenda para que cuidasse da imagem. Este é o vínculo entre Manoel e Nossa Senhora de Luján. A imagem passa a ser assim chamada, porque o milagre havia ocorrido junto ao rio que tem esse mesmo nome. Manoel ficou 40 anos cuidando da imagem. Quando os milagres operados por Manoel começaram a acontecer? Manoel colocava uma lamparina de azeite para iluminar a imagem, que sempre ficava acesa. Quando chegava gente enferma, Manoel ungia essas pessoas com o azeite da lamparina e elas se curavam. O milagre mais forte que se tem na história escrita foi quando recebeu um sacerdote chamado Pedro Montalbo, que chegou quase morto e Manoel com o azeite da lamparina o curou. Manoel lhe disse que a Virgem queria que ele fosse o sacerdote daquele lugar. Até esse momento não havia nenhum padre naquela localidade. Ele concordou. Este milagre acontece não na fazenda Rosendo, mas em outro lugar para onde a imagem foi levada. Isto porque uma mulher, Maria de Matos, compra a imagem e a transporta para sua fazenda a uns 30 km também à margem do Rio Luján. Mas, por duas vezes, a imagem volta ao lugar do milagre [fazenda Rosendo] de maneira extraordinária. Então, Maria de Matos disse: “Vou a Buenos Aires ver o bispo e vou lhe pedir conselho sobre a imagem”. E o bispo responde: “vamos fazer uma procissão desde o lugar do milagre até o local onde você quer que a imagem esteja”. Ela já havia feito a promessa de fazer uma capela em devoção à Nossa Senhora. A procissão teve a participação de muita gente, inclusive de Buenos Aires e dos arredores. Buenos Aires era uma pequena cidade nessa época. E nessa peregrinação foi também Manoel e, como ele vai, a

“A padroeira da Argentina, Nossa Senhora de Luján, é brasileira” Read More »

capa olinda

Olinda: do retorno da agitação cultural aos desafios na segurança

*Por Rafael Dantas Entre ladeiras, bares e ateliês, Olinda é o recanto de muitos artistas, foliões e amantes da cultura. Para além dos dias festivos do Carnaval, a vida cultural da cidade tem seus encantos, mas divide opiniões. A percepção de quem vive a cena olindense é de que as expressões culturais brotam quase que espontaneamente das suas esquinas. Todo esse potencial, no entanto, carece de maior organização e comunicação. Além disso, há um fantasma que tem assombrado moradores e turistas: a segurança. Quem vive Olinda há mais tempo registra o fechamento de muitos ateliês e espaços de cultura que marcavam a vida da cidade. Alguns mestres das artes plásticas faleceram, como Tereza Costa Rêgo, outros deixaram o município. Um dos lugares que ficou na lembrança dos moradores, por exemplo, foi a Casa do Cachorro Preto. Mas novos points da música e demais manifestações artísticas também surgiram, como a Casa Criatura e a Casa Estação da Luz. Nesse novo ciclo, também houve a revitalização do Mercado Eufrásio Barbosa e de bares com forte programação musical. Novas veias por onde pulsa essa economia criativa local. NOVOS ESPAÇOS A Casa Estação da Luz tem sido um empreendimento de destaque ao longo dos últimos cinco anos, embora tenha oficialmente aberto suas portas como centro de cultura há três, devido às restrições da pandemia. A ideia original foi concebida por Alceu Valença e sua mulher Yanê Montenegro, que embora passem a maior parte do tempo no Rio de Janeiro, são proprietários do espaço. Natália Reis foi convidada a se tornar sócia e gestora do projeto que transformou a casa em um centro cultural. “Desde a abertura pós-pandemia em 2021, a Casa Estação da Luz tem trabalhado para cumprir sua visão cultural, abrangendo diversas áreas como artes plásticas, dança, música, literatura e culinária. Hoje estamos operando em quase 100% do que a gente pode fazer na casa”, afirmou a gestora. Do movimento cultural sonhado para o espaço, ela diz que só não aconteceu ainda o teatro. Em breve acontecerá também a abertura de uma exposição permanente de Alceu Valença. “Um dos nossos objetivos é que num futuro próximo a casa abrigue a exposição permanente que conta a trajetória e poética de Alceu Valença. Um ponto cultural e turístico, pois Alceu é uma atração turística da cidade”, afirmou o curador Bruno Albertim. Na dinâmica atual da casa, ele destaca duas preocupações: a maior visibilidade de novos artistas e a preservação das raízes olindenses. “Um dos eixos curatoriais que tenho tentado imprimir é reinserir atores e autores de uma prática artística que eram relegados ao segundo plano, sem acesso aos mecanismos de produção de hegemonia e poder, ao coração de Olinda. Outro aspecto é que a casa trabalha muito a memória artística da cidade, dentro de um panorama da arte modernista brasileira, da exposição do modernismo tardio que se manifestou na cidade” Outro novo endereço da cultura olindense é a Casa Criatura. Idealizado por Isac Filho. O projeto completou quatro anos de existência, dois dos quais no atual espaço, situado no Sítio Histórico de Olinda. Concebida na pandemia, a casa começou a ganhar vida em 2021 na Rua do Amparo, mas cresceu substancialmente desde então, agora ocupando um espaço dez vezes maior. Isac e sua companheira Juliana, ambos arquitetos, tiveram a visão de revitalizar o patrimônio e construir um ambiente de criação e inovação em Olinda. A casa funciona como um centro de trabalho colaborativo durante a semana e se transforma em uma galeria de arte gratuita nos fins de semana, com exposições, shows e eventos culturais que valorizam a diversidade e a pluralidade de usos. Isac enfatiza que há um esforço para unir artistas consolidados com iniciantes, homens e mulheres, buscando sempre a diversidade e valores que reflitam o espírito do espaço cultural. Ele projeta que a Casa Criatura se consolide como um centro de arte, influenciando positivamente a cultura e a economia criativa em Olinda e na região. O idealizador da casa lembra que o projeto não se limita a suas instalações, mas abraça o entorno urbano, ativando espaços menos explorados. Um exemplo foi a ideia de criar em Olinda um "Beco do Batman", uma referência a um local em São Paulo que ganhou uma nova vida a partir de uma intervenção urbana com muita arte e criatividade. A percepção de Isac sobre a cultura de Olinda é repleta de entusiasmo e um senso de missão. Ele descreve o momento pós- -pandêmico como uma oportunidade de reconexão local. “Eu vejo como um momento de estruturação. Mais bandas se desenvolvendo, mais orquestras se destacando. Não destacaria só música mas, também, os movimentos voltados à arte. Vejo mais efervescentes as artes visuais, um número crescente de grafites, exposições e colabs surgindo. Aqui tem uma mistura do grafite, da arquitetura, da fabricação digital, das figuras a laser. Uma conexão de diversas linguagens. Isso é uma coisa nova. Vejo um momento bom para isso”. Isac acredita que Olinda possui um potencial criativo poderoso, capaz de atrair artistas e criativos de diversas áreas, a partir do fomento de uma política cultural local que consolide a cidade como um polo de criatividade e inovação. BOEMIA OLINDENSE Morador e também trabalhador de Olinda, Márcio Valença aprecia a cena que se constrói nos bares da cidade. Tanto novos endereços, como alguns já tradicionais abrigam a diversidade musical local. “Gosto de desfrutar a boemia da cidade. Frequento bares, principalmente à noite, numa cidade que acontece após às 18h, quando escurece”, afirma Márcio, ressaltando que os vestígios do período carnavalesco são interessantes para os moradores e visitantes. “São blocos fora de época, orquestras passando, um boneco gigante perdido. São resquícios do Carnaval que vivem durante o ano”. Como um bom boêmio, ele lista uma série de espaços tradicionais, como o Bar do Peneira, a Bodega do Veio, o Recanto do Ingá, entre outros por onde ele caminha. “Existem bares mais novos, como o Bar do Amparo e o Fogo de Oca, que são a cara de Olinda, antenados com a cultura da cidade. Ainda

Olinda: do retorno da agitação cultural aos desafios na segurança Read More »

praca independencia 2023

5 fotos da Praça da Independência Antigamente

Em celebração ao dia 7 de setembro, a coluna Pernambuco Antigamente faz um passeio por um dos espaços centrais da cidade do Recife: a Praça da Independência. Uma das centralidades do tradicional Bairro de Santo Antônio é a Praça da Independência. Conhecida como a pracinha do Diário, ela já fazia parte da planta original da Cidade Maurícia. O local já teve no passado outros nomes, como Praça Grande, Praça do Comércio, Praça da Ribeira, Praça do Polé, Praça da União, recebendo o nome atual apenas em 1833. Confira abaixo uma seleção de imagens da Biblioteca do IBGE. Clique nas fotos para ampliar. 1. Vista do Edifício do Diário de Pernambuco, o jornal mais antigo da América Latina. .2. Vista ampla da Praça, com os prédio da Sulacap e a Avenida Guararapes no lado direito. 3. Destaque para a Matriz de Santo Antônio 4. Meios de transporte antigos circulando pelo bairro (no ônibus placa para o bairro da Tamarineira) 5. Vista parcial a partir da praça para a Rua 1º de Março

5 fotos da Praça da Independência Antigamente Read More »

modelo futuro negocios

Modelos de negócios bem-sucedidos devem ter foco na sustentabilidade e no ser humano

*Por Bruno Queiroz Ferreira Diferentemente de décadas atrás, as mudanças estão “atropelando” a estratégia das empresas em todos os segmentos. E, por muitas vezes, seus gestores não percebem que o modelo de negócios pode estar no centro dessa questão. Mas o que é o modelo de negócio? Para que serve? Por que precisa ser revisto? Com que frequência? Como atualizar o modelo de negócios? Antes de tudo, é preciso esclarecer a diferença entre plano de negócio e modelo de negócio. De maneira prática, o plano de negócios tem o objetivo de demonstrar a viabilidade financeira de um projeto/produto/serviço. É um instrumento de apoio aos gestores para avaliar riscos de novos investimentos, por exemplo. Já o modelo de negócio é mais abrangente. Como o próprio nome sugere, é o responsável por dar uma forma ao negócio. Define o propósito da empresa, o nicho de mercado a ser explorado, o problema que resolve, os diferenciais de atuação, o perfil do público que será atendido, a linha de produtos e serviços, os canais de relacionamento e distribuição, entre outros aspectos. Por que o modelo de negócios precisa ser revisto? As mudanças tecnológicas, econômicas, ambientais e sociais vêm acontecendo de forma mais rápida e intensa na última década. Inteligência artificial, moedas digitais, mudança climática, envelhecimento acelerado e hábitos das novas gerações são algumas dessas mudanças que impactam diretamente o comportamento dos consumidores. Com isso, as premissas que deram origem ao modelo de negócio podem perder o sentido rapidamente também. É preciso, portanto, fazer ajustes para se adaptar à mudança da demanda ou trocar o modelo por completo para explorar novas oportunidades e novos nichos de mercado. Um modelo de negócio não dura para sempre. Além disso, com o modelo de negócio inadequado, o investimento em inovação no produto, no processo produtivo e na forma de gestão não gera o mesmo resultado se ele estivesse atualizado. Pode, inclusive, não gerar nenhum resultado ou acelerar o fim da empresa, pois desperdiça esforços que poderiam ser usados na direção correta. Dois casos atuais exemplificam a importância do modelo de negócio atualizado. As principais companhias petrolíferas, no lugar de investir no desenvolvimento de combustíveis livres de emissão de carbono, ainda focam na prospecção de novos campos de petróleo e na ampliação da produção de gasolina e diesel, que terão forte redução de demanda nas próximas décadas. Por outro lado, as montadoras estão acelerando a transição do motor à combustão para o motor elétrico e do modelo de compra (posse) para compartilhamento (uso) dos automóveis, influenciada por legislações ambientais rigorosas e pela menor necessidade de deslocamento proporcionada pela aumento da velocidade da internet e pelo avanço tecnológico dos celulares. Com que frequência o modelo de negócios precisa ser revisto? Cada mercado tem uma dinâmica própria, podendo ser mais ou menos afetados por fatores tecnológicos, econômicos, ambientais e sociais, por exemplo. Nesse sentido, o modelo de negócios tem que evoluir na mesma velocidade que as mudanças impactam o segmento de atuação da empresa. E como atualizar um modelo de negócios? A melhor forma é entender as mudanças que estão ocorrendo. Estudar o futuro e suas possibilidades, portanto, permite se antecipar e agir estrategicamente diante delas. Um bom modelo de negócio é aquele que atende as demandas do presente e, ao mesmo tempo, permite a transição para as necessidades do futuro. Para concluir, vale dizer que modelos de negócios bem-sucedidos no futuro serão aqueles com foco na sustentabilidade e no ser humano. Isso porque, nas próximas décadas, o planeta precisará ser regenerado e a evolução da tecnologia, como IA e computação quântica, eliminará muitos empregos, causando grande desequilíbrio social. Oportunidades que podem ser exploradas em vários segmentos.

Modelos de negócios bem-sucedidos devem ter foco na sustentabilidade e no ser humano Read More »

magna refazenda

"A produção de roupa como geradora de lixo sempre me incomodou"

Magna Coeli, fundadora da Refazenda conta como a empresa se tornou referência em moda sustentável, a ponto de ser reconhecida pela ONU, e explica o seu processo de fabricação que não produz sobras de tecido. Também fala da relação com o filho, Marcos, com quem trabalha, e das dificuldades de financiamento. Quando adolescente, Magna Coeli costumava usar as sobras dos tecidos que sua mãe, costureira, jogava no lixo. Com os retalhos, Magna fazia peças para ela vestir ou acessórios como bolsas. Tal habilidade e o incômodo pelo refugo da produção de roupas permaneceram até a idade adulta e a impulsionaram a fundar a Refazenda. Reconhecida com várias premiações por sua atuação sustentável, inclusive pela ONU (Organização das Nações Unidas), empresa do setor de moda foi pioneira ao produzir de acordo com padrões de economia circular. Assim como fazia na adolescência, na fábrica Magna não descarta retalhos no lixo: a produção é feita de forma a usar todo o tecido. A sustentabilidade social é outra marca da Refazenda, que faz parceria com cooperativas de rendeiras e bordadeiras de vários estados do Nordeste. Nesta entrevista a Cláudia Santos, Magna conta a trajetória da empresa, os desafios para gerir um negócio com preocupações ecológicas, as dificuldades em obter financiamentos e a relação com o filho Marcos Queiroz, que é diretor de Soluções da Refazenda. Como começou a Refazenda? Há 33 anos, eu tinha uma confecção com meu ex-marido e com a família dele. Quando resolvi criar a Refazenda, foi uma inquietação ecológica, romântica, exótica, que tinha todos esses nomes, menos sustentável ou economia circular. Era quase fazer um hobby. A produção de roupa como geradora de lixo sempre me incomodou, porque o lixo que mamãe fazia, enquanto costureira, me proporcionava fazer coisas para eu vestir, ou para fazer bolsas. Pensava nessa minha habilidade de transformar ao criar a Refazenda. Eu tinha um olhar muito bom para cor, sabia modelar. Então migrei da tradicional confecção de camisaria e fui fazer uma produção com princípios ecológicos. Daí o nome Refazenda. Gilberto Gil criou a música e me inspirou, como também foi um princípio para esse norte: transformar a fazenda em algo primoroso, mas de valor agregado. Venho de uma família de costureira e alfaiate e a minha grande revolta era o pouco valor agregado nas peças que meu pai e minha mãe faziam. Eu pensava: hei de fazer as pessoas respeitarem quem faz roupas como uma coisa muito digna, muito preciosa. Agora, tudo isso de maneira inconsciente. A empresa começou com uma fábrica ou uma loja? Primeiro foi um divórcio. Na hora da separação, eu poderia ter ido para um setor diferente, mas insisti nesse porque eu tinha o ideal de montar algo que fosse pioneiro. Os primeiros cinco anos foram de consolidação da marca e definição de perfil de produto. Era um ateliê, mas eu me sustentava financeiramente de forma bem austera. Depois, procurei o associativismo, para tentar crescer do ponto de vista da confecção e encontrar aliados com as pessoas que falassem a mesma língua. Foi uma busca inútil, porque o setor de confecção não conversa com o setor de ideias, de utopia. Ele é commodity, fabrica fardamento, roupa íntima e modinha e opta por volume, não por valor agregado. Passei a participar de missões empresariais, conhecer projetos fora até que um dos filhos começou a trabalhar na empresa para me ajudar financeiramente. Quem é ele? Marcos, o mais velho. Ele fazia publicidade e veio para me ajudar financeiramente porque tínhamos crescido um pouco mais, a empresa tornou-se mais complexa. Mas não encontrávamos um ponto de venda para o nosso produto que fosse autoexplicável, tínhamos que concorrer com produtos que não tinham a mesmas características. E aí tivemos que montar loja própria. Isso dá um trabalho danado, fabricar e montar loja própria é desafio para loucos. Chegamos a ter sete lojas, uma em São Paulo. Quando estávamos com quatro lojas, entrou o outro filho, André, que fazia administração, para ajudar na gestão. Também tenho a família desses aliados que trabalham e vieram comigo lá de trás que são tão família minha quanto a biológica. São pessoas que acreditam no projeto, que torcem e estão comigo até hoje. Esse foi um dos pilares que seguraram a empresa. Mas, veio a crise em 2013, a perda do capital foi muito grande, assim como a perda de fôlego para girar essa máquina com as dificuldades que o setor têxtil tem no Brasil, com taxação absurda e nenhum projeto ou diferencial para as empresas inovadoras. A loja de São Paulo ficou aberta até 2016, remando contra a maré porque o custo aéreo do frete aumentou. Tínhamos que trazer parte da matéria-prima de lá, fabricar aqui e levar de volta para lá. Além disso, um de nós três da família teria que morar lá e nenhum quis perder qualidade de vida. Resolvemos finalizar a atividade e investir no comércio eletrônico, que começou em 2012. De lá pra cá, trabalhamos de forma mais enxuta, mas com mais liquidez, porque chegamos a ter dívidas em banco. Tivemos que modificar a estrutura administrativa porque o crescimento não respondeu na ponta pelo varejo que estava trucidado pela taxação. Aí, André saiu da empresa para atuar na construção civil. Já Marcos se transformou num grande gestor e articulador de mídia nessas novas linguagens, coisa que eu estava defasada. Estamos fazendo parte do Instituto Capitalismo Consciente, que é nacional, temos o certificado B, ganhamos premiação na ONU pela prática da economia circular. Isso tudo graças a Marcos, que mostrou a nossa experiência como inédita e precisava ser divulgada. Esse reconhecimento tem sido revertido para a marca e para os negócios? Por um lado, é algo para consolidar e legitimar o produto que tem propósito, tem alcance, longevidade, é um produto com ética. Mas, em compensação, o pouco capital de giro que temos também atrofia porque à medida que somos falados e alcançamos níveis longínquos, não conseguimos acompanhar o escalonamento financeiro na mesma proporção. Quando procuramos outros cases que são semelhantes a nós, ou

"A produção de roupa como geradora de lixo sempre me incomodou" Read More »